Resposta + 2010 - BVS Ministério da Saúde
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Reverência histórica<br />
Nos relatos sobre o passado, a guerra<br />
e a rivali<strong>da</strong>de parecem constituir fatos essenciais<br />
<strong>da</strong> existência dos Ticuna. Ain<strong>da</strong><br />
hoje os índios falam extensamente <strong>da</strong>s<br />
guerras entre as diferentes nações, dizendo<br />
que eram frequentes as investi<strong>da</strong>s<br />
de um grupo sobre o outro, com muitas<br />
mortes de ambos os lados. Segundo relatos<br />
documentados pelo Instituto Socioambiental<br />
(ISA), os mais velhos procuram<br />
mostrar o seu desagrado ante aquelas<br />
características do passado, comparando<br />
a convivência tranquila de hoje em dia<br />
nas aldeias com o medo e a belicosi<strong>da</strong>de<br />
do tempo de seus avós.<br />
Já na primeira referência aos Ticuna,<br />
que remonta a meados do século xVII e<br />
se encontra no livro Novo Descobrimento<br />
do Rio Amazonas, de Cristobal de Acuña,<br />
há a citação, no capítulo LI, sobre o caráter<br />
guerreiro desse povo: “Mantêm estas<br />
tribos, por uma e por outra margem do rio,<br />
contínuas guerras com os povos vizinhos<br />
que, pelo lado do sul, são, entre outros, os<br />
Curina tão numerosos, que não apenas<br />
se defendem, pelo lado do rio, <strong>da</strong> grande<br />
quanti<strong>da</strong>de dos Água, como também sustentam<br />
armas, ao mesmo tempo, contra<br />
as demais nações que por via terrestre os<br />
atacam constantemente”, relata o livro.<br />
Esses conflitos deixaram como herança<br />
uma estrutura hierarquiza<strong>da</strong> na organização<br />
política e social dos Ticuna. Por<br />
terem historicamente assumido posições<br />
de comando nas guerras, os líderes são<br />
muito respeitados até hoje nas aldeias.<br />
Isso inclui os pajés, que também participavam<br />
dessas guerras, além de terem o<br />
papel de curar as enfermi<strong>da</strong>des.<br />
Arte como alia<strong>da</strong><br />
Nos dias de hoje, no entanto, esse<br />
povo de tradição guerreira – que está<br />
presente no Brasil, na Colômbia e no<br />
Peru - é mais reconhecido pela capa-<br />
40<br />
A tradição artística dos Ticuna aju<strong>da</strong> na produção<br />
de materiais criativos de prevenção<br />
ci<strong>da</strong>de de preservação de sua cultura<br />
e identi<strong>da</strong>de por meio <strong>da</strong>s artes. os Ticuna<br />
produzem máscaras cerimoniais,<br />
bastões de <strong>da</strong>nça esculpidos, pinturas<br />
em entrecascas de árvores, cerâmicas,<br />
tecelagens, colares com pequenas figuras<br />
esculpi<strong>da</strong>s em tucumã, além <strong>da</strong><br />
música e <strong>da</strong>s tantas histórias que compõem<br />
sua tradição oral.<br />
A própria criativi<strong>da</strong>de Ticuna vem auxiliando<br />
o trabalho de informação como<br />
estratégia na prevenção. Foi criado, por<br />
exemplo, um álbum seriado, com pinturas<br />
feitas pelos próprios índios e traduzido<br />
para o Ticuna, que explica como as pessoas<br />
devem se prevenir e quais os efeitos<br />
<strong>da</strong>s doenças. Estratégias de comunicação<br />
como essa fazem grande diferença<br />
para que o trabalho seja realizado de forma<br />
a respeitar a cultura local.<br />
“Para os serviços de saúde localizados<br />
em áreas indígenas, realizar ações<br />
de prevenção <strong>da</strong>s DST/aids é um grande<br />
desafio, pois a maioria dos profissionais<br />
não são indígenas e também não<br />
falam a língua <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de”, afirma a<br />
antropóloga e assessora técnica <strong>da</strong> Uni<strong>da</strong>de<br />
de Prevenção do Departamento<br />
de DST, Aids e Hepatites Virais do <strong>Ministério</strong><br />
<strong>da</strong> <strong>Saúde</strong>, Vera Lopes.<br />
Ela destaca o papel dos Agentes Indígenas<br />
de <strong>Saúde</strong> no processo. Além de<br />
desenvolverem as primeiras abor<strong>da</strong>gens<br />
<strong>da</strong> ca<strong>da</strong> família no seu próprio ambiente<br />
sociocultural, esses agentes facilitam a<br />
interlocução com os demais profissionais<br />
de saúde <strong>da</strong>s equipes multidisciplinares.<br />
Segundo ela, o diálogo com as lideranças<br />
também é fun<strong>da</strong>mental. “Além<br />
<strong>da</strong> atuação dos Agentes Indígenas<br />
de <strong>Saúde</strong>, a possibili<strong>da</strong>de de diálogo<br />
intercultural no respeito aos diversos<br />
saberes e práticas, dos profissionais<br />
de saúde <strong>da</strong> atenção básica e dos diferentes<br />
especialistas indígenas, como<br />
pajés, curadores, conhecedores de<br />
plantas e cantadores, podem se complementar<br />
para a superação de problemas<br />
de saúde individuais ou coletivos<br />
nas áreas indígenas”, afirma Vera.