Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Direitos reservado para<br />
Cecília Bacci & Guilherme Giordano<br />
ceciliabaccibscm@yahoo.com.br<br />
menuraiz@hotmail.com<br />
mococa / sp<br />
capa CDM sobre CHIRICO<br />
Editora AlterNativaMente<br />
produtoresin<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntespi@gmail.com<br />
coelho.<strong>de</strong>.moraes@bol.com.br<br />
Coleção BROCHURAS & ESPIRAIS & <strong>PDF</strong><br />
2
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Mococa<br />
São Paulo<br />
2012<br />
3<br />
Para<br />
Rose Braga
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
MITOLOGIA<br />
PELO MÉTODO<br />
CONFUSO<br />
Coelho De Moraes<br />
4
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Ariadne Ariadne <strong>em</strong> <strong>em</strong> Naxos<br />
Naxos<br />
Dría<strong>de</strong>s, hamadría<strong>de</strong>s, ninfas e sátiros imbecilizados.<br />
Quando pisaram na areia escaldante – dos pés soltavam-se<br />
golfas escaldantes <strong>de</strong> certo material gru<strong>de</strong>nto somente<br />
reconhecido pelos geólogos - quando pisaram na ilha <strong>de</strong><br />
Naxos, nas areias escaldadas por Helio, este brindou-os com<br />
dar<strong>de</strong>jantes raios. Deuses – daqueles menores - erráticos,<br />
dançavam <strong>em</strong> torno <strong>de</strong>les <strong>em</strong> fumegante dança amorosa. Apolo<br />
flechou-lhes no flanco com certeiras investidas ar<strong>de</strong>ntes e as<br />
ancas <strong>em</strong>pinaram <strong>em</strong> solícita cópula ou promessa <strong>de</strong>la. Mas,<br />
uma vez flechados na bunda fugiram espavoridos.<br />
- Se pensou que Creta está perdoada, errou! – o jov<strong>em</strong><br />
gritou. – Não só a ilha como todos os seus filhos e filhas serão<br />
malditos. Isso Inclui você.<br />
Mas, labirintos não têm saída. Falta o segredo. On<strong>de</strong> as<br />
encruzilhadas? On<strong>de</strong> o fio condutor?<br />
5
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Com Ariadne estava a chave para <strong>de</strong>svendar os<br />
segredos.<br />
Em nenhum momento importou se ela o ajudara a sair<br />
do labirinto ou não. O fio. O Príncipe vestido <strong>de</strong> túnica negra<br />
arrojou Ariadne ao chão <strong>de</strong> areia tépida. Ela chorava. Apesar <strong>de</strong><br />
seus ferimentos o jov<strong>em</strong> carregava um cenho <strong>de</strong> peso e dor.<br />
Teseu <strong>de</strong>via partir. A testa ardia-lhe <strong>em</strong> febre, mas podia ser<br />
Helio incansável.<br />
Ariadne ouviu os passou que se afastavam. Ouviu os<br />
barcos <strong>de</strong> cascos negros e os r<strong>em</strong>adores batendo os r<strong>em</strong>os na<br />
superfície das águas. Marinheiros gritavam or<strong>de</strong>ns <strong>de</strong> partida e<br />
atos <strong>de</strong> velejar. O céu ecoava vozes e o roial dos azuis parecia<br />
chumbo pesado na tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> Naxos. Ariadne ouviu a tocata<br />
olímpica das trompas ao longe. Musculosos marujos erguiam as<br />
trompas na direção do poente. Cada acor<strong>de</strong> era um <strong>de</strong>grau que<br />
Teseu escalava. O rapaz subira cada <strong>de</strong>grau <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira como<br />
se fora um <strong>de</strong>us ar<strong>de</strong>nte. Lentamente os navios ganhavam as<br />
ondas e zarpavam.<br />
Houve pausa seguida <strong>de</strong> mais passos.<br />
Em seguida mãos pujantes a agarraram. Ariadne<br />
per<strong>de</strong>u a noção dos t<strong>em</strong>pos e do espaço. Um bafio <strong>de</strong> vinho e<br />
suor dançou no ar. Zéfiros carregavam aromas almiscarados<br />
enquanto Ariadne se via <strong>de</strong>spida <strong>em</strong> rápidos movimentos. As<br />
roupas dançaram no chão. A areia fen<strong>de</strong>u brilhos <strong>de</strong> ouro e<br />
sílica. As mãos tomaram seus seios e ela sentiu <strong>de</strong>rreter-se por<br />
<strong>de</strong>ntro. Escorria <strong>de</strong> si um liquor pegajoso e enquanto, sob o<br />
suor, ela percebia que os navios negros se afastavam rápidos<br />
da costa, sentiu que estava possuída por uma moleza<br />
<strong>de</strong>senfreada. Deixou-se abrir. Fendida <strong>em</strong> carne <strong>de</strong>ixou-se<br />
levar. O ser que tomava <strong>de</strong> seu ventre com fúria e<br />
6
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
<strong>de</strong>terminação, <strong>em</strong>pinou um pouco o corpo e enterrou o pênis <strong>em</strong><br />
Ariadne. Ela apoiou seu corpo, com as mãos, no chão, e ficou<br />
segura pelas pernas enquanto Dionísio refestelava-se <strong>em</strong> gozos<br />
brutais, urrando, o que muito agradou Ariadne lá <strong>em</strong> seu íntimo.<br />
No meio das revoluções <strong>de</strong> corpo sentiu que ele, atarracado às<br />
coxas, passava seus <strong>de</strong>dos grossos pelas beiradas <strong>de</strong> seu ânus<br />
complacente. Ariadne urrou. Era o que ela <strong>de</strong>sejava, na<br />
verda<strong>de</strong>.<br />
Ariadne passou a freqüentar as bacanais. Tornava-se<br />
um <strong>de</strong>las e mantinha <strong>em</strong>penho voraz no aprendizado das<br />
músicas. Entregou-se aos faunos peludos. Rolou nas areias da<br />
orla beijando a boca <strong>de</strong> cada sátiro bêbedo. Bêbeda ela<br />
também, sorveu <strong>de</strong> líquidos esver<strong>de</strong>ados que a punham <strong>em</strong><br />
<strong>de</strong>lírio. Tropeçou, insana, pelas pedras. Gorgolejava um s<strong>em</strong><br />
número <strong>de</strong> nomes e <strong>de</strong>screvia cida<strong>de</strong>s que somente ela via.<br />
Estava louca.<br />
“Deixaste-me morrer / filho do mar azul / Deixaste-me<br />
traída / filho da Tebas antiga / Caiu minha casa / o palácio<br />
naufragou <strong>em</strong> tristezas / minha salvação jaz <strong>em</strong> gozo <strong>de</strong> prata /<br />
nos abraços monumentais <strong>de</strong> Dionísio / <strong>de</strong> suas Bacantes.<br />
Ariadne - a filha <strong>de</strong> Minos. Amou Teseu. Fo<strong>de</strong>u com<br />
Dionísios. Ariadne queria ir a Atenas. Casar-se com Teseu. A<br />
espada e o novelo <strong>de</strong> linha <strong>de</strong> ouro; achar o caminho <strong>de</strong> volta.<br />
Ela se per<strong>de</strong>u <strong>em</strong> seu caminho <strong>de</strong> paixão. Ela se per<strong>de</strong>u,<br />
enquanto segurava uma das pontas.<br />
Enquanto isso, Ariadne, lí<strong>de</strong>r das coruscantes mêna<strong>de</strong>s,<br />
bacantes, dançarinas vitoriosas, alucinadas mulheres<br />
seguidoras <strong>de</strong> Dionísio, permanecia insana e selvag<strong>em</strong>. Muito<br />
diferente da doce filha <strong>de</strong> Minos. Ela passou a tratar dos rituais<br />
7
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
f<strong>em</strong>ininos da Vila dos Mistérios. Esta vila era um lugar <strong>de</strong>stinado<br />
à iniciação <strong>de</strong> mulheres. Durante a colheita <strong>de</strong> uvas Ariadne se<br />
manifestava à entrada das cavernas do submundo, mostrando a<br />
sátiros meio-humanos e meio-animais, e a Sileno, velho gordo e<br />
bêbado, toda sua exuberância <strong>de</strong> mulher copiosa <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejos,<br />
mas dotada <strong>de</strong> imenso conhecimento do passado e do futuro.<br />
Como se davam as danças nas longas noites <strong>de</strong> orgia?<br />
As mulheres se iam <strong>de</strong>sfazendo das vestes, como se <strong>de</strong>spiss<strong>em</strong><br />
<strong>de</strong> antigos papéis e atitu<strong>de</strong>s. Era coisa <strong>de</strong> receber a nova<br />
imag<strong>em</strong> <strong>de</strong> si mesmas. Depois, tendo recebido o coito <strong>de</strong><br />
Dionísio, elas ganhavam cestas contendo o falo ritual. Ariadne<br />
se tornava, então, capaz <strong>de</strong> olhar o po<strong>de</strong>r fertilizador do <strong>de</strong>us,<br />
uma força regenerativa primordial.<br />
Na noite extr<strong>em</strong>ada, entre luas e brisas febris, uma<br />
<strong>de</strong>usa alada, armada <strong>de</strong> chicote comprido, fustigava os ares,<br />
erguia-se sobre a iniciada, que se submetia com humilda<strong>de</strong>. A<br />
iniciante, ajoelhada, pousava a cabeça sobre o colo da mulher<br />
mais velha que não a protegia mas lhe dava apoio.<br />
Um dia, <strong>em</strong> <strong>de</strong>lírio perdida, escondidas as mulheres,<br />
trazia o mar as últimas ondas do dia, Ariadne pareceu notar que<br />
uma cabeça <strong>de</strong> hom<strong>em</strong> rolava sobre as ondas, indo e<br />
retornando, ao som angustiado da lira. Ela se l<strong>em</strong>brou <strong>de</strong><br />
Orfeu, e pensou <strong>em</strong> fugir para Lesbos.<br />
Talvez ali se livrasse <strong>de</strong> tanto prazer.<br />
8
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
CENTAURO CENTAURO DAS DAS NUVENS<br />
NUVENS<br />
Deixa ver se me l<strong>em</strong>bro corretamente.<br />
Cavalgada <strong>de</strong> centauros. A Tessália sai <strong>de</strong> seus<br />
fundamentos geológicos com o ribombar das patas. São<br />
milhares. São rápidos. Fugimos todos <strong>de</strong>ssa horda <strong>de</strong>struidora.<br />
Nunca sab<strong>em</strong>os o que farão. Os centauros personificam o que<br />
há <strong>de</strong> forças naturais <strong>de</strong>senfreadas, <strong>de</strong> <strong>de</strong>vassidão e<br />
<strong>em</strong>briaguez. Um bando <strong>de</strong> loucos <strong>em</strong> furiosa carreira pelos<br />
campos.<br />
Conheci o Centauro Quíron, um dia, como animal<br />
fabuloso, meta<strong>de</strong> hom<strong>em</strong> e meta<strong>de</strong> cavalo. Eu o encontrei<br />
habitando as planícies da Arcádia e da Tessália. É claro que o<br />
vi <strong>de</strong> longe. Sabia muito b<strong>em</strong> <strong>de</strong> sua força e seu <strong>de</strong>st<strong>em</strong>perado<br />
ânimo pujante. Não seria sábio ficar por perto. As tribos s<strong>em</strong>i-<br />
9
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
selvagens que viviam nas zonas mais agrestes da Grécia <strong>de</strong>ram<br />
orig<strong>em</strong> a ele. Soube, <strong>em</strong> conversa animada com Terpsícore,<br />
que esse especial centauro era filho <strong>de</strong> Ixíon, rei dos lápitas, e<br />
<strong>de</strong> Nefele, <strong>de</strong>usa das nuvens. Se você não conhece esse<br />
pessoal e esses lugares vá atrás <strong>de</strong> uma enciclopédia.<br />
Enciclopédia me l<strong>em</strong>bra ciclope, mas já é outra histórias. Tudo<br />
isso não passa <strong>de</strong> nomes. O que vale mesmo é a história, as<br />
várias histórias que contam do Centauro. Havia ocasiões <strong>em</strong><br />
que ele mesmo se dizia filho <strong>de</strong> Apolo e Hebe. Nesses<br />
momentos um leve sorriso lhe aparecia e ele disparava pelas<br />
campinas. Parecia clara a alusão às águas torrenciais e aos<br />
bosques.<br />
No entanto há episódios <strong>de</strong> barbárie.<br />
Enquanto Terpsícore ensaiava alguns passos novos <strong>de</strong><br />
uma dança para convidados no Olimpo, l<strong>em</strong>brei-me <strong>de</strong> outra<br />
festa e outros convidados. Eram os convidados para o<br />
casamento <strong>de</strong> Pirítoo, rei dos lápitas. Novamente nomes e<br />
aci<strong>de</strong>ntes geográficos... Naquele dia, os centauros, todos,<br />
enlouquecidos pelo vinho, tentaram raptar a noiva,<br />
<strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ando-se ali uma terrível batalha. Tanto alvoroço<br />
causou o episódio que acabou retratado nos frisos do Partenon.<br />
Faltou o <strong>de</strong>talhe <strong>de</strong> se saber o que fariam com a noiva, se<br />
l<strong>em</strong>brarmos que raptos têm conotação sexual e os<br />
centauros...b<strong>em</strong>... eles ainda têm língua...<br />
Ao acabar o relato a musa riu da minha ingenuida<strong>de</strong> e<br />
disse que não acreditava <strong>em</strong> nada daquilo. Deu meia volta,<br />
volitando <strong>em</strong> gaze e véus finíssimos entre azuis e nácares. Ela<br />
disse que tinha absoluta certeza <strong>de</strong> que os centauros também<br />
teriam lutado contra Heracles. Por isso o herói os expulsara do<br />
cabo Mália. Sim. Claro! N<strong>em</strong> todos os centauros eram seres<br />
selvagens. Um <strong>de</strong>les, Quíron, o Centauro aquele a qu<strong>em</strong> me<br />
10
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
referi acima, foi instrutor e professor <strong>de</strong> Aquiles, Heráclito, Jasão<br />
e outros heróis, entre os quais Esculápio. É! Pelo visto a<br />
centaurida<strong>de</strong> t<strong>em</strong> relações com a filosofia e a medicina. Mas<br />
também t<strong>em</strong> com a guerra <strong>de</strong> Tróia.<br />
Terpsícore n<strong>em</strong> prestou atenção nos <strong>de</strong>talhes <strong>de</strong><br />
minhas invectivas poéticas. Olhava as nuvens. Sonhava com<br />
palcos e salões rebrilhando <strong>em</strong> diamante. Levantou uma perna<br />
para o mais alto dos movimentos. Ela disse: - Você sabia que,<br />
enquanto grupo, os Androhipos foram notórias personificações<br />
da violência!?<br />
Sei, pensei com minhas sandálias, o velho Sófocles<br />
escrevendo suas peças. Mas não interessa... nós, helenos,<br />
achamos que Eros e Dioniso são influencias <strong>de</strong>cisivas para um<br />
bom centauro <strong>de</strong>s<strong>em</strong>bestar pela Tessália. E lá vão eles; às<br />
vezes como homens aos quais se acrescenta a meta<strong>de</strong><br />
posterior <strong>de</strong> um cavalo, outras vezes realçando seu caráter<br />
bestial, só o <strong>de</strong>snudo busto humano, mas s<strong>em</strong>pre cavalgando<br />
na direção das nuvens. S<strong>em</strong>pre.<br />
Disso eu me l<strong>em</strong>bro como se fosse hoje. Meu pai<br />
contando essas fantasias.<br />
11
MEDUSA<br />
MEDUSA<br />
Ah! Mulher!<br />
Mulher? Qu<strong>em</strong> sabe!?<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
T<strong>em</strong> um po<strong>de</strong>r extraordinário que mesmo morta petrifica<br />
qu<strong>em</strong> olha para sua cabeça multiofídica.<br />
Ela é ruiva para alguns. Outros já a viram, <strong>de</strong> longe, é<br />
claro, com cabelos cor <strong>de</strong> ouro ou cobre... muitas vezes cabelos<br />
fumegando. Alguns fios <strong>de</strong> cabelos vermelhos surg<strong>em</strong> no meio<br />
das cobras e serpentes e se <strong>de</strong>ixam cair sobre os ombros. A<br />
mecha daquele cabelo afugenta qualquer exército e seu sangue<br />
t<strong>em</strong> o dom <strong>de</strong> matar e ressuscitar pessoas. Quando entrei <strong>em</strong><br />
12
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
seu território vinha atrás <strong>de</strong> um pouco <strong>de</strong>sse sangue. Derramar<br />
o seu sangue, mas, ainda não sabia como contê-lo. Só não me<br />
livrava da espada hermética.<br />
Medusa é uma das três Górgonas, filhas das divinda<strong>de</strong>s<br />
marinhas Fórcis e Ceto. Isso todo mundo sabe; fing<strong>em</strong> que não.<br />
Que me perdo<strong>em</strong>. Ao contrário <strong>de</strong> suas irmãs, Esteno e Euríale,<br />
Medusa é mortal. Bom para nós. No entanto, as outras são<br />
muito menos famosas e talvez por isso a inveja e, por incrível<br />
que pareça, muito mais bonitas, relativamente. Os sentimentos<br />
humanos s<strong>em</strong>pre projetados nos <strong>de</strong>uses e nos monstros. Todos<br />
ainda têm medo das três irmãs. Todos. T<strong>em</strong>idas pelos humanos<br />
e <strong>de</strong>uses e santos, elas habitam o extr<strong>em</strong>o Oci<strong>de</strong>nte, junto ao<br />
país das Hespéri<strong>de</strong>s, país cantado por muitos bardos<br />
amedrontados, que é por on<strong>de</strong>, pé ante pé caminho inequívoco<br />
segurando, <strong>de</strong>cidido, a terrível espada do mensageiro. Não só a<br />
espada mas, também, um brilhante escudo. A espada está<br />
colada <strong>de</strong>finitivamente <strong>em</strong> minha mão direita. O capacete eu<br />
<strong>de</strong>ixei <strong>de</strong> lado por que não gostei do mo<strong>de</strong>lo.<br />
Medusa!<br />
T<strong>em</strong> serpentes <strong>em</strong> vez <strong>de</strong> cabelos – mas há os cabelos<br />
ruivos, como já disse – e ela é dona <strong>de</strong> presas pontiagudas,<br />
carrega pesadas mãos <strong>de</strong> bronze e asas <strong>de</strong> ouro. Fe<strong>de</strong> muito.<br />
Um dia eu me aproximei <strong>de</strong>la pelas costas e não pu<strong>de</strong><br />
conter o vômito.<br />
Fui encarregado por Poli<strong>de</strong>ctes <strong>de</strong> <strong>de</strong>cepar a cabeça da<br />
górgona. Para isso, muni-me <strong>de</strong> objetos mágicos como<br />
sandálias aladas, para qu<strong>em</strong> acredita é claro, – fáceis <strong>de</strong><br />
encontrar no Jardim da Frigia, - mas estas foram presentes<br />
13
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
divinos – e, com eles po<strong>de</strong>r pairar acima do monstro num<br />
arr<strong>em</strong>edo <strong>de</strong> estratégia.<br />
Levo, também, além da espada cortante, o escudo <strong>de</strong><br />
bronze, como também já disse. Quero, com o po<strong>de</strong>roso reflexo<br />
do escudo, neutralizar o olhar petrificador. Esse é o plano que<br />
me propus executar. Com a espada dada pelo <strong>de</strong>us Hermes <strong>em</strong><br />
pessoa, <strong>de</strong>capitarei a mulher e, imediatamente, a colocarei na<br />
frente do escudo <strong>de</strong> Atena, como proteção contra os inimigos.<br />
Ei! Lá está ela, comendo as partes <strong>de</strong> um cão. Prefere<br />
as entranhas.<br />
Não tenho muito t<strong>em</strong>po. Para o reflexo funcionar e ela<br />
mesma se petrificar é preciso <strong>de</strong> luz e com isso a exposição do<br />
meu corpo. Ela está se virando! Ela fala como se mil águas<br />
<strong>de</strong>sabass<strong>em</strong> sobre mim. E ouço:<br />
- Perseu é novamente meu convidado?<br />
Ela me viu. É agora.<br />
14
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
NINFAS NINFAS QUE QUE AMAM AMAM MO MORTAIS MO<br />
RTAIS<br />
Pisando <strong>em</strong> falso o arqueólogo escorregou nas pedras e<br />
acabou sentado na lápi<strong>de</strong>. Do meio do barro podia ler um<br />
fragmento αδαυτισ αιχρΓ αδ ετρον οδ, sobre seres<br />
mitológicos parecidos com elfos, fadas e gnomos, <strong>de</strong> clara<br />
inspiração greco-romana. Era um achado <strong>de</strong> importância.<br />
Graças ao seu tombo. As ninfas, essas divinda<strong>de</strong>s f<strong>em</strong>ininas<br />
secundárias - αιλ〈σσεηΤ( οδ σο⎜ιχαµ σολεπ αδατιµιΛ<br />
.αιν⎮δεχαΜ αδ λυσ οα ,υεγΕ ραµ ο ε οριπΕ ο ερτνε -<br />
s<strong>em</strong>pre associadas à fertilida<strong>de</strong> e i<strong>de</strong>ntificadas <strong>de</strong> acordo com<br />
os el<strong>em</strong>entos naturais <strong>em</strong> que habitavam, <strong>de</strong>ram a dica do<br />
caminho a seguir. O passo <strong>em</strong> falso e o tombo, certamente,<br />
seriam ações dos <strong>de</strong>uses mo<strong>de</strong>rnos.<br />
15
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Tudo b<strong>em</strong> aí? – perguntou o colega que <strong>de</strong> longe viu o<br />
arqueólogo <strong>de</strong>saparecer barranco abaixo. Ele levantou o <strong>de</strong>do<br />
polegar para cima. Que não se preocupass<strong>em</strong>.<br />
Tomou da pedra e passou os <strong>de</strong>dos sobre os escritos.<br />
Tinha mais coisas. Sabia que <strong>de</strong>via usar espelho para ler mas<br />
conhecedor do idioma po<strong>de</strong> b<strong>em</strong> enten<strong>de</strong>r do que se tratava.<br />
υοηνεπµεσεδ σοιν⎢λιµ σιοδ εδ σιαµ ροΠ . As oceânidas<br />
e as nereidas eram ninfas marinhas; as náia<strong>de</strong>s, crenéias,<br />
pegéias e limneidas moravam <strong>em</strong> fontes, rios ou lagos; as<br />
hamadría<strong>de</strong>s (ou dría<strong>de</strong>s) eram protetoras das árvores; as<br />
napéias, dos vales e selvas; e as oréa<strong>de</strong>s, das montanhas. Mas<br />
qu<strong>em</strong> é que <strong>de</strong>seja saber sobre isso? Tudo ali escrito, mas e<br />
daí? Uma lista <strong>de</strong>las, no original, e a poesia do escrito<br />
l<strong>em</strong>brava uma frase feita para feiticeiros e oráculos.<br />
υοηνεπµεσεδ σοιν⎢λιµ σιοδ εδ σιαµ ροΠ .ετσεο α<br />
,οδνιΠ ε ,ετσεδρον α ,οπµιλΟ σεδαδιλαϖιρ εδ οχλαπ<br />
ιοφ αχισσ〈λχ αχοπ⎡ αΝ.<br />
Mas, abaixo, o lago se mexeu, as terras tr<strong>em</strong>eram, e o<br />
mato parecia andar na campina <strong>em</strong> torno. As ondulações dos<br />
montes se tornaram mais claras e <strong>de</strong>finidas. Havia uma<br />
diferença no mundo. A estela <strong>em</strong> suas mãos pesou mais do que<br />
parecia valer.<br />
Nisso, vozes surgiram, cálidas e penetrantes...<br />
- Não somos imortais. σεδαδιλαϖιρ εδ οχλαπ ιοφ<br />
αχισσ〈λχ αχοπ⎡ αΝ .Viv<strong>em</strong>os muito. αγεργ αιρ⌠τσιη<br />
αν ετνατροπµι. Não envelhec<strong>em</strong>os. Não somos imortais<br />
λεπαπ ε σιετρ⎡φ σαρρετ σαυσ ροπ ασοµαφ αρΕ. As<br />
vozes ecoavam nas pare<strong>de</strong>s das ruínas. Fragmentos. O<br />
arqueólogo percebeu que o senso lhe faltava.<br />
16
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Não somos imortais. Mas os filhos <strong>de</strong> Prometeu estão<br />
com os dias contados sobre a Terra. Não há mais cura. Não há<br />
mais como nutrir a humanida<strong>de</strong>.<br />
O arqueólogo tentou dizer alguma coisa. Em geral, ele<br />
não se <strong>de</strong>stacava individualmente, <strong>em</strong>bora tenha sido, algumas<br />
vezes, um dos mais citados cientistas <strong>de</strong> seu t<strong>em</strong>po, das mais<br />
citadas publicações da literatura <strong>de</strong> seu meio, porém, naquele<br />
momento estava <strong>de</strong>cididamente mudo.<br />
Súbito, um grupo <strong>de</strong> nereidas, filhas do <strong>de</strong>us marinho<br />
Nereu, subiu pela praia e entre elas via-se Tétis, mãe <strong>de</strong><br />
Aquiles. Por <strong>de</strong>trás <strong>de</strong>la surgiram duas ou três náia<strong>de</strong>s recém<br />
geradas pelo <strong>de</strong>us do rio, rio que fluía na encosta a dois<br />
quilômetros dali. E <strong>de</strong> uma árvore especial – o freixo -<br />
brotavam as melía<strong>de</strong>s, duras e firmes <strong>em</strong> sua beleza vegetal,<br />
porém belicosas.<br />
Todas se aproximavam do arqueólogo. Elas<br />
conversavam entre si “σεδαδιχ ερτνε οµοχ σαιλ⎨µαφ<br />
ερτνε ⌠σ ο©ν ).σολαϖαχ συεσ”. Belas, graciosas e<br />
s<strong>em</strong>pre jovens, amadas por muitos <strong>de</strong>uses, confabulavam <strong>em</strong><br />
seu grego invertido. Naquele momento queriam, ar<strong>de</strong>nt<strong>em</strong>ente o<br />
cientista. Ele tentava, obstinadamente, correr.<br />
*<br />
Na busca que a comitiva <strong>de</strong> pesquisadores <strong>de</strong>u nas<br />
encostas só pu<strong>de</strong>ram encontrar o corpo carbonizado do<br />
arqueólogo, sob uma lápi<strong>de</strong> on<strong>de</strong> se lia :<br />
17
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Levamos o corpo, como aconteceu com Hilas,<br />
Fundimo-nos com ele, da mesma forma que Salmácis com<br />
Hermafrodito e o corpo, frágil e simples, se auto-<strong>de</strong>struiu, como<br />
fez Eco, por amor .<br />
18
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O O DESTINO DESTINO DE DE DDEDALO<br />
DD<br />
DALO<br />
Por que monstro?<br />
Escondido dos olhares sarcásticos, a abominação<br />
taurina era nada mais e nada menos do que um filho não<br />
amado, como tantos há <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a divinda<strong>de</strong> hebraica preferiu<br />
um <strong>de</strong>les.<br />
Como gostar daquela atrocida<strong>de</strong>?<br />
Evi<strong>de</strong>nte que <strong>de</strong> touro nada tinha. Seu porte<br />
monstruoso, suas <strong>de</strong>formações, seus esgares nada traziam <strong>de</strong><br />
bom para a linha genética <strong>de</strong> Minos.<br />
19
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Pasífae, a mulher, dormira com seus soldados, com<br />
seus oráculos, com seus <strong>de</strong>uses, com a ilha toda <strong>de</strong> Creta, e <strong>de</strong><br />
repente, <strong>de</strong>ita-se com Zeus <strong>em</strong> pessoa e dá à luz um filho<br />
doente? Que diferença tinha esta figura da beleza <strong>de</strong> Ariadne, a<br />
traidora. De que valia Ariadne, com sua juventu<strong>de</strong>, se teceu o fio<br />
dourado que levou a livrar os tebanos do tributo que<br />
alimentavam o idiota Minotauro?<br />
Per<strong>de</strong>u-se o filho <strong>de</strong>sprezível, per<strong>de</strong>u-se a prezada filha.<br />
Nas terras e nas ilhas do Helesponto era proibido<br />
conceber filhos impuros, alquebrados, fracos, <strong>de</strong>struídos... e o<br />
fim <strong>de</strong>les era a morte. O esquecimento. Olvidar a doença. Filho<br />
<strong>de</strong> Rei não po<strong>de</strong> ser doente. Filho <strong>de</strong> Rei t<strong>em</strong> que mostrar vigor<br />
e comando. Se não for lançado pelo abismo, como mandam os<br />
argivos, o monstro será oculto <strong>de</strong> todos. Mesmo que humano,<br />
ou filho s<strong>em</strong>idivino, apren<strong>de</strong>rá os modos do animal.<br />
- Dédalo! – ecoou a voz <strong>de</strong> Minos, alquebrado pela<br />
tristeza, - sobre você pesa a ord<strong>em</strong> <strong>de</strong> construir uma prisão. Lá<br />
colocarei esse... Touro. Longe do olhar do inimigo. Longe do<br />
olhar <strong>de</strong> Zeus. Longe do riso <strong>de</strong> todos. Meu tributo a ele será a<br />
terna juventu<strong>de</strong> do povo tebano. (Nesse momento Minos tocou<br />
um gongo para <strong>de</strong>terminar que os escribas anotass<strong>em</strong> sua<br />
palavras). Tributo: - 14 jovens tebanos, todo ano, para alimentar<br />
a sanha do animal. Todo ano a fúria do prisioneiro será<br />
aplacada com essa leva <strong>de</strong> sangue fresco e carne tenra. O resto<br />
do ano fica por conta dos incautos e dos animais que<br />
<strong>de</strong>ixar<strong>em</strong>os à porta: cabras, bo<strong>de</strong>s... Fica por conta <strong>de</strong> suas<br />
caçadas. (pensou) Se pu<strong>de</strong>sse matá-lo s<strong>em</strong> enfurecer Zeus<br />
Cronida assim o faria.<br />
- Dédalo!, - a voz <strong>de</strong> Minos, entre queixosa e<br />
or<strong>de</strong>nança, marchetava o ouvido do arquiteto, - quero muros<br />
20
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
instransponíveis. Quero corredores imensos e falsos. Quero que<br />
a estrebaria vizinha alimente o local <strong>de</strong> animais novos para que<br />
o Touro se alimente <strong>de</strong>les.<br />
Na verda<strong>de</strong> Minos o queria morto. Queria morta a<br />
Ariadne. Queria ver Teseu morrer. Queria matar Pasífae que<br />
engendrou a abominação. Mas não tinha n<strong>em</strong> forças n<strong>em</strong><br />
corag<strong>em</strong> para nada disso.<br />
- Dédalo!, - a ord<strong>em</strong> final, arrogante e pesada, -<br />
ninguém <strong>de</strong>ve saber como entrar ou sair. Arquitete caminhos<br />
secretos. Engendre pare<strong>de</strong>s nuas e lisas. Alimente alturas <strong>de</strong><br />
pedras.<br />
Dédalo não sabia mas seria a primeira vítima da sua<br />
própria obra. Queima <strong>de</strong> arquivo.<br />
21
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O FIO DE DE ARIADNE<br />
ARIADNE<br />
O jov<strong>em</strong> aportou.<br />
Desceram todos do navio negro. Ma<strong>de</strong>irame protegido<br />
por breu compacto. Estavam, os jovens, aparent<strong>em</strong>ente<br />
amarrados. Levados a palácio vi muita coisa estranha. Foram<br />
presos nas celas da praia e eu não tirava meus olhos daquele<br />
que parecia ser o príncipe dos príncipes.<br />
Aquele era Teseu. Filho <strong>de</strong> Egeu. Príncipe tebano.<br />
Os gritos do Minotauro ecoavam nas noites longas <strong>de</strong><br />
Creta e ele parecia faminto ou adivinhava que a época dos<br />
tributos havia chegado.<br />
22
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
As mulheres, nas noites longas <strong>de</strong> Creta, se<br />
<strong>em</strong>belezavam para a festa do Tributo. Os 14 jovens trazidos<br />
esperavam pela morte. Nas ruas, mulheres s<strong>em</strong> posses ou<br />
aristocratas <strong>de</strong>vassas exageravam no vermelho da boca,<br />
l<strong>em</strong>brando vulvas que se abririam ao toque.<br />
Corri para a praia. Pelo caminho do mar alcancei as<br />
celas que recebiam o sal das marés.<br />
Chamei Teseu. Combinei com ele que traria na noite<br />
seguinte, véspera do envio dos 14 para o Labirinto, um rolo <strong>de</strong><br />
fios dourados. Ele sorriu. Ele estava convicto <strong>de</strong> que o filho <strong>de</strong><br />
Egeu não po<strong>de</strong>ria permanecer preso muito t<strong>em</strong>po. Chamou-me<br />
<strong>de</strong> ninfa que sai das águas. Fez-me crer que <strong>de</strong>sejava um beijo.<br />
Corri alegre, dali, para mergulhar e fugir do príncipe. Em<br />
ponto seguro voltei-me e nada via no escuro da noite azul.<br />
Contra os <strong>de</strong>senhos da lua o que me chamou a atenção foi<br />
notar que um gran<strong>de</strong> pássaro partia das muralhas, alçava vôo<br />
com asas que pareciam <strong>de</strong> cera. Nada mais.<br />
Fiz o que foi combinado.<br />
Quando, os 14 foram enviados para as portas da<br />
muralha, fiz com que o rolo <strong>de</strong> fios dourados alcançasse as<br />
mãos atadas <strong>de</strong> Teseu <strong>de</strong> roupas negras. Ele tomou daquilo, o<br />
ouro coruscou igual aos cabelos do príncipe e acreditei que no<br />
futuro eu po<strong>de</strong>ria viver com a majesta<strong>de</strong> daquele s<strong>em</strong>i-<strong>de</strong>us,<br />
longe da minha louca mãe, amante <strong>de</strong> Zeus Taurida, e do<br />
terrível pai Minos, s<strong>em</strong>pre preocupado com os negócios <strong>de</strong><br />
estado. Principalmente, saber que, finalmente, o irmão<br />
abominável teria fim e teria fim também, o tributo e a morte <strong>de</strong><br />
jovens inocentes como eu.<br />
23
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Teseu entrou para os corredores do Labirinto. Rápido e<br />
forte. Vi que <strong>de</strong>senrolava o novelo. Pren<strong>de</strong>u uma ponta na<br />
entrada e seguiu adiante.<br />
Restava a mim esperar. Teseu voltaria, seguindo o fio.<br />
O Touro <strong>de</strong> Minos estaria morto e eu ficaria, para<br />
s<strong>em</strong>pre, livre.<br />
24
PROMETEU<br />
PROMETEU<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
MOLDANDO MOLDANDO MOLDANDO EM EM EM BARRO<br />
BARRO<br />
A figura trágica... A figura rebel<strong>de</strong>... A figura <strong>de</strong><br />
Prometeu, moldando <strong>em</strong> barro suas criaturas... dobrando sobre<br />
si mesmo como se pensasse <strong>em</strong> orações ou fortalecesse<br />
planos... chorando sobre elas... dando-lhes a vida...<br />
- Pren<strong>de</strong> o filho <strong>de</strong> Jápeto nas pedras. Envia o abutre<br />
para comer o fígado do filho <strong>de</strong> Clímene. Se eu pu<strong>de</strong>sse eu<br />
daria fim a esse Titã importuno. Mas, n<strong>em</strong> Zeus po<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sconcertar um dos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> Urano e Gaia, meu<br />
primo, meu parente, meu traidor. Inimigo dos <strong>de</strong>uses olímpicos.<br />
25
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Hesíodo, o poeta, tomou da pena e relatou aquele<br />
discurso. Montou um livro com bastas folhas papiras e mandou<br />
que less<strong>em</strong>. Escreveu <strong>em</strong> sua Teogonia, como Prometeu<br />
roubou o fogo escondido no Olimpo para entregá-lo aos seres<br />
humanos, aquelas criaturas animalescas, tontas, vagabundas<br />
sobre a terra. Fez do limo da terra, mágico escultor, toda a<br />
humanida<strong>de</strong>. A m<strong>em</strong>ória dos seres que brotam do barro v<strong>em</strong><br />
das m<strong>em</strong>órias antiquíssima do povo grego, copiada por tantos<br />
outros povos. Estátuas, por assim dizer. Milhares <strong>de</strong>las<br />
espalhadas sobre a superfície do planeta <strong>de</strong>sabitado, olhando o<br />
nada. Multidão <strong>de</strong> estátuas. A horda precisava <strong>de</strong> vida.<br />
Prometeu não pensou duas vezes e roubou uma fagulha do<br />
fogo divino a fim <strong>de</strong> dar vida às estátuas <strong>de</strong> barro.<br />
- Antes disso eu quero que Pandora leve uma caixa, –<br />
sua própria boceta <strong>de</strong> males e bens, – e que se abra essa caixa<br />
para espalhar todos as virtu<strong>de</strong>s, – positivas e negativas, -<br />
sobre a Terra.<br />
- Mesmo acorrentado a rebelião está aberta contra a<br />
injustiça e a onipotência divina! Cuida do seu futuro, Zeus, pois<br />
eu sei como ele será. As criaturas terão a liberda<strong>de</strong> que<br />
esperam. O <strong>de</strong>us que virá <strong>em</strong> seu lugar t<strong>em</strong> seu nome escrito<br />
no Livro dos Mortos.<br />
- Dessa forma a humanida<strong>de</strong> enfrentará com orgulho<br />
seu <strong>de</strong>stino.<br />
- Sim! Minhas criaturas... com orgulho.<br />
Mas, Prometeu resistiu aos encantos da mensageira.<br />
26
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Que a humanida<strong>de</strong> aprenda a enfrentar seus suplícios;<br />
a gran<strong>de</strong> luta das conquistas civilizadoras e da propagação <strong>de</strong><br />
seus benefícios será à custa <strong>de</strong> sacrifício e sofrimento.<br />
Zeus acorrentou-o a um penhasco, on<strong>de</strong> o abutre lhe<br />
<strong>de</strong>vorava diariamente o fígado. Seu corpo se reconstruía<br />
diariamente e, para seu horror, ele sofria diariamente os novos<br />
ataques da ave. Mas era um Titã e seres <strong>de</strong>ssa estirpe<br />
aguentam qualquer coisa. No entanto Prometeu sabe. É sua<br />
sina, saber. É seu gran<strong>de</strong> talento ser o previ<strong>de</strong>nte e ele sabe e<br />
prevê. E espera. Sabe que da mesma forma que Urano foi<br />
<strong>de</strong>stronado por Cronos, e, este por Zeus, outra divinda<strong>de</strong> virá<br />
para <strong>de</strong>stroná-lo. Divinda<strong>de</strong> <strong>de</strong> outro povo. Sabe também que<br />
escapará <strong>de</strong>ssa fúria vulturina com ajuda <strong>de</strong> Heracles,<br />
<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> Io para além <strong>de</strong> <strong>de</strong>z gerações.<br />
Hesíodo dirá, <strong>em</strong> seu leito <strong>de</strong> morte, meditando sobre<br />
inteligência e arte: - Haverá altares consagrados ao culto <strong>de</strong><br />
Prometeu. Haverá altares <strong>em</strong> Atenas. Nas festas das<br />
lâmpadas, reverencia-se aquele que roubou o fogo do céu. O<br />
<strong>de</strong>us que virá será reflexo <strong>de</strong> Prometeu.<br />
Prometeu – o primeiro profeta.<br />
Talvez o <strong>de</strong>us dos hebreus.<br />
27
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
ReIA, IA, A MAe DOS DOS DOS DEUSES<br />
DEUSES<br />
Ensaio para opereta.<br />
Coro (<strong>de</strong>scendo as escadas <strong>de</strong> nuvens do t<strong>em</strong>plo,<br />
gritando fervorosos. Uns cantam melodias dóricas):<br />
Réia.<br />
Réia <strong>em</strong> Creta.<br />
Réia na Arcádia e na Beócia.<br />
Réia <strong>em</strong> Atenas, cida<strong>de</strong> estado magnífica e bela. Réia!!<br />
28
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Nela, o santuário que a <strong>de</strong>usa compartilhava com o<br />
irmão e esposo Cronos. Coisas <strong>de</strong> rico barro e gamas <strong>de</strong> ouro.<br />
Coro (já no chão, repousados sobre tapetes cretenses):<br />
Réia, antiga <strong>de</strong>usa.<br />
Réia pré-helênica e Gran<strong>de</strong> Mãe cretense.<br />
Réia dos ritos agrícolas, símbolo da terra; sincrética<br />
esposa <strong>de</strong> Cronos.<br />
Réia, titânida, filha <strong>de</strong> Urano e Gaia - o casal primordial,<br />
céu e terra.<br />
(Entra o oráculo).<br />
O oráculo, entupido <strong>de</strong> gases lacrimejantes, dança e<br />
grita nos montes calvos. Conclamou a turba para que todos<br />
soubess<strong>em</strong>:<br />
- Dessa união nascerão seis filhos: Héstia, D<strong>em</strong>éter,<br />
Hera, Ha<strong>de</strong>s, Posêidon e Zeus, mas um <strong>de</strong> seus filhos lhe<br />
tomará o trono.<br />
Feita a profecia ele se retira claudicante. Pisara num<br />
seixo pontiagudo que ninguém vira enquanto limpavam o salão.<br />
Pul<strong>em</strong>os para outra cena.<br />
Réia passa o t<strong>em</strong>po a ver Cronos <strong>de</strong>vorando cada um<br />
dos filhos, logo que nasc<strong>em</strong> (t<strong>em</strong>po perdido e tédio, s<strong>em</strong><br />
trocadilhos). Cronos quer reinar para s<strong>em</strong>pre (um tanto estranho<br />
para qu<strong>em</strong> é o próprio t<strong>em</strong>po. Na verda<strong>de</strong> ele <strong>de</strong>seja ganhar<br />
29
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
t<strong>em</strong>po). Ele é o t<strong>em</strong>po. Ele perdura. Cronos <strong>de</strong>safia o céu e<br />
<strong>de</strong>sce à terra para dominar as hostes pré-humanas.<br />
Réia, muito esperta, quando da gestação <strong>de</strong> Zeus, foge<br />
e <strong>de</strong>saparece <strong>de</strong> seus palácios. Réia foi para Creta e, numa<br />
caverna s<strong>em</strong> luz do monte Dicte, <strong>de</strong>u à luz o caçula, que foi<br />
amamentado pela cabra Amaltéia. Envolveu então uma pedra<br />
<strong>em</strong> panos, como se fosse a criança, e <strong>de</strong>u-a ao esposo, que a<br />
engoliu s<strong>em</strong> perceber a troca. Cronos e cego.<br />
Coro (rolando pelo chão como se sentisse dores <strong>de</strong><br />
barriga):<br />
Réia, mãe <strong>de</strong> Zeus.<br />
Zeus <strong>de</strong>strona Cronos e o obriga a vomitar a todos.<br />
Zeus Cronida.<br />
Réia, mãe do <strong>de</strong>us <strong>de</strong> pedra. Réia faz Zeus renascer.<br />
Réia comanda as estátuas.<br />
Coro (refeitos do pânico abdominal, voltam para a<br />
escada <strong>de</strong> nuvens e sob<strong>em</strong>):<br />
Filha <strong>de</strong> Urano filha <strong>de</strong> Gaia (mãe dos <strong>de</strong>uses, a<br />
própria Terra).<br />
30
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
TESEU TESEU EM NEGRO<br />
NEGRO<br />
A nave negra rasgava o mar.<br />
Estandartes negros indicavam a morte do príncipe.<br />
Egeu num ímpeto se joga nas águas, triste, o filho<br />
estava morto. Morria ele também. Ficava acéfala a terra dos<br />
heróis. O her<strong>de</strong>iro morrera. Creta o absorvera. Assim diziam as<br />
velas negras do navio negro. A nave negra <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ira negra<br />
rasgava os véus dos ventos.<br />
Ariadne estava só. O Minotauro estava morto. Creta<br />
s<strong>em</strong> tributos. Voltavam as naus. Tudo fora um erro. Um golpe<br />
das Erínias. Mais um golpe das tecedoras das teias da vida.<br />
31
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O príncipe estava combalido <strong>em</strong> sua cabine <strong>de</strong> odorífera<br />
ma<strong>de</strong>ira. Doente. A vitória obtida sobre o monstro nascido dos<br />
amores <strong>de</strong> Zeus Cronida e Pasífae, mulher <strong>de</strong> Minos, o pusera<br />
doente. Qu<strong>em</strong> era aquele? Abominação das abominações.<br />
A luta renhida no escuro labirinto. O cheio <strong>de</strong> morte<br />
infestando as pare<strong>de</strong>s. Mofo, larvas e carne pútrida. O sangue<br />
coagulado cobria o chão. O Touro <strong>de</strong> Minos se alimentava dos<br />
filhos <strong>de</strong> Tebas ainda vivos. O tributo. Sete jovens homens e<br />
sete jovens mulheres, todo ano, eram levados para Creta.<br />
A nave negra se arrastava lenta, às vezes. O olhar <strong>de</strong><br />
Teseu se perdia no céu, l<strong>em</strong>brando <strong>de</strong> certa Ariadne. O peso da<br />
traição caía sobre seus braços.<br />
Teseu dormitava cansado e febril. O pai se lançava nas<br />
águas s<strong>em</strong> nenhuma noção da verda<strong>de</strong>. Todos sob o sol da<br />
Héla<strong>de</strong>.<br />
- Se a ban<strong>de</strong>ira negra estiver no mastro principal é porque<br />
morri.<br />
Quando partiu <strong>de</strong> Naxos sentiu que per<strong>de</strong>ra tudo.<br />
Em Tebas encontrou o trono vazio.<br />
Então, era Rei.<br />
*<br />
Com três terríveis penetrações Teseu matou o<br />
Minotauro <strong>em</strong> meio à penumbra do labirinto mantido por Minos,<br />
na ilha <strong>de</strong> Creta. O filho <strong>de</strong> Egeu e Etra, que era filha do sábio<br />
Piteu, da Argólida, num rompante <strong>de</strong>sesperado, durante a fuga,<br />
32
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
ainda foi presa <strong>de</strong> aranhas venosas, larvas e insetos<br />
nauseabundos. Uma golfada <strong>de</strong> sangue do Minotauro caiu sobre<br />
seu rosto. O líquido grosso e <strong>de</strong>nso tingiu-o do vermelho/morte.<br />
Teseu chegou até o portal do labirinto, arfando, mãos<br />
recostadas nas pedras cortantes das pere<strong>de</strong>s, seguindo o fio <strong>de</strong><br />
ouro que Ariadne lhe havia dado. Mas a cabeça <strong>de</strong> Teseu<br />
estava <strong>em</strong>papada <strong>de</strong> suor e ele já fervia na febre. Febre e<br />
tontura. Um tanto envenenado, <strong>em</strong> meio a <strong>de</strong>lírios l<strong>em</strong>brou-se<br />
do pai, da espada escondida, dos seus 16 anos e da <strong>de</strong>cisão<br />
<strong>de</strong> livrar seu povo do pesado tributo <strong>de</strong>vido a Creta, imposto por<br />
Creta: sete moças e sete rapazes que serviam <strong>de</strong> alimento do<br />
monstro, todos os anos. Era sua promessa. Cumprira.<br />
Em seus <strong>de</strong>vaneios febris, tomando do fio pela mão,<br />
correndo pelos corredores, sujando sua pele <strong>de</strong> terra podre,<br />
Teseu ainda po<strong>de</strong> ver a luz no fim do túnel. Caiu.<br />
Ariadne o ajudou, com tr<strong>em</strong>endo esforço, a encontrar o<br />
barco negro. Sim. Ele matara o <strong>de</strong>formado filho <strong>de</strong> Minos. Sim,<br />
ele salvou os companheiros. Sim, ele se vingou da jov<strong>em</strong><br />
<strong>de</strong>ixando-a na ilha <strong>de</strong> Naxos, mas, se serve <strong>de</strong> <strong>de</strong>sculpa, ele<br />
<strong>de</strong>lirava e falava sozinho ou pensava falar com Dioniso. Dioniso<br />
dizia que cuidaria b<strong>em</strong> <strong>de</strong>la. Teseu tencionava voltar? Toda a<br />
confiança <strong>de</strong>positada na fala mansa <strong>de</strong> Dionisio <strong>de</strong> uvas e<br />
vinhos.<br />
As naves, <strong>em</strong> vez <strong>de</strong> se dirigir<strong>em</strong> para o continente<br />
navegam na direção <strong>de</strong> Naxos. Jogada na areia, a jov<strong>em</strong> filha<br />
<strong>de</strong> Minos vê Teseu partir. Cambaleante. Mas ele estava doente.<br />
Durante a travessia, o séquito do príncipe levantou<br />
velas negras. O sinal <strong>de</strong> luto pois o her<strong>de</strong>iro parecia não<br />
conseguir atravessar o mar ainda <strong>em</strong> vida.<br />
33
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Desesperado, vendo <strong>de</strong> longe que as velas tr<strong>em</strong>ulavam<br />
agourentas sobre o azul do intenso mar, Egeu se jogou nas<br />
águas. Esperava a vitória do filho e seu retorno. Jogou-se nas<br />
águas turbulentas <strong>de</strong> tantos azuis e profundida<strong>de</strong>s. O pai<br />
orgulhoso não agüentou saber da morte do herói. Lançou-se<br />
nos braços <strong>de</strong> Posidônio.<br />
Teseu assumiu o governo: uniu os povos da Ática,<br />
capital <strong>em</strong> Atenas, adotou o uso <strong>de</strong> moedas, criou o Senado,<br />
promulou leis e instaurou a d<strong>em</strong>ocracia. Teseu arquitetou<br />
grandiosida<strong>de</strong>s para sua terra.<br />
Mas não é só disso que viverá Teseu.<br />
Cumpridas as tarefas, o príncipe retoma a vida <strong>de</strong><br />
aventuras. Ele é um hom<strong>em</strong> comum que <strong>de</strong>seja a glória mas<br />
não <strong>de</strong>seja se sentar sobre ela. Sai para lutar contra as<br />
amazonas, e acaba por se unir à rainha <strong>de</strong>las, Antíope. Pura<br />
aventura <strong>de</strong> sexo e po<strong>de</strong>r.<br />
Ao lado do amigo Pirítoo, rapta Helena <strong>de</strong> Esparta,<br />
influencia na luta com os argivos <strong>em</strong> Ìlion. Não contente com<br />
isso <strong>de</strong>sce, <strong>de</strong>pois, aos infernos protuberantes <strong>de</strong> terra e rocha,<br />
para tentar raptar também Perséfone, esposa <strong>de</strong> Plutão, mas o<br />
<strong>de</strong>us da terra dos Mortos o manteve preso <strong>em</strong> suas ca<strong>de</strong>iras<br />
durante um banquete. Pura aventura <strong>de</strong> medo e horror.<br />
Novamente preso, largado na terra além do Estige,<br />
r<strong>em</strong><strong>em</strong>ora as canções do barqueiro Caronte, o feio e, é pr<strong>em</strong>ido<br />
por l<strong>em</strong>branças dispersas das idéias platonicas, sorvendo os<br />
sofrimentos <strong>de</strong> Orfeu e Eurídice. Anos <strong>de</strong>pois, Teseu é salvo<br />
por Heracles. Heracles que salva a todos mas se per<strong>de</strong> <strong>em</strong><br />
fúria.<br />
34
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O retorno do herói é triste. Teseu encontra sua terra<br />
dilacerada por lutas internas. Os cidadãos o julgavam morto e<br />
prevaleceu a <strong>de</strong>cadência. Ele, por fim, <strong>de</strong>siste do po<strong>de</strong>r, manda<br />
os filhos para a Eubéia e, amaldiçoa a cida<strong>de</strong>.<br />
Parte para o exílio na ilha <strong>de</strong> Ciros.<br />
Lá é morto por seu primo Licome<strong>de</strong>s, o torto.<br />
35
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
KLEIO KLEIO MEA MEA PAULISTA PAULISTA E<br />
E<br />
GENEROSA<br />
GENEROSA<br />
Conversando com amigas muito íntimas - musas<br />
célebres e convidativas - sobre leitos quentes, relendo<br />
Nietzsche, s<strong>em</strong> ser, necessariamente, nesta ord<strong>em</strong>, passamos a<br />
refletir sobre a arte da cópia. Fazia isso enquanto enrolava<br />
meus <strong>de</strong>dos <strong>em</strong> cachos <strong>de</strong> cabelos notáveis.<br />
- Não sendo arte <strong>de</strong> alta envergadura, - disse-me Kleio,<br />
- os povos chamados mo<strong>de</strong>rnos a praticam diariamente.<br />
36
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Nesse ponto, fui obrigado a intervir; centramos <strong>em</strong><br />
Muganga, – cida<strong>de</strong> que Kleio b<strong>em</strong> conhece, nossa amadamarga<br />
terra-cida<strong>de</strong> do café-com-leite – on<strong>de</strong> encontramos contingente<br />
enorme <strong>de</strong> entediados, <strong>em</strong>burrescentes crônicos e, aptos<br />
incansáveis copiadores. Ela disse:<br />
- Seres, que ainda consi<strong>de</strong>rados humanos, pararam no<br />
t<strong>em</strong>po, concluindo que o t<strong>em</strong>po melhor era s<strong>em</strong>pre o t<strong>em</strong>po <strong>de</strong><br />
ont<strong>em</strong>, - ela assim o disse, folheando seus papiros,<br />
proclamando os textos <strong>de</strong> interminável pergaminho, numa clara<br />
voz meio-soprano.<br />
- Tais seres muganguenses – disse-o eu, l<strong>em</strong>brando do<br />
cheiro <strong>de</strong> goiaba, aos modos <strong>de</strong> Macondo do velho Marques, -<br />
eles praticam tudo aquilo que já foi, s<strong>em</strong>pre, s<strong>em</strong> perceber que<br />
o futuro é o novo que <strong>de</strong>ve espantar a todos. Mesmo espantar<br />
àquele que pratica o novo.<br />
- A prática do futuro requer têmpera e corag<strong>em</strong>, - a<br />
musa concluiu, balançando sua cabeça <strong>de</strong> cabelos ruivos. Os<br />
cacheados aqueles. E fechou seu livro num rompante: - Requer<br />
t<strong>em</strong>po, na verda<strong>de</strong>. Ousadia. Audácia. S<strong>em</strong> audácia não se faz<br />
uma Revolução Francesa. S<strong>em</strong> audácia burguesa. Audácia e a<br />
fome do outro. Sim, pois o pobre faminto não t<strong>em</strong> audácia.<br />
Olhei para os dois lados para ver se alguém nos<br />
observava. Adorava o épico das palavras. Kleio parecia subir<br />
<strong>em</strong> palcos.<br />
- Acho que você exagera, Clio...<br />
- Kleio. Não gosto que me chamam assim... não é Clio...<br />
é Kleio... Pronuncia-se Clio, mas é Kleio.<br />
37
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Desculpa, s<strong>em</strong>pre me esqueço que você é qu<strong>em</strong><br />
confere a flama... a musa da História...<br />
- Se não a fama, - disse ela, - pelo menos o crédito <strong>de</strong><br />
algum feito.<br />
S<strong>em</strong> pestenejar ela tomou do clarim heróico e obrigou<br />
os céus a se elevar<strong>em</strong> durante b<strong>em</strong> uns cinco minutos. Quando<br />
ela parou perguntei, - os céus se relaxaram um tantitnho, - para<br />
puxar qualquer assunto...:<br />
- O que é que você está lendo?<br />
- Tucídi<strong>de</strong>s... – e, mostrou-me o livro, - obra muito<br />
antiga, confeccionada num material frágil, mas eu tomo muito<br />
cuidado com este livro. Eu amo os livros... e aqui diz, - abriu<br />
repentinamente as páginas amareladas, apontando um verbete,<br />
- aqui diz que os atuais muganguenses, atuais <strong>em</strong> ser<strong>em</strong><br />
antiquados, não praticam o caminho que vai para a frente,<br />
porém, pensam que sim.<br />
- Sei, - disse eu, - in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> romancear futuros<br />
frutos e COSMicida<strong>de</strong> por-vir. T<strong>em</strong><strong>em</strong>, na verda<strong>de</strong>, a<br />
CAOScida<strong>de</strong> do <strong>de</strong>vir e se escond<strong>em</strong> sob capas duras dos<br />
livros já escritos. Muganguenses da estirpe Átila-café dão<br />
passos para trás e posam <strong>de</strong> cultos. Estátuas <strong>de</strong> sal. Por on<strong>de</strong><br />
lentamente passam nada mais cresce, como disse o Lobato.<br />
- Há que passar esta geração, - concluiu ela. -<br />
Muganguenses, aqui nascidos ou não, pensam na repetição do<br />
óbvio e tratam disso como novida<strong>de</strong>. São mímicos e cegos ao<br />
mesmo t<strong>em</strong>po e cada passo representa retorno ao que há <strong>de</strong><br />
pior; a uma era romana da <strong>de</strong>cadência dos imperadores. Todos<br />
loucos, aliás. É necessário reafirmar a burrice pois impérios<br />
38
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
on<strong>de</strong> se estabelec<strong>em</strong> novelas e sopóperas, dizquediz <strong>de</strong><br />
esquinas e papo político do leva e traz inter-bares, sopapos<br />
literários e prolapsos <strong>de</strong> úteros tardiamente estéreis, não pod<strong>em</strong><br />
merecer epíteto outro que não seja o da limitada capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
reflexão. - Kleio falou como se vento fosse. Brisa macia. Na<br />
verda<strong>de</strong> n<strong>em</strong> estava aí. Só aromas <strong>de</strong> hortelã e romãs dilatadas.<br />
- Esta é uma terra <strong>em</strong> que fumantes inveterados se<br />
tornam Secretários <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>.<br />
- O que? – Kleio perguntou, - não entendi.<br />
- Esquece.<br />
- Isso é impossível para mim.<br />
- O que?<br />
- Esquecer. Mas, sabe, seu eu tiver que dar algum<br />
conselho... – Kleio espreguiçou-se mostrando vasto cabelo axial<br />
vermelho, - eu diria... Vivamos a realida<strong>de</strong>. Mesmo que sejam<br />
muitas e que cada um tenha a sua. Ou, no mínimo, vivamos a<br />
realida<strong>de</strong> possível. Ou ainda, a realida<strong>de</strong> que pu<strong>de</strong>rmos criar a<br />
cada momento, - e bocejou.<br />
- Pior que isso é a esquizofrenia no po<strong>de</strong>r.<br />
- Po<strong>de</strong>r é esquizofrenia. Esta é uma cida<strong>de</strong> <strong>em</strong> que as<br />
pessoas têm medo das múltiplas realida<strong>de</strong>s e n<strong>em</strong> mesmo se<br />
dá ao luxo <strong>de</strong> se olhar ao espelho. T<strong>em</strong>e ver o erro estampado.<br />
Ela dormia.<br />
39
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Olhando a tez macia <strong>de</strong> Kleio pensei na areia vermelha<br />
<strong>de</strong> tijolos triturados. Trocamos um reino por um sonho.<br />
Trocamos resultados satisfatórios por período <strong>de</strong> aprendizado e<br />
<strong>de</strong> espera. Marcamos passo como bons militares s<strong>em</strong><br />
caminhos. Trocamos ações reais por tentativas no estilo “euacho-que-é-assim’.<br />
E a cida<strong>de</strong>, como boa Muganga que é, excetuando, um<br />
número <strong>de</strong> pensadores que cabe na mão direita ou esquerda –<br />
hoje tanto faz - não reage a nada, pois, morta está. Onírica.<br />
Deitada no louro da história antiga – se é que os há – vive com<br />
ex<strong>em</strong>plos do passado e corta as s<strong>em</strong>entes do futuro. Vive com<br />
as enchentes do passado/hoje.<br />
- T<strong>em</strong>os que esperar que <strong>de</strong>sapareçam, morram, - Kleio<br />
falou enquanto dormia, - e lev<strong>em</strong>, consigo, o carma; então, será<br />
hora <strong>de</strong> retirar dos obeliscos os nomes <strong>de</strong>ssa gente toda e dar<br />
fim a uma era.<br />
Kleio, Kleio... Aos seus atributos acrescentam-se ainda<br />
o globo terrestre sobre o qual ela <strong>de</strong>scansa, e o t<strong>em</strong>po que se<br />
vê ao seu lado, para mostrar que a história alcança todos os<br />
lugares e todas as épocas. Alguém assim escreveu.<br />
40
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
THALEIA THALEIA E E AS AS FLORES<br />
FLORES<br />
CANDENTES CANDENTES<br />
CANDENTES<br />
- Sente-se!<br />
- Também, assim...<br />
- Sente-se!... você não está respeitando <strong>de</strong>vidamente a<br />
presença das flores...<br />
- Quero lá eu saber <strong>de</strong> flores...<br />
- Ora, direis, não ouvir as flores...<br />
41
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Você está misturando teses e...<br />
- Cale-se! Sente-se!<br />
Sentei-me por fim. Por meio <strong>de</strong> uma superabundância<br />
<strong>de</strong> flores, prímulas, para ser exato, b<strong>em</strong> como <strong>de</strong> instalações,<br />
vasos e cachepôs para ser mais exato, que se afirmam por<br />
meio <strong>de</strong> um percurso jardinativo intenso, on<strong>de</strong> a mulher gentil,<br />
amável, para ser mais exato, vivencia e sente...<br />
- Vivencia e sente o que? – ele perguntou, sobraçando<br />
orquí<strong>de</strong>as... – vivencia o que?<br />
Sujeito chato. Dono <strong>de</strong> um nariz aquilino que sugava<br />
quase todo o ar do ambiente. A garota, por sua vez, muito<br />
engraçada, brincando com suas flores. Ele continuou a lengalenga<br />
interminável... ela ria...<br />
- A criação <strong>de</strong> novas formas e tradições <strong>de</strong> flores, entre<br />
formas <strong>de</strong> flores estanques, como margaridas, rosas,<br />
anêmonas, estrelitzas, acácias, gardênias (e o que mais viesse)<br />
é também parte do passado, - e jogou sobre mim uma maço <strong>de</strong><br />
crisânt<strong>em</strong>os amarelos (vim saber <strong>de</strong>pois, para ser mais exato).<br />
Fica evi<strong>de</strong>nte, pois, para qualquer conhecedor <strong>de</strong> flores<br />
que a exposição montada por aquele chato s<strong>em</strong> galocha, não<br />
trazia nenhuma novida<strong>de</strong> formal. Se <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>sse <strong>de</strong>le inventaria<br />
umas <strong>de</strong>z novas floradas e novos botões, mas, não <strong>de</strong>pendia...<br />
tudo se <strong>de</strong>via <strong>de</strong> acordo com a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> Thaleia. Ela se<br />
limitava a contar piadas e a colocar e retirar máscaras. Ela<br />
mesma ria e rolava no chão com dores <strong>de</strong> barriga.<br />
- Thaleia, - ele dizia entre <strong>de</strong>ntes, - usa o mesmo<br />
repertório criativo <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> movimentos mo<strong>de</strong>rnos da<br />
42
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
época grega pré-Aristóteles, - e eu percebi um ar <strong>de</strong> mofa que...<br />
não disse o nome <strong>de</strong>le não é(?), pois digo-o agora... o meu maleducado<br />
or<strong>de</strong>nador se chamava Clóvis. Clóvis continuava. - Isso<br />
não <strong>de</strong>veria surpreen<strong>de</strong>r ninguém... mas, não precisa per<strong>de</strong>r<br />
nosso t<strong>em</strong>po contando anedotas que n<strong>em</strong> mesmo Tales <strong>de</strong><br />
Mileto conhece...<br />
- O jônio?<br />
- Falo <strong>de</strong> Tales, o que cultiva azeitonas...<br />
- O senhor conheceu Tales?<br />
- Evi<strong>de</strong>nte... <strong>de</strong> leituras e ouvir falar.<br />
- Muita gente diz que sua Filosofia v<strong>em</strong> da plantação e<br />
colheita <strong>de</strong> azeitonas...<br />
- Como?<br />
- Primeiro era ciência, contar azeitonas, calcular<br />
estoques e prevenir o futuro... <strong>de</strong>pois virou Filosofia. (ela o olhou<br />
com os olhos <strong>de</strong> amêndoas) Então, não conheceu...<br />
Clovis resmungou e <strong>em</strong>purrou o canteiro <strong>de</strong> azaléias<br />
para a esquerda...<br />
- Quer coisa mais imbecil que uma azaléia?<br />
Clovis t<strong>em</strong> formação como Mestre engenheiro, porém,<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> Thaleia. A que faz brotar as flores... Isso talvez<br />
explique sua linguag<strong>em</strong> rebuscada, sardônica, um tanto<br />
int<strong>em</strong>pestiva e or<strong>de</strong>nadora... mas, não explica seu sucesso.<br />
43
- Sente-se!<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Thaleia jogou seu bastão para Clovis pegar e ele <strong>de</strong>ixou<br />
o bastão cair. Foi incompetente nas li<strong>de</strong>s circenses. Thaleia<br />
começou a rir, levantou os pés sujos...<br />
Se aceitarmos que as flores são mensagens, aí<br />
começamos a compreen<strong>de</strong>r a razão do sucesso <strong>de</strong> Clovis. O<br />
trabalho <strong>de</strong> Clovis não é uma obra <strong>de</strong> arte <strong>em</strong> jardinag<strong>em</strong>, no<br />
sentido tradicional. É, na verda<strong>de</strong>, um projeto lá da vida <strong>de</strong>le<br />
que não faz nenhum sentido para a vida dos outros...<br />
- Sente-se! E preste atenção!<br />
- Se cada jardim plantado por Clovis acionar estruturas<br />
olfativas ou visuais acrescentando significados à mensag<strong>em</strong><br />
original, então ter<strong>em</strong>os, como resultado um <strong>de</strong>terminado jardim<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>lícias, zona <strong>de</strong> flores entrando <strong>em</strong> nós por diferentes<br />
buracos e furos... algo um tanto erótico, para ser exato...<br />
maneiras, por assim dizer, por meio <strong>de</strong> sentidos vários: você<br />
vê, cheira, toca a flor, acessa, presencia a criação do jardim.<br />
Evi<strong>de</strong>nt<strong>em</strong>ente que o jardim gira <strong>em</strong> torno da vida da musa, mas<br />
seu maior ator e divulgador é o próprio Clovis que se arrasta <strong>em</strong><br />
carretas e sacos repletos <strong>de</strong> gerânios, que são as personagens<br />
da mostra...<br />
- A culpa é <strong>de</strong> Thaleia, se não há novida<strong>de</strong>s... Já<br />
carreguei cinquenta bal<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Dálias... mundo afora.<br />
Clovis, apesar <strong>de</strong> mal-humorado, é a razão do sucesso<br />
do jardim. Ele carrega a bisnaguinha com específico e<br />
misterioso caldo ver<strong>de</strong> que espirra na cara das plantas. E<br />
quando o jardineiro é mais importante que o jardim (tipo: “isso<br />
não é apenas uma fúscia, é uma alfaz<strong>em</strong>a”!) já sab<strong>em</strong>os:<br />
44
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
estamos <strong>em</strong> presença do gênio. E esse gênio submete a platéia<br />
<strong>de</strong> visitantes com uma massa <strong>de</strong> informações e <strong>de</strong> formas <strong>de</strong><br />
exposição tão diferentes, numa quantida<strong>de</strong> superlativa <strong>de</strong> vasos<br />
<strong>de</strong> barro e cimento, que qualquer mortal fica inferiorizado por<br />
esse volume <strong>de</strong> begônias e bogarins nunca visto, fantasias <strong>de</strong><br />
glicínias, símbolos <strong>de</strong> camélias, citações <strong>de</strong> hortênsias e<br />
controles r<strong>em</strong>otos <strong>de</strong> cactos. Cactos <strong>de</strong> vidro.<br />
Única atitu<strong>de</strong>: a reverência. Estamos num labirinto <strong>de</strong><br />
cardos e ciclamens. Infinitu<strong>de</strong>s <strong>de</strong> risonhas íris azuis, pletora <strong>de</strong><br />
cravos e centáureas.<br />
- Sente-se! Verei se espr<strong>em</strong>o alguma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Thaleia.<br />
E, já volto. Não mexa nas flores!<br />
45
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
TESEU TESEU RETORNA<br />
RETORNA<br />
A luta com o Minotauro, <strong>em</strong> meio ao labirinto estava a<br />
meio; o rapaz se via fugindo, correndo, caindo, jogando pedras<br />
no hom<strong>em</strong>/animal; isso <strong>de</strong>ixou-o exausto e por pouco não perdia<br />
o fio <strong>de</strong> ouro que atava à cintura. Aventura como aquela n<strong>em</strong><br />
mesmo nas mais <strong>de</strong> mil páginas da Ilíada.<br />
Minotauro, filho <strong>de</strong> Pasífae e Zeus, longe <strong>de</strong> ser uma<br />
besta era apenas um ser <strong>de</strong>struído. Sim. Nascera com <strong>de</strong>feitos<br />
genéticos horrorosos que o tornavam parecido a um touro. Um<br />
bisonte. A cabeça muito gran<strong>de</strong> e alguns ossos que explodiam<br />
sob a pele a modos <strong>de</strong> chifre.<br />
46
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Na verda<strong>de</strong> n<strong>em</strong> parecia bisonte, n<strong>em</strong> touro, n<strong>em</strong> pecus<br />
algum... a sua estrutura <strong>de</strong>struída apenas l<strong>em</strong>brava um ser<br />
monstruoso... se fosse na China seria chamado Minodrago, por<br />
ex<strong>em</strong>plo.<br />
Minos, com vergonha, encarcerou o filho ainda criança e<br />
esqueceu o garoto por lá. Este cresceu s<strong>em</strong> a famosa educação<br />
minóica e n<strong>em</strong> sentido <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong> alguma, com ou s<strong>em</strong><br />
filosofia. Mas isso era prática normal. Nasceu <strong>de</strong>formado(?),<br />
direto para o abismo(!), era essa a prática daqueles t<strong>em</strong>pos,<br />
naquelas regiões paraolímpicas...<br />
Minos aproveitou e mandou para o Inferno o arquiteto<br />
do labirinto. É evi<strong>de</strong>nte e claro que a presença do filho<br />
abominável o fazia l<strong>em</strong>brar <strong>de</strong> Zeus. O fazia l<strong>em</strong>brar que Zeus<br />
estivera <strong>em</strong> sua casa, o honrara com sua presença, comera sua<br />
mulher e <strong>de</strong>stinara um par <strong>de</strong> chifres augustos na testa <strong>de</strong><br />
Minos, facilmente visíveis a quilômetros espirituais.<br />
Abro parênteses. A história <strong>de</strong> Teseu não é uma história<br />
simples <strong>de</strong> se ouvir ou contar. A gente se per<strong>de</strong> no que é<br />
mentira ou verda<strong>de</strong>. Por ex<strong>em</strong>plo: É verda<strong>de</strong> que Pasifae era<br />
ninfomaníaca por isso Zeus a comeu fácil... bastou passar o<br />
rabo entre as pernas da mulher. No entanto Zeus houvera<br />
comido outras que não eram ninfomaníacas, outras que eram<br />
ninfas e outras que eram apenas maníacas, ou mesmo frias.<br />
Teseu chegou <strong>em</strong> Atenas usando espada e par <strong>de</strong><br />
sandálias que Egeu tinha <strong>de</strong>ixado para seu filho, <strong>em</strong> Troezen,<br />
sandálias confeccionadas com couro <strong>de</strong> lagartos velozes.<br />
Me<strong>de</strong>ia, esposa <strong>de</strong> Egeu, bruxa <strong>de</strong> larga envergadura e capaz<br />
<strong>de</strong> solércias infinitas, tentou envenenar Teseu, mas reconheceu<br />
as sandálias, e impediu que o jov<strong>em</strong> bebesse do veneno. Egeu<br />
proclamou Teseu her<strong>de</strong>iro; Me<strong>de</strong>ia foi banida.<br />
47
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Fecho parênteses e pego um atalho.<br />
Teseu matou o Minotauro, MonstrHom<strong>em</strong> que habitava<br />
o intransponível labirinto – até aquele momento - na ilha <strong>de</strong><br />
Creta. Teseu, filho <strong>de</strong> Egeu, rei <strong>de</strong> Atenas, filho <strong>de</strong> Etra, que por<br />
sua vez era filha do sábio Piteu, rei <strong>de</strong> Trezena, na Argólida... e<br />
senão pararmos ai ir<strong>em</strong>os ao início dos t<strong>em</strong>pos on<strong>de</strong> Adão não<br />
t<strong>em</strong> vez. Os gregos adoram estas filiações, especialmente as<br />
que <strong>de</strong>ságuam num <strong>de</strong>us ou num titã. Pontificam as<br />
nomenclaturas intermináveis. Eles se orgulham <strong>de</strong> saber <strong>de</strong><br />
suas ascendências, que, volta e meia acabam num bando <strong>de</strong><br />
assassinos monstruosos do passado. Filhos <strong>de</strong> dragões, <strong>de</strong><br />
touros, <strong>de</strong> putas...<br />
A <strong>de</strong>scendência também não <strong>de</strong>ixa por menos.<br />
Enquanto Teseu percorria os corredores do labirinto,<br />
suado e sujo <strong>de</strong> merda, l<strong>em</strong>brava-se das histórias que o pai<br />
Egeu contava ao pé do fogo, à beira do mar s<strong>em</strong> nome. Egeu<br />
escon<strong>de</strong>ra a espada sob a rocha. Espada esver<strong>de</strong>ada,<br />
construída com pedras e metais variados numa aglutinação <strong>de</strong><br />
energias e liames nunca sabidos; diz<strong>em</strong> que tinha po<strong>de</strong>res<br />
especiais, no entanto, Teseu sabia que era mentira. O po<strong>de</strong>r<br />
mais especial <strong>de</strong> uma espada é o braço que a levanta. Mas,<br />
essa rocha, dizia Egeu, acabaria por simbolizar Teseu e sua<br />
força e seu po<strong>de</strong>r. Uma <strong>de</strong>ssas histórias o transformou <strong>em</strong> Rei.<br />
- Meu filho..., - dizia Egeu cofiando a barba <strong>em</strong> posição<br />
<strong>de</strong> pensador ensimesmado, - procure apenas a rocha quando<br />
for bastante forte para levantá-la.<br />
Teseu tinha 16 anos. Também ele forte como um touro.<br />
Teseu levantou a pedra com um braço, puxou a espada com o<br />
outro trazendo junto um enxame <strong>de</strong> abelhas, larvas e vermes<br />
48
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
que moravam ali durante anos. Realizou a façanha com esmero<br />
e valentia. Ganhou duas mulheres e um efebo para aquela<br />
noite. Apresentou a espada ao pai. Decidido, s<strong>em</strong>pre, a livrar<br />
Tebas do pesado tributo <strong>de</strong>vido a Creta.<br />
- Nunca mais o tributo <strong>de</strong> sete moças e sete rapazes!<br />
Tal tributo era para alimentar o monstro do labirinto;<br />
monstro que urrava na noite; alimento humano do Minotauro,<br />
todos os anos; mas, havia um plano.<br />
Os melhores <strong>de</strong> Tebas traçaram um plano nos melhores<br />
salões da cida<strong>de</strong> bruxuleante. O melhor dos heróis seguiu para<br />
essa cida<strong>de</strong> como se fosse um dos jovens sacrificáveis,<br />
cabisbaixo, tez febril, olhar cinzento. Antes <strong>de</strong> penetrar no<br />
labirinto do Minotauro, por força do <strong>de</strong>stino ou urgências <strong>de</strong><br />
Dioniso, conheceu Ariadne, a melhor das jovens princesas.<br />
Apesar <strong>de</strong> irmã do Minotauro Ariadne nada tinha <strong>de</strong> taurina.<br />
Alguns príncipes com dor <strong>de</strong> cotovelo a chamavam <strong>de</strong> vaca,<br />
mas n<strong>em</strong> era para tanto.<br />
Recebeu, Teseu, <strong>de</strong> Ariadne, filha dileta <strong>de</strong> Minos, rei<br />
<strong>de</strong> Creta, um novelo <strong>de</strong> lã dourada para marcar o caminho <strong>de</strong><br />
volta. Diz<strong>em</strong> que fora tecido a partir do velocino dos argonautas.<br />
Assim, com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sair do labirinto, conseguiu matar<br />
o monstro e se salvar com os companheiros.<br />
Como corriam ao sair do labirinto!<br />
Por <strong>de</strong>scuido, o barco <strong>de</strong> Teseu retornou a Tebas com<br />
as velas negras infladas, uma vez que o herói havia caído <strong>em</strong><br />
febre e o davam como morto. Seriam sauda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Ariadne<br />
<strong>de</strong>ixada <strong>em</strong> Naxos?<br />
49
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Febre <strong>de</strong> medo, febre <strong>de</strong> vergonha, febre <strong>de</strong> amor...<br />
talvez... febres misturadas. Febres palustres, febres<br />
transmissíveis; estava tão mal e doente que os tripulantes<br />
acharam que morreria mesmo, vomitando a bile negra do jeito<br />
que fazia; levantaram as velas negras para dar aviso aos<br />
navegantes e para que Egeu soubesse <strong>de</strong> ant<strong>em</strong>ão que a coisa<br />
estava para pior. As velas negras indicavam luto.<br />
Do outro lado do mediterrâneo azul, <strong>de</strong>sesperado, ao<br />
ver as velas que apontavam no horizonte, 24 quilômetros além,<br />
Egeu jogou-se no mar para afogamento imediato. Besteira.<br />
Podia ter esperado.<br />
O herói assumiu então o governo s<strong>em</strong> antes passar por<br />
vários dias e meses <strong>de</strong> luto e cantorias e dançarinagens s<strong>em</strong><br />
fim. Bebeu-se muito nesses dias. Néctar e ambrosia foram<br />
espalhados pelos cantos da cida<strong>de</strong>. Luto na Héla<strong>de</strong> era assim.<br />
Com garfo e faca.<br />
Teseu uniu no braço da espada maravilhosa os povos<br />
da Ática, capital <strong>em</strong> Atenas; adotou o uso da moeda, uma peça<br />
com vários lados e muito pesada que às vezes só servia para<br />
segurar papiros contra o vento medonho que vinha das praias;<br />
criou o Senado, combinando <strong>de</strong> ant<strong>em</strong>ão alguns favores entre<br />
os amigos; não se esqueceu <strong>de</strong> promulgar leis, com o senado<br />
no saco, e instaurou a base <strong>de</strong> um certo tipo d<strong>em</strong>ocracia.<br />
B<strong>em</strong>... partes <strong>de</strong>ssa história já foi proclamada acima.<br />
Depois disso, Teseu retomou à vida <strong>de</strong> aventuras.<br />
Armou exércitos e caminhou para locais longínquos. Mas, me<br />
parece que são histórias já contadas... vale a pena repetir?<br />
Depois <strong>de</strong> lutar contra as amazonas, uniu-se à rainha <strong>de</strong>las,<br />
Antíope e blá, blá, blá... ou bar... bar... bar... que é coisa mesmo<br />
50
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
<strong>de</strong> bárbaros que não sab<strong>em</strong> falar direito o idioma olímpico dos<br />
gregos.<br />
Saiu a matar vilões. Esqueceu Tebas. Tomou parte na<br />
caça ao boi da Caledônia e na missão dos Argonautas para<br />
encontrar o Velocino <strong>de</strong> ouro. O mesmo do novelo que o salvou<br />
no labirinto mantendo liames, linhagens, ligações e vidas<br />
enoveladas.<br />
Entre os vilões que Teseu matou, fazendo cada um<br />
sofrer o mesmo método <strong>de</strong> morte que infligia aos outros, estão<br />
Sciron, Sinis, e Procusto (três nomes já esquecidos frente ao<br />
nome <strong>de</strong> Teseu).<br />
O rei escolheu fazer viag<strong>em</strong> arriscada por terra, abrindo<br />
caminho por entre bandidos e monstros, entre montanhas e<br />
lagos. Para que? À toa. Príncipe não t<strong>em</strong> o que fazer. Por<br />
motivos políticos, casou-se com Fedra, e esta, como qualquer<br />
pessoa que t<strong>em</strong> <strong>de</strong> interpretar o papel que não <strong>de</strong>seja, <strong>de</strong>ixou<br />
seguir livr<strong>em</strong>ente o curso das paixões e apaixonou-se por<br />
Hipólito, filho <strong>de</strong> Teseu com Antíope.<br />
Enquanto a história <strong>de</strong> Fedra e Hipólito seguia <strong>em</strong><br />
frente, sendo que Hipólito honrava o pai afastando-se <strong>de</strong> Fedra,<br />
Teseu, ao lado do amigo íntimo, - muito íntimo, - Pirítoo, raptou<br />
Helena <strong>de</strong> Esparta, - que parece ser a sequestrável <strong>de</strong> todo<br />
momento, como já foi dito. Muito mais tar<strong>de</strong>, Helena foi<br />
resgatada por seus irmãos Castor e Pólux, os gêmeos, mas<br />
Teseu não se <strong>de</strong>u por vencido, e parece que per<strong>de</strong>ra o juízo...<br />
<strong>de</strong>sceu aos infernos para tentar raptar também Perséfone,<br />
esposa <strong>de</strong> Plutão. Coisas <strong>de</strong> um louco!<br />
O herói estava fora <strong>de</strong> si.<br />
51
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Nada disso. Na verda<strong>de</strong> Teseu se consi<strong>de</strong>rava um<br />
<strong>de</strong>us... No entanto Plutão os manteve presos, - a Pirítoo e<br />
Teseu, - <strong>em</strong> suas ca<strong>de</strong>iras genuflexoras, durante um lauto<br />
banquete on<strong>de</strong> cabeças <strong>de</strong> mortos eram servidas ao lado <strong>de</strong><br />
gelatina <strong>de</strong> flores.<br />
Anos <strong>de</strong>pois, Teseu foi salvo por Heracles, que parece<br />
ser o salvador <strong>de</strong> todo mundo na Héla<strong>de</strong>. Heracles, <strong>de</strong>pois que<br />
matou a mulher e o filho, parece que queria salvar o mundo.<br />
Livra Prometeu do penhasco, livra a cara <strong>de</strong> Teseu... Contudo,<br />
n<strong>em</strong> tudo são alegrias... se Teseu pensava que podia sair por aí<br />
e <strong>de</strong>vastar meio planeta s<strong>em</strong> pagar algum tributo estava errado.<br />
A antiga dívida tributária com Minos veio com juros. Ao voltar a<br />
Tebas Teseu encontrou-a dilacerada por lutas internas, - lutas<br />
intestinas, eu diria, - pois os cidadãos o julgavam morto e<br />
partiram para cima do po<strong>de</strong>r e do trono e fizeram muita merda.<br />
Duplamente intestinas. Isso explica por que fizeram tanta<br />
merda, mas divago.<br />
Triste, macambúzio, <strong>de</strong>sistiu do po<strong>de</strong>r, entregou Tebas<br />
<strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ja para os corvos que se engalfinhavam nas<br />
escadarias do palácio, mandou os filhos para a Eubéia e,<br />
amaldiçoando a cida<strong>de</strong>, exilou-se na ilha <strong>de</strong> Skiros, on<strong>de</strong> foi<br />
morto por seu primo Licome<strong>de</strong>s, que já o espreitava <strong>de</strong> longe.<br />
Licome<strong>de</strong>s o jogou <strong>de</strong> um <strong>de</strong>spenha<strong>de</strong>iro, caindo no mar. Foi<br />
para junto pai.<br />
Em terras <strong>de</strong> po<strong>de</strong>rosos, inteligentes e <strong>de</strong>uses há muita<br />
inveja, saiba disso, caro leitor que <strong>de</strong>seja um dia ser famoso e<br />
divinizado.<br />
O maior herói ateniense, filho tanto <strong>de</strong> Egeu, rei <strong>de</strong><br />
Atenas, quanto <strong>de</strong> Possêidon, <strong>de</strong>us do mar, e Etra, filha <strong>de</strong><br />
Piteus, rei <strong>de</strong> Troezen, estava <strong>de</strong>siludido e, estando, também,<br />
52
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
mortalmente ferido, enquanto boiava na águas do mar, ainda<br />
po<strong>de</strong> vislumbrar uma nesga <strong>de</strong> céu... e voltou a sonhar febril<br />
com a época dos seus 16 anos.<br />
Era feliz?<br />
53
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
ADMETO ADMETO E E ALCESTE<br />
ALCESTE<br />
Quando Zeus matou Esculápio, algumas caravanas <strong>de</strong><br />
médicos surgiram no levante (carroças e velhos carros fretados<br />
eram contados aos milhares).<br />
Os médicos e curan<strong>de</strong>iros e xamãs variados, s<strong>em</strong>pre<br />
s<strong>em</strong> dinheiro algum, dracma nenhuma, alcançavam os lugares<br />
mais longínquos da Tessália para armar<strong>em</strong> a conspiração. A<br />
bordo <strong>de</strong> carroças e barcaças que pareciam lixos ambulantes.<br />
Diversão predileta do médico: infernizar os outros com o<br />
seu péssimo gosto musical; cantorias <strong>de</strong>sencontradas varavam<br />
as noites; se havia gente <strong>de</strong> voz ruim era o médico; valia<br />
qualquer coisa: canções jônias, modulações dóricas, danças<br />
frigias e um s<strong>em</strong> número <strong>de</strong> o<strong>de</strong>s vindas <strong>de</strong> Colofão. A<br />
conspiração parecia ser a da arte <strong>de</strong>struída. Os médicos<br />
54
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
costumavam se concentrar nas cida<strong>de</strong>s e dilapidavam a<br />
paciência alheia com as atitu<strong>de</strong>s iconoclastas. Os médicos mais<br />
endinheirados, se é que era coisa possível, preferiam ir ao teatro.<br />
Além <strong>de</strong> gostar<strong>em</strong> muito <strong>de</strong> pacotes <strong>de</strong> peças on<strong>de</strong> se misturava<br />
a tragédia e comédia, juntavam-se às caravanas <strong>de</strong> mercadores<br />
ricos, só para passar a impressão <strong>de</strong> gente b<strong>em</strong>. Os médicos da<br />
elite, se é que isso po<strong>de</strong> ser dito <strong>de</strong> um médico, s<strong>em</strong>pre<br />
confundidos com metecos, preferiam ficar <strong>em</strong> Atenas puxando o<br />
saco dos tiranos <strong>de</strong> plantão.<br />
No entanto, como já se dissera, Esculápio era filho <strong>de</strong><br />
Apolo, e este se enfureceu <strong>de</strong> forma tão violenta, <strong>de</strong>scontando a<br />
raiva nos pobres ciclopes que s<strong>em</strong>pre apanhavam nestas<br />
historias s<strong>em</strong> mesmo saber por que; é que estes seres haviam<br />
fabricado os raios utilizados por Zeus. Zeus então puniu Apolo,<br />
obrigando-o a servir os mortais por um ano. Supr<strong>em</strong>a vergonha.<br />
Uma espécie <strong>de</strong> punição com serviços sociais. O <strong>de</strong>us servia os<br />
humanos mas quando Zeus não via dava uns petelecos na orelha<br />
do primeiro que lhe estivesse à mão. Cuspir nos pratos qualquer<br />
um fazia.<br />
Apolo passou a servir o rei Admeto, que queria obter a<br />
mão <strong>de</strong> Alceste, uma bela, jov<strong>em</strong>, doce, sensível jov<strong>em</strong>, <strong>em</strong><br />
casamento. O pai <strong>de</strong> Alceste prometeu dar a mão <strong>de</strong> sua filha a<br />
qu<strong>em</strong> viesse buscá-la <strong>em</strong> uma carruag<strong>em</strong> puxada por leões e<br />
javalis sar<strong>de</strong>ntos.<br />
Com a ajuda <strong>de</strong> Apolo, Admeto conseguiu o feito e casou<br />
com a jov<strong>em</strong>, porém um pouco <strong>de</strong>pois, Admeto adoeceu e ficou<br />
muito próximo da morte.<br />
Mais uma vez, o <strong>de</strong>us Apolo negociou com a Morte,<br />
oferecendo benesses a Esculápio. A Morte, s<strong>em</strong>pre discreta,<br />
aceitou não levar Admeto se outra pessoa se oferecesse morrer<br />
55
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
<strong>em</strong> seu lugar. Mas é claro, e n<strong>em</strong> é preciso ser muito ladino,<br />
como dizia meu pai, ninguém, <strong>em</strong> todo o reino, quis sacrificar a<br />
vida pelo rei, n<strong>em</strong> mesmo seus pais tomaram esta <strong>de</strong>cisão.<br />
A única opção que restou foi Alceste dar sua vida pela do<br />
amado.<br />
- Puta merda! – gritou Apolo.<br />
Admeto não aceitou, logicamente, porém não havia como<br />
voltar atrás; o <strong>de</strong>creto era irrevogável. Papel passado e tudo.<br />
Carimbo celestial dominando a assinatura e o acordo. Então, na<br />
medida <strong>em</strong> que Admeto se curava, Alceste caminhava para o fim.<br />
No dia <strong>de</strong> sua morte, quando todos do reino lamentavam<br />
e esperavam a morte <strong>de</strong> Alceste a qualquer momento, Heracles<br />
chegou ao local e viu a situação com olhar arguto e pensamento<br />
repleto <strong>de</strong> caminhos. Como para Heracles não havia nenhuma<br />
tarefa árdua d<strong>em</strong>ais, ele esperou a Morte vir para buscar Alceste;<br />
quando chegou, ele agarrou a Morte pelos cabelos ralos da calva<br />
e a forçou a <strong>de</strong>sistir da vítima a po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> cuspe na cara e uns<br />
safanões. A foice foi quebrada a <strong>de</strong>ntadas.<br />
Alceste recuperou-se e foi <strong>de</strong>volvida ao marido.<br />
Puxa! Finalmente um final feliz.<br />
56
ANDROMEDA<br />
ANDROMEDA<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Andrômeda era filha do rei Cepheus.<br />
Andrômeda era filha da rainha Cassiopeia, da Etiópia.<br />
Cassiopeia era mulher presunçosa, dada a arrogâncias<br />
inauditas e sopros que dizia ser<strong>em</strong> divinos. Coisa lá <strong>de</strong>la.<br />
Cassiopeia ousou se vangloriar <strong>de</strong> que era mais bonita do que<br />
as Nereidas (<strong>de</strong>pois da <strong>de</strong>stituição <strong>de</strong> Urano, Nereu casou-se<br />
com Dóris, filha do titã Oceano, e teve cinquenta filhas, as<br />
nereidas)... um grupo <strong>de</strong> 50 ninfas do mar, todas <strong>de</strong><br />
extraordinária beleza.<br />
Bom... As Nereidas ficaram ofendidas pela arrogância<br />
da rainha que imploraram a Posseidon que a punisse com<br />
57
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
po<strong>de</strong>rosas punições aquáticas, como por ex<strong>em</strong>plo, fazê-la<br />
engolir todas as ostras <strong>de</strong> um atol.<br />
Poseidon, porém, teve outra idéia e enviou o monstro<br />
do mar Cetus para <strong>de</strong>vastar a Etiópia. Coisa horrível <strong>de</strong> se ver.<br />
O rei Cepheus, sob cotejo esplendoroso e brilhante com<br />
mil pedrarias, dirigiu-se ao oráculo <strong>em</strong> Ammon. Perguntava para<br />
si: - “O que ele <strong>de</strong>via fazer para acalmar a ira do <strong>de</strong>us?”.<br />
O oráculo não tardou na respostas se b<strong>em</strong> que levasse<br />
uma s<strong>em</strong>ana para respon<strong>de</strong>r, o que era consi<strong>de</strong>rado rápido<br />
naqueles t<strong>em</strong>pos. Foi-lhe dito que ele <strong>de</strong>veria dar a filha <strong>em</strong><br />
sacrifício ao monstro do mar.<br />
Acorrentou Andrômeda, - que nada entendia daquilo e<br />
provavelmente sofreu traumas com sintomas crônicos daí <strong>em</strong><br />
diante, - a um rochedo na costa do Mediterrâneo, mais<br />
precisamente <strong>em</strong> Jaffa, à espera da aproximação do monstro.<br />
Mas, e aqui vai outro final feliz, felizmente, a vida <strong>de</strong><br />
Andrômeda foi salva por Perseus, herói <strong>de</strong>st<strong>em</strong>ido, que matou o<br />
monstro e ficou com Andrômeda para ele. E essas meninas<br />
gregas eram todas muito bonitinhas.<br />
58
CERES CERES CERES CERES<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Ceres é o nome romano para a <strong>de</strong>usa grega D<strong>em</strong>eter.<br />
Nós o manter<strong>em</strong>os aqui para que os romanos não se arm<strong>em</strong> <strong>de</strong><br />
legiões e venham nos buscar nas ruas.<br />
Para os gregos Ceres era a <strong>de</strong>usa mãe da Terra.<br />
Seduzida, para variar, por Zeus, s<strong>em</strong>pre ele o garanhão das<br />
ilhas, ela teve uma filha, Persephone. Persephone cresceu<br />
alegr<strong>em</strong>ente, segundo alguns estudiosos, e, muito triste<br />
segundos outros; sendo extr<strong>em</strong>amente atraente e bela seu tio<br />
Ha<strong>de</strong>s, o capeta <strong>em</strong> pessoa, se apaixonou por ela, e, paixão <strong>de</strong><br />
capeta é fogo.<br />
59
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Um dia, enquanto Persephone colhia flores usando um<br />
capuzinho vermelho, o chão se abriu, assim, do nada. Ha<strong>de</strong>s,<br />
que usava pele <strong>de</strong> lobo, apareceu e arrastou-a para as ínferas<br />
terras subterrâneas... por isso chamado Inferno.<br />
Persephone gritou o quanto po<strong>de</strong> enquanto isto<br />
acontecia, tendo ralado as pernas na <strong>de</strong>scida entre pedras e<br />
raízes o que muito estimulou a libido <strong>de</strong> Ha<strong>de</strong>s, mas, apesar da<br />
gritaria, ninguém se movia enquanto não terminasse o repasto<br />
<strong>de</strong> ambrosia e néctar. Ceres ouviu-a gritar; Iris avisou que a<br />
coisa estava confusa lá na floresta. Mal<strong>em</strong>olente, sugando o ar<br />
da tar<strong>de</strong>, Ceres voejou até a mata e chegou ao local exatamente<br />
às 16 horas... mas, já não havia mais sinal <strong>de</strong> Persephone, n<strong>em</strong><br />
capuzinho, n<strong>em</strong> cestinha, n<strong>em</strong> lobo, n<strong>em</strong> nada.<br />
Por nove dias e nove noites, com a alma dolorida e a<br />
vergonha estampada na cara, Ceres vagou pelo mundo<br />
sobraçando uma tocha (escusa dizer que acesa pois para que<br />
serviria uma tocha?), <strong>em</strong> ambas as mãos... logo, duas tochas,<br />
procurando a adorada filha. Gente <strong>de</strong> má ascendência dizia que<br />
uma tocha era para a noite e outra para o dia. Riam se<br />
quiser<strong>em</strong>. Somente no décimo dia ela encontrou Helios, aquele<br />
que vê tudo e nada faz. Hélio teve a corag<strong>em</strong> <strong>de</strong> dizer a Ceres o<br />
que havia acontecido.<br />
Ceres então <strong>de</strong>cidiu abandonar a condição divina até<br />
que sua filha retornasse para ela. Uma tolice s<strong>em</strong> nome<br />
naquelas rodas. Tornar-se uma comum <strong>em</strong> meio a tantos<br />
<strong>de</strong>uses e titãs... inda mais com um Zeus Taurida rondando as<br />
donzelas...<br />
O exílio que Ceres impôs a si mesma fez a Terra se<br />
tornar estéril. Zeus or<strong>de</strong>nou a Ha<strong>de</strong>s que <strong>de</strong>volvesse<br />
Persephone à mãe, mas, isto não era mais possível.<br />
60
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Uma vez no buraco negro, - disse ele com voz <strong>de</strong><br />
barítono, - não po<strong>de</strong> mais sair.<br />
Durante a estada nos infernais e abafados fundos <strong>de</strong><br />
Ha<strong>de</strong>s, Persephone comera uma s<strong>em</strong>ente <strong>de</strong> romã e, pasm<strong>em</strong><br />
todos, era justamente o objeto frutal que a ligava para s<strong>em</strong>pre a<br />
Ha<strong>de</strong>s, sendo ‘s<strong>em</strong>pre’ consi<strong>de</strong>rado um t<strong>em</strong>po muito longo.<br />
Mas houve acordo celeste.<br />
A Grécia fica a 12 000 quilômetros <strong>de</strong> qualquer outro<br />
centro, é só escolher... mas Zeus ofereceu um atalho.<br />
- Que tal serpentear entre colunas longilíneas do<br />
Partenon? – disse a Ha<strong>de</strong>s.<br />
- Não quero passear com ninguém... sei dos seus<br />
truques, Zeus.<br />
- Mas olha, - continuou com cara <strong>de</strong> cínico, cofiando<br />
lentamente as barbichelas capitolinas, - sobrevoar<strong>em</strong>os nas<br />
asas <strong>de</strong> Hermes (pisca<strong>de</strong>la) a Acrópole!!! Não acha o máximo?<br />
- N<strong>em</strong> máximo n<strong>em</strong> mínimo. Sei tudo o que po<strong>de</strong><br />
oferecer a cida<strong>de</strong> velha, meu caro; pensa que não sei da sua<br />
intenção <strong>de</strong> me afastar do Inferno? Pensa que não sei?<br />
Zeus circundou-o amistosamente pelos ombros.<br />
- Ora, mas o que é isso? Os Gregos mantêm as ruínas<br />
b<strong>em</strong> arruinadas e vale a pena ver no que se transformará essa<br />
belezura que construímos com mãos titânicas...<br />
61
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Mesmo assim não me interessa. Persephone está<br />
comigo e vou dizendo... no começo <strong>de</strong>u certo trabalho mas<br />
agora, amaciada, não <strong>de</strong>seja sair do meu lado... velho bruxo.<br />
- Muito bonita a sua historia, mas, Ceres...<br />
- Ceres que se lixe... vá você abraçá-la e console a mãe<br />
da filha que já se <strong>de</strong>itou comigo milhares <strong>de</strong> vezes... por que<br />
quis.<br />
Contam que Ceres teve que engolir <strong>em</strong> seco as<br />
patranhas quando Zeus contou <strong>de</strong>talhes sórdidos da conversa<br />
que teve com Ha<strong>de</strong>s. N<strong>em</strong> sei o que seria da história da Grécia<br />
clássica e <strong>de</strong> suas principais personagens usando recursos<br />
multimídia avançados. Talvez Ha<strong>de</strong>s, <strong>em</strong> troca <strong>de</strong> vitrine<br />
televisiva ce<strong>de</strong>sse com facilida<strong>de</strong> aos arroubos <strong>de</strong> Ceres...<br />
talvez negociasse junto a conselhos mundiais a <strong>de</strong>volução <strong>de</strong><br />
Persephone..., mas o fato é que no final da história (final <strong>de</strong><br />
uma, começo <strong>de</strong> outra) Persephone ficava seis meses nas<br />
profundas infernais, nas sombrias profundas infernais, nas<br />
solitárias, mesquinhas, enfadonhas sombrias profundas<br />
infernais, para que nos seguintes seis meses estivesse na Terra<br />
com Ceres e o resto da cambada Olímpica... botando o clima e<br />
as estações no lugar.<br />
Pergunta: - Qu<strong>em</strong> limpava aquele lugar?<br />
Em textos <strong>de</strong> livros futuros isso tudo passou a ser<br />
roteiro <strong>de</strong> passeios (Por aqui passou Zeus <strong>em</strong> seu carro celeste;<br />
por ali Ha<strong>de</strong>s seqüestrou Persephone; ali e acolá Ceres chorou<br />
lágrimas doiradas)... passeios vários para o turista solerte é no<br />
que se transforma a lenda olímpica.<br />
62
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O mais sensacional, - cá entre nós, anacrônico -<br />
foi uma câmera digital ligada ao vivo, lá <strong>em</strong> Atenas, <strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />
Zeus controlava tudo, até o conúbio sexual <strong>de</strong> Persephone e<br />
Ha<strong>de</strong>s. Isso era novida<strong>de</strong> pois estava no campo das quimeras.<br />
Através <strong>de</strong>ste estratag<strong>em</strong>a mo<strong>de</strong>rnoso, um misto <strong>de</strong> bola <strong>de</strong><br />
cristal líquido e solércias, ele soube que o báculo <strong>de</strong> Ha<strong>de</strong>s n<strong>em</strong><br />
s<strong>em</strong>pre se tornava autoritário <strong>em</strong> t<strong>em</strong>po integral, e, que para<br />
que o báculo <strong>de</strong>sse uma solapada <strong>de</strong>scente Persephone tinha<br />
que lhe dar umas bofetadas, - na cara <strong>de</strong> Ha<strong>de</strong>s e não no<br />
báculo, - para fazê-lo acordar da sonambúlica torpeza. Há<br />
gravações da caixa preta Olímpica <strong>em</strong> que se ouve Persephone<br />
gritar: - Olha que eu volto já para minha mãe, hein?, - e nesse<br />
momento o báculo se exalta, apesar da cara cansada <strong>de</strong> Ha<strong>de</strong>s,<br />
o <strong>de</strong> barba por fazer.<br />
Zeus, mesmo que Ceres não concordasse infiltrou a<br />
maquininha nas cavernas inferiais com ajuda <strong>de</strong> Zéfiro e umas<br />
ajudantes brisas calhordas. Talvez as ninfas briseidas. Dá para<br />
virar para todos os lados sob controle <strong>de</strong> um painel coberto <strong>de</strong><br />
botões; po<strong>de</strong> apontar para cima, para baixo, aproximar ou<br />
distanciar a imag<strong>em</strong> (essa parte do zoom foi consi<strong>de</strong>rada <strong>de</strong><br />
utilíssima utilida<strong>de</strong> pública e privada; s<strong>em</strong>pre que podiam os<br />
olímpicos paravam um t<strong>em</strong>po a olhar as aventuras do báculo <strong>de</strong><br />
Ha<strong>de</strong>s. Às vezes riam, às vezes choravam <strong>de</strong> rir. Era zoom para<br />
lá e zoom para cá. O báculo, para tristeza <strong>de</strong> Ha<strong>de</strong>s ficava<br />
maior ou menor a po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> zoom).<br />
É possível ver turistas andando pela Acrópole, sujando<br />
as ruínas, pois a máquina t<strong>em</strong> a proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> trazer imagens<br />
do futuro, também, ou <strong>de</strong> nada serviria ser <strong>de</strong>us, afinal, um <strong>de</strong>us<br />
que se preze prevê o futuro.<br />
Muita vez pegaram o fauno Nelson bisbilhotando...<br />
bisbilhotava os quintais <strong>de</strong> gregos e troianos <strong>de</strong>savisados na<br />
63
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
vizinhança. Mas isso <strong>de</strong> bisbilhotar é coisa <strong>de</strong> fauno. O que não<br />
é coisa <strong>de</strong> fauno é perambular pelos mármores do Olimpo. A<br />
segurança falhou feio nisso.<br />
B<strong>em</strong> ... volt<strong>em</strong>os ao âmago da história... o tal do<br />
acordo. Seguinte: Ceres retornaria ao Monte Olimpo e<br />
Persephone dividiria o ano <strong>em</strong> duas partes, como já foi dito, mas<br />
aqui ratifico o acordo; meta<strong>de</strong> com a sua mãe a outra meta<strong>de</strong> no<br />
Inferno. Vai saber a diferença. Mas os gregos sabiam.<br />
Por esta razão quando Persephone <strong>de</strong>ixa o Inferno a<br />
Terra floresce, efeitos primaveris que ela não consegue aplicar<br />
no Inferno, l<strong>em</strong>brando que Inferno é apenas terra <strong>de</strong> mortos e<br />
não local <strong>de</strong> fogo e quetais insalubre. Mesmo o báculo, para<br />
florescer, já é um custo. O que mantém Persephone por lá é<br />
que, uma vez florescido o báculo, a coisa fica boa <strong>de</strong> montão...<br />
B<strong>em</strong>... Persephone traz a Primavera e o Verão aos<br />
mortais... uma espécie <strong>de</strong> sinal da alegria. Mãe e filha juntas.<br />
O Outono e o Inverno cobr<strong>em</strong> a Terra <strong>em</strong> sinal <strong>de</strong><br />
tristeza, mas isso é coisa da cultura como dizer que o tom<br />
menor é triste. Forçaram a barra, propagaram, todo mundo<br />
aceitou e ficou... efeito da mentira repetida mil vezes.<br />
Persephone volta, o báculo está florido, nesse caso, dura uns<br />
três meses <strong>em</strong> ponto <strong>de</strong> bala... e fenece. Ha<strong>de</strong>s fica puto, nada<br />
mais há que se fazer a não ser sob efeito dos tapas ou do zoom,<br />
como já dito.<br />
É isso... e que me <strong>de</strong>smintam se for<strong>em</strong> capazes... Ah!<br />
Ainda por cima, Ceres era consi<strong>de</strong>rada <strong>de</strong>usa Siciliana das<br />
s<strong>em</strong>entes, dos cereais. Pão, broas, milharais... tanto é que<br />
Persephone, her<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> alguns talentos da mãe, após seu<br />
período <strong>de</strong> seis meses transforma Ha<strong>de</strong>s num fubá só. Isso fica<br />
64
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
claro. É nesse momento que as almas interessadas fog<strong>em</strong> da<br />
terra dos mortos. Foi num período <strong>de</strong>sses que Orfeo chegou por<br />
lá e conseguiu livrar Eurídice, mas é outra história.<br />
Ceres, po<strong>de</strong>rosa que era, foi introduzida <strong>em</strong> Roma lá<br />
por 500 anos antes <strong>de</strong> cristo, já que o povo estava faminto <strong>em</strong><br />
função do cerco da cida<strong>de</strong> pelos Etruscos, que odiavam milho.<br />
65
HELIOS HELIOS HELIOS HELIOS<br />
O Sol!<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Os gregos o chamavam <strong>de</strong> Hélios; os romanos <strong>de</strong> Sol,<br />
mesmo.<br />
A criativida<strong>de</strong> s<strong>em</strong>pre é b<strong>em</strong> antropomórfica... correto<br />
até, pois, esta é a única imag<strong>em</strong> que conhec<strong>em</strong>os... a <strong>de</strong> nós<br />
mesmos... a <strong>de</strong> seres s<strong>em</strong>elhantes ao ser humano; é b<strong>em</strong> claro<br />
que na Grécia, na famigerada Héla<strong>de</strong>, todos os el<strong>em</strong>entos da<br />
natureza tivess<strong>em</strong> a correlação andrói<strong>de</strong>. Os hebreus é que<br />
voaram longe com seu <strong>de</strong>us s<strong>em</strong> forma, mas há lógica ai.<br />
Moisés querendo diferenciar a coisa e vendo que os povos<br />
todos já haviam tomado todas as formas conhecidas como<br />
<strong>de</strong>uses, ficou s<strong>em</strong> gente, bicho ou vegetal para adorar. Chamou<br />
Aarão <strong>de</strong> lado, seu irmão que sabia ler e escrever e disse: - Já<br />
que não t<strong>em</strong> como dar forma para esse novo <strong>de</strong>us, fica assim<br />
mesmo. S<strong>em</strong> forma.<br />
66
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Aarão levantou o <strong>de</strong>do polegar <strong>em</strong> sinal <strong>de</strong> aprovação: -<br />
Jóinha!<br />
Agora, façamos umas aparas e uns reparos... sendo<br />
<strong>de</strong>us do Sol, Hélios era imaginado a passear <strong>em</strong> uma<br />
carruag<strong>em</strong> puxada por cavalos através do céu, - da mesma<br />
forma que Elias. Elias, Hélios, Eli... como esses nomes se<br />
parec<strong>em</strong>!, - trazendo luz para a Terra.<br />
A jornada do Sol, naturalmente, começava no leste e<br />
terminava no oeste, local on<strong>de</strong> Hélios completava a ronda diária<br />
e flutuava <strong>de</strong> volta para o palácio no leste, <strong>em</strong> uma taça<br />
dourada. Agora é taça.<br />
Todas as vezes que me perguntam: “Como Hélios foi<br />
levado ou perambula pelo céu?”<br />
- “Numa carruag<strong>em</strong> <strong>de</strong> fogo!”, numa carruag<strong>em</strong> <strong>de</strong> fogo,<br />
ou taça <strong>de</strong> fogo, dourada como Apolo.<br />
Seria lenda? Que pergunta. Evi<strong>de</strong>nte que sim... Tirando<br />
aviões e foguetes, que pod<strong>em</strong> muito b<strong>em</strong> ser interpretados ao<br />
bel prazer, quantas pessoas a gente vê por ai numa carruag<strong>em</strong><br />
<strong>de</strong> fogo? Com cavalos <strong>de</strong> fogo? Mas é lenda difundida <strong>em</strong><br />
vários países, no mundo, faz<strong>em</strong> até canções, surgiram<br />
músicas, peças teatrais, atrativos e souvenirs baseados nesta<br />
pr<strong>em</strong>issa <strong>de</strong> Hélios/Sol/Elias. Os pregadores falam nos púlpitos<br />
e proclamam o milagre das carruagens que transportaram<br />
Hélios a alumiar o céu do mundo até as moradas olímpicas!<br />
O papel <strong>de</strong> Hélios como o <strong>de</strong>us Sol aparece na<br />
literatura, poesia e arte. E isso é legal.<br />
67
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Hesíodo dizia: - Hélios era filho <strong>de</strong> dois Titãs - Theia e<br />
Hyperion. Era o irmão <strong>de</strong> Eos, - a <strong>de</strong>usa da alvorada, - e<br />
Selene, - a <strong>de</strong>usa da Lua. Trata-se <strong>de</strong> um cortejo celeste.<br />
Eos/Hélios/Selene (não sei como é que fica quando não há lua<br />
vista claramente).<br />
Suce<strong>de</strong>u que Zeus estava para elevar Hélios num<br />
red<strong>em</strong>oinho, um <strong>de</strong>sses pilares divinos, ao céu. Hélios caiu fora<br />
dizendo que ia visitar o bombardinista Eliseu, aliás, um cara que<br />
nunca cumpria o que falava. Isso <strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos dant’anhos.<br />
Hélios disse a Eliseu, à boca miúda, pois não<br />
tencionava ser achado por Zeus: - Fica aqui, ô Eliseu, <strong>de</strong> boca<br />
fechada, pelo amor <strong>de</strong> Zeus, porque Zeus, com ou s<strong>em</strong> amor,<br />
me enviou a Arceburgo sei lá para que.<br />
- Vive Zeus, - disse Eliseu coçando o nariz, - e vive a<br />
tua alma, que não <strong>de</strong>ixarei você na mão.<br />
Hélios não enten<strong>de</strong>u o que Eliseu dissera mas este era<br />
realmente um cara confuso, provado pelo fato <strong>de</strong> ter vendido 40<br />
camelos a um mercador a troco <strong>de</strong> tâmaras. Quatro tâmaras<br />
secas. O mercador disse que elas cresceriam até o céu.<br />
Então, já <strong>em</strong> Arceburgo, os filhos dos titãs que estavam<br />
lá por causa da festa a Juno, saíram ao encontro <strong>de</strong> Hélios, e<br />
lhe disseram, não todos ao mesmo t<strong>em</strong>po, - pois ficaria difícil <strong>de</strong><br />
enten<strong>de</strong>r, - mas interpretando um madrigal:<br />
- Sabe que Zeus hoje tomará a sua alma e a mandará<br />
para o céu?<br />
- Caraca! Que é isso, - disse sabiamente Hélios, - Vapo.<br />
68
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Não quer que Zeus se <strong>de</strong>ite sobre sua cabeça?<br />
- Claro que não! Sei lá on<strong>de</strong> ele andou sentando<br />
ultimamente, - e disse-o olhando cuidadosamente para os lados.<br />
Continuou: - Zeus anda com umas idéias muito estranhas...<br />
Também, eu b<strong>em</strong> o sei; é melhor todo mundo aqui fechar essa<br />
boca... Eliseu, ficará aqui, porque Zeus não só me enviou a<br />
Arceburgo como quer que eu dê uma passadinha <strong>em</strong> Monte<br />
Santo...<br />
- Zeus t<strong>em</strong> cada idéia...<br />
- Idéia <strong>de</strong> jerico.<br />
- Eu não fico aqui, coisa nenhuma - disse Eliseu, eu vou<br />
junto que tenho medo.<br />
E assim foram a Monte Santo <strong>de</strong> Minas. E assim<br />
andaram pelas estradas <strong>de</strong> cida<strong>de</strong> <strong>em</strong> cida<strong>de</strong>. Muzambinho,<br />
Guaranésia e outras... Ambos foram juntos, mas não sozinhos...<br />
cinqüenta homens dos filhos dos titãs os seguiram, pararam<br />
para beber água <strong>de</strong> boi no rio da Onça.<br />
Hélios tomou a capa e a dobrou, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>u uma<br />
chapuletada com ela na água do rio, feriu as águas, e aconteceu<br />
um lance que prometia ser massa: as águas se dividiram para<br />
os dois lados; e passaram todos andando por ali, mas tudo isso<br />
s<strong>em</strong> nenhuma necessida<strong>de</strong> pois o rio da Onça é muito pequeno.<br />
Um corguinho assim por dizer. Bastava dar uma puladinha. Uma<br />
pinguela bastaria. Essa coisa <strong>de</strong> dar tabefe na água era mais<br />
cena do que necessida<strong>de</strong>. Hélios s<strong>em</strong>pre foi bom ator nas terras<br />
helênicas.<br />
69
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
De qualquer modo passaram, estavam já do outro lado<br />
dando a<strong>de</strong>usinho aos filhos dos titãs quando Hélios disse a<br />
Eliseu:<br />
- Po<strong>de</strong> pedir o que quiser... pe<strong>de</strong> logo por que daqui a<br />
pouco eu tô dando o fora daqui...<br />
- Peço que haja porção dobrada <strong>de</strong> pasteis e milho na<br />
minha cabana...<br />
- Pô, - disse Hélios, - coisa difícil... n<strong>em</strong> sei se dá<br />
t<strong>em</strong>po...<br />
- Pe<strong>de</strong> pra Zeus...<br />
- Mesmo assim...<br />
Suce<strong>de</strong>u que, indo eles andando e falando e rindo e<br />
contando piadas sujas e falando besteiras sobre Jezebel, a filha<br />
futrica do mercador ju<strong>de</strong>u, eis que um carro <strong>de</strong> fogo, com<br />
cavalos <strong>de</strong> fogo, com arreios <strong>de</strong> fogo, com poltronas <strong>de</strong> fogo os<br />
separou, Hélios <strong>de</strong> Eliseu. Hélios subiu ao céu num red<strong>em</strong>oinho<br />
<strong>de</strong> poeira e fogo que encheu <strong>de</strong> terra a boca <strong>de</strong> Eliseu.<br />
Eliseu olhou para o céu e exclamou: - Porra!<br />
*<br />
Hélios está <strong>em</strong> todas...<br />
Um m<strong>em</strong>orável conto é a lenda <strong>de</strong> Phaethon. Restos <strong>de</strong><br />
um planeta <strong>de</strong>saparecido. Meteoritos no <strong>de</strong>serto <strong>de</strong> Karakum<br />
levou à conclusão <strong>de</strong> que Phaeton, como foi batizado apesar <strong>de</strong><br />
70
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
que astrônomos americanos quisess<strong>em</strong> chamá-lo <strong>de</strong> Krypton,<br />
existiu e <strong>de</strong>sintegrou-se.<br />
Zavaritsky, um velhinho careca, m<strong>em</strong>bro do Comitê <strong>de</strong><br />
Meteoritos, pesquisou o planeta que existia, e, era consi<strong>de</strong>rado<br />
um dos maiores peritos no assunto. Zavaritsky <strong>de</strong>dicou anos e<br />
anos <strong>de</strong> sua vida à teoria do planeta <strong>de</strong>saparecido que acabou<br />
formando o cinturão <strong>de</strong> asterói<strong>de</strong>s. O planeta <strong>de</strong>saparecido<br />
seria maior que Marte e tinha hidrosfera e biosfera. Inferiu que<br />
seu núcleo era <strong>de</strong> ferro, encerrado <strong>em</strong> película <strong>de</strong> silicato <strong>de</strong><br />
ferro, coberta por peridotite, envolvida por lava basáltica, e mais<br />
<strong>de</strong>talhes que escuso <strong>de</strong> dar, mesmo por que não entendo disso.<br />
O Sol, Hélios e amigos, também aparec<strong>em</strong> na história<br />
da ninfa Clytie. T<strong>em</strong>a – Amor e Beleza. Pieguices e<br />
mumunhas... lero-lero e lambeção <strong>de</strong> orelha... Tudo <strong>em</strong> tom cor<br />
<strong>de</strong> rosa e Rosa s<strong>em</strong> cor... As conotações cor-<strong>de</strong>-rosa do amor e<br />
da beleza e da pieguice e moleza pós coito, pois s<strong>em</strong>pre se<br />
conota <strong>de</strong>ssa forma.<br />
Quando se vê Zeus tomando banho é bom dar no pé<br />
pois ele virá para intercursos.... As origens da ligação <strong>de</strong> Venus<br />
com as rosas s<strong>em</strong>pre fizeram cabeça <strong>de</strong> Zeus e suas taras.<br />
Intrincados efeitos <strong>em</strong> uma série <strong>de</strong> histórias românticas que<br />
acabam <strong>em</strong> gravi<strong>de</strong>z <strong>de</strong> alguém. Ninfas, por ex<strong>em</strong>plo. Apesar<br />
<strong>de</strong> Zeu ser o todo po<strong>de</strong>roso ele nunca engravidava.<br />
As rosas brancas vieram da espuma do mar, querendo<br />
representar bolhas e bolhas <strong>de</strong> esperma...; as rosas cor-<strong>de</strong>-rosa<br />
vieram <strong>de</strong> múltiplas dobras da vulva da ninfa, colhidas e<br />
separadas lentamente pelas hábeis mãos <strong>de</strong> Zeus Capitolino...,<br />
mas, pod<strong>em</strong> ser <strong>de</strong> sangue, coisa que excita o rei do Olimpo...<br />
<strong>em</strong> referência ao amor por Adonis que foi rasgado pelos<br />
71
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
espinhos, que se transformaram <strong>em</strong> <strong>em</strong>bl<strong>em</strong>a do amor e da dor<br />
<strong>em</strong> conflito no pega.<br />
Mas o lance é que Clytie era uma ninfa que caíra<br />
<strong>de</strong>sarvorada por amor ao <strong>de</strong>us do sol, Apolo. Apolo é <strong>de</strong>us do<br />
sol, mas, Hélios é o próprio sol?<br />
Bom... o fato é que a ninfa o assistia na jornada diária<br />
<strong>de</strong> leste a oeste, no entanto o amor nunca foi correspondido.<br />
Hélios/Apolo a transformou <strong>de</strong> ninfa da água <strong>em</strong><br />
girassol, e eu acho que ela saiu per<strong>de</strong>ndo nessa. Por isso ela<br />
gira a cabeça para todo lado. A <strong>de</strong>voção resistiu. Procura-o<br />
todos os dias, <strong>de</strong> leste à oeste, seguindo os movimentos <strong>de</strong><br />
Hélios. Dessa forma o girassol foi ligado também com o amor,<br />
apesar das caturritas que com<strong>em</strong> as s<strong>em</strong>entes e nunca param<br />
com a barulheira. Lealda<strong>de</strong> e <strong>de</strong>voção. Mas o que t<strong>em</strong> o amor a<br />
ver com lealda<strong>de</strong> e <strong>de</strong>voção?<br />
Entretanto, Hélios é aquele que tudo vê. Igual ao <strong>de</strong>us.<br />
Igual a Rá, o disco solar. A <strong>de</strong>usa Ceres pe<strong>de</strong> a Hélios ajuda<br />
para encontrar Persephone. É ele o primeiro que saca o caso<br />
entre Aphrodite e Ares. Hélios, também, teve relacionamentos<br />
com mulheres humanas que resultaram <strong>em</strong> <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes.<br />
Phaethon era produto <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>stas uniões. Eram chamados<br />
todos filhos do Sol; os Helia<strong>de</strong>s.<br />
- Eli... Eli..., - cantava o poeta, espetado no ma<strong>de</strong>iro,<br />
olhando para o céu, com a visão nublada <strong>de</strong> sangue – ora,<br />
direis, ouvir estrelas? Então ficarei aqui pregado a noite toda?<br />
Por que me abandonaste?<br />
72
AFAIR:<br />
AFAIR:<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
AFRODITE AFRODITE COM COM ARES<br />
ARES<br />
Ares e Afrodite se apaixonaram daquela forma que<br />
somente os <strong>de</strong>uses pod<strong>em</strong> se apaixonar sendo que os dois<br />
eram muito dourados <strong>em</strong> suas roupas e corpos resplan<strong>de</strong>centes<br />
<strong>de</strong> quimeras e lentejoulas. Perdidamente enamorados,<br />
encontravam-se às escondidas. E, olha que eram <strong>de</strong>uses.<br />
Podiam até dizer: - Ficar<strong>em</strong>os escondidos para que quando tudo<br />
isso acabar a vida eterna volte ao normal.<br />
- Afinal, - dizia, Ares,- ela é casada e tal...<br />
- Uma coisa é a família e o casamento, que são<br />
basilares do Olimpo, e, outra é a foda com Ares..., - dizia<br />
73
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Afrodite, - mas qu<strong>em</strong> enten<strong>de</strong>rá isso? Por isso é melhor<br />
permanecermos escondidos.<br />
Ares <strong>de</strong>ra a Afrodite muitos presentes: lanças erguidas<br />
e rombudas, capacetes com amplas aberturas, troncos<br />
amarelados <strong>de</strong> ipês que ela fora buscar <strong>em</strong> outro continente,<br />
enfim, a paixão estava no auge e, como sói acontecer, pisaram<br />
<strong>em</strong> falso... <strong>de</strong>cidiram se encontrar no palácio <strong>de</strong> Hefaístos,<br />
marido <strong>de</strong> Afrodite, num dia <strong>em</strong> que ele estivesse fora à procura<br />
<strong>de</strong> jazidas <strong>de</strong> metais para a confecção <strong>de</strong> armaduras mais<br />
po<strong>de</strong>rosas e uma nova roupa para Zeus, seu compadre.<br />
Mas, novamente, Hélios espionava, e, foi <strong>de</strong>durar o<br />
ocorrido ao ferreiro manquitola... o <strong>em</strong>buste que se tramava...<br />
pênis Arianos <strong>em</strong> vulvas Afrodíticas... consumação <strong>de</strong> corpos<br />
<strong>em</strong> orgasmos vorazes... os gritos <strong>de</strong> tesão <strong>de</strong> Afrodite...<br />
- Para <strong>de</strong> falar! Isso me irrita Hélios, - gritou Hefaístos,<br />
também conhecido nos meios olímpicos como O Capenga. - Já<br />
<strong>de</strong>durou, está satisfeito, agora cai fora...<br />
Consumido pela ira, Hefaístos foi à bigorna e<br />
confeccionou po<strong>de</strong>rosa re<strong>de</strong> <strong>de</strong> correntes <strong>de</strong> ouro, do mesmo<br />
tom das peles dos amantes, com a qual capturaria e pren<strong>de</strong>ria<br />
os adúlteros.<br />
Com toda a astúcia que lhe competia e era pouco, digase<br />
<strong>de</strong> passag<strong>em</strong>, pois Hefaístos não era muito dado aos lances<br />
do intelecto, ele pren<strong>de</strong>u as correntes aos balaústres da cama<br />
com um tecido diáfano. Declarou, assim como qu<strong>em</strong> nada quer,<br />
falando meio <strong>de</strong> lado, que ia sair da cida<strong>de</strong>.<br />
No meio da tar<strong>de</strong> Afrodite <strong>de</strong>itou-se langorosa e abriu as<br />
pernas. Ares logo chegou, encontrou Afrodite à sua espera<br />
74
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
molhada e chupando manga. Mangas que vieram com ipês do<br />
mesmo país para lá da Atlântida. Cheiraram-se, lamberam-se,<br />
cuspiram um no outro, cheios <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejo, mas, ao se <strong>de</strong>itar<strong>em</strong><br />
com peso <strong>de</strong> muita safa<strong>de</strong>za, acionaram um maquinário que fez<br />
a teia dourada cair sobre ambos. Já não podiam n<strong>em</strong> escapar<br />
n<strong>em</strong> se mover. Prometeram que se casariam... O Casamento<br />
aconteceria, mas era tudo mentira <strong>de</strong> cama e lençol, <strong>em</strong> um<br />
Saguão do Olimpo. Ouro e Brilhante <strong>de</strong>corariam os corredores<br />
<strong>de</strong> entrada; <strong>de</strong>talhes <strong>em</strong> rosa branca ou rosa carminada .<br />
Orfeu e sua Lira engataria um xote épico; a esquerda<br />
ficaria para os Filhos <strong>de</strong> Ares, e, os lugares da direita para os<br />
Filhos <strong>de</strong> Afrodite. A música <strong>de</strong> Orfeu, esplendorosa <strong>em</strong> ritmos<br />
alienígenas, marcaria a chegada do pai Zeus, que usaria roupas<br />
brancas e <strong>de</strong>talhes avermelhados cor <strong>de</strong> açafrão.<br />
Perséphone e Ha<strong>de</strong>s, um tanto cobertos <strong>de</strong> terra,<br />
seriam os padrinhos <strong>de</strong> Ares. Quando Afrodite a<strong>de</strong>ntrasse o<br />
Saguão choveria pétalas <strong>de</strong> rosas vermelhas e brancas.<br />
Más línguas disseram que nada disso aconteceu. A<br />
verda<strong>de</strong> era que no meio do coito a vulva <strong>de</strong> Afrodite, por ação<br />
divina <strong>de</strong> Ares, teve câimbra e pren<strong>de</strong>u o m<strong>em</strong>bro do moço <strong>de</strong><br />
modo que ficaram engatados <strong>em</strong> meio a dores e humilhação até<br />
qu<strong>em</strong> Hefaísto chegasse.<br />
Ainda agindo como espião, Hélios informou Hefaístos<br />
das suas presas, e o ferreiro <strong>em</strong> fúria, burro por se expor à<br />
opinião pública, - bastava ferro <strong>em</strong> brasa na bunda <strong>de</strong> Ares, -<br />
clamou aos gritos que os <strong>de</strong>uses do Olimpo viess<strong>em</strong><br />
test<strong>em</strong>unhar a traição.<br />
75
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Minha teia <strong>de</strong> ouro e metais platinados irá mantê-los<br />
presos até que o Pai Zeus <strong>de</strong>volva os presentes que lhe fiz para<br />
conquistar a putinha da sua filha.<br />
- Tenho nada a ver com isso, - dissera Zeus mais tar<strong>de</strong><br />
numa roda <strong>de</strong> <strong>de</strong>uses, - ela po<strong>de</strong> ser minha filha, e uma linda<br />
criatura, mas é escrava das paixões. E, cá para nós, - <strong>em</strong> meio<br />
a risos e cotoveladas, - qu<strong>em</strong> não é minha filha?<br />
Despertados pelos brados enfurecidos, os <strong>de</strong>uses do<br />
Olimpo acorreram todos para ver o que ocorria. Chegando no<br />
palácio <strong>de</strong> Hefaísto começaram a rir <strong>de</strong>sbragadamente.<br />
Disseram, os pudicos, que as <strong>de</strong>usas, permaneceram <strong>em</strong> casa<br />
por modéstia, mas é mentira. Foram as primeiras as chegar e se<br />
admiravam e mediam e pensavam no que fazer caso rolasse<br />
com elas...<br />
Diz<strong>em</strong> também que quando Posêidon, Apolo e Hermes<br />
viram o casal <strong>de</strong>sataram a gargalhar incontrolavelmente. Ficou<br />
concor<strong>de</strong> que Ares pagaria a fiança dos adúlteros. Hermes disse<br />
que teria ele próprio arriscado qualquer coisa para <strong>de</strong>itar-se com<br />
a <strong>de</strong>usa dourada.<br />
Posêidon foi o fiador e Hefaístos libertou-os. Os<br />
amantes fugiram - Ares para o norte da Grécia, on<strong>de</strong> escreveu<br />
suas m<strong>em</strong>órias e contou ampliadamente os últimos relatos;<br />
Afrodite zuniu para o t<strong>em</strong>plo <strong>em</strong> Pafos, Chipre, on<strong>de</strong> foi<br />
banhada e untada e melecada e <strong>de</strong>sodorizada com óleos<br />
extrato <strong>de</strong> vários troncos e s<strong>em</strong>entes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a canela, o<br />
bálsamo, a amêndoa, por suas serviçais, as Graças.<br />
Graça Maria, Graça Lúcia, Graça Petúnia.<br />
E é claro, gozou a valer com as carícias.<br />
76
PERSEU<br />
PERSEU<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O matador da Górgona Medusa. Era filho <strong>de</strong> Zeus –<br />
para variar qu<strong>em</strong> não é filho <strong>de</strong> Zeus? - e <strong>de</strong> Dânae, filha <strong>de</strong><br />
Acrísios, aquele do palácio, rei <strong>de</strong> Argos. Advertido <strong>de</strong> que seria<br />
morto pelo neto, Acrísios trancou a mãe e a criança numa arca<br />
<strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira muito b<strong>em</strong> feita e trabalhada <strong>em</strong> ouropéis, lançandoos<br />
ao mar.<br />
Mas tudo que t<strong>em</strong> brilho falso se entrega. Chegaram à<br />
ilha <strong>de</strong> Sérifo, on<strong>de</strong> foram salvos e on<strong>de</strong> Perseu cresceu.<br />
Poli<strong>de</strong>ctos, rei <strong>de</strong> Sérifo, apaixonou-se por Danaê e, t<strong>em</strong>endo<br />
que Perseu talvez interferisse <strong>em</strong> seus planos, enviou-o numa<br />
missão para obter a cabeça da Medusa, um monstro para o qual<br />
qu<strong>em</strong> voltasse o olhar, era transformado <strong>em</strong> pedra. Todo mundo<br />
queria se livrar do rapaz.<br />
Auxiliado por Hermes, mensageiro dos <strong>de</strong>uses, Perseu<br />
abriu caminho por entre as Gréias, três velhas <strong>de</strong>crépitas e<br />
<strong>de</strong>sgrenhadas, daí o nome, que compartilhavam o mesmo olho<br />
entre elas e vigiavam (só rindo mesmo) a caverna que levava<br />
77
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
ao local on<strong>de</strong> estavam as Górgonas. Perseu tomou-lhes do olho<br />
e recusou a <strong>de</strong>volvê-lo até que elas lhe <strong>de</strong>ss<strong>em</strong> a direção para<br />
alcançar a Medusa. Elas apontaram a direção com <strong>de</strong>dos<br />
afilados e raquíticos.<br />
Recebeu das ninfas um par <strong>de</strong> sandálias aladas, um<br />
alforje mágico que guardaria qualquer coisa que fosse colocado<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>le e um capacete que o tornava invisível. Equipado<br />
com a espada flamejante <strong>de</strong> Hermes, - mal podia segurá-la <strong>de</strong><br />
tão quente que era, - uma espada que nunca podia ser<br />
entortada ou quebrada, e, ainda pior peso, o escudo da <strong>de</strong>usa<br />
Atena, que o protegeria <strong>de</strong> virar pedra.<br />
Perseu encontrou a Medusa e a matou, vou já dizendo.<br />
Com seu capacete que o tornava invisível, ele foi capaz <strong>de</strong><br />
escapar da ira <strong>de</strong> suas irmãs e, com a cabeça do monstro <strong>em</strong><br />
seu alforje ele voou nas sandálias aladas <strong>de</strong> volta para casa.<br />
Coisa muito simples <strong>de</strong> se fazer naqueles t<strong>em</strong>pos.<br />
Enquanto passava pela Etiópia, por mero exercício,<br />
salvou a princesa Andrômeda prestes a ser sacrificada para um<br />
monstro marinho e a tomou como sua esposa. Seguindo para<br />
Sérifo ele libertou sua mãe <strong>de</strong> Poli<strong>de</strong>ctos usando a cabeça da<br />
Medusa para transformar o rei e seus seguidores <strong>em</strong> pedra,<br />
ampliando assim as estátuas do palácio que ficou muito mais<br />
belo e felizmente ornamentado. Então todos retornaram à<br />
Grécia, on<strong>de</strong> Perseu, aci<strong>de</strong>ntalmente, matou seu avô Acrísios<br />
com um disco digital (atirar com a ponta dos <strong>de</strong>dos) , cumprindo<br />
assim a profecia.<br />
De acordo com a lenda, Perseu foi à Ásia, on<strong>de</strong> seu<br />
filho Perses governou os persas, povo que recebeu seu nome.<br />
Simples assim.<br />
78
ZEUS<br />
ZEUS<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Falamos nele o t<strong>em</strong>po todo. O bonzão. O tudão <strong>de</strong> tudo. O<br />
po<strong>de</strong>roso. O Réis. O Fodão. Pai <strong>de</strong> todo mundo e comedor <strong>de</strong><br />
todas as mulheres, ninfas, <strong>de</strong>usas, titani<strong>de</strong>s e quetais. Deus do<br />
céu Olímpico e regente dos <strong>de</strong>uses do mesmo Olimpo. Pater<br />
dos <strong>de</strong>uses e dos mortais. Zeus Capitolino. O pai dos <strong>de</strong>uses e<br />
dos homens, - patēr andrōn te theōn te; <strong>de</strong>us dos céus e do<br />
trovão. Zeus Cronida. Panelênio. Zeus trovejante bronteos.<br />
Convenhamos que não é um <strong>de</strong>us criador; não criou qualquer<br />
<strong>de</strong>us n<strong>em</strong> criou mortal algum. Nesse quesito o esquisito do<br />
Prometeu, que não passa <strong>de</strong> um Titã, está na frente. Zeus é pai<br />
da humanida<strong>de</strong>, ou era, no sentido <strong>de</strong> ser o protetor e regente<br />
tanto da família do Olimpo quanto da raça humana. Senhor do<br />
céu, louv<strong>em</strong>os o senhor e ajoelh<strong>em</strong>os perante sua po<strong>de</strong>rosa<br />
barba. Deus da chuva provedor <strong>de</strong> umbrellas e guardachuvas,<br />
protetor <strong>de</strong> pingos e respingos, doador <strong>de</strong> gotas <strong>de</strong> cristal; além<br />
79
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
disso, ceifeiro das nuvens, primo <strong>de</strong> Tupã, <strong>de</strong>tinha o terrível<br />
trovão, po<strong>de</strong>r que Thor usurpou <strong>de</strong>pois. Seu pássaro era a<br />
águia, sua árvore símbolo era o carvalho, - adorava a terra das<br />
árvores <strong>de</strong> carvalho, e seu instrumento <strong>de</strong> folguedos predileto<br />
era o caralho. Enquanto a mãe dava uma pedra para Cronos<br />
engolir ele ficava oculto <strong>em</strong> Creta, mamando nas tetas da cabra<br />
Amaltéia, talvez por isso a sua lubricida<strong>de</strong> inequívoca; foi criado<br />
pelado por ninfas peladas com seios mordiscáveis. Tinha que<br />
dar no que <strong>de</strong>u. Depois <strong>de</strong> muito leite e tetas Zeus chegou à<br />
maturida<strong>de</strong>. Forçou Cronos a vomitar as outras crianças, - ele,<br />
ficou maduro mas as crianças permaneceram crianças e isso é<br />
mistério da fé. Seguiu-e uma guerra s<strong>em</strong> pejos. Os Titãs lutaram<br />
ao lado <strong>de</strong> Cronos. Ao lado <strong>de</strong> Zeus lutaram os outros <strong>de</strong>uses.<br />
Se <strong>de</strong>ram b<strong>em</strong>. Os Titãs foram mandados aos quintos dos<br />
enfermos que recebeu o nome <strong>de</strong> abismo do Tártaro.<br />
Zeus dominou o céu. A Posêidon e Ha<strong>de</strong>s foi conferido<br />
o po<strong>de</strong>r para dominar o mar e o mundo subterrâneo,<br />
respectivamente. A terra seria governada pelos três. Zeus: O<br />
<strong>de</strong>us da justiça e da misericórdia. Zeus protetor dos fracos e<br />
punidor do mau. Zeus, o <strong>de</strong>us que se apaixona por uma mulher<br />
a cada instante. O gran<strong>de</strong> adúltero. O infiel.<br />
Hoje muitos automóveis e lojas e <strong>em</strong>presas usam um<br />
<strong>em</strong>bl<strong>em</strong>a dizendo: Zeus é infiel. Não sei por que... ele nada<br />
prometeu!<br />
Ops. Prometeu é palavra proibida.<br />
80
APOLO<br />
APOLO<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Doze divinda<strong>de</strong>s tinha o Olimpo, perguntou-me<br />
Kargayos. Eu disse sim... Uma das doze... divinda<strong>de</strong> grega que<br />
habitava as alturas do Olimpo, uma das divinda<strong>de</strong>s mais<br />
ecléticas da mitologia greco-romana, que recebeu gran<strong>de</strong><br />
reverência <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os t<strong>em</strong>pos dos gregos primitivos até os<br />
romanos e, conhecido primordialmente como uma divinda<strong>de</strong><br />
solar, também representou o i<strong>de</strong>al grego da jov<strong>em</strong> beleza<br />
masculina e era o <strong>de</strong>us <strong>de</strong>ssa juventu<strong>de</strong>, ajudando na transição<br />
para a ida<strong>de</strong> adulta. Filho <strong>de</strong> Zeus e da titã Leto, e irmão gêmeo<br />
da <strong>de</strong>usa da caça Artêmis e pai <strong>de</strong> Asclépio (Esculápio) e <strong>de</strong><br />
Orfeu, tornou-se o <strong>de</strong>us do sol, da luz, da música, da poesia, da<br />
juventu<strong>de</strong>, dos esportes e da caça e ainda o <strong>de</strong>us da profecia: o<br />
senhor <strong>de</strong> todos os oráculos, inclusive o <strong>de</strong> Delfos, o mais<br />
célebre <strong>de</strong> todos os lugares <strong>de</strong> profecias. Também tinha sua<br />
parte negra, quando ele usava o arco, para disparar dardos<br />
letais que matavam os homens com doenças ou morte súbita;<br />
<strong>de</strong>ssa forma também consi<strong>de</strong>rado o <strong>de</strong>us das pragas <strong>de</strong> ratos e<br />
81
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
dos lobos, que atormentavam muitas vezes os gregos. Depois<br />
<strong>de</strong> ter morto a serpente Pitho que aterrorizava as pessoas, <strong>em</strong><br />
com<strong>em</strong>oração a essa façanha, ele instituiu os Jogos Pithios,<br />
cujo vencedor nas competições <strong>de</strong> força, velocida<strong>de</strong> ou corrida<br />
<strong>de</strong> carruagens era coroado com uma coroa <strong>de</strong> louro. Um poeta<br />
brasileiro disse que o brasileiro <strong>de</strong>smistificou essa coroa <strong>de</strong><br />
louro e a botou na feijoada.<br />
Fundador <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s, dava boas leis, era um <strong>de</strong>us puro<br />
e justo e que curava os doentes, venerado <strong>em</strong> gran<strong>de</strong>s t<strong>em</strong>ploshospitais,<br />
cediam-lhe po<strong>de</strong>r para a cura através do sono.<br />
Exagero, talvez.<br />
Pã (Fauno) que havia inventado a gaita, <strong>de</strong>safiou-o para<br />
uma competição musical on<strong>de</strong> <strong>de</strong>veria tocar a lira, e apesar da<br />
bela música tocada por Pã (Fauno ou Silvano), tocando a lira,<br />
que ganhou como um presente <strong>de</strong> Hermes, Apolo, mostrou uma<br />
canção tão impressionante que foi imediatamente <strong>de</strong>clarado<br />
vencedor. Todos concordaram, menos Midas, seguidor <strong>de</strong> Pã,<br />
até ali vencedor <strong>de</strong> qualquer disputa; por causa disso Apolo<br />
transformou as orelhas <strong>de</strong> Midas <strong>em</strong> orelhas <strong>de</strong> asno. Midas<br />
tentou escon<strong>de</strong>r as orelhas <strong>de</strong>baixo <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> turbante, mas<br />
o seu cabeleireiro conhecia o segredo e não conseguia proteger<br />
Midas da vergonha, por que parava <strong>de</strong> rir. Diz<strong>em</strong> que o<br />
cabeleireiro ficou s<strong>em</strong> as suas. Não ousando dizê-lo a ninguém,<br />
cavou um buraco no chão, cochichou o acontecido <strong>de</strong>ntro do<br />
buraco e <strong>de</strong>pois o cobriu. Mas uma moita espessa <strong>de</strong> juncos<br />
nasceu e se pôs a sussurrar a história a partir daquele dia, cada<br />
vez que o vento soprava sobre eles.<br />
Por espalhar que era o melhor arqueiro entre os <strong>de</strong>uses,<br />
Apolo irritou Eros o <strong>de</strong>us do amor, e este vingou-se disparando<br />
uma <strong>de</strong> suas flechas no coração do <strong>de</strong>safeto e uma outra no<br />
coração da ninfa Dafne, filha do <strong>de</strong>us-rio, Pineus. Pura malda<strong>de</strong>.<br />
82
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Apolo apaixonou-se por Dafne que costumava andar pelas<br />
florestas e, como Árt<strong>em</strong>is, a <strong>de</strong>usa da caça, não queria se<br />
casar. Ele perseguiu-a, mas ela se negou a parar e partiu<br />
voando, seguida por ele, <strong>de</strong>terminado <strong>em</strong> apanhá-la. Cansada e<br />
prestes a cair no chão, Dafne chamou o seu pai, o <strong>de</strong>us-rio,<br />
para salvá-la. A natureza se mobilizava. No exato momento <strong>em</strong><br />
que ela ia ser apanhada, Dafne foi convertida <strong>em</strong> um pé <strong>de</strong><br />
louro.<br />
S<strong>em</strong> po<strong>de</strong>r casar com a amada, pois nunca que se<br />
casaria com um vegetal, e por amá-la tanto, Apolo <strong>de</strong>cidiu que<br />
as coroas que seriam usadas para as cabeças dos vencedores<br />
dos Jogos <strong>de</strong>veriam ser feitas com galhos <strong>de</strong> louro. Uma<br />
sacada. Uma homenag<strong>em</strong>.<br />
Apolo tomou partido na famosa guerra <strong>de</strong> Ílion ao lado<br />
dos teucros, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo a cida<strong>de</strong>, dizimando os aqueus com<br />
praga quando estes ofen<strong>de</strong>ram o seu sacerdote troiano, e<br />
acabando por matar Aquiles. Em época mais tardia foi<br />
i<strong>de</strong>ntificado com Hélios, <strong>de</strong>us do sol, pois era antes o <strong>de</strong>us da<br />
luz, e por arrastamento a sua irmã foi i<strong>de</strong>ntificada com a <strong>de</strong>usa<br />
Selene, da lua. Mitologicamente foi um <strong>de</strong>us <strong>de</strong> inúmeros<br />
amores, mas que nunca teve sorte, por vingança <strong>de</strong> Eros, <strong>de</strong>us<br />
do amor. Na mitologia etrusca, foi conhecido como Aplu e era<br />
venerado no Chipre, com o título <strong>de</strong> Abeu. Em cada terra um<br />
nome.<br />
83
AFRODITE AFRODITE<br />
AFRODITE<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
A cipriota. Beleza, Amor, amor sexual, a afeição da vida social e<br />
t<strong>em</strong>as agradáveis como esse que <strong>em</strong> qualquer mesa <strong>de</strong> bar<br />
pod<strong>em</strong>os <strong>de</strong>gustar. Nascida da espuma, restos <strong>de</strong> esperma <strong>em</strong><br />
sal <strong>de</strong>itado por um Urano castrado, ela é. V<strong>em</strong>os genitais<br />
fervidos <strong>em</strong> salmoura <strong>de</strong>nsa, v<strong>em</strong>os a espuma <strong>de</strong> fecundar<br />
Tálassa.<br />
Deusa erguida da espuma levada a Chipre. A cipriota.<br />
Criada e educada pelas ágeis ninfas do mar verdoengo,<br />
habitando <strong>em</strong> cristalinas cavernas, <strong>de</strong> ilha <strong>em</strong> ilha. Três amigas<br />
teciam grinaldas escorreitas para os seus cabelos, teciam<br />
vestidos <strong>de</strong> escarlate finura <strong>em</strong> certos pontos e <strong>em</strong> outros nada<br />
menos que a cor do nácar. Belas cores.<br />
O mar imerso <strong>em</strong> fragrâncias florais.<br />
84
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
No Monte Olimpo a inesperada beleza levou os <strong>de</strong>uses à luta.<br />
Havia lá um trono para ela. Mas ela recusou. Zeus, o injusto,<br />
<strong>de</strong>u-a ao trôpego Hefaísto <strong>em</strong> paga <strong>de</strong> algum trabalho. Hefaísto<br />
feio e <strong>de</strong>formado babava metal <strong>de</strong> chumbo. Amais bela do<br />
Olimpo com o mais feio e aleijado dos po<strong>de</strong>rosos.<br />
T<strong>em</strong>endo a traição Hefaísto dava-lhe jóias. O lance <strong>de</strong> smepre.<br />
Comprar o amor. A troca. Deu-lhe, impensadamente, o cinto<br />
mágico <strong>de</strong> ouro, Hefaísto não era mesmo muito bom da cabeça.<br />
Com tal cinto Afrodite conquistava amantes. Teve filhos muitos<br />
mas o amor maternal não lhe cabia pois sabia ser valor <strong>de</strong><br />
cultura; nada a ver com a essência da mulher. Não há<br />
essências. Teve filhos vários. Afrodite não admitia competição<br />
na beleza. N<strong>em</strong> <strong>em</strong> mulher mortal. Punia-as. Cortava-lhes o<br />
rosto. Lançava-lhes lama do mar morte com arestas <strong>de</strong> cristais<br />
sólidos salinos.<br />
Mantinha-se venerada. Gregos e romanos. L<strong>em</strong>bravam todos<br />
das festas afrodisíacas.<br />
Com a vinda dos patriarcas a <strong>de</strong>usa passou a ser vista como<br />
frívola e promíscua. Mulher com coroa <strong>de</strong> flores, ramo <strong>de</strong> oliva<br />
<strong>em</strong> uma das mãos e um símbolo da abundância na outra. Mas,<br />
os patriarcas, chegados num compulsão e tara não queriam<br />
saber <strong>de</strong> mulheres livres.<br />
Inspirava amor nos corações humanos. Ou os <strong>de</strong>struía.<br />
85
QUIMERA<br />
QUIMERA<br />
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Enquanto atravessávamos a ponte sobre o Canoas ouvi<br />
zumbidos variados vindos das bandas do norte. Os amigos<br />
disseram que eu estava <strong>em</strong>ocionado com o passeio e com a<br />
presença <strong>de</strong> Sofia – todo mundo riu – ali, à mão, numa barraca<br />
só <strong>de</strong>la e sozinha. Ela riu também.<br />
Mãos soltas ao vento a modos <strong>de</strong> <strong>de</strong>spedida à noite, as<br />
estrelas eram fugidias e as mesmas mãos tr<strong>em</strong>iam com certo<br />
frio. Acend<strong>em</strong>os fogueira. Dormimos <strong>de</strong> cansado, cada um <strong>em</strong><br />
sua barraca e nada mais. No entanto, pela manhã, Dario e<br />
Carmelita disseram que ouviram assobios, também. Dessa vez<br />
nada escutei. Pregado <strong>de</strong> sono que estava <strong>de</strong>sfiz da conversa e<br />
fui tomar meu café com laranja. Logo seguimos caminho e Sofia<br />
me veio dar a mão. Mãos entrelaçadas. Passeio e calma.<br />
Quatro horas <strong>de</strong>pois, já <strong>em</strong> Minas, terras propícias para<br />
acontecimentos misteriosos, místicos e mentirosos, como estes,<br />
86
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
um fabuloso monstro com cabeça <strong>de</strong> leão, torso <strong>de</strong> cabra e<br />
cauda <strong>de</strong> dragão, estacava à nossa frente, num frenesi<br />
tamanho, soltando fogo pela boca. À primeira vista não acreditei<br />
no que via pois aquilo nunca existiu. Nenhum <strong>de</strong> nós achou, por<br />
b<strong>em</strong>, que aquilo fosse <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>. O profeta, misto <strong>de</strong><br />
profanador e poeta, Getúlio Cardozo disse, um dia, que se visse<br />
fantasma na frente <strong>de</strong>le, assim mesmo, não acreditaria, ou<br />
melhor, acreditaria estar louco.<br />
Nós ali sabíamos que não estávamos loucos, portanto,<br />
o que víamos era quimera pura. E era mesmo.<br />
Um dos nossos amigos, ginecologista, raramente ficava<br />
conosco até o fim das viagens e dos gran<strong>de</strong>s passeios pelos<br />
campos, com ou s<strong>em</strong> garotas por perto. Era-nos<br />
preconceituosamente suspeito. Naqueles dias esteve conosco e<br />
não arredou pé. Armou-se <strong>de</strong> papeis e gravadores e uma<br />
gran<strong>de</strong> matulag<strong>em</strong> para viagens longas se necessário.<br />
Durante as pausas para alimentação ou passeios por grotas<br />
ru<strong>de</strong>s ele esteve atento a qualquer ruído, inda mais <strong>de</strong>pois das<br />
aparições e <strong>de</strong>saparições, que eram fenômenos constantes no<br />
sul <strong>de</strong> Minas Gerais; e agora a coisa do leão à nossa frente. Um<br />
dia, com pena, fui ter com ele, perguntei se ele não via como<br />
evitar essa coisa <strong>de</strong> relações homossexuais e ele mandou que<br />
eu calasse a boca e me atinasse com o fenômeno. Ele não se<br />
cansava. Respon<strong>de</strong>u, <strong>de</strong>pois, que po<strong>de</strong>ríamos conversar com<br />
mais <strong>de</strong>talhes mas que por ora se interessava pela Quimera e<br />
nada mais. Entendia que nossa ativida<strong>de</strong> rotineira era como um<br />
trabalho <strong>de</strong> permanente observação e cuidado; ficar sentado<br />
filmando com celular era muito fácil mas enten<strong>de</strong>r a fundo o<br />
acontecimento... o <strong>de</strong>ixava <strong>em</strong>ocionado a ponto <strong>de</strong> chorar (sic)...<br />
L<strong>em</strong>brei <strong>de</strong> que uns dois meses atrás eu o vira na<br />
avenida principal, sentado numa das ca<strong>de</strong>iras <strong>de</strong> mogno do<br />
87
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
restaurante Fogo na Brasa; esperava, certamente, pelo cardápio<br />
que já d<strong>em</strong>orava; gesticulava para o garçom; <strong>de</strong>s<strong>em</strong>brulhava<br />
guardanapos e observava os talheres; limpava-os, até. Saindo<br />
dali foi submeter-se à manicure, acredito; para ele, não havia<br />
nada mais encantador do que as unhas b<strong>em</strong> esmaltadas com a<br />
transparência, outra vez, do nácar. Essa palavra, nácar, não<br />
mês ai da boca quando falo <strong>de</strong> gregos e similares. Achei muito<br />
razoável pois todos nós sabíamos <strong>de</strong> suas preferências – <strong>em</strong><br />
suspeita respeitosa e preconceituosa, como já disse e como sói<br />
acontecer a todos – e ouvimos, enfim, no final do dia, a sua<br />
idéia <strong>de</strong> captura daquele monstro. Isso nos espantou tamanha a<br />
macheza do <strong>em</strong>preendimento.<br />
Hoje cedinho, com a primeira pontada <strong>de</strong> inquietação<br />
com o início <strong>de</strong> uma nova s<strong>em</strong>ana, ainda meditando no<br />
travesseiro, avancei mais um pouco nas caraminholas. Pois já<br />
havia ligado a segunda-feira com o primeiro dia <strong>de</strong> aula no<br />
passado longínquo, quando a criança <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser apenas<br />
"filha" e passa a integrar uma socieda<strong>de</strong> maior, iniciando-se<br />
inocent<strong>em</strong>ente naquele lento esforço <strong>de</strong> socialização "oficial". O<br />
peso do trabalho v<strong>em</strong> da responsabilida<strong>de</strong> profissional. Não é<br />
"ser como cozinheira", mas "ser cozinheira" e ganhar salário,<br />
pagar INSS e IR, ter direitos e <strong>de</strong>veres como cidadã através da<br />
culinária, por ex<strong>em</strong>plo. A imag<strong>em</strong> do trabalho que recebi<br />
daquele <strong>de</strong>dicado amigo não estava correta porque não trazia<br />
este primeiro travo dolorido ligado a reinserção num<br />
<strong>de</strong>terminado nível da vida social. Usar pijama e chinelo é<br />
cômodo para aposentados dos cartuns não tanto pelo conforto<br />
da indumentária, mas pela sinalização do estado <strong>de</strong><br />
"indisponibilida<strong>de</strong> , ou isenção das responsabilida<strong>de</strong>s<br />
profissionais" marcadas pelo salário e pelos impostos. É viajar<br />
grátis <strong>de</strong> ônibus, pagar meia no cin<strong>em</strong>a como criança...<br />
88
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Um enorme preâmbulo para comentar os filmes <strong>de</strong> um<br />
diretor que encantou Humberto e que acho doloroso d<strong>em</strong>ais<br />
assistir, <strong>em</strong>bora se apresente como uma comédia. Trata-se <strong>de</strong><br />
um português chamado João César Monteiro. As três fitas que<br />
ele mandou vir da Europa são pr<strong>em</strong>iadas: Recordações da Casa<br />
Amarela, Leão <strong>de</strong> Prata no Festival <strong>de</strong> Veneza <strong>de</strong> 1989; A<br />
Comédia <strong>de</strong> Deus, Gran<strong>de</strong> Prêmio Especial do Júri no Festival<br />
<strong>de</strong> Veneza <strong>de</strong> 1995; As Bodas <strong>de</strong> Deus, Seleção Oficial do<br />
Festival <strong>de</strong> Cannes <strong>em</strong> 1988.<br />
Já havia tentado ver As Bodas <strong>de</strong> Deus, com uma cena<br />
<strong>em</strong> que João manipula uma mulher que nada sobre a mesa <strong>de</strong><br />
massag<strong>em</strong>, tendo Wagner (a morte <strong>de</strong> Isolda) ao fundo. Ont<strong>em</strong><br />
vi partes das Recordações da Casa Amarela. Estes filmes são,<br />
pra mim, manhãs <strong>de</strong> segunda-feira esticadas ao infinito. A<br />
fotografia é principesca. A luz é <strong>de</strong> Fra Angelico. As casas<br />
l<strong>em</strong>bram os casarios do bairro do centro <strong>de</strong> Mococa on<strong>de</strong> me<br />
davam suspiros recém saídos das palmeiras imperiais enquanto<br />
escutava os tesourinhas e melros.<br />
Ia eu nesses pensamentos perdidos olhando o sol<br />
coado pela tenda quando ouvi gritos lá fora. Sai e pu<strong>de</strong> notar a<br />
algazarra. De qualquer forma o bicho avançou e retroce<strong>de</strong>u s<strong>em</strong><br />
que saíss<strong>em</strong>os <strong>de</strong> nosso lugar. Nisso, tamanha poeira<br />
levantada, outra aparição nos fez tr<strong>em</strong>er na base. Um cavaleiro<br />
sobre um cavalo que voava. Belerofonte, montado no cavalo<br />
alado Pégaso dado por Atena. Ataca o bicho que cuja<br />
representação plástica, na arte cristã medieval, era um símbolo<br />
do mal, mas com o passar do t<strong>em</strong>po, passou a se chamar <strong>de</strong><br />
quimera. Hoje quimera significa produto da imaginação,<br />
fantasia, utopia, sonho, e, eu ainda não sei porque não fujo pois<br />
o monstro acaba <strong>de</strong> <strong>de</strong>vorar os braços <strong>de</strong> Sofia e ruma para<br />
abocanhar a cabeça do médico que corria como uma gazela.<br />
89
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
PÃ DE DE TODOS<br />
TODOS<br />
Bosques, campos, caçadores a pés <strong>de</strong>scalços, pastores <strong>de</strong><br />
frauta ruda à boca, rebanhos dormentes <strong>de</strong> acasalamentos.<br />
‘Deusinho tudo’, caráter pagão <strong>em</strong> qu<strong>em</strong> se adora a natureza.<br />
Terá sido filho <strong>de</strong> Zeus? Diz<strong>em</strong> as más línguas que Zeus pegou<br />
sua ama <strong>de</strong> leite e daí nasceu Pã. Outras línguas diz<strong>em</strong> que<br />
nasceu Nelson. Zeus e a cabra. Zeus e Amaltéia. Zeus é o <strong>de</strong>us<br />
dos caipiras que pegam suas vacas encostando a bicha no<br />
barranco, pelo visto. Vacas ou cabras, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> caipira e da<br />
altura do barranco.<br />
Tudo isso me disseram enquanto caminhava absorto com um<br />
grupo <strong>de</strong> milicianos, atravessando o Rubicão. Eram meses frios.<br />
Muito agasalho. Os pés gelavam na estrada <strong>de</strong> pedra e as<br />
costas <strong>de</strong> Cesar não saiam da minha frente. Eu tinha a<br />
responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> segurar o general caso caísse, vítima <strong>de</strong><br />
outro ataque epilético. Não podia per<strong>de</strong>r a atenção ou perdia a<br />
90
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
cabeça. Por isso, qu<strong>em</strong> contava essa historia <strong>de</strong> Pã b<strong>em</strong> que<br />
podia aumentar à vonta<strong>de</strong> e mentir a valer que eu não<br />
perceberia. Outros aproveitavam para palpitar sobre a mesma<br />
coisa. Lendas... Pã como filho <strong>de</strong> Hermes... Pã como filho do<br />
Ar...<br />
- ... e <strong>de</strong> uma nereida -, gritou outro centurião lá do fundo. Voltei<br />
meu rosto e vi Quintilius rindo, escon<strong>de</strong>ndo o rosto <strong>de</strong> puro<br />
<strong>de</strong>boche no casaco <strong>de</strong> peles. Balançava a cabeça.<br />
- ... ou, filho da Terra e do Céu -. Alguém disse, mas n<strong>em</strong> me<br />
<strong>de</strong>i conta. Naquele momento atravessávamos grutas e vales e<br />
montanhas. Quintilius gritou.<br />
- Olh<strong>em</strong> lá pra baixo... ninfas. As ninfas estão dançando.<br />
Dez ou vinte soldados viraram o rosto e nada viram. Ninfas não<br />
exist<strong>em</strong>. Quintilius ria. Percebi que a cabeça <strong>de</strong> Cesar virou<br />
para a direita e atentei a seus movimentos. Acho que ele ria,<br />
também. Levantou o braço e a fileira parou. Cesar <strong>de</strong>sceu do<br />
cavalo e mandou montar a barraca. Descansaríamos. Quintilius<br />
se aproximou <strong>de</strong> mim.<br />
- ... caçando ou dançando com as ninfas. Vamos lá, Antonius...<br />
a viag<strong>em</strong> está no fim... Mais uns três dias?<br />
- Talvez -, respondi.<br />
- Então!... <strong>de</strong>pois é só ninfa e dança, meu velho.<br />
- Já estou cansado, mesmo -, dizia eu enquanto <strong>de</strong>satrelava o<br />
cavalo. Barulho e movimento nas terras geladas tomavam corpo<br />
no acampamento. Os soldados t<strong>em</strong>erosos se escondiam <strong>em</strong><br />
suas barracas unitárias enquanto outros formavam círculos para<br />
91
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
esquentar ao fogo e contar histórias. Quintilius e seu grupo não<br />
paravam <strong>de</strong> rir n<strong>em</strong> <strong>de</strong> resgatar lendas e causos sobre Pã.<br />
- Contam, as ciganas, aquelas mentirosas... que seu gran<strong>de</strong><br />
amor foi Selene.<br />
- Eu também me apaixonei pela Lua... e daí?<br />
- Vai ver você é primo <strong>de</strong> Pã -, gritou outro e todos gargalharam.<br />
- Mas interessam mais os muitos outros amores... e que entre<br />
os muitos amores <strong>de</strong> Pã, nada vale mais do que os que teve<br />
com as ninfas Pítis e Eco...<br />
- Ei, Quintilius... Cesar ainda te pren<strong>de</strong>... você sabe mais <strong>de</strong><br />
coisas da Hellas do que <strong>de</strong> Roma...<br />
Quintilius abanou a mão pedindo silêncio: - Nada disso... a<br />
coisa é grave..., <strong>de</strong>ixa que eu conte. Pítis e Eco, ao<br />
abandonar<strong>em</strong> Pã... foram transformadas <strong>em</strong> pinheiro, a<br />
primeira, e <strong>em</strong> uma voz con<strong>de</strong>nada a repetir as últimas palavras<br />
que ouvia, a segunda.<br />
- Pã, além <strong>de</strong> tudo, é mágico.<br />
- Sim... -, disse Quintilius. – Mágico e mal.<br />
Nisso Cesar saiu <strong>de</strong> sua tenda magnífica e caminhou na direção<br />
do grupo. Fiz<strong>em</strong>os silêncio respeitoso.<br />
- Nós o estamos incomodando, Cesar? – no campo <strong>de</strong> batalha<br />
Cesar não usava <strong>de</strong> protocolos n<strong>em</strong> burocracias. Era direto com<br />
todos e todos eram diretos com ele.<br />
92
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
- Não... vim para ouvir <strong>de</strong> perto os teus relatos... Depois, a noite<br />
está fria e... – sorrindo – acho que ouvi a flauta <strong>de</strong> Pã tocando<br />
naquela mata. Antes que escureça é bom estar ao lado dos<br />
amigos.<br />
Os soldados baixaram a cabeça.<br />
- Posso dizer alguma coisa?<br />
- Por favor, General.<br />
- Pã <strong>de</strong>ve ser t<strong>em</strong>ido por todos os que necessitam atravessar as<br />
florestas... assim como nós... à noite,... justamente como nós<br />
faz<strong>em</strong>os agora... pois as trevas e a solidão da travessia<br />
predispõe a pavores súbitos... -, as brisas com aroma <strong>de</strong><br />
eucalipto passaram pelo grupo que se ia aumentando, colorindo<br />
a história <strong>de</strong> Cesar com característico aroma. Ele continuou com<br />
sua voz grave:<br />
- Os sons e os medos s<strong>em</strong> qualquer causa aparente são<br />
atribuídos a Pã... E por força <strong>de</strong> tudo eu quero que meus<br />
soldados se transform<strong>em</strong> na contrapartida <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>usinho das<br />
florestas... Cada soldado meu t<strong>em</strong> que ser um <strong>de</strong>us aparte...<br />
talvez s<strong>em</strong> nome... ou com o nome romano <strong>de</strong> Quintilius... ou <strong>de</strong><br />
Antonius... novos <strong>de</strong>uses que instil<strong>em</strong> o medo e o respeito por<br />
on<strong>de</strong> passarmos... Não ser<strong>em</strong>os nós a ter medo <strong>de</strong> um <strong>de</strong>us<br />
que mostra orelhas, chifres, cauda e pernas <strong>de</strong> bo<strong>de</strong>... -. Todos<br />
riram imersos na confiança <strong>de</strong> Cesar... - Não é?<br />
De longe eu vi que um par <strong>de</strong> olhos flamejantes nos observava<br />
através da mata. Hesitei <strong>em</strong> passar por bobo na frente <strong>de</strong> Cesar<br />
e nada comentei. Permaneci <strong>em</strong> estado <strong>de</strong> alerta. Cesar <strong>de</strong>u<br />
boa noite e foi para a tenda. Os soldados se separam e, como<br />
amante da música, pu<strong>de</strong> apurar o ouvido... o som fluia da<br />
93
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
floresta... alguém ali estava... pedi que batedores fizess<strong>em</strong> a<br />
ronda e os olhos que me pareciam flamejantes mudaram <strong>de</strong><br />
lugar rapidamente... Seriam vagalumes? Voando aos pares?<br />
Vermelhos?<br />
A noite se fez <strong>de</strong>nsa e Cesar or<strong>de</strong>nou que eu fizesse o primeiro<br />
turno <strong>de</strong> guarda, mais curto, para que dormisse<br />
a<strong>de</strong>quadamente... Antes <strong>de</strong> entrar na tenda relancei o olhar e vi<br />
uma pessoa que carregava uma flauta... parecia um flauta <strong>de</strong><br />
caniço... o caniço <strong>em</strong> que se havia transformado a ninfa Siringe.<br />
Chegamos a Roma na tar<strong>de</strong> do dia seguinte e nada mais<br />
aconteceu n<strong>em</strong> Quintilius falou coisa nenhuma. Na verda<strong>de</strong> ele<br />
sumira... disseram que perdido na floresta. Eram calendas <strong>de</strong><br />
fevereiro, meta<strong>de</strong> do mês passara e logo teria início a festa das<br />
Lupercais... Lupércius, o <strong>de</strong>us dos pastores. O festival,<br />
celebrado no aniversário da fundação <strong>de</strong> seu t<strong>em</strong>plo; a<br />
Lupercália, prometia muita comida, bebida e festejos orgiásticos.<br />
De cima do palco o apresentador gritava: - Toda criança que<br />
nascer nesses dias <strong>de</strong>ve receber o nome <strong>de</strong> Lupercius, ou<br />
Silvano... – e pulou <strong>de</strong> lá, soprando um pequeno aulo, coberto<br />
<strong>de</strong> pele e ria muito olhando para mim enquanto se afastava<br />
per<strong>de</strong>ndo-se na multidão.<br />
94
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
ÁRTEMIS RTEMIS DIANA BRUXA<br />
De quantas Dianas pod<strong>em</strong>os falar?<br />
Diana Art<strong>em</strong>ísia Bruxa muito popular entre arroubos e lances<br />
grotescos <strong>de</strong> violência; Diana Bruxa Art<strong>em</strong>ísia, cercada <strong>de</strong><br />
animais e peles e arcos e muita lambida salivosa nas coxas<br />
nuas; Árt<strong>em</strong>is Bruxa Caçadora, a popular das <strong>de</strong>usas, s<strong>em</strong>pre<br />
ligada à floresta – dría<strong>de</strong>s e hamadría<strong>de</strong>s / seiva e flora / fauna<br />
e <strong>de</strong>sertos <strong>de</strong> secos vegetais, - caçadora <strong>de</strong> gente incauta,<br />
caçadora <strong>de</strong> pelos luzidios, caçadora <strong>de</strong> nuvens perdidas.<br />
Depois, tendo passado por quiméricos ventos noroeste,<br />
associou-se à luz da lua e à magia. Tomou nome <strong>de</strong> Lilith ou<br />
Hécate, um dos dois, e andou pelos <strong>de</strong>sertos vermelhos,<br />
misturando o sangue menstrual com a areia escaldante.<br />
95
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Escondia-se m cavernas <strong>de</strong> pura aci<strong>de</strong>z. Lutou com magos e<br />
profetas, arreganhou as pernas para um s<strong>em</strong> número <strong>de</strong><br />
monstros podres e saiu ilesa na contenda com S<strong>em</strong>anguelof.<br />
Filha <strong>de</strong> Zeus e Leto, que brincavam com ela pequena entre<br />
aquários e fossas <strong>de</strong> leite; irmã gêmea <strong>de</strong> Apolo, muita vez<br />
fingia ser Apolo atrapalhando guerras a sorver o calor do<br />
sangue jorrado s<strong>em</strong> peias nas terras <strong>de</strong> barro e cal. Diana<br />
Caçadora. Diana Bruxa Árt<strong>em</strong>is. Diana.<br />
Ainda assim, Leto, sua mãe foi perseguida por Hera, mas, cá<br />
entre nós, qu<strong>em</strong> é que Hera não perseguia? Seria mais fácil<br />
cortar o bastão <strong>de</strong> Zeus enquanto este dormisse, mas preferia<br />
importunar suas amantes; Hera, a <strong>de</strong>usa rainha protetora do<br />
casamento e do parto, se com mais cuidado visse o parto <strong>de</strong><br />
outra forma protegeria os filhos e filhas do parto, <strong>de</strong> qual parto<br />
fosse, não quis receber Leto quando esta estava prestes a dar à<br />
luz, pois Hera odiava e perseguia as amantes <strong>de</strong> Zeus, como já<br />
foi dito, e, principalmente os filhos <strong>de</strong> tais relacionamentos. Hera<br />
protegia partos que não foss<strong>em</strong> oriundos <strong>de</strong> Zeus. Todos menos<br />
estes e não causa espanto que Hera andasse <strong>em</strong>burrada para<br />
cima e para baixo tropeçando nas pedras marmóreas do<br />
T<strong>em</strong>plo.<br />
Leto esperava gêmeos e era uma quarta-feira, se não me<br />
engano. É o que posso dizer. Ventava... b<strong>em</strong>, isso também<br />
posso dizer. Ventava e o frio cortante subia as encostas como<br />
que para <strong>em</strong>purrar a paz para longe. Leto chegou à ilha <strong>de</strong><br />
Delos e <strong>de</strong>u à luz no monte Cinto.<br />
O Monte Cinto se revelou áspero e recoberto <strong>de</strong> muita camada<br />
e terra ocre. Duas pessoas comuns – gentes do povo <strong>de</strong> Cinto<br />
– <strong>de</strong>sciam as costas do monte <strong>de</strong> cume arredondado, como se<br />
<strong>de</strong>slizass<strong>em</strong>. Estavam alegres, os braços erguidos, gritavam<br />
para os ventos como alucinados. Se não me engano uma<br />
96
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
<strong>de</strong>ssas pessoas, a mais baixa, era uma tal <strong>de</strong> Lady<br />
Mariana, loira <strong>de</strong> cabelos frizitas cuja cor <strong>de</strong> melenas<br />
combinava com o ocre das paragens. A segunda pessoa era um<br />
careca s<strong>em</strong> nome que se arrastava tentando lamber as canelas<br />
<strong>de</strong> Lady Mariana. Devo dizer que não conseguia. Leto<br />
esperou que passass<strong>em</strong> pois não <strong>de</strong>ra espaço para ela, com<br />
toda a cortesia que uma grávida po<strong>de</strong> ter <strong>em</strong> tais circunstâncias.<br />
Leto subiu. Estava tensa. Sua roupa nacarada (olha o nácar ai<br />
novamente) flutuava ao zéfiro. De on<strong>de</strong> estava podia ver o<br />
cinzento do recorte das pedras do Cinto, como se fosse um<br />
nariz rasgado contra o céu <strong>em</strong> granito. Lá <strong>de</strong>u à luz a<br />
DianÁrt<strong>em</strong>is e Apolo.<br />
Algum viajante engraçadinho havia pintado <strong>em</strong> vermelho com<br />
uma flecha o nome do monte como se fosse necessário.<br />
Hera observava <strong>de</strong> longe amparada por lacaios furtivos. Furiosa.<br />
Pronta para vinganças.<br />
Ela mesma, Árt<strong>em</strong>is, <strong>de</strong>usa criativa, revelou dotes <strong>de</strong> <strong>de</strong>usa dos<br />
nascimentos, também - auxiliara no parto do irmão gêmeo,<br />
Apolo. Recebera prêmios. Zeus presenteou-a com arco e<br />
flechas <strong>de</strong> prata; presenteou-a com uma lira do mesmo material.<br />
O irmão Apolo ganhou os mesmos presentes, <strong>de</strong> ouro, obra do<br />
exímio Hefaísto, s<strong>em</strong>pre pronto a forjar metais preciosos, o<br />
<strong>de</strong>us do fogo e das forjas. Apolo recebeu uma corte <strong>de</strong> Ninfas<br />
para banquetear-se s<strong>em</strong>pre que <strong>de</strong>sejasse, afinal, as ninfas são<br />
muito úmidas e favorec<strong>em</strong> o coito. Favoreceu Árt<strong>em</strong>is com o<br />
po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> ser rainha dos bosques. Árt<strong>em</strong>is dos Bosques. Árt<strong>em</strong>is<br />
Bruxa e Caçadora. Ou Diana.<br />
In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> Hera e das lambidas dos animais – mero<br />
consolo - a jov<strong>em</strong> era a mais pura e casta das <strong>de</strong>usas, s<strong>em</strong>pre<br />
amada pelas Ninfas; com elas dançava nas florestas sob a luz<br />
97
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
prateada da lua. Selene. Art<strong>em</strong>is era para as mulheres o que<br />
Apolo era para os homens.<br />
T<strong>em</strong>pos <strong>de</strong>pois, já muito jov<strong>em</strong> e, apesar disso, apesar <strong>de</strong><br />
caçadora, apesar do voto <strong>de</strong> castida<strong>de</strong>, apaixonou-se pelo<br />
jov<strong>em</strong> Órion, seu primo, filho <strong>de</strong> Posêidon. Um gigante que<br />
corria pelas estradas com seu cão Sirius. Orion também caçava.<br />
Caçou-a. Mas Apolo não queria saber daquele primo aquático.<br />
Apolo estava enciumado. Jov<strong>em</strong> e, enciumado, um dia <strong>de</strong>cidiu<br />
impedir sua irmã <strong>de</strong> se juntar a ele <strong>em</strong> sexo e <strong>de</strong>lícias.<br />
A coisa se <strong>de</strong>senvolveu assim. Estavam os dois – Árt<strong>em</strong>is e<br />
Apolo - numa praia quando Apolo percebeu Órion mergulhado<br />
na água e percebeu que estava com a cabeça <strong>de</strong> fora. Tomando<br />
um sol, talvez. Assim <strong>de</strong> longe somente o olhar arguto do<br />
dourado <strong>de</strong>us po<strong>de</strong> discernir as forma do primo. Apontou<br />
naquela direção, s<strong>em</strong> nada dizer para sua gêmea, a não ser as<br />
sentenças do <strong>de</strong>safio. Apolo mostrou-lhe o objeto imenso,<br />
escuro e <strong>de</strong>safiou-a a acertá-lo com suas famosas flechas.<br />
Ela, s<strong>em</strong> mais pensar e armando um sorriso argentino, retesou<br />
o arco e acertou a cabeça <strong>de</strong> Órion com sua flecha, s<strong>em</strong> o<br />
saber. De prima. O objeto balançou sobre as ondas e afundou<br />
num barulho metálico. Imediatamente uma onda vertiginosa<br />
alcançou os pés dos irmãos. Árt<strong>em</strong>is estranhou a violência das<br />
ondas, mas, Apolo n<strong>em</strong> se moveu. Só observava. Então as<br />
ondas trouxeram o corpo <strong>de</strong> Órion até a praia com uma flecha<br />
enterrada; Árt<strong>em</strong>is <strong>de</strong>sabou <strong>em</strong> choro e dores. E, ela, não<br />
querendo que o amado <strong>de</strong>saparecesse para s<strong>em</strong>pre, colocou-o<br />
entre as estrelas do céu, on<strong>de</strong> aparece como gigante que é,<br />
ornado <strong>de</strong> cinto e espada, pele <strong>de</strong> leão, uma clava,<br />
acompanhado cão. Uma triste história.<br />
98
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Árt<strong>em</strong>is, <strong>de</strong>sse momento <strong>em</strong> diante per<strong>de</strong>u muito da paciência e<br />
da cordialida<strong>de</strong> com a humanida<strong>de</strong>, n<strong>em</strong> se sabe por que. O<br />
certo seria enfiar uma flecha na goela <strong>de</strong> Apolo. É minha<br />
opinião. Mas, <strong>em</strong> todo caso, ela tornou-se severa com os<br />
mortais que ousavam <strong>de</strong>safiá-la. E, não há mortal que não<br />
<strong>de</strong>safie os <strong>de</strong>uses. Trata-se, no fundo, <strong>de</strong> uma certeza <strong>de</strong> que<br />
os <strong>de</strong>uses não exist<strong>em</strong>.<br />
Uma antiga história, contada a mim pelo velho Tirésias, cego <strong>de</strong><br />
boa audição, dizia que, certa vez, como <strong>de</strong> costume, Árt<strong>em</strong>is<br />
banhava-se nas águas das fontes cristalinas; foi surpreendida<br />
pelo caçador Acteon que ali se dirigiu, com um bando <strong>de</strong> cães<br />
atrozes na caça, para saciar a se<strong>de</strong>. Acteon era conhecido,<br />
havia sido treinado pelo centauro Quiron, portanto era pessoa<br />
<strong>de</strong> fama e abrigo <strong>de</strong> soberba. Há qu<strong>em</strong> diga que Acteon parou<br />
para olhar a nu<strong>de</strong>z <strong>de</strong> Árt<strong>em</strong>is, - se b<strong>em</strong> que não precisava<br />
parar para isso, - e lançou uns sorrisinhos estranhos na<br />
direção da <strong>de</strong>usa.<br />
Árt<strong>em</strong>is, ao vê-lo assim ousado, saiu das águas, o líquido<br />
escorria pela pele, um apelo erótico para <strong>de</strong>sviar a atenção;<br />
aproximou-se do caçador. Em um movimento brusco, mas,<br />
elegante Árt<strong>em</strong>is o transformou <strong>em</strong> um veado e tornou-o vítima<br />
da própria matilha que o estraçalhou. Assim simplesmente.<br />
Outra história que o pân<strong>de</strong>go do Tirésias conta era o que ela fez<br />
com Agamêmnon. Mas esse merecia mesmo. Sujeito chato. O<br />
Rei Agamêmnon, muitas vezes <strong>de</strong> má m<strong>em</strong>ória, matou um<br />
cervo no bosque consagrado. S<strong>em</strong>pre cervos e veados. Até ai<br />
tudo b<strong>em</strong> já que Agamêmnon era doidivanas e s<strong>em</strong>pre que<br />
podia comia um veado. Árt<strong>em</strong>is exigiu do grego – no meio da<br />
viag<strong>em</strong> para Tróia - o sacrifício da filha, Ifigênia. Os ventos<br />
voltaram a soprar. A viag<strong>em</strong> seguiu. Mas, Árt<strong>em</strong>is, diferente <strong>de</strong><br />
99
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Hera, a ru<strong>de</strong>, teve pena <strong>de</strong> Ifigênia, a jov<strong>em</strong>, e levou-a para seu<br />
t<strong>em</strong>plo/santuário on<strong>de</strong> a moça se tornou sacerdotisa.<br />
Diana é Árt<strong>em</strong>is, com certeza, mas, pod<strong>em</strong> chamá-la <strong>de</strong> Cíntia.<br />
Tirésias garante.<br />
100
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
OS OS DOZE TRABALHOS<br />
TRABALHOS<br />
Heracles, notável herói <strong>de</strong>tentor <strong>de</strong> força extraordinária<br />
e corag<strong>em</strong> s<strong>em</strong> limites, s<strong>em</strong>pre foi admirado pelas lendárias<br />
expedições. Muita gente dizia que eram mentiras, lorotas; um<br />
pessoal <strong>de</strong> Arceburgo e Milagres dizia que eram papagaidas e<br />
tal, mas Heracles s<strong>em</strong>pre trazia a cabeça <strong>de</strong> alguém para<br />
mostrar que eram verda<strong>de</strong>s. Arrancava, até, a do interlocutor <strong>em</strong><br />
caso <strong>de</strong> dúvida.<br />
Heracles é o nome grego para Hércules, o herói<br />
romano. Mesma pessoa, mesmo drama. Era filho <strong>de</strong> Zeus e<br />
Alcmene, - gosto s<strong>em</strong>pre <strong>de</strong> dizer o nome da família toda para<br />
que saibam da minha idoneida<strong>de</strong> e sabedoria. Alcmene, por sua<br />
vez, era esposa do general tebano Anfitrião. Zeus, naquela<br />
época, variava muito <strong>de</strong> vaginas. Hoje n<strong>em</strong> tanto. Parece um<br />
<strong>de</strong>us capado, <strong>de</strong>ixado <strong>de</strong> lado a envelhecer no Panteão<br />
Olímpico ao lado <strong>de</strong> outros <strong>de</strong>uses celibatários e bentos e<br />
esquecidos, donos <strong>de</strong> hirsutas barbas, exceto as mulheres.<br />
101
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Mas contam, entre as más línguas, que a esposa mulher <strong>de</strong><br />
alguém, <strong>de</strong> qualquer alguém infausto cornificável, não passava<br />
<strong>de</strong> vagina vaga e nada mais. Não havia vínculo espiritual na<br />
coisa. Zeus dizia que <strong>de</strong> espiritual bastava ele. Tanto é que<br />
Zeus n<strong>em</strong> se l<strong>em</strong>brava <strong>de</strong> qu<strong>em</strong> era pai, muita vez... Ele apenas<br />
dizia, com um sorriso nos lábio : - Sé não o cham<strong>em</strong> <strong>de</strong> Junior.<br />
- Ah! Fui eu?, - perguntava displiscente enquanto<br />
enrolava as ma<strong>de</strong>ixas lendo o jornaldiário, s<strong>em</strong> se importar<br />
muito com o assunto. Hera, que nada esquecia, mostrando o<br />
s<strong>em</strong>blante austero e fechado, a esposa ciumenta <strong>de</strong> Zeus,<br />
estava <strong>de</strong>terminada a matar qualquer filho <strong>de</strong> seu marido infiel;<br />
às vezes se limitava a encher o saco das mulheres cuja vagina<br />
serviu <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito para o sêmen divino.<br />
Logo <strong>de</strong>pois que Heracles nasceu, Hera enviou duas<br />
gran<strong>de</strong>s serpentes para matá-lo. Heracles, porém, <strong>em</strong>bora<br />
ainda fosse um bebê, estrangulou as cobras pensando que<br />
chocalhos foss<strong>em</strong>... brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> criança mesmo. Na ida<strong>de</strong><br />
adulta, Heracles matou um leão com suas próprias mãos e<br />
certos camponeses que assistiam ao <strong>em</strong>bate disseram que com<br />
uma bela cabeçada também. Detalhes. Como troféu <strong>de</strong>sta<br />
aventura ele usou a pele do leão como vestimenta e a cabeça<br />
do felino como elmo. Muitos riam do mo<strong>de</strong>lito mas somente<br />
quando Heracles já estava b<strong>em</strong> longe. Covar<strong>de</strong>s.<br />
O herói, logo, - não se sabe quão logo esse pois com a<br />
morte <strong>de</strong> Cronos o t<strong>em</strong>po se tornara meio anárquico, - Heracles<br />
conquistou uma tribo que exigia tributos <strong>de</strong> Tebas. Qu<strong>em</strong> <strong>em</strong> sã<br />
consciência, sabendo que existia um sujeito que mata cobra,<br />
mostra o pau, sufoca leão, ainda vai exigir tributo. B<strong>em</strong> se vê<br />
que as relações políticas estavam atrasadas e olvidadas,<br />
naquela época. B<strong>em</strong>... como recompensa, foi-lhe dada a mão da<br />
princesa tebana Megara, com qu<strong>em</strong> teve três filhos.<br />
102
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Passado algum t<strong>em</strong>po Hera, ainda <strong>de</strong>sejosa <strong>de</strong> matar<br />
Heracles, sugestionou-lhe com séries incontáveis <strong>de</strong> associação<br />
<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e imagens que se <strong>de</strong>senvolveram <strong>em</strong> um espasmo <strong>de</strong><br />
loucura que <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ou fúria e horrendas pre<strong>de</strong>stinações. Ele<br />
matou a esposa e os filhos. Ponto.<br />
Horrorizado e com r<strong>em</strong>orso, após voltar a si com a<br />
risada <strong>de</strong> Hera ecoando pelos abismos, Heracles tentou se<br />
matar, mas foi-lhe revelado pelo oráculo <strong>de</strong> Delfos e, nesse<br />
momento surg<strong>em</strong> dúvidas pois sab<strong>em</strong>os todos que há um ritual<br />
específico para que o oráculo divulgue suas frases espirituosas,<br />
- no entanto o oráculo inalou gases e proferiu que Heracles<br />
<strong>de</strong>veria se purificar tornando-se o servente <strong>de</strong> seu primo<br />
Euristeu, que era, naquelas calendas, rei <strong>de</strong> Micenas e, diga-se<br />
<strong>de</strong> passag<strong>em</strong>, um sujeito que não tomava muito banho. Não que<br />
nisso altere a história mas favorece a que o leitor tenha nojo<br />
<strong>de</strong>le logo <strong>de</strong> cara. A não ser que o leitor também não tome seu<br />
banho diário.<br />
Euristeu, aconselhado por Hera, tramou, articulou, como<br />
penitência, 12 tarefas a ser<strong>em</strong> <strong>de</strong>senvolvidas pelo herói que<br />
caíram na mídia como os "Trabalhos <strong>de</strong> Heracles".<br />
O primeiro trabalho era matar o leão <strong>de</strong> N<strong>em</strong>eia, uma<br />
besta que não podia ser ferida por qualquer arma, mas, cá entre<br />
nós e à boca chiusa: - qu<strong>em</strong> já matou um leão a cabeçadas não<br />
teria probl<strong>em</strong>a com outro leão, mesmo que <strong>de</strong> N<strong>em</strong>eia, sabe-se<br />
lá on<strong>de</strong> ficava isso.<br />
Heracles, pobre <strong>em</strong> geografia, vagou um tanto até achar<br />
a região; lá chegando, primeiro atordoou o leão com sua clava e<br />
<strong>de</strong>pois, estrangulou-o. Podia tê-lo cortado <strong>em</strong> pedacinhos,<br />
trocado <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lito, mas não, preferiu estrangular o bicharoco<br />
que urrou, arfou e morreu.<br />
103
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Em seguida matou a verdoenga Hidra gosmenta que<br />
vivia <strong>em</strong> um pântano mefítico, <strong>em</strong> Lerna. O monstro tinha nove<br />
cabeças: cada cabeça, na verda<strong>de</strong> como se fosse uma<br />
cornamusa. O Caudas Aulete nos dá o seguinte significado para<br />
cornamusa: Instrumento <strong>de</strong> sopro composto <strong>de</strong> um odre (bolsa<br />
<strong>de</strong> couro) <strong>de</strong> ar, um tubo superior (soprado pelo executante),<br />
dois bordões e um tubo modulante, estes três munidos <strong>de</strong><br />
palheta interna; algo como uma gaita <strong>de</strong> foles... Tal era a alma<br />
poética <strong>de</strong> Heracles <strong>em</strong> ter visões similares. Da pele da Hidra<br />
ele fez um tapete.<br />
Uma <strong>de</strong>ssas cabeças era imortal mas era impossível<br />
saber qual s<strong>em</strong> os óculos 3D que só existiriam mais tar<strong>de</strong> e<br />
ninguém sabia. Dava-se que quando uma <strong>de</strong>las era cortada,<br />
duas novas cabeças cresciam <strong>em</strong> seu lugar e isso <strong>em</strong>baralhou a<br />
mat<strong>em</strong>ática <strong>de</strong> Heracles que já não estava muito bom da<br />
cabeça n<strong>em</strong> na geografia e n<strong>em</strong> nos números. Heracles<br />
cauterizou cada pescoço mortal com uma tocha ar<strong>de</strong>nte, - claro,<br />
a não ser que foss<strong>em</strong> tochas <strong>de</strong> gelo, - para prevenir a<br />
reprodução das duas cabeças supl<strong>em</strong>entares; então ele<br />
enterrou a cabeça imortal sob uma rocha qualificada como...<br />
não uma rocha qualquer mas algo fenomenal como rocha<br />
metálica. Depois tomou um bom banho com sabonete Febo,<br />
pois, o pântano era pestilento e a Hidra não queria sair <strong>de</strong> lá.<br />
Com o sangue da Hidra Heracles molhou suas flechas para que<br />
se tornass<strong>em</strong> venenosas. Uma bela sacada.<br />
O próximo trabalho era capturar vivo o veado com<br />
chifres <strong>de</strong> ouro e cascos <strong>de</strong> bronze, o qual era sagrado a<br />
Árt<strong>em</strong>is, <strong>de</strong>usa da caça; coisa que ele fez com a mão amarrada<br />
às costas; e o quarto trabalho foi capturar o javali que vivia no<br />
monte Erimanto. E esse negócio <strong>de</strong> capturar veado vivo s<strong>em</strong>pre<br />
dá o que falar. Pelo que diz<strong>em</strong> os cronistas, com apoio <strong>de</strong><br />
104
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
Heródoto, é que Heracles se <strong>de</strong>u b<strong>em</strong>... com a mão nas costas,<br />
como dito, um pé atrás, enfim, mel no mamão.<br />
Finalmente, o po<strong>de</strong>roso Heracles teve <strong>de</strong> limpar <strong>em</strong> um<br />
único dia os 30 anos <strong>de</strong> sujeira acumulada pelo gado dos<br />
estábulos do rei Áugias. Muita merda. É claro que tudo aquilo já<br />
havia virado pedra e não era tanta coisa assim. Mas fedia muito.<br />
Colossal quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estrume <strong>em</strong> espécie e <strong>em</strong> pedra, seja lá<br />
como for, provava que Áugias era um porco. Mas teve outra boa<br />
sacada. Desviou o curso <strong>de</strong> dois rios, fazendo-os fluir através<br />
dos estábulos nauseabundos. Quer dizer: - N<strong>em</strong> mexeu na<br />
bostaria, se pensavam que assim se daria.<br />
Em seguida, Heracles, apesar <strong>de</strong> <strong>em</strong>ocionado, teve <strong>de</strong><br />
matar os pássaros bicudos carnívoros; uns bichos com garras e<br />
asas duras que viviam próximos ao lago Estínfale, num bosque,<br />
ao norte da Arcádia. Devoravam a colheita e mordiam as<br />
pessoas. Eram bonitos. Uns diziam que os pássaros tinham<br />
cabeça vermelha e pena acinzentada; gritavam até encher o<br />
saco. Heracles usou um instrumento <strong>de</strong> percussão, o címbalo,<br />
que <strong>de</strong>ve ter enchido e estimulado a tumbadora auricular das<br />
aves. O barulho do címbalo chamou a atenção das aves que se<br />
aproximaram da fonte sonora e Heracles enfiou po<strong>de</strong>rosas setas<br />
envenenadas nos bichos. Foi o que disseram. Tenho que<br />
acreditar.<br />
Para completar o sétimo trabalho, Héracles trouxe a<br />
Euristeu um touro louco que Posêidon, <strong>de</strong>us do mar, tinha<br />
enviado para aterrorizar Creta. O touro, possante e nervoso,<br />
fora enlouquecido pelo <strong>de</strong>us e passou a <strong>de</strong>vastar as terras.<br />
Ainda se fosse um cavalo marinho, mas um touro louco? B<strong>em</strong>...<br />
subjugou o touro pelos cornos e o levou para a Argólida. Após<br />
controlar o animal veio com ele a nado atravessando o<br />
Mediterrâneo, on<strong>de</strong>, diz<strong>em</strong> os pescadores (nesse ponto já não<br />
105
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
acredito muito <strong>em</strong> função da fonte) o entregou a Euristeu, o tal<br />
qu<strong>em</strong> não tomava banho. Este rei, cheio <strong>de</strong> mesuras, e,<br />
babações divinas, quis doá-lo a Hera, mas a <strong>de</strong>usa que não ia,<br />
<strong>de</strong> jeito maneira, aceitar um presente vindo <strong>de</strong> Heracles, botou a<br />
fera <strong>em</strong> liberda<strong>de</strong>.<br />
Para trazer <strong>de</strong> volta as éguas, - quatro éguas ferozes e<br />
carnívoras, - que eram <strong>de</strong> Dióme<strong>de</strong>s, o bruno, rei da Trácia,<br />
Heracles matou o rei, pois notou que as éguas estavam<br />
famintas e serviu-lhes Diome<strong>de</strong>s como refeição. Então, barriga<br />
cheia, conduziu as éguas para Micenas. Às vezes Heracles<br />
tinha muito senso <strong>de</strong> humor. Às vezes pesava na mão.<br />
Por falar nisso, Hipólita, rainha das Amazonas, <strong>de</strong>sejava<br />
ajudar Heracles <strong>em</strong> seu nono trabalho. As Amazonas viviam do<br />
saque e da caça e Hipólita não daria ponto s<strong>em</strong> nó.<br />
Suas vestes <strong>de</strong> peles <strong>de</strong> animais ferozes, castrados e<br />
mortos na peleja <strong>de</strong> lutas, presos no ombro esquerdo,<br />
chegavam até os joelhos; <strong>de</strong>scoberta ficava toda a parte direita<br />
do corpo, incluindo o peito s<strong>em</strong> seio.<br />
Segundo os relatos suas armas se compunham <strong>de</strong> arco,<br />
aljava cheia <strong>de</strong> setas e dardos, e ainda levava machados<br />
ornados <strong>de</strong> penachos. O escudo na forma <strong>de</strong> crescente lunar,<br />
com cerca <strong>de</strong> meio metro. A rainha Hipólita usava malha<br />
violácea presa por cinturão; usava capacete com plumas<br />
brilhantes. Era bonitona.<br />
As Amazonas combatiam a pé ou a cavalo.<br />
Quando Hipólita estava prestes a dar seu cinturão a<br />
Heracles, o mesmo que Euristeu queria dar para sua filha, Hera<br />
fez as tropas <strong>de</strong> Hipólita acreditar<strong>em</strong> que Heracles tentava<br />
106
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
raptar a rainha. Foi um auê! No meio da confusão <strong>de</strong> dardos,<br />
setas, lanças e bastonadas, e como não custava nada para um<br />
assassino contumaz, Heracles matou Hipólita, pensando que<br />
fora responsável pelo ataque subsequente, e escapou das<br />
Amazonas levando o cinturão.<br />
S<strong>em</strong>pre se dá b<strong>em</strong> esse herói.<br />
Capturou os bois do gigante Gerião, certo gigante com<br />
três cabeças que vivia <strong>em</strong> Cádiz, na Espanha. Começa que<br />
Gerião era neto <strong>de</strong> Medusa. E nessa família, pelo visto, o<br />
pessoal é s<strong>em</strong>pre um tanto feio e <strong>de</strong>formado. Gigante<br />
monstruoso <strong>de</strong> três cabeças, corpo tríplice, até os quadris. Tinha<br />
seis braços e seis asas. E se danou assim mesmo.<br />
Os probl<strong>em</strong>as começaram a aparecer. A primeira<br />
dificulda<strong>de</strong> era atravessar o oceano. Por isso resolveu se munir<br />
da taça gigantesca <strong>de</strong> Hélios. Mas a taça não veio na boa.<br />
Heracles ameaçou varar o astro com flechas. Hélios,<br />
aterrorizado, <strong>em</strong>prestou a taça imediatamente.<br />
Os inimigos diziam <strong>de</strong> Gerião que uma cabeça não<br />
entendia o que a outra falava. Às vezes dava tapas <strong>em</strong> si<br />
mesmo. Po<strong>de</strong> até ser ciúme <strong>de</strong> gente que t<strong>em</strong> apenas uma<br />
cabeça. Para piorar a situação qu<strong>em</strong> guardava o rebanho <strong>de</strong><br />
bois vermelhos era Eurítion e seu cão Ortro, e, também eram<br />
eles dotados <strong>de</strong> várias cabeças. Tanta cabeça para nada.<br />
Falou <strong>em</strong> cabeça falou <strong>em</strong> clava. Heracles <strong>de</strong>sceu o<br />
porrete nas cabeças e levou os bois a Euristeu e fim <strong>de</strong><br />
conversa.<br />
Para l<strong>em</strong>brar disso tudo, preocupado com a pouca<br />
midia, ergueu duas colunas: Gibraltar e Celta. Só não vê qu<strong>em</strong><br />
107
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
é cego. Ainda diz<strong>em</strong> que quando ergueu as colunas é que se<br />
<strong>de</strong>u o dilúvio universal que acabou por afundar Atlântida. Platão<br />
sabe <strong>de</strong>talhes sobre isso.<br />
Finalmente, o herói, com o gado rubicundo,<br />
encaminhou-se para a Héla<strong>de</strong>, possante e rijo a passo épico.<br />
Mais probl<strong>em</strong>as o esperavam, no entanto.<br />
Ao tocar a marg<strong>em</strong> do Mar Jônio, o rebanho foi atacado<br />
por moscardos, uns putos moscardos enviados por Hera, a<br />
ciumenta. Enlouquecidos, os animais se dispersaram pelas<br />
montanhas da Trácia dando coices no vento. Heracles reuniu<br />
uma parte, pois, o próprio rio Estrímon procurava dificultar a<br />
caçada e foi, por isso, amaldiçoado: Seu leito se formou <strong>em</strong><br />
rocha e nada mais navegou por ele. Com Heracles não se<br />
brinca, véi.<br />
Quanto mais esforço fazia para <strong>de</strong>s<strong>em</strong>penhar suas<br />
tarefas mais forte ficava.<br />
Em seguida Heracles fora enviado, - obe<strong>de</strong>ceu s<strong>em</strong><br />
pensar -, a colher as maçãs <strong>de</strong> ouro do pomar das Hespéri<strong>de</strong>s: -<br />
‘Oh! Que bom... alguma coisa leve nesses forçados trabalhos’,<br />
pensou.<br />
Para variar, Heracles, como b<strong>em</strong> sab<strong>em</strong>os, que não<br />
sabia geografia, n<strong>em</strong> mat<strong>em</strong>ática, n<strong>em</strong> agricultura, e, muito<br />
menos on<strong>de</strong> estas maçãs estavam, pediu ajuda a Atlas,<br />
reconhecido pai das Hespéri<strong>de</strong>s. As Hespéri<strong>de</strong>s, - Heracles não<br />
sabia, - eram <strong>de</strong>usas primitivas... meio burrinhas...<br />
representavam o espírito da Primavera e nada mais. Umas tais<br />
el<strong>em</strong>entais. Era um grupo <strong>de</strong> divinda<strong>de</strong>s menores. As <strong>de</strong>usas<br />
Hespéri<strong>de</strong>s personificavam a luz da tar<strong>de</strong> e o ciclo do<br />
108
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
entar<strong>de</strong>cer. Um negócio bonito <strong>de</strong> se ver... poético e místico,<br />
cont<strong>em</strong>plativo. As belas e tontinhas filhas <strong>de</strong> Nix, a que era mais<br />
do que a noite. Filhas também <strong>de</strong> Érebo que se confundia com a<br />
escuridão. Quer dizer... uma confusão <strong>de</strong> noite com trevas e <strong>de</strong>u<br />
as doidivanas das Hespéri<strong>de</strong>s... Eu mesmo vejo as Herspéri<strong>de</strong>s<br />
como se foss<strong>em</strong> vagalumes perdidos dando cabeçadas nas<br />
pedras e na luz, rindo.<br />
Qu<strong>em</strong> sabe a escuridão é que confundia Érebo? Mas,<br />
há qu<strong>em</strong> diga e afirme <strong>de</strong> pés juntos que são apenas ninfas,<br />
sete ninfas Hespéri<strong>de</strong>s, ou ninfas do poente, - ou seja, a beleza<br />
poética permanece.<br />
Tudo b<strong>em</strong>... Atlas concordou <strong>em</strong> ajudá-lo, mas Heracles<br />
teria <strong>de</strong> sustentar o mundo <strong>em</strong> seus ombros enquanto o gigante<br />
colheria as tais maçãs. O velho Atlas, esperto e cansado, não<br />
queria voltar a carregar seu fardo para a eternida<strong>de</strong>; Heracles,<br />
contudo, o enganou, e, o gigante voltou a sustentar o mundo <strong>em</strong><br />
suas costas.<br />
Como assim o enganou?<br />
Assim: Antes <strong>de</strong> levantar o mundo disse a Atlas que<br />
precisava <strong>de</strong> uns anteparos <strong>de</strong> proteção nas costas e Atlas<br />
retomou o globo. Claro que Heracles nunca mais voltou. As<br />
Hespéri<strong>de</strong>s tinham a qu<strong>em</strong> puxar mesmo na burrice.<br />
As <strong>de</strong>usas Hespéri<strong>de</strong>s, alegrinhas e felizes, passeavam<br />
pelos céus, encarregando-se <strong>de</strong> iluminar todo o mundo com a<br />
luz da tar<strong>de</strong>. Uma coisa violeta. O jardim das Hespéri<strong>de</strong>s era o<br />
mais belo jardim conhecido. Era o jardim dos imortais e isso não<br />
é pouco. Tinha o pomar das árvores mágicas. Lá nasciam<br />
pomos ou maçãs <strong>de</strong> ouro, consi<strong>de</strong>rados fontes <strong>de</strong> juventu<strong>de</strong><br />
eterna.<br />
109
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
O décimo segundo trabalho foi o mais difícil, e Heracles<br />
tinha <strong>de</strong> trazer do Ha<strong>de</strong>s o cão <strong>de</strong> três cabeças, Cérbero. Porra!<br />
Ha<strong>de</strong>s novamente... Ha<strong>de</strong>s e seu báculo. Ha<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>us dos<br />
campos inferiores, <strong>de</strong>u permissão a Heracles para levar a besta<br />
tricapital se ele não usasse armas. Ali na mão <strong>de</strong>snuda mesmo.<br />
Heracles capturou Cérbero, trouxe-o para Micenas e então<br />
levou-o <strong>de</strong> volta. Explico: é que Euristeu, o sujo, mandou que<br />
<strong>de</strong>volvesse o bicho pois ficou com medo; na verda<strong>de</strong> não podia<br />
mais dormir com o uivo noturno daquelas três cabeças, mesmo<br />
que escondido <strong>em</strong> sua cuba <strong>de</strong> bronze. Que voltass<strong>em</strong> para o<br />
Ha<strong>de</strong>s.<br />
E nesse ponto finalizam os 12 trabalhos.<br />
Qu<strong>em</strong> quiser que minta mais.<br />
110
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
A A MORTE MORTE DO DO HEROI<br />
HEROI<br />
Mas tudo t<strong>em</strong> um fim, exceto as investidas vaginianas<br />
<strong>de</strong> Zeus.<br />
Heracles se casou com Dejanira, cuja mão ele ganhou<br />
<strong>de</strong> Anteu, filho <strong>de</strong> Posêidon, <strong>de</strong>us do mar. Quando o centauro<br />
Nessus atacou Dejanira, e tudo se resume a ataque e <strong>de</strong>fesa,<br />
Heracles feriu-o com uma flecha envenenada, mergulhada que<br />
fora antes no sangue da Hidra. Se o leitor prestou atenção e não<br />
pulou conto algum sabe do que falo. O centauro moribundo,<br />
numa tomada <strong>de</strong> cena roliudiana, disse a Dejanira para guardar<br />
seu sangue, garantindo-lhe que ele era um po<strong>de</strong>roso e<br />
irresistível tônico que trazia a paixão àqueles que bebess<strong>em</strong><br />
<strong>de</strong>le. Dejanira acreditou, mas, na verda<strong>de</strong> o sangue era veneno<br />
do brabo.<br />
Acreditando, mais tar<strong>de</strong>, que Heracles tinha se<br />
apaixonado pela princesa Iole, Dejanira enviou-lhe um pouco do<br />
111
MITOLOGIA PELO MÉTODO CONFUSO<br />
COELHO DE MORAES<br />
sangue do centauro. Para mim aquilo estava coagulado e seria<br />
impossível <strong>de</strong> beber... Mas, vá lá. Quando ele bebeu do tônico a<br />
dor causada pelo veneno foi tão gran<strong>de</strong> que ele se matou numa<br />
pira fúnebre. Quer dizer, Heracles dá fim a si mesmo. Depois da<br />
morte, Heracles foi trazido pelos <strong>de</strong>uses ao Olimpo e se casou<br />
com Hebe, <strong>de</strong>usa da juventu<strong>de</strong>. Heracles foi adorado pelos<br />
gregos como ambos: como <strong>de</strong>us e como herói mortal. Ele<br />
normalmente é figurado como um hom<strong>em</strong> forte e musculoso,<br />
protegido pela ridícula pele <strong>de</strong> leão, carregando uma clava.<br />
A estátua mais famosa do herói está no Museu Nacional<br />
<strong>de</strong> Nápoles.<br />
Editora AlterNativaMente<br />
112