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O Guarani - CE NESTOR VICTOR DOS SANTOS

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Decorreu cerca de meia hora: a casa tinha aberto todas as suas janelas para receber o<br />

ar paro da manhã, e as emanações saudáveis dos campos; um ligeiro penacho de fumo<br />

alvadio coroava o tubo da chaminé, anunciando que os trabalhos caseiros haviam<br />

começado.<br />

De repente ouviu-se um grito no interior da habitação; todas as portas e janelas do<br />

edifício fecharam-se com um estrépito e uma rapidez, como se um inimigo caísse de<br />

assalto.<br />

Pela fresta de uma janela entreaberta apareceu o rosto de D. Lauriana, pálida, e com<br />

os cabelos sem estarem riçados, o que era uma coisa extraordinária.<br />

— Aires Gomes!... O escudeiro!... Chamem Aires Gomes! Que venha já! gritou a<br />

dama.<br />

A janela fechou-se de novo com o ferrolho.<br />

A personagem que já conhecemos pouco tardou, e atravessando a esplanada<br />

dirigiu-se à casa, sem compreender a razão por que àquela hora com o sol alto ainda toda<br />

a habitação parecia dormir.<br />

— Fizestes-me chamar! disse ele chegando-se à janela.<br />

— Sim; estais armado? perguntou D. Lauriana por detrás da porta.<br />

— Tenho a minha espada; mas que novidade há?<br />

A fisionomia decomposta de D. Lauriana apareceu de novo na fresta da janela.<br />

— A onça!... Aires Gomes! A onça!...<br />

O escudeiro deu um salto prodigioso julgando que o animal de que se falava ia<br />

saltar-lhe ao cangote, e sacou da espada pondo-se em guarda.<br />

A dama vendo o movimento do escudeiro supôs que a onça atirava-se à janela, e<br />

caiu de joelhos murmurando uma oração ao santo advogado contra as feras.<br />

Alguns minutos se passaram assim; D. Lauriana rezando; e Aires Gomes rodando no<br />

pátio como um corrupio, com receio de que a onça não o atacasse pelas costas, o que<br />

além de ser uma vergonha para um homem de armas da sua têmpera, seria um pouco<br />

desagradável para sua saúde.<br />

Por fim, de pulo em pulo o escudeiro conseguiu ganhar de novo a parede do edifício<br />

e encostar-se nela, o que o tranqüilizou completamente; pela frente não havia inimigo que<br />

o fizesse pestanejar.<br />

Então batendo com a folha da espada na ombreira da janela disse em voz alta:<br />

— Explicar-me-eis que onça é essa de que falais, Sra. D. Lauriana; ou estou cego,<br />

ou não vejo aqui sombra de semelhante animal.<br />

— Estais bem certo disso, Aires Gomes? disse a dama reerguendo-se.<br />

— Se estou certo! Assegurai-vos com os vossos próprios olhos.<br />

— E verdade! Mas em alguma parte há de estar!<br />

— E por que quereis vós à fina força que aqui esteja uma onça, Sra. D. Lauriana?<br />

disse o escudeiro um tanto impacientado.<br />

— Pois não sabeis! exclamou a dama.<br />

— O quê, senhora?<br />

— Aquele bugre endemoninhado não se lembrou de trazer ontem uma onça viva<br />

para a casa!<br />

— Quem, o perro do cacique?<br />

— E quem mais senão aquele cão tinhoso!<br />

— É das que ele costuma fazer!

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