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O poder local (2005).preview.pdf - Universidade de Coimbra

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consequência inelutável <strong>de</strong> avanços tecnológicos que a ciência introduziu nos Esta­<br />

dos nacionais sem cuidar - nem ela nem ninguém - <strong>de</strong> os fazer acompanhar pelas<br />

necessárias adaptações sociais. Mesmo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> termos conquistado o espaço e<br />

pisado a lua; mesmo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> estarmos à beira da total <strong>de</strong>cifração do nosso código<br />

genético; com os cientistas já habilitados, não apenas a copiar um ser humano, mas<br />

a criá-lo laboratorialmente sem intervenção do sémen masculino e do óvulo feminino<br />

(o Homem na metafísica função <strong>de</strong> Deus) continuamos a organizar-nos e a gerir as<br />

nossas vidas como no século XVIII : os mesmos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong>mocráticos, os mesmos<br />

mo<strong>de</strong>los executivos, os mesmos mo<strong>de</strong>los legislativos, os mesmos sistemas judiciais,<br />

basicamente os mesmos comportamentos, os mesmos valores ou a mesma ausência<br />

<strong>de</strong>les.<br />

A perversão das consequências da globalização vem daí. Vem do facto irrecusável<br />

<strong>de</strong> que, tudo o que se globalizou, passou a funcionar sem controlo, em roda livre. Os<br />

controlos nacionais ce<strong>de</strong>ram o passo às liberda<strong>de</strong>s que a tudo agora presi<strong>de</strong>m - a<br />

livre troca, o livre investimento, as livres migrações, a livre competição, em suma -<br />

sem que a nível global tenham surgido novas formas <strong>de</strong> regulação. Enquanto isso,<br />

tudo o que está por globalizar permanece ou pouco menos, «antiquíssimo e idênti­<br />

co », como diria o Fernando Pessoa.<br />

Resultado: quando a competição é <strong>de</strong>sregulada e livre, o forte é livre <strong>de</strong> esmagar<br />

o fraco, o gran<strong>de</strong> país <strong>de</strong> esmagar o pequeno, a gran<strong>de</strong> empresa <strong>de</strong> esmagar a<br />

pequena, o <strong>po<strong>de</strong>r</strong>oso cidadão <strong>de</strong> esmagar o cidadão coitado.<br />

Daí a concentração da riqueza em cada vez menos mãos e a expansão da pobre­<br />

za (portadora da fome, do analfabetismo, do <strong>de</strong>semprego e da doença) por cada<br />

vez mais pobres. Serei só eu a recear o potencial explosivo <strong>de</strong>sta tendência e <strong>de</strong>sta<br />

mistura?<br />

A situação é tão potencialmente grave que o que faz falta não são apenas novas<br />

formas universais <strong>de</strong> regulação e <strong>de</strong> controlo, ou novas regras do jogo, digamos<br />

assim. Falta, inclusive, o <strong>de</strong>senho dos novos órgãos globais <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão que hão-<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>finir e aplicar essas regras.<br />

Isto porquê? Porque as comunida<strong>de</strong>s nacionais, e o que resta dos Estados em que 289<br />

se organizaram, recusam, quantas vezes fanaticamente, a superação da organização<br />

herdada. Sabem que, cada <strong>po<strong>de</strong>r</strong> que se elimina, se globaliza ou transitoriamente se<br />

transfere (caso dos países da União Europeia), é <strong>de</strong>scarregado na tradicional<br />

«potestas» do Estado Soberano. Mas persistem em querer mantê-lo tão soberano<br />

como dantes.<br />

Isto é não apenas contraditório e irracional, mas pouco lúcido. Acaso <strong>de</strong>sconhe­<br />

cemos que as Renascenças se fizeram com resistências, tumultos e sofrimento?<br />

É quase compreensível que, quem ainda <strong>de</strong>tém <strong>po<strong>de</strong>r</strong>es soberanos, resista a abdi­<br />

car dos <strong>po<strong>de</strong>r</strong>es que lhe restam. Mas os cidadãos que não <strong>de</strong>têm <strong>po<strong>de</strong>r</strong>es nenhuns<br />

Obra protegida por direitos <strong>de</strong> autor

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