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Revista - Individuais - Juventude Adventista Portuguesa

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O REAVIVAMENTO<br />

QUE CONTA:<br />

Um chamado à<br />

justiça e à<br />

misericórdia<br />

2013


ÍN<br />

DI<br />

CE<br />

Introdução<br />

Sábado / 9 MAR<br />

Um Verdadeiro Reavivamento<br />

Domingo / 10 MAR<br />

O Deus que Vê, Ouve e Sente<br />

Segunda / 11 MAR<br />

O Deus que se Curva<br />

Terça / 12 MAR<br />

“Porque Deus Amou o Mundo...“<br />

Quarta / 13 MAR<br />

A Grande Comissão<br />

Quinta / 14 MAR<br />

Agentes de Justiça e Beleza<br />

Sexta / 15 MAR<br />

Fuga ou Motivação?<br />

Sábado / 16 MAR<br />

A “História“ dos 3 Anjos<br />

Música<br />

FICHA TÉCNICA | Tradução e Revisão: Departamento de Jovens | Capa e design editorial: Augusto Pereira<br />

União <strong>Portuguesa</strong> dos <strong>Adventista</strong>s do Sétimo dia | Departamento de Jovens<br />

4<br />

5<br />

12<br />

18<br />

25<br />

33<br />

40<br />

47<br />

54<br />

61


A<br />

vida às vezes é mesmo complicada, não é? Não te estou a dar uma grande<br />

novidade e nem precisas de ter uma grande experiência de vida para perceber<br />

que as coisas são mesmo assim. São escolhas a fazer, decisões a tomar,<br />

incertezas quanto ao futuro, ou podem ser “apenas” relacionamentos difíceis …<br />

com os pais, com os professores, com o patrão, com a(o) namorada(o), com o<br />

marido ou a esposa, enfim, as muitas pequenas/grandes coisas com que todos<br />

os dias nos confrontamos. E depois ainda falta um elemento tão importante - a<br />

nossa vida cristã, o nosso relacionamento com Jesus, o nosso compromisso com<br />

a Igreja - e a pergunta que me faço, e já agora a ti também, é se a vida espiritual<br />

é mais uma elemento a complicar ou se é na verdade o facilitador que “descomplica”<br />

todo o resto, capaz de comunicar a paz e o conforto a que Jesus se referia.<br />

Não sei qual é a tua experiência, mas sei que Deus é O mestre da simplicidade,<br />

e que nós teimamos em complicar as coisas que Ele quis simples, belas e profundas.<br />

Pensa comigo: Ele deu-nos a beleza e a simplicidade da fruta e das sementes<br />

para nos servirem de alimento e nós transformámos isso em tartes, assados<br />

e bifes - de tofu, seitan e outros nomes mais complicados. Ele deu-nos a<br />

pureza e a simplicidade de um manto de glória como veste e nós, porque tínhamos<br />

de nos cobrir, complicámos as coisas até inventarmos écharpes, boleros,<br />

fatos de 2,3 e 4 botões e para cerimónias especiais, fatos de grilo. Mas pensemos<br />

agora na nossa experiência com a fé, com a Bíblia e a nossa comunhão com Deus,<br />

será que perdemos aqui também a capacidade de sermos simples e práticos?<br />

O ensino de Jesus e dos apóstolos aponta-nos no sentido de um cristianismo<br />

real, prático, simples e relevante. Lembras-te como Jesus definiu a Sua missão?<br />

“Ide, e contai a João o que tens visto e ouvido: os cegos vêem, os coxos andam,<br />

os leprosos são purificados, e os surdos ouvem; os mortos são ressuscitados, e<br />

aos pobres é anunciado o evangelho.” (João 7.22). Jesus via desta forma, simples<br />

e prática, o seu ministério e a sua vida espiritual, que se media pelo impacto que<br />

Ele tinha na vida dos outros, especialmente os mais desfavorecidos. E como não<br />

pensar na quase surpreendente definição do apóstolo Tiago: “A religião pura e<br />

imaculada diante de nosso Deus e Pai é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas<br />

suas aflições e guardar-se isento da corrupção do mundo.” (Tiago 1.27).<br />

As mensagens desta semana falam de reavivamento, e se calhar estás pensar<br />

- “outra vez este tema?” - mas eu acredito que vais ser surpreendido por uma<br />

visão de reavivamento que vai muito para além de conceitos e sentimentos,<br />

ou mesmo de clichés espirituais. O autor desafia-nos a um cristianismo mais<br />

prático, mais ligado às pessoas e ao mundo que Deus ama e quer Salvar, um reavivamento<br />

de serviço e compaixão, um reavivamento que não se expressa tanto<br />

em palavras mas mais em gestos e em ações.<br />

Este é o reavivamento, simples e prático, que os profetas pregaram, que os<br />

apóstolos ensinaram e de que Jesus deu exemplo. A questão agora é se este é<br />

o reavivamento que tu e eu queremos viver, mas sinceramente acredito numa<br />

resposta simples e prática: sim, é!<br />

Departamental de Jovens<br />

Pr. Pedro Esteves


O REAVIVAMENTO<br />

QUE CONTA:<br />

“Agora, pois, ó Israel, que é que o Senhor teu Deus requer de ti,<br />

senão que temas o Senhor teu Deus, que andes em todos os<br />

seus caminhos, e o ames, e sirvas ao Senhor teu Deus de todo<br />

o teu coração e de toda a tua alma, que guardes os mandamentos<br />

do Senhor, e os seus estatutos, que eu hoje te ordeno<br />

para o teu bem?<br />

Eis que do Senhor teu Deus são o céu e o céu dos céus, a terra<br />

e tudo o que nela há. Entretanto o Senhor se afeiçoou a teus<br />

pais para os amar; e escolheu a sua descendência depois<br />

deles, isto é, a vós, dentre todos os povos, como hoje se vê.<br />

Circuncidai, pois, o prepúcio do vosso coração, e não mais<br />

endureçais a vossa cerviz.<br />

Pois o Senhor vosso Deus, é o Deus dos deuses, e o Senhor<br />

dos senhores, o Deus grande, poderoso e terrível, que não faz<br />

acepção de pessoas, nem recebe peitas; que faz justiça ao<br />

órfão e à viúva, e ama o estrangeiro, dando-lhe pão e roupa.<br />

Pelo que amareis o estrangeiro, pois fostes estrangeiros na<br />

terra do Egito. Ao Senhor teu Deus temerás; a ele servirás, e a<br />

ele te apegarás, e pelo seu nome; jurarás. Ele é o teu louvor e<br />

o teu Deus, que te fez estas grandes e terríveis coisas que os<br />

teus olhos têm visto.”<br />

Deuteronómio 10:12-21


SÁBADO<br />

9 Mar<br />

T<br />

alvez tenham sido os líderes a<br />

dar início ao chamado por reavivamento.<br />

Ou talvez tenha sido<br />

o próprio povo a sentir a necessidade<br />

de reforma entre a sua comunidade.<br />

Eles tinham sido chamados no passado<br />

a serem o povo de Deus e com<br />

razão sentiam agora que era tempo de<br />

recentrarem as suas vidas nEle, e que<br />

Deus deveria abençoá-los mais por<br />

isso. Eles começaram a juntar-se diariamente<br />

para adorar e orar a fim de que<br />

a presença e o poder de Deus os acompanhasse.<br />

Eles estudavam as Escrituras<br />

e encorajavam-se uns aos outros<br />

nas suas práticas espirituais. O povo<br />

até jejuava por longos períodos de<br />

tempo, abstendo-se de comer como<br />

forma de expressar a sua devoção e o<br />

seu desejo de maior santidade.<br />

O problema é que de alguma maneira<br />

parecia que Deus não reparava nem<br />

respondia. Apesar do aparente fervor,<br />

das orações sentidas e dos muitos<br />

cultos de adoração, o povo não se sentia<br />

mais perto de Deus. No início, eles<br />

redobraram os esforços. Deus deve<br />

querer mais dedicação, pensavam,<br />

uma fidelidade mais profunda do tipo,<br />

24 horas por dia 7 dias por semana.<br />

UM VERDADEIRO<br />

REAVIVAMENTO<br />

Amós 8:4-6 | Isaías 58:6-12 | Mateus 23:13-23<br />

5<br />

Mais oração. Mais estudo. Mais<br />

adoração.Dar mais e abandonar mais.<br />

Mas alguns entre o povo começaram a<br />

ficar cansados destes esforços espirituais.<br />

Enquanto uns continuavam a jejuar<br />

regularmente, outros começaram<br />

a desistir e a voltar às antigas rotinas.<br />

Se Deus não era capaz de reconhecer e<br />

responder de formas mais poderosas<br />

às suas orações e ofertas, talvez Ele<br />

não estivesse assim tão interessado<br />

neles – talvez eles já não fossem o Seu<br />

povo de qualquer forma. Quem eram<br />

eles para pensar que valiam alguma<br />

coisa de especial?


Foi então que o profeta chegou.<br />

Isaías era conhecido em toda a nação<br />

pelas suas mensagens contundentes<br />

e por anunciar que falava em nome<br />

de Deus. Ele chamou certamente a<br />

atenção do povo quando chegou ao<br />

templo e as suas palavras ecoaram<br />

em redor da cidade como o soar da<br />

trombeta. Ele tinha uma mensagem<br />

de Deus! «Por que razão jejuámos»<br />

perguntava o povo a Deus agora que<br />

tinha finalmente a oportunidade de<br />

fazer ouvir a sua frustração pela sua<br />

recente fidelidade «e Tu não viste?<br />

Por que razão nos humilhámos e Tu<br />

nem deste conta?» Isaías anuncioulhes<br />

que ao contrário do que pensavam<br />

Deus tinha reparado nos esforços<br />

do povo para chamar a Sua atenção,<br />

mas Ele não estava impressionado.<br />

O duro trabalho espiritual tinha sido<br />

visto mas não apreciado. Os seus esforços<br />

religiosos estavam de alguma<br />

forma a passar ao lado do que Deus<br />

ansiava ver no Seu povo.<br />

O Problema com a Religião<br />

Como acontece frequentemente connosco,<br />

a relação e a fidelidade do povo<br />

de Deus teve os seus altos e baixos<br />

através dos anos que percorrem as<br />

histórias do Velho Testamento. Durante<br />

os tempos áureos dos reinos de<br />

Israel e Judá, o povo vinha de tempos<br />

a tempos ao templo para O adorar.<br />

Mas, segundo os profetas, às vezes<br />

até as tentativas mais fervorosas não<br />

eram suficientes para desviar da in-<br />

6<br />

justiça e do egocentrismo das suas<br />

vidas diárias, e das falhas em apoiar,<br />

ajudar e servir os outros. E por mais<br />

que se esforçassem para se tornarem<br />

religiosos através dos seus rituais de<br />

adoração, eles não conseguiam abafar<br />

os gritos dos pobres e oprimidos<br />

com a música dos seus hinos.<br />

O profeta Amós descreve o povo dos<br />

seus dias como aqueles que: “pisais<br />

o necessitado, e destruís os pobres<br />

da terra” (Amós 8:4). Ele imaginava<br />

a ansiedade do povo para terminar a<br />

adoração nos Sábados e nas Festas<br />

da Lua Nova, para poderem depois<br />

reabrir o mercado e voltar aos seus<br />

negócios desonestos, “comprando os<br />

pobres por dinheiro, e os necessitados<br />

por um par de sandálias” (Amós<br />

8:6). «Por quê darem-se ao trabalho<br />

deste tipo de religião?» dizia Amós a<br />

estes comerciantes, «se ela só está a<br />

atrapalhar o verdadeiro objetivo das<br />

vossas vidas: lucro e exploração?»<br />

Podemos não ter um negócio, podemos<br />

não negar os salários aos nossos<br />

empregados ou não estarmos ativamente<br />

empenhados em oprimir os<br />

outros. Mas será que aproveitamos<br />

as oportunidades que nos são dadas<br />

para cuidarmos, ajudarmos e encorajarmos<br />

aqueles que estão feridos,<br />

desfavorecidos, sozinhos, doentes ou<br />

esquecidos? Através dos Seus profetas,<br />

Deus usou uma linguagem forte<br />

para expressar o Seu desapontamento<br />

para com as formas de religião e


e adoração que estavam desligadas<br />

das injustiças no mundo que os rodeava,<br />

das pessoas que estavam magoadas<br />

e das maldades a que eram sujeitas.<br />

Lemos afirmações de Deus dizendo<br />

que Ele: “odiava”, “desprezava” e que a<br />

adoração que lhe prestavam era como<br />

uma abominação. As suas reuniões<br />

são descritas como “cheiro pestilento”,<br />

e as suas ofertas e músicas consideradas<br />

como desprezíveis e destituídas<br />

de qualquer valor.<br />

No capítulo 6 do profeta Miquéias<br />

encontramos uma série de hipóteses<br />

muito inflamadas sobre como adorar<br />

a Deus de forma adequada. O profeta<br />

sugere a possibilidade de ofertas<br />

queimadas, depois aumenta a parada<br />

para “milhares de carneiros, ou de<br />

miríades de ribeiros de azeite” (Miquéias<br />

6.7), antes de ir para o horrendo,<br />

mas não desconhecido extremo,<br />

de sacrificar um primogénito para<br />

conquistar o favor e o perdão de Deus.<br />

Mas a resposta é muito mais simples,<br />

mais profunda e mais digna: “E o que<br />

é que o Senhor pede de ti, senão que<br />

pratiques a justiça, ames a misericórdia,<br />

e andes humildemente com o teu<br />

Deus?” (Miquéias 6:8).<br />

De volta a Isaías 58<br />

Falando através de Isaías, foi assim<br />

que Deus respondeu ao Seu povo que<br />

estava à procura de reavivamento: a<br />

adoração que Eu quero de vós é que<br />

sirvam aqueles que necessitam da<br />

7<br />

UM<br />

VER-<br />

DA-<br />

DEIRO<br />

REA-<br />

VIVA-<br />

MEN-<br />

TO<br />

vossa ajuda. Ajudem as pessoas a libertar-se<br />

das coisas que as aprisionam,<br />

ajudem-nas a serem verdadeiramente<br />

livres. Alimentem os famintos. Deem<br />

abrigo aos que não o têm. Partilhem<br />

as vossas roupas com os que têm<br />

falta delas (ver Isaías 58:6, 7). Mesmo<br />

que tenham pouco, isso pode ser mais<br />

do que muitos têm, e Deus chamavos<br />

a serem generosos, quaisquer que<br />

sejam os vossos recursos, com os que<br />

em vosso redor podem ser ajudados.


Esta postura de serviço não é meramente<br />

uma coisa “bonita” para se<br />

fazer, e estes versículos descrevemna<br />

como uma forma de adorar a Deus.<br />

Não é a única maneira de O adorar<br />

mas, falando através de Isaías ao<br />

Seu povo em busca de reavivamento,<br />

Deus exortou-os a adotarem esta<br />

abordagem aparentemente diferente<br />

de adoração. Aos olhos de Deus, esta<br />

pode ser preferível a muitas das formas<br />

mais tradicionais de adoração,<br />

especialmente se essa adoração é<br />

feita enquanto as necessidades dos<br />

outros são ignoradas.<br />

A adoração não se centra no interior<br />

da pessoa mas em ser uma bênção<br />

para todos os estão perto dos que<br />

adoram. É notável que o espírito de<br />

Jesus e a fidelidade para com Deus<br />

possam centrar-se desta maneira nos<br />

outros, ao ponto de mesmo o nosso<br />

reavivamento espiritual não ser tanto<br />

a respeito de nós mesmos, como<br />

de revelar interesse pelos pobres e<br />

oprimidos, pelos feridos e famintos.<br />

“O “O verdadeiro objetivo objetivo da religião da é relibertarligião<br />

o Homem é libertar do o seu Homem pecado, do elimi- seu<br />

nar pecado, a intolerância eliminar e a opressão, intolerância e pro- e<br />

mover a opressão, a justiça, e promover a liberdade a e justiça, a paz”<br />

(Comentário Bíblico <strong>Adventista</strong> do Sétimo Dia, Vol.<br />

a liberdade e a paz”<br />

4, pg. 306).<br />

(Comentário Bíblico,, Vol. 4, pg. 306).<br />

Em Isaías 58:8-12, Deus promete<br />

bênçãos em resposta a esta forma<br />

de adoração. De facto, Deus está a<br />

dizer que se o povo estivesse menos<br />

8<br />

centrado em si próprio, seria capaz<br />

de O encontrar a trabalhar com eles<br />

e através deles a fim de promover<br />

cura e restauração. Este era o reavivamento<br />

que o povo procurava, um<br />

rejuvenescimento das esperanças e<br />

objetivos que só em Deus pode ser<br />

encontrado e que lhes daria uma clara<br />

perceção da Sua presença nas suas<br />

vidas: “Então romperá a tua luz como<br />

a alva, e a tua cura apressadamente<br />

brotará, e a tua justiça irá adiante da<br />

tua face, e a glória do Senhor será à<br />

tua retaguarda. Então clamarás, e o<br />

Senhor te responderá; gritarás, e ele<br />

dirá: Eis-me aqui” (Isaías 58:8, 9).<br />

A Partilha do Sábado<br />

É interessante notar que Isaías 58<br />

também relaciona esta adoração voltada<br />

para o serviço, com um reavivamento<br />

do “deleite” em guardar o dia<br />

de Sábado, facto que deve captar a<br />

nossa atenção enquanto cristãos que<br />

adoram no Sétimo Dia. Comparado<br />

com os esforços de “religiosidade”<br />

descritos anteriormente na resposta<br />

de Deus através de Isaías, o Sábado<br />

é verdadeiramente uma dádiva. E ela<br />

chega cada semana quando somos<br />

convidados a relembrá-Lo e a honrá-<br />

Lo. O Sábado é um símbolo da graça<br />

de Deus através da qual a nossa salvação<br />

não é ganha mas recebida.<br />

Aqui está um importante símbolo da<br />

nossa humilde caminhada com Deus<br />

(rever Miquéias 6:8).


Mas apesar de ser um elemento válido<br />

no nosso relacionamento com<br />

Deus, há alguma coisa acerca do<br />

Sábado que deve transformar o nosso<br />

relacionamento com os outros. Na<br />

experiência do Sábado, esta mesma<br />

graça e bondade deve para ser partilhada<br />

com outros. Refletindo sobre<br />

estes versículos, Ellen White comenta:<br />

“Sobre os que guardam o sábado<br />

do Senhor é imposta a responsabilidade<br />

de realizar uma obra de misericórdia<br />

e beneficência” (Beneficência<br />

Social, pg. 121).<br />

Uma das coisas óbvias de uma leitura<br />

rápida dos Dez Mandamentos (ver<br />

Êxodo 20) é que o quarto mandamento<br />

é de longe o mais detalhado.<br />

Enquanto alguns dos mandamentos<br />

estão registados em apenas algumas<br />

palavras, o quarto mandamento<br />

dá-nos espaço para os como, quem<br />

e porquês do “lembra-te do dia de<br />

Sábado”. E entre estes “detalhes” a<br />

respeito do não é de pouca relevância<br />

o foco no cuidado com o outro No livro<br />

The Lost Meaning of the Seventh<br />

Day (O Significado Perdido do Sétimo<br />

Dia), Sigye Tonstad descreve de que<br />

forma este mandamento é único em<br />

todas as culturas do mundo.<br />

O mandamento do Sábado, explica<br />

ele: “estabelece as prioridades a partir<br />

de baixo e não a partir de cima,<br />

mostrando em primeiro lugar consideração<br />

pelos mais fracos e mais vulneráveis<br />

da sociedade. Aqueles que<br />

mais precisam de descanso – o escra-<br />

9<br />

vo, o estrangeiro e o animal de carga<br />

–são mencionados com especial atenção.<br />

No descanso do Sétimo Dia os<br />

mais desfavorecidos, até os animais<br />

sem voz, encontram um aliado” (The<br />

Lost Meaning of the Seventh Day, pg.<br />

126,127)<br />

O quarto mandamento salienta que o<br />

Sábado é um dia para ser desfrutado<br />

por toda a gente. Do ponto de vista do<br />

Sábado, somos todos iguais. Se fores<br />

um empregador durante a semana,<br />

não tens nenhuma autoridade para<br />

obrigar os teus empregados a trabalhar<br />

no Sábado – Deus deu-lhes um dia<br />

de descanso. Se fores um estudante,<br />

um empregado, ou até mesmo um escravo<br />

para o resto da tua vida, o Sábado<br />

lembra-te que foste da mesma<br />

maneira criado e redimido por Deus, e<br />

Ele convida-te a celebrares esse facto<br />

de maneiras diferentes das tuas rotinas<br />

ou obrigações diárias. Mesmo<br />

aqueles que não observam o Sábado<br />

– “nenhum estrangeiro que está dentro<br />

das tuas portas” – (Êxodo 20:10),<br />

podem beneficiar das suas bênçãos,<br />

se isso estiver ao nosso alcance.<br />

Não admira que Isaías tenha descrito<br />

o Sábado como um deleite se<br />

colocarmos este dia à parte para nos<br />

centrarmos em coisas que são mais<br />

importantes do que todas as outras<br />

coisas que nos mantêm ocupados<br />

durante a semana (ver Isaías 58:13).<br />

Estes versículos surgem novamente<br />

associados à promessa de reaviva-


mento, deleite, e contínuo crescimento<br />

no relacionamento com o nosso<br />

Deus (ver o versículo 14).<br />

Jesus e as Pessoas Religiosas<br />

Não deve naturalmente surpreendernos<br />

que Jesus conhecesse muito bem<br />

a mensagem de Isaías 58. Ele viveu<br />

uma vida de amor e serviço. A sua interação<br />

com os outros, as Suas curas<br />

milagrosas e muitas das Suas parábolas,<br />

demonstram e salientam que<br />

este estilo de vida era a melhor forma<br />

de prestar culto a Deus. Mas os líderes<br />

religiosos eram ao mesmo tempo os<br />

Seus grandes críticos e o alvo da Sua<br />

acérrima reprovação. Tal como os religiosos<br />

dos dias de Isaías, estes homens<br />

trabalhavam arduamente para<br />

serem devotos religiosos e acreditavam<br />

que um relacionamento especial<br />

com Deus lhe era assegurado através<br />

das suas práticas religiosas. Mas ao<br />

mesmo tempo exploravam os pobres<br />

e ignoravam os mais necessitados<br />

(ver Marcos 12:38-40).<br />

10<br />

Naquele que pode ser considerado<br />

como o sermão mais arrojado de Jesus<br />

– particularmente para os líderes<br />

religiosos – em Mateus 23, Jesus descreve<br />

a religião que praticavam não<br />

apenas como não tendo em conta os<br />

mais desfavorecidos, mas como sendo<br />

mesmo tal religião como uma sobrecarga<br />

às suas dificuldades. Pelas<br />

suas ações, ou outras vezes pela falta<br />

delas, Jesus disse: “fechais o reino dos<br />

céus aos homens” (Mateus 23:13).<br />

Dando eco à voz dos profetas de<br />

séculos anteriores, Jesus referiu-se<br />

diretamente ao fosso entre as suas<br />

mais sérias práticas religiosas e as<br />

injustiças que toleravam e das quais<br />

se aproveitavam. “Ai de vós, escribas<br />

e fariseus, hipócritas! Dais o dízimo<br />

da hortelã, do endro e do cominho,<br />

mas negligenciais o mais importante<br />

da lei, a justiça, a misericórdia e a fé”<br />

(Mateus 23:23). Jesus foi pronto em


acrescentar que as práticas religiosas<br />

e a sua observância não estão erradas<br />

em si mesmas, mas elas não podem<br />

tomar o lugar de “praticar a justiça,<br />

amar a misericórdia, e andar humilde<br />

e fielmente com Deus” repercutindo<br />

o apelo de Miquéias para uma verdadeira<br />

adoração e um sincero reavivamento.<br />

O Chamado e a Promessa de Isaías<br />

Não sabemos como estes primeiros<br />

ouvintes responderam ao chamado de<br />

Isaías a um verdadeiro reavivamento.<br />

Como se prova pelo facto de que Jesus<br />

confrontou as mesmas questões<br />

religiosas, talvez haja sempre aqueles<br />

que se contentam com a mera formalidade<br />

da religião, enquanto outros<br />

ouvem o chamado para adorarem<br />

numa perspetiva que promove genuína<br />

mudança em si mesmo e nos que<br />

estão à sua volta. Talvez seja por isso<br />

que a voz de Isaías, qual trombeta,<br />

ainda ecoa nos dias de hoje.<br />

Ellen White insiste que os princípios<br />

e a ação descritos em Isaías 58 eram<br />

importantes para a igreja que ela<br />

amava. Lê este capítulo cuidadosamente<br />

e tenta compreender a espécie<br />

de ministério que traz vida às igrejas.<br />

“Lede cuidadosamente este capítulo<br />

e compreendei a espécie de ministério<br />

que levará vida às igrejas. A obra<br />

do evangelho deve ser promovida<br />

por meio de nossa liberalidade bem<br />

assim de nossos esforços. Quando<br />

11<br />

imentai-os. Assim fazendo estareis<br />

trabalhando nas linhas do ministério<br />

de Cristo. O santo trabalho do Mestre<br />

era um trabalho de benevolência.<br />

Que nosso povo em todos os lugares<br />

seja encorajado a tomar parte nele”<br />

(Beneficência Social, pg. 29).<br />

Se queremos seguir Jesus com seriedade,<br />

o nosso foco estará igualmente<br />

nos outros. Se queremos guardar<br />

o Sábado com seriedade, vamos<br />

permitir que a Sua graça beneficie<br />

qualquer pessoa através de nós. Se<br />

estamos realmente interessados em<br />

viver o reavivamento, então vamos<br />

dispor-nos ao serviço com seriedade.<br />

PERGUNTAS<br />

PARA DEBATE<br />

a) Como explicarias o que correu<br />

mal no relacionamento entre Deus<br />

e o Seu povo tal como descrito na<br />

primeira parte de Isaías 58?<br />

b) Já alguma vez pensaste que<br />

praticar a justiça e amar a misericórdia<br />

são atos de adoração?<br />

Como pode isto influenciar a<br />

forma como te preocupas com<br />

os outros? Como isto mudar a<br />

tua abordagem ao louvor e à<br />

adoração?<br />

c) O que significa ser um “mordomo”<br />

da criação? Como é que o<br />

nosso cuidado pela criação afeta<br />

outras pessoas?


DOMINGO<br />

10 Mar<br />

I m a g i n a<br />

vais visitar<br />

alguém da tua<br />

família que se encontra<br />

hospitalizado. Ele está doente<br />

há algumas semanas e ninguém<br />

sabe qual será o desfecho da situação.<br />

Estiveste fora e esta é a primeira<br />

oportunidade que tens de visitar o<br />

teu familiar doente. Conversas com a<br />

esposa que se encontra sentada ao<br />

lado da cama do marido. Durantes as<br />

últimas semanas ela passou muitos<br />

dias e noites no hospital e tu insistes<br />

em que ela vá para casa e descanse,<br />

assegurando-lhe que ficarás ali durante<br />

a noite. Ela diz-te que não é preciso,<br />

que está bem, mas percebes que<br />

fica agradecida pela oportunidade de<br />

poder descansar, mesmo se fica relutante<br />

em ir. Ela reúne as suas coisas<br />

e prepara-se para sair, dá um beijo<br />

ao marido, dá-te um abraço e deixa<br />

o quarto, sendo substituída quase<br />

de imediato por uma enfermeira que<br />

vem verificar o estado do paciente.<br />

O DEUS QUE VÊ,<br />

OUVE E SENTE<br />

Mateus 10:30-31 | Génesis 16:13 | Êxodo 4:31 | Isaías 53:8<br />

12<br />

Na luz ténue do entardecer consegues<br />

perceber aquele vulto distante<br />

mas familiar, que deixa o edifício do<br />

hospital em direcção à estrada. Há instantes<br />

ela encontrava-se contigo no<br />

quarto, agora vai para casa sozinha.<br />

Vai de ombros caídos, cabeça baixa,<br />

mal se apercebendo do movimento à<br />

sua volta. Caminha sozinha, e enquanto<br />

a vês afastar-se podes quase sentir<br />

o cansaço e a tristeza que carrega.<br />

É uma caminhada solitária que ela<br />

tem feito muitas vezes nas últimas<br />

semanas, e na maior parte delas ninguém<br />

parece reparar nela. Ali, naquele<br />

“quase retiro” em que te encontras,<br />

tu que conheces a história por detrás<br />

daquela caminhada solitária e que te<br />

preocupas com esta esposa sofredora<br />

e com o seu marido no leito de dor<br />

mesmo atrás de ti, tens o pensamento<br />

que este pode ser um vislumbre do<br />

como Deus vê e tem visto cada uma<br />

das suas caminhadas solitárias ao<br />

deixar o hospital durantes as últimas<br />

semanas. E de que Ele vê cada uma<br />

das incontáveis caminhadas feitas<br />

por gente cansada, triste e preocupada<br />

com os seus queridos enquanto


saem daquele hospital. Vê todos os<br />

doentes, em cada um dos hospitais…<br />

Por instantes, sentes o desejo de correr<br />

atrás dela, apenas para lhe dar<br />

mais um abraço e lembrá-la que Deus<br />

também a vê. Mas ela já atravessou<br />

a rua e já não a podes apanhar. A<br />

enfermeira terminou o seu trabalho<br />

e tu sentas-te junto à cama. Nesse<br />

momento, tu oras por aquele casal e<br />

pelas suas lutas, oras também pela<br />

enfermeira e pelo hospital e por todos<br />

os que consegues ver naquele<br />

momento. E enquanto o teu coração<br />

sofre com a enormidade da dor, tu<br />

agradeces a Deus porque nunca estás<br />

sozinho, mesmo nos momentos mais<br />

escuros da tua vida.<br />

O Deus Que Vê<br />

Gritar é uma resposta humana natural<br />

ao sofrimento e à injustiça. Mesmo<br />

se não estamos seguros a quem<br />

ou porque gritamos, o ato de gritar e<br />

clamar é em si mesmo um ponto de<br />

partida. Mas estes gritos são mais penetrantes<br />

quando dirigidos a um Deus<br />

que cremos ser bom, que nos ama e<br />

quer o nosso melhor. Quando passamos<br />

por tragédias, o “silêncio” de Deus<br />

parece ser um escárnio para o fiel sofredor.<br />

Na história de Job, por exemplo,<br />

os seus sofrimentos físicos e as suas<br />

perdas eram agravados pelas questões<br />

que se levantavam a propósito da natureza<br />

de Deus e se Deus tinha sequer<br />

13<br />

No entanto, enquanto ouvimos estas<br />

perguntas ecoar através da Bíblia e<br />

através da história humana, também<br />

vemos Deus repetidamente apresentar-se<br />

como o Deus que vê e sente o<br />

sofrimento até dos mais “pequeninos”<br />

(ver Mateus 25). Entre a imensidão<br />

da Sua criação, Ele repara na<br />

queda do pequeno pardal e Jesus<br />

assegura-nos “mais valeis vós do que<br />

muitos pardais” (Mateus 10:31). Este<br />

é um assunto recorrente em muitas<br />

histórias da Bíblia.


Hagar estava numa difícil e traumática<br />

situação familiar. Ela era egípcia,<br />

mas não sabemos nada sobre as circunstâncias<br />

que a fizeram deixar o<br />

seu país. Como serva de Abraão e<br />

Sara, Hagar não podia escolher onde<br />

e como viver. Quando Sara sugeriu o<br />

seu desesperado plano a Abraão para<br />

ter um filho, é pouco provável que<br />

Hagar tenha sido consultada sobre o<br />

assunto. Tão má quanto essa ideia<br />

pudesse parecer, ela só se tornaria<br />

pior quando o plano parecia estar a<br />

resultar. Sara começou a mostrar-se<br />

melindrada pela gravidez de Hagar,<br />

e quando a situação se tornou insuportável,<br />

Hagar fugiu – uma mulher,<br />

grávida, sozinha, num país estrangeiro,<br />

no deserto, talvez temendo pela<br />

sua vida.<br />

Mas até mesmo no auge da injustiça<br />

de que foi vítima e da sua extrema<br />

situação física, Hagar, não estava na<br />

verdade sozinha ou esquecida. Um<br />

anjo veio até ela com a mensagem de<br />

que Deus tinha visto a sua dificuldade<br />

e de que ela não estava abandonada.<br />

Ele assegurou-lhe de que Deus estava<br />

com ela e ia resolver a situação. O anjo<br />

deu-lhe inclusivamente instruções<br />

a respeito da criança que ela teria:<br />

“Terás um filho, a quem chamarás<br />

Ismael” – que significa Deus ouve –<br />

“pois o Senhor ouviu a tua aflição”<br />

(Génesis 16:11). Enquanto fosse mãe,<br />

cada vez que chamasse pelo nome do<br />

seu filho, ela seria recordada que na<br />

pior situação da sua vida,<br />

14<br />

Deus atentou para o seu desespero.<br />

Hagar respondeu dando por sua vez<br />

um nome a Deus: “Ela chamou o<br />

nome do Senhor, com quem ela falava:<br />

“Tu és o Deus que vê, pois disse<br />

ela: agora olhei para aquele que me<br />

vê” (Génesis 16:13).<br />

Isto não significou que tudo foi pacífico<br />

e justo para ela depois desta experiência,<br />

até porque alguns anos mais<br />

tarde Hagar veio a encontrar-se numa<br />

situação semelhante, desta vez com o<br />

seu filho mais novo, morrendo de sede<br />

no deserto. Novamente um anjo falou<br />

com ela, assegurando-lhe que Deus<br />

tinha visto a sua situação e “Deus ouviu<br />

a voz do rapaz” (Génesis 21:17).<br />

A partir destas experiências temos<br />

um dos mais profundos e reconfortantes<br />

nomes atribuídos a Deus – “O<br />

Deus que me vê”. É um nome que<br />

qualquer pessoa através da história<br />

pode chamar, não importa quais sejam<br />

as circunstâncias, angústias ou<br />

sofrimentos. Deus vê.<br />

O Deus Que Ouve<br />

Alguns séculos mais tarde, todo um<br />

grupo de pessoas descendentes da<br />

mesma família, estavam a sofrer,<br />

mantidos como escravos e vítimas<br />

dos abusos dos egípcios. Quatrocentos<br />

anos é muito tempo para se esperar,<br />

especialmente quando essa<br />

espera é feita em condições de dura e<br />

horrenda escravidão. Deus prometera


voltar-se para o Seu povo e tirá-lo do<br />

Egito, mas geração após geração eles<br />

continuavam a construir a riqueza e o<br />

prestígio dos seus opressores idólatras<br />

– e Deus parecia estar em silêncio<br />

– . Será que Ele já tinha reparado no<br />

seu sofrimento? Será que os tinha esquecido?<br />

Estava sequer preocupado?<br />

Foi então que Deus se voltou para<br />

eles. Apareceu no deserto no meio<br />

de uma sarça ardente e ao líder mais<br />

improvável, um príncipe fugitivo e<br />

um humilde pastor chamado Moisés.<br />

Deus deu ao relutante Moisés um trabalho<br />

a fazer, e a primeira parte desse<br />

trabalho era regressar para juntos dos<br />

israelitas que estavam no Egito com<br />

a mensagem de que Deus tinha ouvido<br />

e visto a sua opressão. “De facto<br />

15<br />

tenho visto a aflição do meu povo,<br />

que está no Egito, e tenho ouvido o<br />

seu clamor por causa dos seus opressores,<br />

e conheço os seus sofrimentos”<br />

(Êxodo 3:7).<br />

Sim, Deus estava afinal preocupado.<br />

Na realidade, Ele estava prestes a fazer<br />

algo que mudaria drasticamente a<br />

situação. Não que fosse automático<br />

ou instantâneo. As condições no<br />

Egito tornaram-se ainda piores antes<br />

que pudessem sair, guiados por<br />

Deus, e o cumprimento do plano que<br />

o Senhor deu a Moisés levaria mais<br />

alguns anos. Mas, tal como aconteceu<br />

com Hagar, a consciência de que<br />

Deus tinha ouvido os seus pedidos de<br />

ajuda foi um significativo ponto de<br />

viragem na sua experiência e no seu<br />

relacionamento com Deus, apesar<br />

das circunstâncias: “E quando ouviram<br />

que o Senhor tinha visitado os<br />

filhos de Israel e que tinha visto a sua<br />

aflição, inclinaram-se, e o adoraram”<br />

(Êxodo 4:31).


O Deus Que Sente<br />

É reconfortante saber que Deus é<br />

um Deus que vê e ouve os gemidos<br />

dos pobres e oprimidos. É espantoso<br />

pensar que Deus, em Jesus, experimentou<br />

e suportou a pior das brutalidades<br />

do nosso mundo, a mais vil<br />

opressão e injustiça. Apesar de toda a<br />

compaixão e bondade manifestadas<br />

por Jesus na Sua vida e ministério,<br />

a Sua morte aconteceu como resultado<br />

do ódio, da inveja e da injustiça.<br />

Desde as suas angustiadas orações<br />

no Jardim do Getsêmani até à sua<br />

prisão, aos “julgamentos”, à tortura,<br />

zombaria, crucifixão e morte, Ele<br />

suportou a provação extenuante de<br />

um poder opressivo que lhe infligiu<br />

dor, crueldade e maldade. Tudo isto é<br />

agravado se pensarmos na inocência,<br />

pureza e bondade d’Aquele que sofreu<br />

tais agruras. Através das “lentes”<br />

da história da salvação nós conseguimos<br />

ver a beleza do sacrifício de Jesus,<br />

mas não podemos esquecer da<br />

brutalidade, do sofrimento e da injustiça<br />

que Ele experimentou.<br />

Porque os sacerdotes e líderes religiosos<br />

odiavam Jesus, eles precisavam<br />

de encontrar uma acusação contra<br />

Ele, e o julgamento que Lhe fizeram<br />

violava muitas das práticas legais<br />

por eles estabelecidas. Foi uma farsa<br />

conduzida com celeridade e oportunismo<br />

para atingir os seus objetivos.<br />

“Muitos testemunhavam falsamente<br />

contra ele, mas os testemunhos não<br />

16<br />

eram conformes” (Marcos 14:56). Até<br />

mesmo quando os líderes trouxeram<br />

Jesus à presença de Pilatos, eles não<br />

estavam seguros sobre de que crime<br />

relevante o haveriam de acusar, e Pilatos<br />

“sabia que por inveja o entregaram”<br />

(Mateus 27:18). O facto de Jesus<br />

ter sido crucificado depois de tão<br />

fortes declarações do Seu juiz confirmando<br />

a Sua inocência, sublinha<br />

a horrível injustiça de que foi vítima<br />

(ver Isaías 53:8). Em Jesus, Deus sabe<br />

o que é ser vítima do mal, da injustiça<br />

e da violência. Deus identificou-se<br />

de tal maneira connosco na nossa<br />

condição caída e debilitada, que não<br />

podemos duvidar da Sua empatia,<br />

compaixão e fidelidade: “Pois não<br />

temos um sumo sacerdote que não<br />

possa compadecer-se das nossas<br />

fraqueza, porém um que, como nós,<br />

em tudo foi tentado, mas sem pecado”<br />

(Hebreus 4:15). Em Jesus, Deus<br />

experimentou as profundezas da dor<br />

e do sofrimento deste mundo. Ele vê,<br />

Ele ouve e Ele sabe o que é passar<br />

pelas nossas mais terríveis experiências.<br />

Ele esteve lá.<br />

Quebrando o silêncio<br />

Através da história bíblica, há um<br />

apelo que se repete por parte do povo<br />

de Deus – particularmente por aqueles<br />

que experimentaram a escravidão,<br />

o exílio, a opressão, a ocupação, a<br />

pobreza ou outro tipo de injustiças<br />

ou tragédias – para que Deus intervenha.<br />

Os escravos no Egipto, os isra-


elitas em Babilónia, e muitos outros,<br />

clamaram para que Deus visse e ouvisse<br />

o seu sofrimento, e interviesse<br />

para corrigir estes males.<br />

O livro de Salmos está cheio de lamentos<br />

acerca da aparente prosperidade<br />

e felicidade dos ímpios, enquanto<br />

os justos são injuriados, explorados<br />

e pobres. O salmista clama vez após<br />

vez pela intervenção de Deus, acreditando<br />

que o mundo não está hoje a<br />

funcionar de acordo com o que Deus<br />

criou e planeou, dando continuidade<br />

ao grito dos profetas e dos oprimidos.<br />

“Até quando, ó Senhor?” (ver, por<br />

exemplo, Salmos 94:3-7). O povo de<br />

Deus terá sempre um sentimento de<br />

impaciência em relação à injustiça e<br />

à pobreza – e a aparente inacção de<br />

Deus – é outra fonte de impaciência.<br />

Mas quando ouvimos a voz de Deus<br />

e confiamos no Seu cuidado, misericórdia<br />

e compaixão por nós e por<br />

todos aqueles que sofrem de uma<br />

ou de outra maneira, tornamo-nos a<br />

voz de Deus no meio do sofrimento<br />

e da injustiça dos outros. Podemos<br />

não ter condições para impedir ou resolver<br />

o sofrimento dos outros – em<br />

última análise – algumas situações e<br />

circunstâncias só serão resolvidas no<br />

julgamento final e na re-criação.<br />

Mas como povo que conhece e confia<br />

num Deus que vê, ouve, e sente, somos<br />

também chamados a partilhar<br />

as suas dores e a resplandecer a luz<br />

da misericórdia e do amor de Deus em<br />

17<br />

direcção às suas trevas. Deus ouve, e<br />

nós somos um dos meios pelos quais<br />

Ele responde. Imagina Deus a contemplar<br />

aquela esposa que atravessa<br />

a rua na sua triste e solitária caminhada<br />

de regresso a casa. Imagina<br />

Deus a caminhar pelos corredores de<br />

um hospital na tua cidade. Imagina<br />

Deus a ver as notícias na televisão e<br />

qual seria a Sua reação. Imagina Deus<br />

a ouvir as histórias dos teus vizinhos<br />

que estão a atravessar momentos<br />

difíceis na sua vida familiar. Imagina o<br />

que Ele gostaria de nos ver fazer para<br />

servirmos na nossa família, na nossa<br />

comunidade e no nosso mundo.<br />

PERGUNTAS<br />

PARA DEBATE<br />

a) Quão importante é para ti que<br />

Deus seja o Deus que vê o sofrimento<br />

do povo na terra e ouve os<br />

seus pedidos de ajuda? O que é que<br />

isso te diz acerca de Deus?<br />

b) Até que ponto refletir sobre o<br />

sofrimento e a injustiça que Jesus<br />

experimentou podem ajudar-te<br />

a enfrentar o sofrimento e a injustiça?<br />

c) De que forma a compaixão e a<br />

preocupação de Deus pelos “últimos,<br />

os menores e os perdidos”<br />

afeta as nossas atitudes e ações<br />

para com aqueles que à nossa<br />

volta passam por necessidades?


SEGUNDA<br />

11 Mar<br />

Lavar os pés a outra pessoa é um<br />

dos símbolos e memoriais mais<br />

profundos da fé cristã. É também<br />

um padrão de como devemos colocar<br />

a nossa fé em prática nos momentos<br />

de culto. Como discípulos do Deus que<br />

se curvou, os crentes cristãos devem<br />

ser pessoas que se curvam para servir<br />

os seus semelhantes, particularmente<br />

aqueles que padecem necessidades.<br />

Jesus foi o primeiro a curvar-se e a dar<br />

este profundo exemplo de atitude e<br />

ação: “Antes da festa da Páscoa, sabendo<br />

Jesus que a sua hora de passar<br />

deste mundo para o Pai já tinha chegado,<br />

como havia amado os seus, que<br />

estavam no mundo, amou-os até ao<br />

fim… depois colocou água numa bacia,<br />

e começou a lavar os pés dos discípulos,<br />

e a enxugá-los com a toalha<br />

com que estava cingido” (João 13:1-5).<br />

Outras traduções da Bíblia (New Living<br />

Translation) são mais explícitas<br />

relativamente ao que se passou neste<br />

ato, dizendo “mostrou-lhes a plena<br />

extensão do Seu amor” (Ler também<br />

Salmos 18:35 e Filipenses 2:5-7).<br />

Através dos escritos apostólicos de<br />

João – o seu evangelho e as suas cartas<br />

– o amor de Deus é tema con-<br />

O DEUS QUE<br />

SE CURVA<br />

João 13:1-5 | Mateus 1:23 | Hebreus 1:2,3 |<br />

Filipenses 2-5:8 | João 12:14-17<br />

18<br />

stante, particularmente porque ele<br />

tinha a experiência de conhecer Jesus<br />

pessoalmente. É por isso interessante<br />

reparar no que João considera como<br />

o crescendo deste refrão. Este era o<br />

momento em que “a plena extensão”<br />

deste amor se revelava. João prossegue<br />

descrevendo Jesus, o eterno Filho<br />

de Deus, lavando os pés empoeirados<br />

dos seus discípulos um a um. De acordo<br />

com João, esta era a maior e mais<br />

profunda expressão do amor de Deus,<br />

demonstrada num ato de incrível humildade<br />

e serviço.<br />

Nota: Lavar os pés era um costume social do<br />

primeiro século porque o povo calçava sandálias<br />

abertas e andava em estradas muito poeirentas.<br />

Era um humilde dever, normalmente<br />

feito por um servo.


Jesus – “Deus connosco”<br />

Nunca compreenderemos esta ato de<br />

rebaixamento tão drástico da parte de<br />

Deus ao tornar-se humano na pessoa<br />

de Jesus. O Criador do universo tornouse<br />

uma criatura. O todo poderoso soberano<br />

do universo tornou-se num<br />

bebé humano com todas as nossas<br />

limitações físicas. O que tudo isto significa<br />

é um grande mistério, mas um<br />

admirável mistério capaz de transformar<br />

o mundo. Mesmo antes deste<br />

relato o apóstolo João fala-nos do que<br />

Jesus fez naquela noite, ele faz uma<br />

pausa na história para nos recordar<br />

exatamente quem estava a operar estas<br />

coisas: “Jesus, sabendo que o Pai<br />

tinha depositado nas suas mãos todas<br />

as coisas, e que havia vindo de Deus<br />

para ir para Deus” (João 13:3).<br />

É necessário recordar esta realidade<br />

sempre que ouvimos as histórias<br />

de Jesus. Os relatos mais profundos<br />

acerca de Jesus não são as de grandes<br />

multidões ou de grandes milagres<br />

públicos, mas do tempo que Ele passou<br />

a sós com as pessoas – a mulher<br />

junto ao poço, a conversa com Nicodemos<br />

à noite, as conversas com<br />

Maria, Marta e Lázaro em sua casa, o<br />

tempo e a atenção que ele dispensou a<br />

cada um dos Seus discípulos de forma<br />

personalizada, as conversas íntimas<br />

com as pessoas quando Ele as curava,<br />

o convite a Zaqueu para descer da sua<br />

árvore, Maria no jardim na manhã da<br />

ressurreição, no caminho para Emaús<br />

19<br />

com dois crentes desapontados, ao<br />

fazer o pequeno almoço na praia para<br />

alguns dos Seus discípulos. Em cada<br />

um destes momentos, vemos o Deus<br />

do universo interagindo com cada<br />

pessoa individualmente, como se<br />

elas fossem a única coisa importante<br />

em todo o universo. Pelos padrões de<br />

muitos isto é terrivelmente ineficaz,<br />

talvez mesmo arriscado e esbanjador,<br />

mas é uma visão notável de quem é<br />

Deus e do amor que Ele tem por cada<br />

um de nós.<br />

E este é o mesmo Jesus que se curvou<br />

para lavar os pés dos discípulos um a<br />

um. O ato mais pessoal assim como<br />

também um símbolo poderoso, uma<br />

autêntica declaração de que significa<br />

Jesus ser “Deus connosco” (Mateus<br />

1:23) demonstrando a plena extensão<br />

do Seu amor.


1<br />

Curvado para Lavar os Pés<br />

Há ainda outro elemento na introdução<br />

que João faz a esta história<br />

de Jesus como o grande servo. Ele percebeu<br />

que Jesus sabia o que estava<br />

a acontecer nas sombras dos bastidores<br />

naquela noite: “Durante a ceia,<br />

tendo já o diabo posto no coração de<br />

Judas Iscariotes, filho de Simão, que o<br />

traísse” (João 13.2). Jesus “sabia quem<br />

o havia de trair” (versículo 11), e onde<br />

isso os conduziria aos dois. Dentro de<br />

algumas horas os seus destinos estariam<br />

traçados.<br />

Mas por agora a refeição estava a<br />

decorrer e ninguém tinha feitos quaisquer<br />

preparativos ou se tinha oferecido<br />

para lavar os pés do grupo. Foi então<br />

que Jesus, o Filho de Deus, executou<br />

um ato surpreendente e de grande humildade.<br />

A imagem do Deus do universo<br />

curvado a lavar os pés de um grupo<br />

de homens vulgares, é extraordinária.<br />

Adicionada a esta admiração, encontra-se<br />

o estigma cultural ligado ao ato<br />

de lavar os pés naqueles dias – era um<br />

trabalho para os menores dos criados<br />

– sem esquecer que entre os pés que<br />

Ele lavou estavam os daquele que se<br />

preparava para o entregar aos Seus inimigos<br />

e os de outro que o iria negar<br />

mais tarde naquela noite.<br />

O “espírito de serviço” de Deus é uma<br />

das mais profundas realidades da fé<br />

cristã, mas que muitas vezes assumimos<br />

apenas como um dado adquirido.<br />

Até mesmo para os mais fiéis filhos<br />

de Deus seguir este exemplo de humildade<br />

é uma luta. Esta é uma espécie<br />

de amor que transcende o melhor<br />

que a humanidade pode oferecer<br />

ou até compreender completamente.<br />

“O amor pelos menos afortunados é<br />

uma coisa maravilhosa – o amor por<br />

aqueles que sofrem, por aqueles que<br />

são pobres, doentes, fracassados,<br />

pouco atraentes – . Isto é compaixão<br />

e toca o coração do mundo. Temos<br />

ainda o amor pelos mais afortunados<br />

que é uma coisa rara – amar aqueles<br />

que são bem sucedidos onde nós falhámos<br />

– regozijando-nos sem inveja<br />

com aqueles que estão felizes, o amor<br />

dos pobres pelos ricos. E ainda existe<br />

o amor pelos inimigos – amar aquele<br />

que não nos ama mas que nos ridiculariza,<br />

ameaça e inflige dor . O amor<br />

do torturado para com o torturador<br />

–. Este é o amor de Deus. O amor que<br />

conquista o mundo” (Frederick Buechner,<br />

The Magnificent Defeat, pg. 105).<br />

Curvar-se até ao limite:<br />

Jesus, o Deus-Homem Morreu<br />

Este ato foi o início de uma provação<br />

de vinte e quatro horas que terminou<br />

com Jesus torturado, crucificado<br />

e morto a ser colocado num túmulo<br />

emprestado ao pôr de sol daquela<br />

sexta-feira. Em certo sentido, curvarse<br />

para lavar os pés dos discípulos<br />

foi o prelúdio de que Jesus haveria de<br />

curvar-se até ao ponto mais baixo a<br />

fim de erguer o mundo inteiro através<br />

20


da ressurreição e da esperança: “Ele<br />

foi prostrado para se erguer de novo e<br />

trazer com ele este devastado mundo<br />

… Ele rebaixou-se para poder levantar-se,<br />

Ele teve que chegar ao ponto<br />

de quase sucumbir debaixo do peso<br />

que carregou antes de incrivelmente<br />

se colocar de pé e caminhar com toda<br />

a humanidade aos seus ombros” (C S<br />

Lewis, Miracles, pg. 179).<br />

SE<br />

RV<br />

IR<br />

Partindo de várias passagens do Antigo<br />

Testamento para construir a sua argumentação,<br />

todo o primeiro capítulo<br />

do livro de Hebreus é uma declaração<br />

a favor da bondade absoluta de Jesus.<br />

“Havendo Deus outrora falado muitas<br />

vezes, e de muitas maneiras, aos pais,<br />

pelos profetas, a nós falou-nos nestes<br />

últimos dias pelo Filho, a quem constituiu<br />

herdeiro de tudo, por quem fez<br />

o mundo.<br />

21<br />

O Filho é o resplendor da sua glória<br />

e a expressa imagem da sua pessoa,<br />

sustentando todas as coisas pela<br />

palavra do seu poder. Havendo feito<br />

por si mesmo a purificação dos nossos<br />

pecados, assentou-se à destra da<br />

Majestade nas alturas” (Hebreus 1:2,<br />

3). Jesus era Deus – Eterno, Criador,<br />

Mantenedor. Alguns dos discípulos e<br />

amigos de Jesus que testemunharam<br />

à distância a Sua morte, tinham ouvido<br />

esta afirmação entre eles (ver Mateus<br />

16:13-16) e da voz do próprio Deus<br />

(ver Mateus 17:5). Agora – naquela colina<br />

ali mesmo ao lado montanha – o<br />

Deus-Homem estava morto.<br />

Foi verdadeira humilhação. Foi o assumir<br />

de uma insignificância que o rebaixou<br />

até ao ponto de não existir.<br />

A morte traz sempre tremor e horror,<br />

mas a morte do Deus-Homem foi<br />

muito mais do que isso. Tratou-se de<br />

uma morte capaz de abalar e estremecer<br />

o mundo inteiro, mas também de<br />

o transformar e redimir. Perguntaram<br />

um dia ao autor Douglas Coupland<br />

qual era o seu maior medo, ao que ele<br />

respondeu: “Que Deus exista, mas que<br />

não esteja muito preocupado com a<br />

humanidade.” Em Jesus e na Sua crucifixão,<br />

Deus inverteu este grande temor:<br />

Deus preocupa-se, e muito, com<br />

a humanidade, a tal ponto que Ele<br />

estava preparado para fazer o derradeiro<br />

sacrifício a fim de demonstrar o<br />

quanto Se preocupa, e tornar possível<br />

a nossa eterna comunhão, resgate e<br />

relacionamento com Ele.


A Atitude de Se Curvar<br />

Não é de admirar que Paulo utilize estas<br />

imagens de humildade e espírito<br />

de serviço de um Deus que é capaz<br />

de se curvar, como a maior de todas<br />

as expressões da glória e do amor de<br />

Deus, e de como somos chamados a<br />

vivê-las nas nossas vidas: “De sorte<br />

que haja em vós o mesmo sentimento<br />

que houve em Cristo, que sendo em<br />

forma de Deus, não teve por usurpação<br />

ser igual a Deus, mas a si mesmo se<br />

esvaziou, tomando a forma de servo,<br />

fazendo-se semelhante aos homens.<br />

E, achado na forma de homem, humilhou-se<br />

a si mesmo, sendo obediente<br />

até à morte, e morte de cruz” (Filipenses<br />

2:5-8).<br />

Em resposta a esta bondade e esmagadora<br />

humildade, somos chamados<br />

a nos mantermos, praticarmos e<br />

partilharmos a nossa fé com a mesma<br />

humildade. Com frequência consumimo-nos<br />

a nós mesmos – pessoal e<br />

colectivamente – com o intuito de<br />

servir e procura o melhor para aqueles<br />

com quem partilhamos as nossas<br />

vidas e o nosso mundo. Não é de admirar<br />

que o profeta Miqueias tenha<br />

feito a ligação entre a procura por<br />

justiça e misericórdia com o imperativo<br />

de “caminhar humildemente com<br />

o seu Deus” (Miqueias 6:8). Uma das<br />

tentações dos crentes é quererem ficar<br />

a “morar” com Deus quando estão<br />

nos picos das suas experiências espirituais.<br />

Esta foi a malfadada sugestão<br />

de Pedro no Monte da Transfiguração,<br />

de que eles deviam construir abrigos<br />

naquele exato momento e lugar (ver<br />

Mateus 17:4). Mas este não é o método<br />

de Deus. A prática da humildade<br />

implica descer da montanha e caminhar<br />

entre e com o povo que está perdido,<br />

ameaçado ou a sofrer, assumindo<br />

os riscos que forem precisos para o<br />

ajudar, restabelecer e salvar.<br />

Ele ficou<br />

Carl Wilkens era diretor da ADRA no<br />

Ruanda à cerca de quatro anos em<br />

abril de 1994, quando se viu no meio<br />

de uma das situações mais horrendas<br />

da história recente. Durante os cem<br />

dias que se seguiram, mais de 800<br />

000 ruandeses foram assassinados<br />

numa frenética carnificina étnica, enquanto<br />

o resto do mundo ignorava ou<br />

pouco ligava ao assunto. A igreja, a<br />

ADRA e os representantes do governo<br />

dos Estados Unidos insistiram para<br />

que Wilkens e a sua família fugissem<br />

do genocídio, mas ele sabia que a sua<br />

partida deixaria alguns membros da<br />

sua equipa em grande perigo. Enquanto<br />

a sua esposa, filhos e pais eram<br />

evacuados para o Quénia, Wilkens ficou<br />

e fez tudo o que pode para ajudar<br />

e proteger aqueles que foram apanhados<br />

na loucura dos acontecimentos<br />

daqueles três meses.<br />

A experiência de Wilkens durante esse<br />

período foi publicada em 2011 num livro<br />

intitulado I’m Not Leaving (Eu Não<br />

22


Vou Embora). Não se trata de um relato<br />

sobre os horrores do Ruanda, mas<br />

de uma história mais pessoal. Wilkens<br />

conta histórias sobre o trabalho de<br />

salvar vidas em circunstâncias normais<br />

e extraordinárias, e reflete sobre<br />

como essas experiências mudaram o<br />

seu relacionamento com a sua família,<br />

com Deus e com os outros. Assim<br />

sendo, I’m Not Leaving é uma história<br />

de esperança, mais do que de horror<br />

(mesmo se o horror está ali mesmo ao<br />

lado). A tarefa de Wilkens foi personalizar<br />

o povo que viveu essas tragédias,<br />

fazer o contrário do trabalho dos<br />

assassinos cujo método era fazer das<br />

suas vítimas objetos. É uma história<br />

de coragem e fé, demonstrando que<br />

estas virtudes são importantes por<br />

mais brutais que sejam as circunstâncias,<br />

em locais onde a vida era tão dolorosamente<br />

ténue e teimosamente<br />

resiliente. Entre estes extremos, Wilkens<br />

deu testemunho do que significa<br />

arriscar tudo pelos outros, simplesmente<br />

porque era a coisa certa a fazer.<br />

A história de Wilkens é um apelo a<br />

viver corajosa, fiel, humilde e compassivamente,<br />

qualquer que seja o preço<br />

a pagar, e a confiar em Deus com as<br />

nossas vidas e o nosso serviço para<br />

Ele e para os outros. Esta é a história<br />

de alguém que demonstrou “o mesmo<br />

sentimento de Jesus Cristo” de maneira<br />

notável.<br />

23<br />

Deus ainda Está Curvado<br />

Jesus demonstrou o Seu amor ao<br />

dispor-se a servir enquanto “Deus<br />

connosco”, num tempo e num local<br />

históricos no caos que é o nosso mundo.<br />

Isto é o que Ele faz nas nossas vidas,<br />

nos vários desafios e problemas<br />

que enfrentamos. E é o que Ele ainda<br />

está a fazer no nosso mundo hoje, se<br />

tão somente olharmos para Ele. Deus<br />

ainda está curvado para servir – a ti, a<br />

mim, a nós, a qualquer pessoa – mesmo<br />

quando O traímos e negamos. Os<br />

apóstolos João e Paulo descrevem-no<br />

como o mais sublime ato de Jesus, capaz<br />

de mostrar “a plena extensão do<br />

Seu amor”.


Depois de lhes ter lavado os pés, Jesus<br />

convidou os Seus discípulos – assim<br />

como nos convida a nós – a juntarmonos<br />

a Ele nesta atitude e ação. “Ora,<br />

se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os<br />

pés, vós deveis também lavar os pés<br />

uns dos outros. Eu vos dei o exemplo,<br />

para que façais o que fiz. Em verdade,<br />

em verdade vos digo que o servo não<br />

é maior do que o seu senhor, nem o<br />

enviado maior do que aquele que o<br />

enviou. Agora que sabeis estas coisas,<br />

bem-aventurados sois se as fizerdes”<br />

(João 12:14-17).<br />

24<br />

PERGUNTAS<br />

PARA DEBATE<br />

a) De que forma pode algo tão<br />

simples (como lavar os pés aos<br />

discípulos) mostrar “a plena extensão”<br />

do amor de Deus?<br />

b) Sabendo que não é uma<br />

atitude natural no ser humano,<br />

como podemos nós “ter o mesmo<br />

pensamento de Jesus Cristo”?<br />

c) O que podemos nós fazer para<br />

“ter o mesmo pensamento de<br />

Jesus Cristo” ou de alguma maneira<br />

torná-lo uma realidade nas<br />

nossas vidas?


TERÇA<br />

12 Mar<br />

Se frequentas a igreja há algum<br />

tempo, já deves ter visto um<br />

exercício com o bem conhecido<br />

texto de João 3.16. É uma “versão”<br />

personalizada muitas vezes utilizada<br />

como um apelo para aceitar Jesus<br />

como “o teu Salvador Pessoal”, e é<br />

mais ou menos assim: “Porque Deus<br />

amou o (coloca o teu nome aqui) de<br />

tal maneira que deu o Seu Filho Unigénito<br />

para que tu (coloca o teu nome<br />

aqui) que n’Ele crês, não pereças mas<br />

tenhas a vida eterna”. Apesar de toda<br />

a maravilhosa complexidade que encontramos<br />

na história da Bíblia sobre<br />

Deus, o coração do Evangelho pode<br />

ser resumido numa simples frase que<br />

até mesmo uma criança pode decorar<br />

e entender. E esta versão personalizada<br />

do versículo mais conhecido da<br />

Bíblia é uma forma de enfatizar o<br />

amor pessoal de Deus por cada um de<br />

nós e da escolha que individualmente<br />

temos de fazer para aceitar a oferta<br />

de Deus através de Jesus. Por isso,<br />

esta adaptação do versículo tão amado<br />

representa uma verdade inspiradora<br />

e capaz de transformar vidas.<br />

Talvez seja também uma verdade<br />

capaz de mudar o mundo.<br />

“PORQUE DEUS<br />

AMOU O MUNDO”<br />

João 3:16 | Efésios 2:8-10 | Romanos 8:18-26<br />

25<br />

“Porque Deus amou o<br />

mundo de tal maneira que<br />

deu o seu filho unigénito<br />

para que todo aquele que<br />

n’Ele crê não pereça mas<br />

tenha a vida eterna”<br />

Ao relembrar uma conversa tida com<br />

um amigo sobre a necessidade de<br />

haver confissão para desenvolver um<br />

relacionamento com Deus, o escritor<br />

Don Miller sugere: “Talvez possas ver<br />

a confissão como um ato de justiça<br />

social. O mundo inteiro está a cair aos<br />

pedaços porque ninguém quer admitir<br />

que está errado. Mas, ao pedir a<br />

Deus que te perdoe, estás disposto a<br />

assumir a tua própria miséria” (Blue<br />

Like Jazz, pg. 53). Tal como João 3:16<br />

enfatiza, tanto o pecado como a salvação<br />

são realidades que necessitamos<br />

de assumir pessoalmente e com<br />

seriedade.<br />

Mas também temos de nos lembrar<br />

que João 3:16 implica mais do que a<br />

perspetiva pessoal com a qual esta-


mos familiarizados. E se lido apenas<br />

neste sentido, podemos acabar por<br />

ficar com uma compreensão e mesmo<br />

com uma experiência limitada da<br />

salvação, correndo o risco de perdermos<br />

a riqueza que se pode encontrar<br />

numa leitura mais profunda deste<br />

versículo.<br />

O Velho Argumento<br />

Com muita frequência falamos de<br />

salvação em termos que se relacionam<br />

sobretudo com a ideia de “ir<br />

para o céu”. É espantoso pensar que<br />

até nas nossas discussões teológicas<br />

podemos estar centrados em<br />

nós próprios. Se somos facilmente<br />

motivados pelos valores materiais<br />

do tipo “quanto é que eu posso ganhar<br />

com isto”, a não ser que sejamos<br />

26<br />

cuidadosos, esta lógica pode influenciar<br />

até as nossas mais piedosas<br />

reflexões. Neste sentido, às vezes<br />

podemos mesmo andar à procura de<br />

uma salvação a preço de saldos.<br />

Inegavelmente, somos salvos exclusivamente<br />

pela graça de Deus: “Pois<br />

é pela graça que sois salvos, por meio<br />

da fé – e isto não vem de vós, é dom<br />

de Deus – não das obras, para que<br />

ninguém se glorie” (Efésios 2:8, 9).<br />

Mas Paulo continua no versículo<br />

seguinte e reconhece um outro aspeto<br />

deste relacionamento:<br />

“Pois somos feitura sua, criados em<br />

Cristo Jesus para as boas obras, as<br />

quais Deus preparou para que andássemos<br />

nelas” (Efésios 2:10).<br />

O apóstolo Tiago amplia esta perspetiva<br />

da salvação:


“Meus irmãos, que proveito há se alguém<br />

disser que tem fé, e não tiver<br />

obras? Pode essa fé salvá-lo? ... Assim<br />

também a fé, se não tiver obras,<br />

é morta em si mesma” (Tiago 2:14, 17).<br />

No eterno e mais amplo enquadramento<br />

da salvação, nós somos salvos<br />

por aquilo que Jesus fez por nós<br />

e é pela fé que tomamos posse dessa<br />

graça. Mas no aspeto prático da vida<br />

presente, a salvação deve ser o motor<br />

de uma vida de parceria com Deus,<br />

enquanto membros do reino de Deus<br />

nesta Terra. O chamado de Deus,<br />

repetido através da Bíblia, é para uma<br />

vida de fé e fidelidade. A questão crucial<br />

não é tanto como ganhar a salvação<br />

mas como viver e servir com regozijo<br />

enquanto caminhamos à luz da<br />

salvação. Quando começamos a apreciar<br />

a maravilha e o mistério infalível<br />

do amor de Deus, respondemos com<br />

fé e gratidão e procuramos a Sua bondade<br />

nas nossas vidas e para aqueles<br />

que estão à nossa volta. Desejamos<br />

viver com tanta fé e com tantas boas<br />

obras quantas nos for possível, tendo<br />

consciência de que estas são dons de<br />

Deus e que nenhuma delas pode acrescentar<br />

seja o que for à nossa salvação<br />

ou à abundante provisão de Deus.<br />

Lê Novamente<br />

27<br />

Lê Novamente<br />

João 3:16 diz: “Porque Deus amou o<br />

mundo...”, e a palavra no original grego<br />

para “mundo” é kosmos, que significa:<br />

“o mundo enquanto entidade<br />

criada e organizada”<br />

Pensar que “João 3:16 é para mim<br />

é um importante ponto de partida,<br />

mas além disso, perceber que o plano<br />

da salvação, tão bem resumido neste<br />

versículo, tem implicações para toda<br />

a humanidade e mesmo para toda<br />

a criação é um pensamento sobre o<br />

qual necessitamos de passar mais<br />

tempo a explorar.<br />

É claro que não estamos a tentar defender<br />

o conceito de universalismo,<br />

que pretende que todos serão salvos<br />

independentemente das suas escolhas<br />

a favor ou contra Deus e o Seu<br />

plano. Em vez disso, o ponto central<br />

aqui é a consciência de que o amor de<br />

Deus se estende a todos, bem como<br />

o Seu propósito de trabalhar através<br />

daqueles que decidem cooperar com<br />

Ele para redimir e por fim recrear toda<br />

a obra criada.<br />

Trata-se portanto de uma com-


Trata-se portanto de uma compreensão<br />

mais ampla de salvação,<br />

afastando-se da tentação de algum<br />

egocentrismo que por vezes adultera<br />

o entendimento do que é a salvação<br />

e que pode surgir a partir de formas<br />

de pensamento mais individualistas.<br />

Sim, é verdade que a salvação diz-me<br />

respeito a mim e ao meu relacionamento<br />

pessoal com Deus – mas não<br />

é apenas acerca de mim. O teólogo<br />

N. T. Wright coloca esta ideia nos<br />

seguintes termos: “A justificação não<br />

é apenas sobre “como é que eu obtenho<br />

o perdão dos meus pecados”.<br />

É sobre como Deus criou, através do<br />

Messias Jesus e do poder do Espírito<br />

Santo, uma única família, celebrando<br />

o perdão definitivo dos seus pecados<br />

e a segurança de que em Cristo estão<br />

“sem condenação”, e de que através<br />

de cada um dos membros dessa<br />

família os propósitos de Deus podem<br />

agora ser alargados a todo o mundo”<br />

(Justufication: God’s plan and Paul’s<br />

vision, pg. 248).<br />

Podemos aceitar com facilidade que<br />

Deus ama outras pessoas que não<br />

apenas nós. Ele ama aqueles que nós<br />

amamos e regozijamo-nos com isso.<br />

Ele ama também as pessoas a quem<br />

damos testemunho e que visitam as<br />

nossas igrejas, e é claro que a consciência<br />

do Seu amor por cada pessoa<br />

deve motivar-nos a levar o mais<br />

longe possível as boas novas do Seu<br />

amor. Mas Ele também ama aqueles<br />

28<br />

“A justificação<br />

não é apenas sobre<br />

“como é que eu obtenho<br />

o perdão dos<br />

meus pecados”. É<br />

sobre como Deus<br />

criou, através do<br />

Messias Jesus e do<br />

poder do Espírito<br />

Santo, uma única<br />

família, celebrando<br />

o perdão definitivo<br />

dos seus pecados e<br />

a segurança de que<br />

em Cristo estão<br />

“sem condenação”,


de quem temos medo, e a quem não<br />

sabemos como demonstrar e partilhar<br />

da mesma forma o amor de Deus.<br />

Deus ama as pessoas - todas<br />

as pessoas, em toda a parte – Ele<br />

ama-as sempre. O favor de Deus não<br />

se limita àqueles a quem nós favorecemos.<br />

A criação é um dos meios pelos quais<br />

podemos ver esta verdade demonstrada.<br />

A Bíblia apresenta repetidamente<br />

o mundo à nossa volta como<br />

uma evidência da bondade de Deus.<br />

Paulo insiste que todas as pessoas<br />

têm a oportunidade de encontrar<br />

Deus através da Sua criação: “Pois os<br />

atributos invisíveis de Deus, desde a<br />

criação do mundo, tanto o seu eterno<br />

poder, como a sua divindade, se entendem,<br />

e claramente se veem pelas<br />

coisas que foram criadas, de modo<br />

que eles são inescusáveis” (Romanos<br />

1:20). Jesus também se referiu ao<br />

mundo natural e à ordem da criação<br />

como evidências do amor de Deus e o<br />

meio pelo qual todas as pessoas são<br />

recetoras da Sua graça:<br />

“Para que sejais filhos do vosso<br />

Pai que está nos céus. Ele faz que<br />

o seu sol se levante sobre maus e<br />

bons, e envia chuva sobre justos e<br />

injustos” (Mateus 5:45)<br />

Tal como tudo o que é bom no mundo<br />

natural, a própria vida é um dom de<br />

Deus, e independentemente da resposta<br />

ou atitude do indivíduo para<br />

com Deus, cada pessoa é um destinatário<br />

desta graça.<br />

Renovação de Relacionamentos<br />

Mas até mesmo esta leitura não<br />

faz justiça à amplitude de João 3:16:<br />

“Porque Deus amou o mundo…”. A<br />

segunda parte deste versículo coloca<br />

a ênfase no plano da salvação de<br />

Deus como um meio de estender a<br />

vida eterna a “todo aquele que nele<br />

crê”. O verdadeiro perigo de “perecer”<br />

resulta da quebra de relacionamento<br />

com Deus pelo primeiro pecado do<br />

Homem. Só podemos ir pessoalmente<br />

a Deus enquanto seres humanos<br />

caídos. Mas quando aceitamos<br />

esta oferta de salvação, a nossa<br />

relação com Ele é restaurada.<br />

Em resposta ao quanto Deus nos<br />

amou, à oferta que Ele nos fez na<br />

pessoa do Seu filho e à promessa da<br />

vida eterna, somos feitos novas criaturas<br />

e tornamo-nos capazes de desfrutar<br />

dos bons relacionamentos para<br />

os quais Deus nos criou, incluindo os<br />

relacionamentos com os outros e com<br />

o mundo para além de nós mesmos.<br />

É claro que os seres humanos têm<br />

um lugar especial na salvação e na<br />

criação, e que mesmo no relato da<br />

criação em Génesis 1 e 2 é dada maior<br />

atenção à criação do Homem.<br />

Mas a primeira “definição” sobre<br />

o que significa ser Homem inclui o<br />

facto de termos sido criados à ima-<br />

29


gem de Deus e colocados num relacionacionamento<br />

estreito com o<br />

resto da criação (ver Génesis 1:26). A<br />

criação é importante para compreendermos<br />

quem somos enquanto seres<br />

que se relacionam com Deus e, se é<br />

verdade que os seres humanos ocupam<br />

o lugar de destaque na criação, é<br />

também evidente que Deus tem uma<br />

preocupação especial com o resto da<br />

obra criada. Quando Adão e Eva escolheram<br />

desobedecer a Deus, toda<br />

a criação foi afetada. A realidade do<br />

pecado modificou o relacionamento<br />

entre Deus e a humanidade, entre a<br />

humanidade e a natureza, e até mesmo<br />

entre Deus e a globalidade da Sua<br />

criação (ver Génesis 3). Deus continua<br />

a ser o Criador, e Ele ainda ordena e<br />

sustém toda a vida.<br />

Mas talvez à semelhança das alterações<br />

no relacionamento entre Deus<br />

e o Seu povo, a relação de Deus com<br />

a Sua criação tornou-se menos direta<br />

e mais difícil.<br />

30<br />

Isto não significa que não existam<br />

ainda vislumbres de Deus no mundo<br />

natural. Como já foi mencionado,<br />

Deus ainda fala e trabalha na natureza<br />

e através dela. E de alguma<br />

maneira, a criação e as próprias criaturas<br />

têm vozes que louvam a Deus e<br />

dão eco da relação para a qual foram<br />

criados: “Louvai ao Senhor desde<br />

a terra, vós, monstros marinhos, e<br />

todas as profundezas dos oceanos,<br />

relâmpagos e saraiva, neve e nuvens,<br />

ventos tempestuosos que executam<br />

a sua vontade; montes e todos os<br />

outeiros, árvores frutíferas e todos<br />

os cedros, feras e todos os gados, répteis<br />

e aves voadoras; reis da terra e<br />

todos os povos, príncipes e todos os<br />

juízes a terra; jovens donzelas, velhos<br />

e crianças, louvai o nome do Senhor,<br />

pois só o seu nome é exaltado; a sua<br />

glória está sobre a terra e o céu” (Salmos<br />

148:7-13). Mas mesmo neste louvor<br />

orquestrado, os tons são fracos, a<br />

celebração é incompleta e a debili-


dade é evidente. O louvor mistura-se<br />

com lamentos (ver Romanos 8:22).<br />

A vida é pontuada pela morte. A criação<br />

é assaltada pela deterioração, e<br />

de alguma maneira suspira pela recriação:<br />

“A ardente expetativa da criação<br />

aguarda a revelação dos filhos<br />

de Deus. Pois a criação ficou sujeita<br />

à vaidade, não por sua vontade, mas<br />

por causa daquele que a sujeitou, na<br />

esperança de que também a própria<br />

criação será libertada do cativeiro<br />

da corrupção, para a liberdade da<br />

glória dos filhos de Deus” (Romanos<br />

8:19-21).<br />

Em certo sentido, a fragmentação<br />

da criação por causa do pecado do<br />

ser humano foi mais visivelmente<br />

demonstrada na crucifixão. C. S.<br />

Lewis descreve a ressurreição como<br />

“o grande milagre” que apresenta<br />

ao mundo um novo leque de possibilidades,<br />

mas a morte do criador<br />

do mundo, dentro das limitações<br />

e restrições do mesmo, pode ser<br />

vista com a amplitude de um “antimilagre”.<br />

Não é por isso de admirar<br />

que a natureza se tenha revoltado<br />

violentamente neste momento escuro<br />

da história da humanidade (ver<br />

Mateus 27:45-51). Mas mesmo no<br />

momento mais escuro de todos os<br />

tempos, o criador estava a trabalhar<br />

para recriar – até a morte do Criador<br />

abriu o caminho para a recriação – .<br />

“Porque Deus amou o mundo de tal<br />

maneira que deu o Seu único Filho…”<br />

31<br />

Agentes da Re-criação<br />

Quando somos convidados para uma<br />

nova vida no relacionamento com<br />

Deus, com base no que Jesus fez por<br />

nós através da Sua morte, também<br />

somos chamados a voltar ao relacionamento<br />

que Deus originalmente<br />

estabeleceu com os seres humanos<br />

enquanto “mordomos” – como zeladores<br />

e jardineiros – da Sua criação.<br />

O derradeiro plano de Deus é que o<br />

mundo seja restaurado ao seu estado<br />

de perfeição bondade original. A<br />

morte será derrotada (ver I Coríntios<br />

15:26), e os impactos da morte e do


pecado serão removidos (ver Apocalipse<br />

21:1-5). E é por isso que somos<br />

chamados não apenas a aceitar a Sua<br />

oferta de salvação, mas a vivermos<br />

para ela e a partilhá-la no nosso mundo<br />

hoje, em antecipação da completa<br />

recriação prometida por Deus. Somos<br />

salvos pela graça como um dom de<br />

Deus e recreados como “feitura sua,<br />

criados em Cristo Jesus para as boas<br />

obras, as quais Deus preparou para<br />

que andássemos nelas” (Efésios<br />

2:10). Quando somos salvos, também<br />

somos chamados às funções para as<br />

quais Ele nos criou para desempenharmos<br />

no nosso mundo.<br />

Isto tem implicações significativas<br />

na maneira como compreendemos a<br />

nossa resposta à salvação de Deus e<br />

ao nosso relacionamento com o mundo<br />

onde fomos criados e recreados:<br />

“Não somos salvos do mundo da<br />

criação, mas salvos para o mundo<br />

da criação” (Romanos 8:18-26)<br />

Os seres humanos foram feitos para<br />

cuidar do maravilhoso mundo de<br />

Deus, e não será exagero dizer que a<br />

razão pela qual Deus nos salvou não<br />

foi simplesmente porque Ele nos ama<br />

pelo que somos por nós mesmos, mas<br />

que Deus nos ama por aquilo que somos<br />

originalmente: os continuadores<br />

da Sua criação, os Seus mordomos, os<br />

vice-governadores da Sua criação” (N.<br />

T. Wright, Justification, pg. 234).<br />

32<br />

O mundo inteiro deve beneficiar do<br />

renovado relacionamento entre Deus<br />

e o Seu povo.<br />

Porque Deus nos ama tanto, somos<br />

chamados a amar aquilo que Ele ama.<br />

Porque “Deus amou o mundo de tal<br />

maneira” – “enquanto entidade criada<br />

e organizada” – também devemos<br />

fazer o mesmo. Porque aceitámos o<br />

dom Divino da salvação, estamos interessados<br />

na mesma salvação e recriação<br />

para os nossos semelhantes e<br />

até mesmo para a recriação de todo<br />

o mundo criado. E de uma maneira<br />

específica e especial, somos agora<br />

agentes de Deus para servir, preservar,<br />

ajudar e curar o nosso mundo.<br />

PERGUNTAS<br />

PARA DEBATE<br />

a) Como explicarias a salvação<br />

a um amigo não cristão? Quão<br />

importante é a graça de Deus no<br />

nosso relacionamento com Ele?<br />

b) Quais são algumas das formas<br />

pelas quais a graça de Deus é<br />

estendida até àqueles que não<br />

acreditam n’Ele?<br />

c) O que significa ser um “mordomo”<br />

da criação? Como é que o<br />

nosso cuidado pela criação afeta<br />

outras pessoas?


QUARTA<br />

13 Mar<br />

Quando as forças alemãs ocuparam<br />

a Hungria em março de<br />

1944, a máquina do holocausto<br />

estava no seu auge. O genocídio foi<br />

rápido e ceifou seiscentas mil vidas.<br />

Mais de quatrocentos e cinquenta<br />

mil judeus húngaros foram deportados<br />

para o campo de concentração de<br />

Auschwitz em sete semanas, entre<br />

os meses de maio e julho, a maior<br />

taxa de deportação do holocausto. A<br />

maioria foi enviada, à chegada para<br />

as câmaras de gás. Um terço das vítimas<br />

de Auschwitz eram húngaros.<br />

No meio daquela loucura, a reputação<br />

de Laszlo Michnay cresceu. Os<br />

judeus húngaros acreditavam que o<br />

presidente da Igreja <strong>Adventista</strong> do<br />

Sétimo Dia na Hungria era um santo.<br />

Pondo em risco a sua própria vida e<br />

a da sua família, ele alimentou, escondeu<br />

e salvou numerosos judeus<br />

na sua casa e na igreja durante esses<br />

tempos de extrema perseguição.<br />

A determinação do Pr. Michnay em<br />

ajudar os judeus surgiu durante a<br />

sua participação nas conferências da<br />

Igreja realizadas na Alemanha em<br />

1936 e na Polónia em 1941, quando se<br />

apercebeu que o antissemitismo e as<br />

atrocidades começavam a tornar-se<br />

A GRANDE<br />

COMISSÃO<br />

Mateus 28:18-20 | Isaías 61:1-2 |<br />

33<br />

evidentes nessas nações. Percebendo<br />

que seria apenas uma questão de<br />

tempo até que os nazis avançassem<br />

pela Hungria, ele preparou-se para o<br />

iminente holocausto: com o auxílio<br />

dos donativos das igrejas e de uma<br />

herança, ele fez um stock de alimentos<br />

não perecíveis e planeou uma<br />

rede de casas refúgio.<br />

No início da década de 1940, o Pr.<br />

Michnay implorou à sua congregação<br />

que ajudasse os judeus oprimidos. As<br />

pessoas saíam da igreja porque tinham<br />

a certeza de que seriam presas


e tinham medo, mas ele não sofreu<br />

dano. No entanto, as igrejas <strong>Adventista</strong>s<br />

do Sétimo Dia foram fechadas<br />

pelos Serviços Secretos alemães pois<br />

chegavam-lhes notícias dos sermões<br />

sediciosos do Pr. Michnay. No final da<br />

segunda Guerra Mundial, foi emitida<br />

uma ordem a partir da sede local na<br />

Alemanha informando que todos os<br />

membros da família Michnay seriam<br />

executados no dia seguinte porque<br />

eles estavam a esconder os judeus.<br />

Mas nessa noite, informações erradas<br />

conduziram os alemães a pensar<br />

que o exército russo estava muito<br />

próximo e abandonaram o local. No<br />

caos subsequente, a família escapou<br />

ao seu destino. Esta foi apenas uma<br />

das muitas vezes que a família foi<br />

salva miraculosamente.<br />

A cave da igreja estava cheia de judeus<br />

a quem foram dados colchões<br />

e cobertores. Alguns passaram por<br />

familiares mas o Pr. Michnay nunca<br />

mandou ninguém embora. Todos, incluindo<br />

a sua própria família, comiam<br />

apenas uma refeição por dia, normalmente<br />

uma taça de sopa. O número<br />

de pessoas que o Pr. Michnay escondeu<br />

oscilava de acordo com o espaço<br />

disponível e o perigo em Budapeste.<br />

Enviou muitos para as casas de refúgio<br />

nas zonas rurais, pertencentes a<br />

uma rede de ministros <strong>Adventista</strong>s do<br />

Sétimo Dia que nunca foi detetada.<br />

\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\<br />

34<br />

Um Sermão Atuante<br />

Sessenta anos após estes acontecimentos,<br />

a história do Pr. Michnay<br />

foi publicada num jornal nacional da<br />

Austrália, coincidindo com uma exposição<br />

realizada no Museu Judeu<br />

de Sidney onde se encontrava a sua<br />

história como alguém que tinha emigrado<br />

para a Austrália. Enquanto os<br />

seus sermões são recordados pelo<br />

seu efeito, o seu conteúdo é menos<br />

recordado. Mas os seus verdadeiros<br />

sermões são aquelas ações que<br />

demonstram a preocupação de Deus<br />

pelos que são perseguidos e oprimidos,<br />

pelos famintos e os sem-abrigo,<br />

ao se colocar ele próprio na linha da<br />

frente para servir e salvar.<br />

Este é um tipo de “sermão” que<br />

merece grande atenção e prática. Os<br />

versículos conhecidos como a Grande<br />

Comissão (Mateus 28:18-20) estão<br />

entre os mais conhecidos da Bíblia<br />

pelos cristãos. Foram muitas vezes<br />

descritos como a declaração de missão<br />

cristã e foram enfatizados, analisados<br />

e tornaram-se prioritários para<br />

explicar toda a espécie de missão e<br />

projetos evangelísticos. Esta ênfase<br />

tem sido posta em particular na ordem<br />

de: ir, batizar e ensinar, uma formulação<br />

que foi separada e utilizada<br />

de várias maneiras. Mas algumas<br />

vezes separamos ou passamos por<br />

cima das declarações de abertura e<br />

fecho desta comissão: “Então Jesus<br />

veio e disse-lhes: É-me dado todo


poder no céu e na terra (…) E certamente<br />

estou convosco todos os<br />

dias, até à consumação dos séculos:”<br />

(Mateus 28:18, 20b). Esta comissão<br />

começa e termina com Jesus. A Sua<br />

personalidade, poder e presença são<br />

o contexto onde os Seus discípulos<br />

são aceites e cumprem a Sua missão.<br />

Como tal, necessitamos de nos lembrar<br />

de que estas instruções de Jesus<br />

aos primeiros discípulos não eram<br />

uma nova missão mas essencialmente<br />

a continuação da missão que<br />

Jesus já tinha trabalhado entre eles.<br />

A missão de Jesus<br />

Quer tenha sido a leitura estabelecida<br />

para aquele dia ou Jesus que<br />

intencionalmente tenha encontrado<br />

estes versículos importantes (Isaías<br />

61:1, 2) no pergaminho que lhe foi<br />

dado a ler, não foi uma coincidência<br />

que estes versículos tenham sido<br />

o texto base do Seu primeiro sermão<br />

público: “O Espírito do Senhor<br />

está sobre mim, pelo que me ungiu<br />

para evangelizar os pobres. Envioume<br />

para apregoar aos cativos, dar<br />

vista aos cegos, pôr em liberdade os<br />

oprimidos e anunciar o ano aceitável<br />

do Senhor” (Lucas 4:18, 19). Também<br />

não é uma coincidência que a história<br />

do sermão mais curto de Jesus: “ Hoje<br />

se cumpriu esta Escritura em vossos<br />

ouvidos” (Lucas 4:21), seja o arranque<br />

do registo de Lucas sobre o ministério<br />

público de Jesus.<br />

Jesus – e Lucas na sua narração da<br />

história de Jesus – usam a profecia de<br />

Isaías para explicar a obra que Ele estava<br />

a fazer, ou prestes a fazer. Estes<br />

versículos de Isaías 61 foram adotados<br />

como a declaração de missão de<br />

Jesus. Tanto o Seu ministério quanto<br />

a Sua missão deveriam ser espirituais<br />

e práticos e Ele iria demonstrar<br />

que o espiritual e o prático não estão<br />

tão distantes como por vezes os<br />

compreendemos. Para Jesus e para os<br />

Seus discípulos, cuidar das pessoas<br />

fisicamente e de formas práticas, era<br />

pelo menos parte do cuidado espiritual<br />

que lhes prestava.<br />

MI<br />

SS<br />

ÃO<br />

35


Algum tempo mais tarde, o Seu primo<br />

e precursor, João, enviou mensageiros<br />

a Jesus para Lhe fazer a pergunta<br />

chave:<br />

“És tu O escolhido?”<br />

Mesmo se João podia ter diferentes<br />

razões para fazer estas perguntas<br />

(talvez com a intenção de levar Jesus<br />

para a agir em seu favor), esta era a<br />

questão certa. Mesmo se a resposta<br />

de Jesus possa ser diferente daquilo<br />

que se esperaria, retirando o facto de<br />

que a sua resposta faz eco do que já<br />

dissemos sobre o Jesus disse a respeito<br />

da sua missão: “Ide, e anunciai<br />

a João o que tendes visto e ouvido: os<br />

cegos veem, os coxos andam, os leprosos<br />

são purificados, os surdos ouvem,<br />

os mortos são ressuscitados e<br />

aos pobres é anunciado o evangelho”<br />

(Lucas 7:22). Para Jesus parece que o<br />

Seu ministério prático: cuidar daqueles<br />

que estão em necessidade e o<br />

amor espelhado em ações concretas,<br />

deveria ser suficiente para convencer<br />

(ou recordar) a João que Ele era de<br />

facto Aquele que João anteriormente<br />

declarara que Ele era.<br />

A Primeira Comissão<br />

Na história de Mateus sobre o chamado<br />

dos discípulos, quando Jesus terminou<br />

de escolher o grupo dos Seus<br />

doze seguidores especiais, a primeira<br />

coisa que Ele fez, foi enviá-los. Ele<br />

deu-lhes uma missão com instruções<br />

36<br />

específicas: “E indo, pregai, dizendo:<br />

O reino de Deus está próximo.” (Mateus<br />

10:7). Estas eram as boas novas<br />

que Ele queria que eles praticassem<br />

e partilhassem – nesta primeira fase<br />

apenas nas suas comunidades locais.<br />

Depois quando Jesus os deixou com<br />

as instruções finais para irem e evangelizarem,<br />

serem testemunhas e partilharem<br />

as boas novas (ver Mateus<br />

28:18-20 e Atos 1:8), não era uma<br />

nova tarefa que lhes confiava mas<br />

um campo mais vasto para a missão<br />

que eles já estavam a aprender e a<br />

fazer.<br />

Cerca de dois mil anos mais tarde, encontramo-nos<br />

como parte da mesma<br />

história e da mesma missão. Jesus<br />

também nos instruiu a que partilhássemos<br />

as boas- novas. Mas a chave<br />

do evangelismo – e de como fazemos<br />

evangelismo – é ter em consideração<br />

que nós temos de ser para partilhar.<br />

Obviamente, as boas novas são uma<br />

mensagem. Nós contamos a história<br />

de como Deus criou o nosso mundo<br />

e que depois disso as coisas correram<br />

mal. Ele já trabalhou e continua<br />

a trabalhar através da história para o<br />

recrear. Contamos como nos encontrávamos<br />

sem esperança mas que alguma<br />

coisa mudou nas nossas vidas<br />

quando nos ligámos à realidade de<br />

Deus, e que agora vivemos com diferentes<br />

motivações e prioridades. Contamos<br />

como Jesus veio para anunciar<br />

que “o reino dos céus está próximo”<br />

e de como vivemos na expetativa de


ver esse reino que se tornará pleno<br />

quando Ele voltar.<br />

Uma das maneiras de o fazermos é<br />

tomar consciência de que Boa Nova<br />

é também uma ação. As instruções<br />

mais detalhadas que Jesus deu aos<br />

Seus discípulos foram “curar os doentes,<br />

ressuscitar os mortos, limpar os<br />

leprosos, expulsar os demónios. De<br />

graça recebestes, de graça dai” (Mateus<br />

10:8). Estas instruções repetem<br />

a declaração de missão de Jesus em<br />

Lucas 4:18, 19.<br />

Estas boas novas implicavam marcar<br />

uma verdadeira diferença nas vidas<br />

dos pobres, dos oprimidos, dos<br />

feridos e daqueles que estavam sem<br />

esperança. E, se isto não for feito,<br />

podem ser realmente consideradas<br />

boas novas? Esta verdade é não apenas<br />

uma componente vital das boas<br />

novas ensinadas e praticadas por Jesus,<br />

mas é também a chave para a<br />

sua eficácia e capacidade de atrair:<br />

“O mundo não pode discutir com<br />

uma igreja que vive a dor dos pobres<br />

da sociedade. A integridade<br />

desta forma de cristianismo<br />

silencia os mais duros críticos,<br />

porque eles reconhecem o amor<br />

genuíno e a compaixão quando<br />

os testemunham”<br />

(Tony campolo and Gordon Aeschliman)<br />

À medida que os discípulos iam de<br />

cidade em cidade, anunciando o re-<br />

37<br />

ino dos céus e curando os doentes,<br />

ajudando os pobres e dando-se a si<br />

mesmos, é fácil de imaginar que a<br />

questão mais óbvia que lhes podia<br />

ser colocada em cada comunidade<br />

que eles visitavam era, porque é<br />

que eles estão a fazer estas coisas e<br />

quem os enviou?<br />

Em resposta, eles tinham de falar<br />

entusiasticamente às pessoas sobre<br />

o seu Mestre e Amigo – um homem<br />

chamado Jesus – e começavam a explicar-lhes<br />

um pouco do que eles podiam<br />

entender sobre quem Ele era e<br />

sobre a diferença que Ele tinha feito<br />

nas suas vidas.<br />

Por fim, as boas novas são uma Pessoa.<br />

Jesus escolheu os Seus discípulos<br />

“nomeou doze para que estivessem<br />

com ele, e os mandasse a pregar”<br />

(Marcos 3:14), e esta amizade e este<br />

chamado tornaram-se o fundamento<br />

de todo e qualquer evangelismo que<br />

eles viessem a fazer. Eles reconheceram<br />

em Jesus uma bondade transformadora<br />

e um amor tal pelo mundo,<br />

que não podiam deixar de falar sobre<br />

isso (ver I João 1:1-3). Quando despendemos<br />

tempo para conhecer Jesus,<br />

começamos a descobrir um Amigo e<br />

uma amizade sobre a qual temos de<br />

falar aos outros, mesmo que Jesus não<br />

nos tenha instruído pessoalmente<br />

para o fazer. As boas novas são sobre<br />

Jesus. Na verdade, as boas novas são<br />

Jesus. E é por isso que merecem ser<br />

vividas e partilhadas.


Por isso, ide<br />

Como resultado da sua missão, formação,<br />

viagens de serviço e das suas<br />

experiências pessoais com Jesus, os<br />

Seus seguidores foram instruídos<br />

“Portanto, ide e fazei discípulos de<br />

todos os povos, batizando-os em<br />

nome do Pai e do Filho e do Espírito<br />

Santo, ensinando-os a guardar todas<br />

as coisas que eu vos tenho mandado”<br />

(Mateus 28:19, 29). Os seus ministérios<br />

no nome Jesus deveriam refletir<br />

e proclamar os valores e princípios do<br />

ministério de Jesus e do reino para<br />

o qual Ele os convidou. Eles deviam<br />

unir-se a Jesus na Sua missão para<br />

erguer os últimos, o menores e os<br />

perdidos.<br />

Algumas das discussões na igreja<br />

parecem por vezes bloquear na<br />

aparente necessidade de escolher<br />

entre dar relevância ao serviço ou ao<br />

testemunho, à justiça ou ao evangelismo.<br />

Mas quando compreendemos<br />

melhor cada um destes conceitos e<br />

38<br />

observamos o ministério de Cristo, as<br />

diferenças desaparecem e percebemos<br />

que a ação – particularmente no<br />

serviço em prol dos outros – é uma<br />

maneira de proclamação e conduz<br />

naturalmente a um convite. Os sermões<br />

mais marcantes do Pr. Michnay<br />

foram pregados nas vidas das pessoas<br />

que ele salvou com tudo o que<br />

isso lhe custou a ele e à sua família.<br />

Talvez as nossas oportunidades de<br />

serviço não sejam tão dramáticas e<br />

não nos coloquem em risco de vida,<br />

mas a escolha não é entre um tipo e<br />

outro de ação. Em vez disso, nós cooperamos<br />

com Deus quando trabalhamos<br />

com as pessoas, cuidando das<br />

suas necessidades reais e utilizando<br />

todos os recursos que Deus nos confiou.<br />

Numa das declarações mais conhecidas<br />

de Ellen White, ela explica isto da<br />

seguinte maneira: “ Unicamente os<br />

métodos de Cristo trarão verdadeiro<br />

êxito quando o povo se aproxima.


O Salvador misturava-se com os homens<br />

como uma pessoa que lhes<br />

queria bem. Manifestava simpatia<br />

por eles, ministrava às suas necessidades<br />

e granjeava-lhes a confiança.<br />

Ordenava então: “Segue-Me.” … Os<br />

pobres eram libertados, os doentes<br />

eram tratados, os aflitos e os enlutados<br />

confortados, os ignorantes eram<br />

instruídos, os inexperientes eram aconselhados.<br />

Devemos chorar com os<br />

que choram, e alegramo-nos com os<br />

que se alegram” (A Ciência do Bom<br />

Viver, pg. 143).<br />

Como vimos, estas duas ações cristãs<br />

– serviço e evangelismo – estão<br />

intimamente ligadas à primeira comissão<br />

de Jesus aos Seus discípulos,<br />

e é desta forma que a sua final<br />

e grande comissão tem de ser igualmente<br />

compreendida e realizada. No<br />

seu melhor, evangelismo, isto é, levar<br />

as boas novas de esperança, resgate,<br />

a) Lê Lucas 4:16-21. É assim que responderias<br />

a perguntas semelhantes sobre a<br />

divindade, o Messias e a missão de Jesus?<br />

b) Na tua opinião por que razão é que<br />

algumas vezes temos a tendência de<br />

separar o serviço e o evangelismo como<br />

atividades cristãs alternativas?<br />

arrependimento, transformação e<br />

do infinito amor de Deus, é um ato<br />

de serviço. E, quando corretamente<br />

compreendido, serviço é evangelismo,<br />

pois através dele proclamamos<br />

o reino de Deus de forma tal que as<br />

pessoas não podem evitar de o ver<br />

nas nossas vidas, e nas suas.<br />

PERGUNTAS PARA DEBATE<br />

39<br />

c) Tal como Jesus as descreve,<br />

as boas-novas deviam fazer a<br />

diferença na vida dos pobres, dos<br />

oprimidos, dos feridos e dos que<br />

não têm esperança. Se o cristianismo<br />

não tem estes resultados<br />

positivos e práticos, pode ele ser<br />

verdadeiramente considerado uma<br />

boa-nova? Por quê ou por que não?


QUINTA<br />

14 Mar<br />

A<br />

ressurreição de Jesus muda<br />

tudo. É o acontecimento central<br />

do cristianismo e muitas<br />

vezes meramente assumido como tal<br />

em vez de ser recordado e celebrado.<br />

Na verdade é impossível sobrestimar<br />

o que aconteceu naquele domingo de<br />

manhã depois de Jesus ter sido crucificado,<br />

e devemos aproveitar todas<br />

as oportunidades para nos lembrarmos<br />

desta fantástica realidade e das<br />

suas implicações em tudo:<br />

nas nossas vidas,<br />

nos nossos sonhos,<br />

nas nossas<br />

esperanças.Muito<br />

daquilo que aceitamos<br />

acerca da<br />

vida e da morte e do que consideramos<br />

importante e significativo, vem<br />

através da cultura em que nascemos,<br />

fomos educados e vivemos. Inevitavelmente<br />

muito do que é a nossa visão<br />

do mundo absorvemo-lo daquilo que<br />

os que nos rodeiam aceitam como<br />

garantido, o que mais uma vez nos<br />

lembra porque razão a ressurreição<br />

é tão importante. Trata-se de uma<br />

história poderosa o suficiente para<br />

abalar a nossa visão do mundo e os<br />

nossos pressupostos abrindo-nos<br />

não apenas a uma nova maneira de<br />

AGENTES<br />

DE JUSTIÇA<br />

E BELEZA<br />

Salmos 146:7-9 | Génesis 1:31 | I Coríntios 15:58 |<br />

vida, ao encontrarmos uma nova forma<br />

de contarmos as nossas próprias<br />

histórias, e redirecionarmos os nossos<br />

valores e prioridades.<br />

Talvez a ressurreição tenha o seu<br />

mais profundo efeito na maneira<br />

como avaliamos as nossas vidas e a<br />

nossa atitude diante das vitórias e<br />

das derrotas. O escritor cristão Ron<br />

Sider coloca isso nos seguintes termos:<br />

“Aqueles que compreendem o<br />

significado do<br />

“Aqueles que compreendem<br />

o significado do túmulo vazio<br />

estão preparados para perder”<br />

40<br />

túmulo vazio<br />

estão preparados<br />

para perder”<br />

(I am Not<br />

a Social Activist).<br />

Por causa do sacrifício (a derrota)<br />

e da ressurreição (a vitória), a fidelidade<br />

torna-se sempre mais importante<br />

do que o sucesso, não importa<br />

como medimos esse sucesso. O que<br />

Jesus fez é não apenas o fundamento<br />

para esta nova forma de avaliar as<br />

nossas vidas, é também o modelo:<br />

“Olhando firmemente para Jesus, autor<br />

e consumador da nossa fé, o qual<br />

pelo gozo que lhe estava proposto<br />

suportou a cruz, desprezando a ignomínia,<br />

e está assentado à desta do<br />

trono de Deus” – Hebreus 12:2.


Quando “compreendemos o túmulo<br />

vazio” podemos confrontar os nossos<br />

inevitáveis desapontamentos e<br />

perdas de maneira diferente. Já não<br />

temos que ganhar, defender e manter<br />

a nossa imagem ou ser um “sucesso”<br />

para justificar o nosso lugar no mundo<br />

ou o nosso sentido de valor. A nossa<br />

opinião já não tem de vencer todas as<br />

discussões ou ter a última palavra. A<br />

última palavra, ou a Palavra que será<br />

de facto a última, já foi proferida.<br />

É precisamente esta segurança que<br />

nos permite não sermos hoje tão tensos<br />

sobre a possibilidade de ganhar<br />

ou perder. Com frequência em contradição<br />

com os valores assumidos e estabelecidos<br />

em quase tudo o que nos<br />

é dito e ensinado, as realidades eternas<br />

da ressurreição libertam-nos da<br />

necessidade imediata de resultados.<br />

“A nossa resposta à esperança que<br />

temos na eternidade é de nos comprometermos<br />

em trabalhar para Deus<br />

aqui e agora, sabendo que tudo o que<br />

fazemos tem um significado eterno”<br />

(Julie Clawson, Everyday Justice).<br />

41<br />

A ressurreição deve mudar todas as<br />

coisas. Na ressurreição, Jesus mudou<br />

o curso da história. É a garantia de<br />

uma nova vida e de um novo mundo<br />

que vem, mas também o início de<br />

um novo tipo de vida que irrompeu<br />

no nosso mundo. O Reino de Deus<br />

já está entre nós, mesmo que não<br />

esteja ainda completo. Com esta tomada<br />

de consciência, começamos a<br />

perceber que esta é uma realidade<br />

na qual podemos participar e para a<br />

qual podemos mesmo contribuir no<br />

momento presente, particularmente<br />

como agentes de justiça e beleza<br />

num mundo que necessita desesperadamente<br />

mais de ambos.<br />

Justiça<br />

Nós acreditamos que Deus irá julgar o<br />

mundo e endireitar as coisas erradas<br />

que nele são feitas, e por isso precisamos<br />

de escutar os apelos da Bíblia<br />

por justiça e começar a viver de maneira<br />

consistente com o mundo onde<br />

iremos viver. No trabalho e no serviço<br />

associamo-nos a Deus na maneira<br />

como Ele serve o mundo hoje e na edificação<br />

do Seu reino vindouro. Como<br />

Criador e também como Alguém que<br />

ouve os gritos dos pobres, Deus está<br />

a trabalhar para servir e cuidar de


todos nós, até mesmo daqueles de<br />

quem por vezes nos esquecemos: “Ele<br />

sustenta a causa dos oprimidos, e dá<br />

pão aos famintos. O Senhor liberta os<br />

encarcerados, o Senhor abre os olhos<br />

aos cegos, o Senhor levanta os abatidos,<br />

o Senhor ama os justos. O Senhor<br />

guarda os estrangeiros e ampara<br />

o órfão e a viúva, mas transtorna o<br />

caminho dos ímpios” (Salmos 146:7-<br />

9). Embora nos sintamos oprimidos<br />

pelas necessidades à nossa volta e às<br />

vezes pelas que nós mesmos passamos,<br />

é Deus que faz isto:<br />

Ele dá, liberta, encoraja,<br />

toma, cuida e serve.<br />

Surpreendentemente, uma das maneiras<br />

pelas quais Ele o faz é através<br />

do Seu povo: nós. Novamente somos<br />

convidados a participar na Sua missão<br />

neste mundo – com o qual Ele já está<br />

a trabalhar – continuando o que Jesus<br />

fez servindo-O ao servir os outros.<br />

Enquanto apreciamos atos de bondade<br />

e simpatia, os atos de serviço e<br />

justiça têm um impacto mais abrangente,<br />

proclamando que as dores e<br />

feridas que estamos empenhados em<br />

tratar não são o desejo Deus. Quando<br />

as pessoas questionam por que<br />

razão Deus permite o sofrimento, nós<br />

procuramos cooperar para o aliviar.<br />

Podemos não ser capazes de resolver<br />

todos os problemas dos que vivem<br />

nas nossas comunidades, mas ao<br />

trabalharmos com Deus com este objetivo,<br />

podemos mudar as suas vidas.<br />

42<br />

No poder da ressurreição e na humildade<br />

de Jesus, servir os outros e<br />

procurar o seu bem é uma das formas<br />

como podemos mostrar como Deus é<br />

realmente, quando Ele pode ser obscurecido<br />

pelas coisas erradas que<br />

vemos à nossa volta: “Rebuscai o céu<br />

e a terra, e não existe aí uma verdade<br />

mais poderosa do que aquela que se<br />

manifesta em obras de misericórdia<br />

aos que necessitam de nossa simpatia<br />

e auxílio. Este é a verdade tal<br />

como se encontra em Jesus” (Ellen<br />

White, Pensamentos Sobre o Sermão<br />

da Montanha, pg. 137).


Beleza<br />

Acreditamos que Deus recreará o<br />

nosso mundo em perfeição e beleza,<br />

por isso temos de desempenhar o<br />

nosso papel como mordomos da criação<br />

e co-criadores da beleza e, mais<br />

uma vez, começar a viver de maneira<br />

consistente com o que mundo será.<br />

Na história, Breath, escrita por Tim<br />

Winton, um escritor australiano, uma<br />

das suas personagens descreve a sua<br />

primeira impressão do surf: “Como<br />

menino eu não conseguia encontrar<br />

as palavras certas para o descrever,<br />

mas mais tarde compreendi o que<br />

captou a minha imaginação naquele<br />

dia. Que estranho era ver o homem<br />

fazer algo bonito. Algo inútil e elegante,<br />

como se ninguém visse ou se<br />

preocupasse … Nós nunca falamos<br />

sobre a questão da beleza … mas<br />

para mim continua a ser um sentimento<br />

proibido fazer alguma coisa<br />

graciosa, como se dançar na água<br />

fosse a melhor e a mais corajosa ação<br />

que um homem pode empreender.”<br />

Mas ao descrever o surf como “inútil<br />

e elegante” talvez Winton tenha<br />

perdido de vista a questão da beleza,<br />

ou seja, de que num mundo criado e<br />

amado por Deus, a beleza nunca é inútil.<br />

Começando com uma criação em<br />

que tudo era “muito bom” (Génesis<br />

1:31), passando pela poesia do Velho<br />

Testamento que exalta as maravilhas<br />

do Criador e até Jesus que chamava a<br />

43<br />

atenção para as flores do campo (ver<br />

Mateus 6:28-30), a beleza é sempre<br />

um vislumbre do poder, da bondade<br />

e do amor de Deus, e um consciente<br />

reconhecimento do belo um degrau<br />

em direção à comunhão com esta<br />

realidade.<br />

A relevância do conceito de beleza é a<br />

razão pela qual o teólogo N. T. Wright<br />

aponta o belo como um elemento<br />

chave do que a igreja devia procurar<br />

ser no mundo hoje: “A igreja precisa<br />

de despertar o seu desejo pelo belo a<br />

todos os níveis. Isto é essencial e urgente.<br />

É essencial para a vida cristã<br />

que possamos celebrar a excelência<br />

da criação, refletir sobre a presente<br />

destruição, e na medida do possível,<br />

celebrar antecipadamente a cura do<br />

mundo, a recriação de que será alvo”<br />

(Simply Christian).


Como um primeiro passo, precisamos<br />

de encontrar meios para encorajar a<br />

arte nas suas várias formas nas nossas<br />

igrejas e comunidades. Os halls<br />

ou salas das nossas igrejas podem<br />

ser espaços de exposição e a nossa<br />

adoração pode ser mais do que cantar<br />

e falar. Os nossos artistas precisam<br />

das nossas orações e do nosso<br />

apoio prático. O nosso compromisso<br />

com a comunidade pode incluir a partilha<br />

de projetos de criatividade e de<br />

embelezamento. Necessitamos de<br />

criar espaços para os nossos pintores<br />

e fotógrafos, escultores e poetas,<br />

escritores e realizadores, músicos e<br />

contadores de histórias, bailarinos e<br />

atores, encadernadores e artesãos,<br />

desenhadores e animadores. Como<br />

consequência, os nossos artistas<br />

têm de ser sérios e cheios de júbilo,<br />

honestos, redentores e otimistas.<br />

Por outro lado a nossa compreensão<br />

de beleza também necessita de se<br />

expandir para além das artes para<br />

envolver muitas outras áreas que<br />

parecem já não ter nada de novo. A<br />

beleza também é criada pelos jardineiros<br />

e cozinheiros, pelos construtores<br />

e domésticas, pelos agricultores,<br />

pelos auxiliares e conselheiros,<br />

pelos surfistas e exploradores, pelas<br />

nossas mães e amigos. E todos nós<br />

fazemos parte disso: há um compromisso<br />

e uma contribuição real com<br />

a beleza, em qualquer momento em<br />

que reconhecemos e apreciamos<br />

algo bonito. Portanto, quando assinalamos<br />

ou partilhamos beleza com<br />

44<br />

“É essencial<br />

para a vida<br />

cristã que possamos<br />

celebrar<br />

a excelência da<br />

criação, refletir<br />

sobre a presente<br />

destruição, e na<br />

medida do possível,<br />

celebrar<br />

antecipadamente<br />

a cura do<br />

mundo, a recriação<br />

de que será<br />

alvo.”<br />

o outro, tornamo-nos evangelistas<br />

da beleza e deste modo agentes do<br />

reino de Deus. Como seres humanos,<br />

destas de muitas outras formas nós<br />

temos capacidade criativa porque<br />

Deus criou, continua a criar e irá recriar<br />

um mundo onde a beleza nunca<br />

será inútil: “Ele circundou-vos de<br />

beleza a fim de ensinar-vos que não<br />

fostes colocados na Terra apenas<br />

para labutar pelo próprio eu, cavar<br />

e construir, trabalhar muito e correr,<br />

mas tornar a vida luminosa, feliz e<br />

bela com o amor de Cristo – como as


o outro, tornamo-nos evangelistas<br />

da beleza e deste modo agentes do<br />

reino de Deus. Como seres humanos,<br />

destas de muitas outras formas nós<br />

temos capacidade criativa porque<br />

Deus criou, continua a criar e irá recriar<br />

um mundo onde a beleza nunca<br />

será inútil: “Ele circundou-vos de<br />

beleza a fim de ensinar-vos que não<br />

fostes colocados na Terra apenas<br />

para labutar pelo próprio eu, cavar<br />

e construir, trabalhar muito e correr,<br />

mas tornar a vida luminosa, feliz e<br />

bela com o amor de Cristo – como as<br />

flores – alegrando a vida dos outros<br />

mediante o ministério do amor ” (Ellen<br />

White, Pensamentos Sobre o Sermão<br />

da Montanha; pg. 97). Isto inclui<br />

a criação ou o reconhecimento da<br />

beleza que de outra maneira poderíamos<br />

ser tentados a considerar como<br />

sem importância. No meio da dor, dos<br />

temores e dores da vida, talvez “dançar<br />

na água” (como os surfistas) – ou<br />

quaisquer que sejam os nossos dons<br />

criativos ou paixões – esteja entre as<br />

melhores e mais corajosas coisas que<br />

um cristão pode fazer.<br />

45<br />

Partilhando o Convite<br />

É neste contexto de servir Deus e servir<br />

os outros através da procura por<br />

justiça e beleza, que a nossa missão<br />

se torna algo diferente. N. T. Wright<br />

coloca esta ideia nos seguintes termos:<br />

“Se estamos envolvidos no trabalho<br />

em prol de uma nova criação,<br />

em procurar trazer sinais do novo<br />

mundo de Deus para o presente, em<br />

justiça e beleza e de um milhão de<br />

outras formas, então o que sobressairá<br />

será o chamado pessoal do<br />

evangelho de Jesus a cada criança,<br />

mulher e homem” (Surprised by<br />

Hope). Esta é uma maneira diferente<br />

de compreender a nossa missão. E<br />

que tal se entendessemos o evangelismo<br />

como um gracioso convite para<br />

aderir ao tipo de vida que Jesus viveu<br />

e que se foca em trabalhar para criar e<br />

celebrar a justiça e a beleza no nosso<br />

mundo hoje e no mundo que Deus<br />

prometeu recrear?<br />

É evidente que a ressurreição e a redenção<br />

final da criação são obra de<br />

Deus, mas a missão da igreja tem a<br />

ver com a participação nessa vida,<br />

agora, entre nós como comunidade<br />

de fé e como família de Deus, e nas<br />

várias funções que desempenhamos<br />

na nossa igreja. E a partir dela,<br />

este tipo de vida e esperança devem<br />

ser derramadas nas nossas comunidades<br />

alargadas, famílias, locais de<br />

trabalho e em todos os nossos relacionamentos.<br />

Não é necessariamente


fácil, mas Paulo assegura-nos que de<br />

uma maneira ou de outra os atos de<br />

bondade, de justiça, de beleza, e de<br />

evangelismo realizados nesta vida<br />

são importantes e de algum modo<br />

contribuem mesmo para construir o<br />

reino de Deus no nosso mundo e no<br />

futuro que pertence a Deus.<br />

Quase paradoxalmente, a nossa<br />

compreensão da ressurreição – significando<br />

que nos podemos dar ao<br />

luxo de perder – também significa<br />

que não vamos perder. I Coríntios 15<br />

é um dos capítulos mais profundos<br />

do Novo Testamento sobre o significado<br />

da ressurreição e da esperança<br />

que ela nos comunica. É um grandioso<br />

e às vezes mesmo nobre discurso<br />

filosófico, mas Paulo termina com<br />

uma notável nota prática: “Portanto,<br />

meus amados irmãos, sede firmes<br />

e constantes, sempre abundantes<br />

na obra do Senhor, sabendo que, no<br />

Senhor, o vosso trabalho não é vão”<br />

(I Coríntios 15:58).<br />

a) Por que razão achas que os cristãos<br />

algumas vezes negligenciam os chamados<br />

bíblicos para buscar e criar justiça e<br />

beleza no mundo?<br />

b) O que mais poderias fazer para criar<br />

justiça e beleza na tua igreja e na tua<br />

comunidade?<br />

Viver como parte do reino de Deus<br />

coloca-nos fora de sintonia com o<br />

mundo à nossa volta, de maneira<br />

positiva. Mas isso também pode ser<br />

difícil. Quando servimos os outros,<br />

arriscamo-nos a nós mesmos e a<br />

sermos desapontados. Podemos ficar<br />

frustrados ao trabalharmos em<br />

prol da justiça. As nossas tentativas<br />

de criatividade e beleza podem não<br />

parecer grande coisa, mas quando<br />

trabalhamos em harmonia com o reino<br />

de Deus e no poder da ressurreição,<br />

nada do que façamos é em vão.<br />

??<br />

PERGUNTAS PARA DEBATE<br />

46<br />

c) Com que atividades, projetos ou<br />

ministérios já estás envolvido e<br />

que contribuem para a justiça e/ou<br />

beleza em larga ou pequena escala,<br />

mesmo que ainda não tivesses<br />

pensado neles desta maneira?


SEXTA<br />

15 Mar<br />

Uma das críticas que há muito<br />

é feita às religiões, e talvez ao<br />

Cristianismo em particular, é a<br />

tendência para desviar a atenção dos<br />

crentes da vida aqui e agora e direcioná-la<br />

para o desejo por algo melhor<br />

numa vida futura, qualquer que<br />

seja a sua definição. A crítica é que<br />

o foco noutra esfera da vida torna-se<br />

numa espécie de “fuga santa” que<br />

torna os crentes menos benéficos ao<br />

mundo e à sociedade em que vivem<br />

neste momento. Segundo esta linha<br />

de pensamento, a promessa de um<br />

mundo melhor tende a entorpecer a<br />

sensibilidade dos crentes quanto às<br />

alegrias e tristezas desta vida. E temos<br />

de admitir que muitas vezes os<br />

crentes se colocaram à mercê destas<br />

críticas, talvez até cultivando,<br />

pregando e pondo em prática este<br />

tipo de atitudes. Há muitas histórias<br />

de crentes sinceros que, de tão sobrecarregados<br />

com a ideia de santidade<br />

e do eminente fim do mundo, afastaram-se<br />

voluntariamente de uma vida<br />

ativa a fim de garantirem a sua perfeição<br />

e preparação.<br />

FUGA OU<br />

MOTIVAÇÃO?<br />

Mateus 25:1-46| Lucas 1:46-55 |<br />

47<br />

Promessas que Mudam Hoje<br />

Talvez o Cristianismo esteja mais exposto<br />

a este menosprezo pela vida<br />

terrena devido ao forte enfoque que a<br />

Bíblia apresenta em relação à promessa<br />

da Segunda Vinda de Cristo e à esperança<br />

da vida eterna num mundo<br />

recriado de forma perfeita. E é verdade<br />

portanto que há um elemento<br />

de fuga nesta promessa. Nesta cosmovisão,<br />

o nosso mundo é um lugar<br />

caído, quebrantado e trágico, e seria<br />

absurdo não haver quem ansiasse por<br />

um mundo transformado. Como escrevia<br />

o apóstolo Paulo, toda a criação<br />

“geme” por uma recreação e “Não só<br />

ela, mas nós mesmos, que temos as<br />

primícias do Espírito, também gememos<br />

em nós mesmos, aguardando<br />

a adoção, a saber, a redenção do nosso<br />

corpo” (Romanos 8:23). Portanto,<br />

um elemento do que pode ser criticado<br />

como fuga é afinal apropriado para<br />

aqueles que abraçam estas promessas.<br />

Não há nada de errado ou desajustado<br />

em ansiar pelo tempo em que<br />

Deus vai consertar este mundo, pôr<br />

fim à injustiça, ao sofrimento e substituir<br />

o atual caos pela Sua Glória e<br />

pelo seu Reino de Justiça.


No Seu sermão sobre o fim do mundo,<br />

Jesus passou a primeira metade do<br />

discurso – tal como temos registado<br />

em Mateus 24 e 25 – dando detalhes<br />

sobre a necessidade de fugir, chegando<br />

mesmo ao ponto de dizer que “se<br />

aqueles dias não fossem abreviados,<br />

ninguém se salvaria” (Mateus 24:22).<br />

Mas esta afirmação deve ser vista essencialmente<br />

como uma introdução<br />

à Sua explicação sobre significado<br />

destas promessas de Deus. Focar apenas<br />

– ou mesmo em primeiro lugar<br />

– a vertente de “fuga” da esperança<br />

Cristã em relação ao futuro é uma<br />

abordagem incompleta, seja feita<br />

pelos cristãos ou pelos seus críticos.<br />

Mesmo em Mateus 24 Jesus repete a<br />

advertência para uma vida de vigilância<br />

à luz da promessa do Seu retorno,<br />

e expande esta ideia na segunda<br />

parte do sermão de Mateus 25, com<br />

três histórias que se focam na forma<br />

como o crente deve viver enquanto<br />

aguarda por Jesus. Fica portanto claro<br />

que esta espera pelo Mestre não é<br />

passiva ou um mero escape, mas que<br />

ao contrário requer um envolvimento<br />

ativo com a vida, com os outros e com<br />

o mundo que nos rodeia.<br />

A primeira destas três histórias<br />

é a das 10 virgens (ver Mateus 25:1-<br />

13). Esta parábola centra-se na necessidade<br />

de construir recursos e<br />

resiliência espirituais nas nossas<br />

vidas diárias, preparando-nos para<br />

a vida nesta Terra e finalmente para<br />

celebrar e viver com Deus quando o<br />

48<br />

mundo for recreado. Mas a ênfase é<br />

no dever presente em face da espera<br />

pelo regresso do “noivo”.<br />

A segunda história de Jesus é a<br />

parábola dos três servos, conhecida<br />

como a parábola dos talentos (ver<br />

Mateus 25:14-30). Três homens recebem<br />

diferentes valores em dinheiro<br />

– representando os recursos materiais<br />

e as oportunidades que todos<br />

recebemos em diferentes medidas<br />

– e são deixados a trabalhar como<br />

representantes do seu senhor até<br />

que ele volte. Aquando do regresso<br />

do senhor, eles devem prestar contas<br />

pelo uso que fizeram do que lhes foi<br />

confiado. Dois dos servos fizeram um<br />

bom trabalho, mas o terceiro porque


tinha medo de usar os dons ao seu<br />

dispor ficou à mercê da repreensão do<br />

seu senhor e foi por isso expulso da<br />

sua presença. Mais uma vez a ênfase<br />

da história é o tempo entre a partida<br />

e o regresso do Senhor, e o uso feito<br />

dos recursos e oportunidades que Ele<br />

coloca em nossa posse.<br />

A terceira história é normalmente<br />

designada por parábola das ovelhas<br />

e dos bodes mas não tem nada a ver<br />

com separação ou contagem de gado<br />

(ver Mateus 25:31-46). Resumindo o<br />

seu significado, esta parábola é uma<br />

exortação sobre a importância de<br />

como vivemos agora, como nos tratamos<br />

uns aos outros e como tratamos<br />

os menos afortunados. Este é o clímax<br />

do sermão de Jesus. No princípio<br />

de Mateus 24 os seguidores de Jesus<br />

perguntaram-lhe “Quando saberemos<br />

que o mundo está a chegar ao<br />

fim e que vais regressar segundo a<br />

promessa?” – ao que Jesus no fundo<br />

responde “O mais importante é como<br />

vivem no momento presente e como<br />

tratam as pessoas enquanto aguardam<br />

a minha vinda!”<br />

Em vez de ser vista como uma fuga<br />

egocêntrica, a promessa da Segunda<br />

Vinda de Cristo e de um mundo recriado<br />

deve ser um chamado a um<br />

estilo de vida diferente, de serviço e<br />

de relacionamento com os que estão<br />

ao nosso redor. A promessa de Jesus<br />

“enche o presente de uma esperança<br />

revigorada. Porque o futuro enche o<br />

presente de propósito e significado,<br />

49<br />

presente de propósito e significado,<br />

nós damo-nos às necessidades dos<br />

outros e contribuímos mesmo para a<br />

remodelação da sociedade. A esperança<br />

cristã tem sérias consequências<br />

sociais … Nós olhamos para trás em<br />

busca das promessas que nos foram<br />

feitas, olhamos para o futuro na expetativa<br />

do seu cumprimento e agimos<br />

hoje à luz do que ainda está para<br />

vir” (Peter Jensen, The Future of Jesus).<br />

Vivendo à Luz da Esperança<br />

A verdade é que aquilo em que<br />

acreditamos em relação ao futuro<br />

tem implicações importantes na<br />

forma como vivemos no presente.<br />

Desmentindo a caricatura do crente<br />

que está apenas focado numa vaga<br />

bem-aventurança que há de vir, uma<br />

dependência saudável das promessas<br />

de Deus acerca do futuro que Ele<br />

tem preparado para o nosso mundo<br />

deve ser o catalisador para um envolvimento<br />

energético, a centelha<br />

para uma vida rica, profunda e que<br />

faz a diferença para os outros.<br />

Por definição, <strong>Adventista</strong>s – pessoas<br />

que aguardam a vinda e o reino de<br />

Jesus Cristo – são pessoas de esperança.<br />

Mas esta esperança não é sobre<br />

um qualquer ponto distante de luz.<br />

Quase contra-intuitivamente, os efeitos<br />

da esperança são mais visíveis no<br />

dia de hoje do que no amanhã. É verdade<br />

que a esperança olha para o fu-


turo, mas uma compreensão adequada<br />

do que é a esperança transforma o<br />

presente. Com este tipo de esperança<br />

começamos a viver agora, enquanto<br />

esperamos o que o futuro nos trará, e<br />

começaremos a trabalhar para fazer<br />

a diferença no mundo de hoje, de formas<br />

que se encaixem na visão que<br />

temos do que o mundo vai ser um<br />

dia. E este impulso é inegavelmente<br />

de cariz prático. Porque acreditamos<br />

que a intenção justa de Deus acabará<br />

por se tornar a realidade final para<br />

a humanidade, faz sentido para nós<br />

praticar esta forma de viver agora e<br />

ordenar as nossas vidas de tal maneira<br />

que ela se torne real. É também<br />

algo que o povo de Deus deve escolher,<br />

sendo ele constituído por aqueles<br />

que desejam viver nos caminhos<br />

de Deus agora. Se o que acontece<br />

“aos mais pequeninos” (Mateus<br />

25:40, 45) é importante para Deus,<br />

então isso tem de ser importante<br />

para aqueles que são o Seu povo.<br />

50<br />

E porque sabemos que as estruturas<br />

do poder político, económico, cultural<br />

e social que perpetuam a injustiça<br />

em todas as suas formas, serão derrubadas,<br />

somos chamados a viver<br />

de tal forma que a nossa postura de<br />

serviço, a forma como perdoamos e<br />

como amamos esteja em flagrante<br />

contraste com o mundo que está ao<br />

nosso redor. Através da nossa vida,<br />

presença, testemunho e influência,<br />

buscamos desfazer o mal no nosso<br />

mundo. Sabemos que estas forças e<br />

sistemas - bem como a nossa participação<br />

e os benefícios que deles obtemos<br />

– são forçosamente temporários<br />

e que não importa o quão impressionantes<br />

possam parecer, eles não<br />

terão a palavra final.<br />

Há um elemento de fuga nas promessas<br />

da segunda vinda de Jesus. Num<br />

mundo com tanta dor e tristeza, é<br />

mais do que necessário olhar para o<br />

futuro e antecipar um lugar melhor.


De acordo com as promessas de Deus<br />

esse lugar virá, mas ainda não está<br />

aqui, e logo, essas promessas mudam<br />

a forma como vemos o dia de<br />

hoje e fortalecem a nossa ação. As<br />

promessas de Deus desafiam-nos a<br />

um envolvimento maior com o nosso<br />

mundo, a fazer o que estiver a nosso<br />

alcance para enfrentar as injustiças<br />

que vemos à nossa volta, a curar as<br />

feridas dos nossos semelhantes, a<br />

cuidar do mundo, a celebrar a bondade<br />

que ainda podemos testemunhar<br />

e a compartilhar a esperança que<br />

estas promessas nos dão. Por mais<br />

vacilantes e pequenos que os nossos<br />

esforços possam ser, nós cooperamos<br />

com Deus para começar o processo de<br />

recreação do mundo que um dia, finalmente,<br />

Ele acabará de forma gloriosa.<br />

Quando Jesus disse: “Vou e voltarei<br />

a vós” (João 14:28), Ele também<br />

estava a dizer aos seus seguidores:<br />

“Vivam como se isso fosse verdade<br />

hoje e isso vai fazer a diferença.”<br />

A Esperança do Julgamento<br />

Para realmente apreciarmos o impacto<br />

das promessas de Deus e para<br />

sermos motivados a viver fielmente<br />

de forma a fazermos a diferença,<br />

talvez tenhamos que tentar ver o<br />

mundo como Deus o vê. Quando o julgamento<br />

é descrito na Bíblia, a maior<br />

ênfase é colocada sobre a bondade e<br />

a esperança dos juízos de Deus. Em<br />

Reflections on the Psalms (Reflexões<br />

sobre os Salmos), CS Lewis nota<br />

51<br />

que os escritos bíblicos dos Salmos<br />

e dos Profetas “estão cheios de desejo<br />

pelo julgamento, e consideram<br />

o anúncio de que a sentença vem<br />

como uma boa notícia.” Trata-se da<br />

voz dos oprimidos e esquecidos, que<br />

clamam a fim de que os erros sejam<br />

corrigidos e de que as suas queixas<br />

sejam ouvidas. É também um alerta<br />

de que alguém devia tomar nota dos<br />

erros cometidos no nosso mundo, e<br />

ao mesmo tempo um lembrete de<br />

quem é esse Alguém. Se é verdade<br />

que o sofrimento, a opressão e a tragédia<br />

são difíceis de suportar, o dano<br />

e a ofensa são ainda maiores mesmo<br />

que pareçam de menor valor e pouco<br />

visíveis. Uma possível desvalorização<br />

do sofrimento é uma carga mais<br />

pesada do que o próprio peso que o<br />

sofrimento representa. Um mundo<br />

sem memória ou consequências é a<br />

última palavra em cruel absurdo.<br />

Este é o argumento essencial do livro<br />

bíblico do Eclesiastes, um livro que<br />

dificilmente se encaixa em muitas<br />

das tentativas comuns de formulação<br />

de fé. O clamor do filósofo de:<br />

“Vaidade! Vaidade!”, ecoa nas páginas<br />

deste escrito antigo, à medida<br />

que, ponto por ponto, os vários aspetos<br />

da vida como a conhecemos são<br />

considerados como indignos do esforço.<br />

Riqueza, trabalho, sabedoria,<br />

e prazer, são todos descartados como<br />

sem sentido. Mesmo a diferença entre<br />

o bem e o mal é observado como<br />

muitas vezes de pouco valor: “Ainda


há outra vaidade sobre a terra: há<br />

justos a quem acontece segundo as<br />

obras dos ímpios, e há ímpios a quem<br />

acontece segundo as obras dos justos.<br />

Digo que também isto é vaidade”<br />

(Eclesiastes 8:14).<br />

Mas no final da sua reflexão, o pensador<br />

tem um aparente volte face.<br />

No meio das muitas “vaidades”, ele<br />

diz: Espera um minuto! Deus vai julgar<br />

e por isso nem tudo é sem sentido.<br />

Na verdade, agora tudo e todos<br />

são importantes. E por isso fala de “<br />

temer a Deus e guardar os Seus mandamentos”,<br />

que significa amar e honrar<br />

a Deus, e aprender a fazer o que é<br />

reto e a buscar a bondade (ver Eclesiastes<br />

12:13, 14). A esperança do julgamento<br />

resume o que acreditamos<br />

sobre a essência da natureza Deus,<br />

da vida e do mundo em que vivemos.<br />

A Bíblia ensina que vivemos num<br />

mundo criado e amado por Deus mas<br />

que seguiu o rumo errado e por isso<br />

Deus está empenhado num plano<br />

de recreação, fundamentalmente<br />

através da vida e morte de Jesus.<br />

Tal como entendemos a história do<br />

nosso mundo, a humanidade falhou<br />

e por isso muitas pessoas se veem<br />

envolvidas na imperfeição e na miséria<br />

que resultam das vitórias do mal.<br />

Assim, o julgamento de Deus é um<br />

elemento fundamental no Seu plano<br />

de corrigir este mundo. Para aqueles<br />

que têm sido vítimas dos muitos<br />

males do mundo, o julgamento é<br />

uma boa notícia. E nós só deixaremos<br />

52<br />

de apreciar esta esperança se falharmos<br />

em ouvir as vozes e ver com os<br />

olhos daqueles que são marginalizados,<br />

violentados e explorados.<br />

“Porque Deus há de trazer a<br />

juízo toda a obra, e até tudo<br />

o que está encoberto, quer<br />

seja bom, quer seja mau“<br />

Mas não é apenas esta perspetiva<br />

que nos dá uma renovada apreciação<br />

da esperança do julgamento, esta esperança<br />

muda também a nossa visão<br />

sobre os outros. “As pessoas que<br />

acreditam que Deus vai virar o mundo<br />

do avesso – pessoas como Maria,<br />

com o seu Magnificat, rebaixando<br />

os poderosos dos seus tronos e exaltando<br />

os humildes e mansos – (ver<br />

Lucas 1:46-55), não vão virar as costas<br />

à promoção de uma mudança no<br />

mundo, agora” (NT Wright, Surprised<br />

By Hope). Ao olharmos em frente<br />

para a promessa de Deus em julgar<br />

o mundo e ao nos juntarmos à Sua<br />

missão de o restaurar para sempre,<br />

a esperança do julgamento começa a<br />

mudar o mundo no tempo presente,<br />

mesmo se por enquanto apenas por<br />

vislumbres e de formas aparentemente<br />

insignificantes. Começar a ver<br />

o mundo do ponto de vista de Deus<br />

é a maior mudança de perspetiva que<br />

podemos experimentar. Como David<br />

James Duncan conclui em seu posfácio<br />

à edição do 20.º aniversário da sua


obra The River Why, (O Rio Porquê)<br />

este tipo de fé e a compreensão dos<br />

propósitos de Deus para o nosso<br />

mundo devem ser o fundamento do<br />

nosso estilo de vida: “Sabendo que<br />

é impossível fugir à justiça e que ela<br />

não está nas mãos dos Homens, eu<br />

quero finalmente perguntar, porquê<br />

julgar? Porquê ter ódio ou raiva? Por<br />

que não apenas servir, onde, como<br />

e por quanto tempo e com quanta<br />

gratidão pudermos, passo a passo,<br />

de coração a coração? “<br />

53<br />

PERGUNTAS<br />

PARA DEBATE<br />

a) Na tua opinião por que razão os<br />

Cristãos são por vezes criticados<br />

por serem pouco preocupados com<br />

o que passa à sua volta? Será esta<br />

uma crítica justa?<br />

b) De que formas a tua crença na<br />

Segunda Vinda de Jesus te motiva<br />

a servir os outros?<br />

c) Por que razão podemos olhar<br />

para as promessas de julgamento<br />

de Deus como boas notícias?<br />

Ou para ti elas soam mais como<br />

ameaças?


SÁBADO<br />

16 Mar<br />

A<br />

declaração oficial das “Crenças<br />

Fundamentais dos <strong>Adventista</strong>s<br />

do Sétimo Dia” precisa de<br />

pouco mais de 4000 palavras. Destas,<br />

apenas parte de uma frase – num<br />

total de 11 palavras, mais a sua referência<br />

Bíblica – se relacionam com “os<br />

três anjos de Apocalipse 14”. Mesmo<br />

as próprias mensagens dos três anjos<br />

não são mais do que meia dúzia<br />

de frases no meio de toda a história,<br />

profecias, símbolos, drama, avisos e<br />

promessas do Apocalipse. Mas basta<br />

circular por muitas das nossas igrejas<br />

e rapidamente se percebe que estes<br />

“três anjos” são mais significativos<br />

para a nossa identidade e missão do<br />

que se poderia imaginar. Desde vitrais<br />

nas janelas dos nossos maiores templos<br />

até boletins de igreja fotocopiados<br />

até à exaustão, de velhos letreiros<br />

de igreja até aos mais recentes<br />

logos, o símbolo dos três anjos é uma<br />

imagem recorrente do Adventismo<br />

ao redor do globo. Os três anjos são<br />

igualmente parte da história e herança<br />

da nossa igreja. Mais de cinquenta<br />

anos depois do inicial sentido de<br />

urgência da mensagem que despertou<br />

o movimento <strong>Adventista</strong>, Ellen<br />

White insistia na contínua relevância<br />

A “HISTÓRIA”<br />

DOS 3 ANJOS<br />

Apocalipse 14:6-12 | Apocalipse 18:1-8 |<br />

54<br />

dos três anjos: “todas as três mensagens<br />

devem ainda ser proclamadas .<br />

É simplesmente tão essencial agora<br />

como antes que elas sejam repetidas<br />

aos que estão buscando a verdade”<br />

(Mensagens Escolhidas, Vol. 2, pg.<br />

104,105). E a proclamação das mensagens<br />

dos três anjos continua a ser<br />

central para a missão da Igreja <strong>Adventista</strong>.<br />

Mas como em muitas outras áreas<br />

da nossa vida e crenças espirituais,<br />

a frequência da sua utilização pode<br />

torná-las num mero cliché, e pela<br />

força da repetição a sua proclamação<br />

perder urgência e a “verdade presente”<br />

ser alvo de uma compreensão<br />

cristalizada. Portanto, se uma coisa<br />

é importante para nós, precisamos<br />

com frequência de passar tempo


pensando nela, recolocando-nos as<br />

mesmas questões de sempre e acrescentando<br />

novos questionamentos.<br />

Sem necessariamente abandonar a<br />

compreensão que herdámos, também<br />

precisamos de voltar aos textos Bíblicos<br />

para ver se há algo que tenha escapado<br />

à nossa atenção, algo mais que<br />

possamos acrescentar à visão global<br />

que temos da mensagem de Deus<br />

para nós. E precisamos igualmente de<br />

relê-las como parte do enquadramento<br />

Bíblico mais alargado do plano de<br />

Deus para o nosso mundo e em particular<br />

para o Seu povo neste mundo.<br />

Uma destas questões a propósito da<br />

mensagem dos três anjos é tão simplesmente<br />

por que razão os anjos<br />

aparecem num grupo de três. Claro<br />

que existem anjos antes e depois de<br />

Apocalipse 14:6-12, mas estes três<br />

anjos são expressamente introduzidos<br />

juntos, com três mensagens específicas<br />

que encaixam umas nas<br />

outras. Então por quê três? Uma<br />

possibilidade é que se trate de um<br />

recurso linguístico, que na Língua<br />

<strong>Portuguesa</strong> é conhecido como triplicação.<br />

Trata-se de uma maneira de<br />

contar uma história ou explicar uma<br />

verdade que usa uma tripla repetição<br />

da mesma ideia. Em muitas histórias<br />

vemos este padrão repetidas vezes.<br />

Na linguagem da lógica temos a tese,<br />

a antítese e a síntese. Se é verdade<br />

que alguns podem hesitar em fazer<br />

uma leitura dos três anjos a partir<br />

de um padrão “emprestado” da<br />

55<br />

gramática e da narração de histórias,<br />

devemos reconhecer que a Bíblia ela<br />

própria é primariamente uma história<br />

– a história de Deus e o Seu relacionamento<br />

com as pessoas, desde criação<br />

até à recriação –. Quando aprendemos<br />

a ler neste sentido, rapidamente<br />

reconhecemos que nós somos parte<br />

desta história. E é também nesta<br />

história que podemos envolver outros,<br />

ligando-os à história de Deus nas<br />

e pelas suas vidas.<br />

Anjo 1: Criados (Apocalipse 14:7)<br />

Um dos refrões recorrentes na história<br />

da Bíblia apresenta Deus apelando ao<br />

Seu povo para que se lembre dEle,<br />

que volte para Ele, que lhe dê a devida<br />

prioridade. Isto é em parte um<br />

reflexo da inconstância da natureza<br />

humana, pela qual estamos sempre<br />

necessitados de arrependimento e<br />

reforma, sempre a escorregar apesar<br />

das boas intenções. Mas serve também<br />

para nos lembrar de que Deus<br />

procura de formas sempre novas cada<br />

geração, vindo ao encontro das pessoas<br />

no tempo, lugar e circunstâncias<br />

nas quais elas se encontram em cada<br />

momento da história. Mas talvez<br />

seja também uma indicação de que<br />

os apelos que Deus faz às nossas vidas<br />

e ao nosso mundo sempre nos<br />

chamam a ir além dos compromissos<br />

e escolhas do momento, quaisquer<br />

que eles sejam e por melhores que<br />

possam ser. Esta ideia é particularmente<br />

reforçada na medida em que


o apelo a “Temer a Deus e dar-lhe<br />

Glória” é repetido pelo primeiro anjo<br />

de Apocalipse 14. O versículo 6 coloca<br />

esta mensagem no contexto do<br />

“evangelho eterno” – o que nos traz<br />

conforto e segurança, mas sem deixar<br />

espaço para a complacência – .<br />

O anjo chama-nos a continuamente<br />

aprendermos a viver, amar<br />

e louvar melhor.<br />

Por diversas vezes despendemos<br />

tanto tempo e energia nos “certos”<br />

e “errados” do louvor, esquecendo –<br />

como descreveu um músico – que o<br />

nosso louvor é para Deus como uma<br />

tela que Ele pinta com os Seus dedos.<br />

Deus agrada-se do louvor mas não por<br />

causa dos seus méritos, retidão ou<br />

valor artístico. Não é o que fazemos<br />

que torna as nossas interações com<br />

Deus especiais e de valor eterno, mas<br />

o que Deus fez: “Nisto está o amor,<br />

não em que nós tenhamos amado a<br />

Deus, mas em que Ele nos amou e<br />

enviou o Seu Filho como propiciação<br />

pelos nossos pecados” (1 João 4:10).<br />

Mas a pergunta como que se questiona<br />

a si mesma: Se toda a criação, redenção<br />

e recreação emanam de Deus<br />

e se, segundo a Bíblia, Deus tem passado<br />

toda a história da humanidade<br />

a tentar fazer-nos compreender isso<br />

mesmo, por que razão parece Ele estar<br />

tão preocupado em que lho digamos<br />

de volta? Se Deus é quem diz ser,<br />

porque está Ele tão preocupado em<br />

que o adoremos?<br />

56<br />

É claro que este apelo a adorar a Deus<br />

é na verdade mais uma expressão<br />

do Seu amor. Poucas pessoas com<br />

um mínimo de compreensão dos<br />

propósitos mais alargados de Deus<br />

argumentariam que o mundo não seria<br />

um lugar melhor se mais homens<br />

e mulheres realmente atendessem o<br />

chamado para temer e adorar a Deus.<br />

A luz que emana desta mensagem<br />

implica uma radical reinvenção da<br />

forma como interagimos uns com os<br />

outros e com o mundo à nossa volta.<br />

É por isso que o apelo é feito a “toda<br />

a nação, tribo, língua e povo” (Apocalipse<br />

14:6). Não se trata de fazer com<br />

que Deus se sinta melhor consigo<br />

mesmo, como se isso fosse sequer<br />

possível ou necessário, mas trata-se<br />

de Deus desejar o melhor para o Seu<br />

povo e a Sua criação. E neste sentido,<br />

a mensagem do primeiro anjo é<br />

também a afirmação de que o nosso<br />

mundo é, em essência, bom. Por mais<br />

escuro e caído que seja, o mundo<br />

ainda reflete a glória, a bondade e a<br />

grandeza de Deus. No mundo natural,<br />

nas culturas das nações, no melhor<br />

que a humanidade tem para oferecer,<br />

podemos perceber a impressão digital<br />

e os ecos do próprio Criador.<br />

Infelizmente, como povo de Deus<br />

nem sempre temos feito o melhor em<br />

ver e celebrar esta realidade presente<br />

e a expressão de Deus entre nós. O<br />

primeiro anjo de Apocalipse 14 convida-nos<br />

a esse melhor. “Para se defender<br />

a criação e se ser uma comunidade<br />

que dá vida é central a afirmação


de que quando Deus fez o mundo,<br />

disse que ele era ‘bom.’ E ele ainda o<br />

é (Rob Bell, Velvet Elvis, pg. 170). Assim<br />

– tal como chegou às gerações<br />

antes de nós, fundado na segurança<br />

do evangelho e com a urgência do julgamento<br />

– o anjo repete o chamado<br />

de Deus para O adorarmos como Criador,<br />

Senhor e Redentor, para o nosso<br />

bem, para o bem do nosso mundo e<br />

na demanda pelo bem final.<br />

Anjo 2: Caídos (Apocalipse 14:8)<br />

No seu livro Life After God (A vida<br />

depois de Deus), Douglas Coupland<br />

tem um dos seus narradores a descrever<br />

as imagens televisivas de um<br />

zoológico em Miami, na Florida, no<br />

rescaldo das cheias provocadas por<br />

uma furacão: “Havia imagens de patos<br />

e aves altas e elegantes nadando<br />

no meio dos destroços, se bem que<br />

eles não sabiam que eram destroços.<br />

Era apenas o mundo” (pg. 85). Nestas<br />

palavras ele descreve a mesma<br />

situação em que nos encontramos. A<br />

maior parte do tempo, como que nadamos<br />

tranquilamente no meio dos<br />

destroços do mundo em que vivemos.<br />

Olhamos para o sofrimento, a tragédia,<br />

a dor e o mal pelos quais estamos<br />

rodeados e somos tentados a assumir<br />

que o “o mundo é assim mesmo”.<br />

De facto, parece-nos quase impossível<br />

imaginar a vida sem a presença<br />

e a influência do mal. Começamos a<br />

olhar o mal como um dado adquirido,<br />

ignorando o facto de que muitas das<br />

57<br />

coisas com que estamos pelo menos<br />

superficialmente confortáveis estão<br />

profundamente erradas. Depois somos<br />

de vez em quando surpreendidos<br />

por uma manifestação mais clara<br />

que nos lembra dos terríveis danos<br />

que o mal tem feito ao nosso mundo.<br />

Uma perda ou tristeza pessoal, uma<br />

tragédia nacional, um desastre humanitário<br />

ou algum evento de grande<br />

violência que põe a nu o quão caído e<br />

quebrantado ele está.<br />

É para esta realidade que a mensagem<br />

do segundo anjo do Apocalipse chama<br />

a nossa atenção. Nem tudo está bem<br />

com mundo. Na verdade, algo está<br />

desesperada, perigosa e diabolicamente<br />

mal. A história começa com um<br />

mundo criado de forma extraordinariamente<br />

boa por um Deus grandioso<br />

e cheio de amor, mas o mal irrompeu<br />

nesta história. Nós vivemos entre os<br />

destroços dessa história. E o resultado<br />

inevitável desta trajetória é o<br />

desespero total e autodestruição. No<br />

contexto da história do Evangelho (ver<br />

Apocalipse 14:6), é exatamente disto<br />

que precisamos de ser salvos. Se formos<br />

honestos reconheceremos esta<br />

natureza caída que é a nossa. É-nos<br />

muito fácil ver o mal em qualquer outro<br />

lugar, mas, antes de nos preocuparmos<br />

em corrigir os erros à nossa volta,<br />

devemos confessar as nossas próprias<br />

falhas e admitir que podemos ver pelo<br />

menos as sementes desse mesmo<br />

mal em nossos pensamentos e ações.


Mas esta história tem também implicações<br />

numa visão mais alargada<br />

do nosso mundo. Na presença do<br />

mal, as estruturas de poder do nosso<br />

mundo tendem a operar contra Deus,<br />

o Seu povo e as Suas intenções para<br />

este mundo. Os sistemas políticos,<br />

económicos, religiosos e sociais deste<br />

mundo inclinam-se naturalmente<br />

para a imperfeição. A opressão, a<br />

tragédia, a revolta e a injustiça da<br />

história da humanidade são os seus<br />

resultados mais visíveis. No entanto,<br />

os sistemas deste mundo pretendem<br />

igualmente roubar a nossa fidelidade,<br />

colocando-se na posição<br />

que pertence unicamente a Deus enquanto<br />

nosso Criador e Redentor. A<br />

Bíblia usa com frequência duas imagens<br />

para descrever a forma como o<br />

mal trabalha no mundo. Por um lado<br />

a prostituta ou adúltera, que sussurra<br />

sedutoramente tentando-nos a uma<br />

vida de prazeres egoístas, luxúria e<br />

de aproveitamento do melhor que<br />

o mundo tem a oferecer para nosso<br />

“benefício” e diversão pessoais. Por<br />

outro lado, a besta, que chama a atenção<br />

através de ameaças e mesmo<br />

usando a violência como meio de<br />

forçar a sua vontade, dando corpo a<br />

um regime no qual só os fortes sobrevivem<br />

e aqueles que não são de<br />

forma óbvia tão fracos para terem sequer<br />

qualquer valor.<br />

Mas uma outra voz chama desde o<br />

céu “Sai dela povo meu, para que não<br />

sejas participante dos seus pecados,<br />

58<br />

para que não incorras nas suas pragas”<br />

(Apocalipse 18:4). Deus não está<br />

a ameaçar, ao contrário, no Seu amor<br />

Ele alerta-nos para qual será o resultado<br />

final do mal. Em Sua misericórdia,<br />

o mal não será eterno. Quando<br />

somos tentados a ser complacentes<br />

com a horrível realidade do nosso<br />

mundo, o segundo anjo faz um apelo<br />

a que tenhamos consciência da decadência<br />

em que vivemos e a levantarmos<br />

os olhos para além dos destroços<br />

que tomamos como mundo e nos<br />

fixarmos no “evangelho eterno” que<br />

Deus proclama.


Anjo 3: Recriados (Apocalipse 14: 9-12)<br />

A história do primeiro e segundo anjos<br />

faz, em poucas palavras, uma distinção<br />

clara entre os apelos e o chamado<br />

de Deus, por um lado, e a decadência<br />

deste mundo e dos seus sistemas<br />

de poder, por outro, – entre o bem e<br />

o mal. A terceira parte desta história<br />

coloca-nos diante de uma escolha inequívoca:<br />

somos nós fiéis ao Reino de<br />

Deus ou aos reinos deste mundo? Somos<br />

nós parte do problema ou parte<br />

da solução de Deus?<br />

Em tantas ocasiões na história Bíblica<br />

Deus chama pessoas – e grupos<br />

de pessoas – a serem Seus agentes.<br />

Elas tornam-se participantes na contínua<br />

história do evangelho, e trabalham<br />

para o bem do mundo e para o<br />

bem do Reino de Deus no mundo,<br />

levantando-se a favor da verdade e<br />

da bondade mesmo diante da mais<br />

esmagadora maldade. Este é o chamado<br />

repetido pelo terceiro anjo de<br />

Apocalipse 14. E os resultados desta<br />

escolha são igualmente divergentes.<br />

Enquanto o povo de Deus é chamado<br />

a suportar e a permanecer firme diante<br />

dos desafios da vida, das provas<br />

e perseguições temporárias, o destino<br />

dos que escolhem o mal é sombrio.<br />

Com frequência evitamos pensar na<br />

“ira de Deus” ? À primeira vista essa<br />

ideia parece não encaixar na nossa<br />

compreensão do amor de Deus. Mas<br />

isso é um sintoma do quão familiarizados<br />

estamos com o mal. Confron-<br />

59<br />

tado com o horror da Guerra no seu<br />

país, um escritor comentava: “Chego<br />

à conclusão que teria de me insurgir<br />

contra um Deus que não ficasse<br />

irado diante da maldade que há no<br />

mundo. Deus não revela a Sua ira em<br />

substituição do Seu amor. Deus ira-se<br />

porque é amor” (Miroslav Volf, Free of<br />

Charge, pg. 139). Quando começamos<br />

a compreender a verdadeira natureza<br />

do mal, nós compreendemos que para<br />

que o bem reine completamente, o<br />

mal – e tragicamente todos os que<br />

o escolhem – devem ser destruídos<br />

completamente.<br />

O terceiro anjo do Apocalipse dános<br />

uma perspetiva de eternidade.<br />

É porque o mal – mesmo no seu pior<br />

– é apenas temporário, que somos<br />

chamados a nos erguermos contra ele<br />

em todas as suas formas. É interessante<br />

notar que o contraste apresentado<br />

pelo anjo não é entre ira e glória,<br />

mas entre ira e a presente perseverança<br />

e fidelidade. Isto indica que a<br />

nossa primeira preocupação não deve<br />

ser tanto “escapar”, mas sobretudo<br />

descobrir o que significa viver como<br />

povo de Deus que sabe manter-se<br />

fiel sejam quais forem os tempos e<br />

as circunstâncias que enfrenta. Algumas<br />

vezes o chamado a “perseverar”<br />

– a ser o “remanescente” – tem sido<br />

incorretamente interpretado como<br />

o apelo a uma exclusividade santificada<br />

e até a uma firme passividade.<br />

Mas em vez disso, este deve ser um<br />

chamado ao espírito de serviço, que


se traduz em procurar o bem dos outros<br />

não importa quem sejam e onde<br />

estejam, envolvidos pelo mal, pela injustiça<br />

e pela tragédia deste mundo.<br />

Talvez esta perseverança, guardando<br />

os mandamentos de Deus e seguindo<br />

o caminho de Jesus, deva até ser<br />

caracterizada por uma impaciência<br />

profética para com os poderes caídos,<br />

os sistemas e males do nosso mundo.<br />

Para o povo de Deus e para todos os<br />

povos e lugares onde chegue a sua<br />

influência, esse vindouro Reino de<br />

Deus começa agora. É claro que ele<br />

só estará completo quando o mundo<br />

for finalmente recreado pelo próprio<br />

Deus (ver Apocalipse 21: 1-5), mas nós<br />

somos chamados a ser agentes de<br />

restauração aqui e agora, alertando<br />

assim outros para a escolha eterna<br />

que também devem fazer. No contexto<br />

do “evangelho eterno” e da<br />

promessa Divina de julgamento, à luz<br />

da confiança que nos dá o evangelho<br />

e dos avisos contra a complacência e<br />

as muitas outras tentações do mal,<br />

somos chamados a procurar e a ficar<br />

do lado do bem e a servirmos como<br />

Jesus serviu (ver Lucas 4: 18,19)<br />

60<br />

“ ...Deus chama pessoas<br />

e grupos de pessoas a<br />

serem Seus agentes. Elas<br />

tornam-se participantes<br />

na contínua história do<br />

evangelho.”<br />

PERGUNTAS<br />

PARA DEBATE<br />

a) De que formas é esta abordagem<br />

à mensagem dos três anjos<br />

como uma “história”, diferente de<br />

outros sermões, artigos e livros<br />

que já leste acerca destes versículos?<br />

b) Que aspetos da missão e do<br />

serviço podemos ver nas mensagens<br />

dos três anjos?<br />

c) Quando pensas no significado<br />

de viver como povo de Deus<br />

na tua comunidade, quais te<br />

parecem ser os elementos mais<br />

relevantes?


Congresso Pan-Europeu de<br />

Jovens <strong>Adventista</strong>s [SÉRVIA]<br />

[Oradores] Matthew Gamble | David Asscherick |<br />

Gilbert Cangy | Patrick Johnson | Dejan Stojkovic |<br />

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Inscrição (tudo incluído) | 150€<br />

Viagem em grupo | 500€<br />

(podes marcar a tua própria viagem e<br />

juntar-te depois ao grupo na Sérvia)<br />

Inscrições até 15 de Maio<br />

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Onde? > Beja<br />

O quê? > Um evento<br />

nacional que vai juntar o<br />

desporto e o serviço !<br />

Quem? > Para toda a<br />

<strong>Juventude</strong> <strong>Adventista</strong>,<br />

de Tições a Seniores !<br />

INSCRIÇÕES ATÉ 01 DE MAIO


2013<br />

CALENDÁRIO J.A.<br />

16 MAR Dia Global da <strong>Juventude</strong> “Unidos na Compaixão”<br />

28-31 MAR | Acampamentos Regionais<br />

Escola de Formação JA (Nível I)<br />

| 12-14 ABR (Norte e Centro)<br />

| 3-5 MAI (Lisboa e Alentejo/Algarve)<br />

12-16 MAI | Escola de Formação JA para Pastores<br />

7-10 JUN | I Olimpíadas Solidárias JA<br />

29 JUN - 4 AGO | Congresso Europeu de Jovens(+ 16 anos)<br />

Acampamentos Nacionais<br />

| Rebentos: 12 -14 JUL<br />

| Tições: 21-28 JUL<br />

| Desbravadores: 1-11 AGO<br />

| Companheiros: 12-22 AGO<br />

| Impacto: 22 AGO- 1 SET<br />

21 SET | Jornadas Regionais JA<br />

Escola de Formação JA (Nível II)<br />

| 8-10 de NOV (Lisboa e Alentejo/Algarve)<br />

| 15 -17 NOV (Norte e Centro)

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