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DNA PAULISTANO - Rede Nossa São Paulo

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ORIGENS<br />

Saudades de lugares que eu não conheci<br />

Alguém de dentro do trem gritava para o maquinista "Pára! Pááára para o<br />

inglês!". O lugar ficou conhecido como a parada do inglês<br />

ROGÉRIO NUNES<br />

ESPECIAL PARA A FOLHA<br />

Tietê, era intenso o tráfego de pessoas, carroças, carros e bondes. Na beira do rio, alguns<br />

caboclos com linha e anzol fisgavam carás, lambaris e taraíras.<br />

Remadores se afastavam do Club Esperia, com seus barquinhos de regatas. Na outra<br />

margem, a algazarra das lavadeiras, rindo alto e rinhando com as crianças. Era<br />

admirável a brancura dos lençóis que quaravam na relva, em contraste com a água suja<br />

que a fábrica de papelão despejava dentro do rio.<br />

Mais adiante, dezenas de trabalhadores construíam uma ponte sobre o nada! Era a futura<br />

ponte das Bandeiras. Somente depois de concluída a obra é que o Tietê foi passar por<br />

debaixo dela, com a retificação de seu curso. Era o progresso... O ano era 1941, ou 42?<br />

A extensa faixa desabitada e alagadiça por onde o Tietê corria, sinuoso, era a fronteira<br />

entre dois mundos: de um lado a cidade, pulsante e próspera e, do outro, os bairros<br />

pobres, semi-rurais. Os reflexos do isolamento são sentidos até hoje, no brio das<br />

famílias que, tradicionalíssimas e um pouco antiquadas, são orgulhosas por habitarem,<br />

durante gerações, o mesmo bairro, a mesma rua, a mesma casa.<br />

O bonde seguia pela Voluntários da Pátria que, com seu comércio, já era o coração do<br />

bairro. O final da linha do bonde cruzava os trilhos do trem da Cantareira. Não<br />

demorava para o trem aparecer, sofrendo com a subida antes da estação Sant’Anna<br />

(naquele tempo, se escrevia assim). Uns desciam, outros subiam nos vagões de madeira<br />

lotados. Todos com roupas chamuscadas por fagulhas.<br />

Depois o trem subia a rua Alfredo Pujoll, soltando uma fumaça escura. Parava no<br />

quartel da Tropa Federal, hoje quartel do CPOR, onde um dia existiu a sede da fazenda<br />

Sant’Anna. O velho quartel, com as instalações da aeronáutica no Campo de Marte, a<br />

Academia do Barro Branco, o Decap e vários batalhões militares e delegacias, legaram<br />

à zona norte um viés militarista, inclinado à direita, perceptível nas conversas de boteco<br />

ou entre um pingado e outro nos balcões das padarias.<br />

O trem seguia serpenteando por entre morros, parando em estações incrustadas numa<br />

paisagem semi-rural, até chegar na Serra da Cantareira, onde a “italianada” do Brás ia<br />

fazer piqueniques aos domingos.<br />

A Cantareira e o seu parque foram um obstáculo natural ao crescimento ao norte.<br />

Enquanto a faixa urbana se estende de 35 km a 40 km a partir do centro, o Tremembé,<br />

no pé da Cantareira, está a somente 15 km da Praça da Sé, e ainda mantém ares de<br />

cidade do interior.<br />

Colonizado por imigrantes alemães, holandeses, poloneses e russos, o bairro foi muito<br />

fotografado e documentado pelas famílias que foram para lá, mais ricas e<br />

intelectualizadas. Suas construções, também mais sofisticadas, hoje atraem a cobiça<br />

imobiliária. Dizem até que o Josef Mengele morou lá.<br />

O outro ramal do trem da Cantareira, o de Guarulhos, era talvez menos romântico.<br />

Servia com freqüência ao Sanatório de Lázaros Padre Bento e ao antigo Hospital <strong>São</strong><br />

Luis Gonzaga, na baixada do Guapyra.<br />

Essa região, segundo alguns, ficou tão associada à doença de Hansen que lhe mudaram

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