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Conter os casamentos mistos: Eugen Fischer num povoado livre do ...

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<strong>Conter</strong> <strong>os</strong> casament<strong>os</strong> mist<strong>os</strong>: <strong>Eugen</strong> <strong>Fischer</strong> <strong>num</strong> <strong>povoa<strong>do</strong></strong> <strong>livre</strong> <strong>do</strong> racismo<br />

1<br />

Marion Brepohl<br />

Professora da UFPR - Pós-<strong>do</strong>utora<br />

Bolsista <strong>do</strong> CNPq<br />

mbrepohl@yahoo.com.br<br />

É bastante conhecida a dificuldade, para <strong>os</strong> pesquisa<strong>do</strong>res dedicad<strong>os</strong> à História<br />

da África, de encontrar uma <strong>do</strong>cumentação cuja autoria seja d<strong>os</strong> própri<strong>os</strong> african<strong>os</strong>:<br />

quem <strong>os</strong> descreveu e ainda detém uma boa parte das fontes disponíveis sobre eles nestes<br />

últim<strong>os</strong> 150 an<strong>os</strong> é o ex-coloniza<strong>do</strong>r. Ademais, como também é conheci<strong>do</strong>, tais escrit<strong>os</strong><br />

estão sempre impregnad<strong>os</strong> de uma perspectiva eurocêntrica.<br />

Tais <strong>do</strong>cument<strong>os</strong> são mais difíceis de serem aceit<strong>os</strong> em sua credibilidade,<br />

quan<strong>do</strong> <strong>os</strong> autores foram fiéis à ideologia e à prática imperialista, como é o caso de<br />

<strong>Eugen</strong> <strong>Fischer</strong> (1874-1967). Médico e antropólogo alemão, identifica<strong>do</strong> e condena<strong>do</strong><br />

(não sem razão) por sua explícita defesa da eugenia, foi um d<strong>os</strong> médic<strong>os</strong> mais<br />

comprometid<strong>os</strong> com as políticas nazistas relacionadas à esterilização em massa e ao<br />

genocídio.<br />

À guisa de exemplo, citem<strong>os</strong> sua atuação no caso da esterilização de afro-<br />

alemães. Esta pequena minoria era descendente de alemães coloniza<strong>do</strong>res e<br />

missionári<strong>os</strong> de regiões da África Subsaariana que residiam nas colônias alemãs. Tais<br />

pessoas se casaram com mulheres nativas ou tiveram filh<strong>os</strong> fora <strong>do</strong> casamento. Com a<br />

perda <strong>do</strong> império colonial alemão, após a Primeira Guerra Mundial, alguns desses<br />

colon<strong>os</strong> voltaram para a Alemanha com as suas respectivas famílias.<br />

À época <strong>do</strong> nacional socialismo, estes descendentes não perfaziam senão cerca<br />

de 500 a 800 indivídu<strong>os</strong> para 65 milhões europeus; ainda assim, <strong>os</strong> nazistas decidiram<br />

tomar medidas contra eles, então denominad<strong>os</strong>, pejorativamente, de bastard<strong>os</strong> renan<strong>os</strong><br />

(Rheinlandbastard). Não foram promulgadas leis oficiais contra tal população, ou até<br />

mesmo contra <strong>os</strong> filh<strong>os</strong> de ascendência mista, uma vez que eles eram descendentes de<br />

casament<strong>os</strong> e uniões informais desde antes das Leis de Nuremberg (1935). No entanto,


segun<strong>do</strong> estas leis, as pessoas de ascendência mista perderiam a sua liberdade de casar<br />

com cônjuges de sua escolha se f<strong>os</strong>sem considerad<strong>os</strong> arian<strong>os</strong>.<br />

Em 1937, a "Comissão Número 3" foi criada para resolver o problema <strong>do</strong><br />

Rheinlandbastards com o objetivo de impedir a sua procriação na sociedade alemã.<br />

Organizada pelo Dr. <strong>Eugen</strong> <strong>Fischer</strong> <strong>do</strong> Instituto Kaiser Wilhelm de Antropologia,<br />

Hereditariedade Humana e <strong>Eugen</strong>ia, foi decidi<strong>do</strong> que as crianças seriam esterilizadas,<br />

sob a Lei de número 1.933 denominada de Lei para a Prevenção de Descendência<br />

Hereditariamente Enferma.<br />

O programa começou em 1937, quan<strong>do</strong> a<strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong> municipais foi<br />

solicita<strong>do</strong> informar sobre tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> bastard<strong>os</strong> da Renânia sob a sua jurisdição. Os<br />

encontrad<strong>os</strong> (ao to<strong>do</strong>, 400 indivídu<strong>os</strong>), foram pres<strong>os</strong> e esterilizad<strong>os</strong>.<br />

A atuação de <strong>Eugen</strong> <strong>Fischer</strong> à época <strong>do</strong> nacionalsocialismo é bastante conhecida,<br />

ainda que a lei 1.933 seja pouco explorada em pesquisas sobre o tema, aqui citada<br />

apenas para ilustrar alguns d<strong>os</strong> des<strong>do</strong>brament<strong>os</strong> de sua experiência como pesquisa<strong>do</strong>r e<br />

antropólogo na África, fato que também não foi suficientemente explora<strong>do</strong>.<br />

N<strong>os</strong>sa comunicação se detém ao perío<strong>do</strong> anterior ao nazismo: é resulta<strong>do</strong> de<br />

n<strong>os</strong>so estu<strong>do</strong> sobre um de seus livr<strong>os</strong>, redigi<strong>do</strong> em 1913 e intitula<strong>do</strong> Die Rehoboter<br />

Bastards und Bastardieungsproblem beim Menschen, (Os bastard<strong>os</strong> de Rehobot e o<br />

problema da miscigenação d<strong>os</strong> seres human<strong>os</strong>). Trata-se de um minuci<strong>os</strong>o relatório<br />

sobre pesquisa realizada in locu <strong>num</strong> pequeno <strong>povoa<strong>do</strong></strong> da África Alemã Ocidental,<br />

hoje,uma parte da Namíbia, onde habitavam famílias de origem multicultural.<br />

Por ser uma região de clima ameno e de solo fértil, muit<strong>os</strong> bôeres e europeus de<br />

outras origens que residiam no sul da África, em torno da cidade <strong>do</strong> Cabo, emigraram<br />

para aquela região, desde finais <strong>do</strong> século XVIII. Passo a passo, foram constituin<strong>do</strong><br />

família contrain<strong>do</strong> matrimônio ou realizan<strong>do</strong> uniões informais com <strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>, na<br />

maioria, hotentotes. Assim, formaram uma população miscigenada que vivia em<br />

harmonia, por desconhecer tanto a miséria quanto o racismo, pelo men<strong>os</strong> até finais <strong>do</strong><br />

século XIX.<br />

<strong>Fischer</strong>, homem de insuspeita<strong>do</strong> preconceito racial, não deixou todavia de<br />

reconhecer ali crenças e valores que se aproximavam, segun<strong>do</strong> sua ótica, d<strong>os</strong> valores<br />

dito civilizad<strong>os</strong>, bem como de sua sincera confissão religi<strong>os</strong>a, o cristianismo.<br />

2


Meu objetivo nesta comunicação é trabalhar com a análise de <strong>Fischer</strong> sobre <strong>os</strong><br />

habitantes de Rehoboth (como era chamada aquela pequena cidade), sem deixar contu<strong>do</strong><br />

de esquadrinhar, nas entrelinhas, n<strong>os</strong> hábit<strong>os</strong> descrit<strong>os</strong>, na economia de gest<strong>os</strong>, etc,<br />

como foi p<strong>os</strong>sível desenvolver-se, em plena era d<strong>os</strong> impéri<strong>os</strong>, uma micro-sociedade que<br />

passou incólume, ainda que por um curto tempo, às <strong>do</strong>utrinas racistas. E como, a partir<br />

<strong>do</strong> início <strong>do</strong> século XX, esta mesma micro-sociedade passará a introjetar, graças à<br />

atuação d<strong>os</strong> coloniza<strong>do</strong>res alemães na região, o senso de superioridade étnica em<br />

relação a<strong>os</strong> habitantes de suas fronteiras: hotentotes, namas e herer<strong>os</strong>, aproximan<strong>do</strong>-se,<br />

por interesses econômic<strong>os</strong> mas também psicológic<strong>os</strong>, d<strong>os</strong> responsáveis pelas práticas<br />

imperialistas.<br />

Sobre a nação d<strong>os</strong> bastard<strong>os</strong><br />

Rehoboth era uma pequena aldeia de 15 a 20.000 quilômetr<strong>os</strong> quadrad<strong>os</strong>, situada<br />

ao norte <strong>do</strong> que hoje é a Namíbia, sen<strong>do</strong> a região mais fecunda da então colônia alemã<br />

(SWA).<br />

Desde 1760 já se observara a presença de europeus na região, mas somente em<br />

1845 é que se cria uma comunidade evangélica, sob a liderança <strong>do</strong> missionário<br />

Kleinschmidt Rehoboth (que dará nome à cidade). Antes mesmo de sua chegada, esta<br />

população ministrava ensinament<strong>os</strong> bíblic<strong>os</strong> às crianças. Um outro da<strong>do</strong> registra<strong>do</strong> por<br />

<strong>Fischer</strong> a partir de autores divers<strong>os</strong> é que, segun<strong>do</strong> <strong>os</strong> c<strong>os</strong>tumes, a<strong>os</strong> casament<strong>os</strong><br />

precedia o namoro, e o par precisava se entender bem, motivo pelo qual a miscigenação<br />

parecia não ser um problema entre eles. Todas as famílias tinham muit<strong>os</strong> filh<strong>os</strong> que iam<br />

também se casan<strong>do</strong> entre si, forman<strong>do</strong> então a população local.<br />

Pel<strong>os</strong> sobrenomes, pôde-se identificar que aproximadamente 40 homens de<br />

origem européia foram <strong>os</strong> funda<strong>do</strong>res daquela pequena cidade (<strong>Fischer</strong> elaborou 23<br />

árvores genealógicas, com riqueza de detalhes, observan<strong>do</strong> que em sua maioria eram<br />

holandeses, e em segun<strong>do</strong> lugar, alemães).<br />

À época em que <strong>Fischer</strong> realizou suas pesquisas, contava-se com uma população<br />

de 50 branc<strong>os</strong> (coloniza<strong>do</strong>res alemães) e 3.000 nativ<strong>os</strong> miscigenad<strong>os</strong>, além de<br />

hotentotes que circundavam a aldeia ou que se empregavam como serviçais das famílias<br />

mais abastadas, estas comp<strong>os</strong>tas, segun<strong>do</strong> <strong>Fischer</strong>, por 150 famílias.<br />

3


Não tem<strong>os</strong> informações o suficiente para saber <strong>os</strong> motiv<strong>os</strong> que levaram a que<br />

missionári<strong>os</strong> evangélic<strong>os</strong> da Renânia estabelecessem ali um campo missionário;<br />

sabem<strong>os</strong> que já atuavam em outras regiões da África e da América Latina, muito<br />

provavelmente, pela demanda da população de origem germânica. O fato é que desde<br />

antes da ocupação alemã, a Igreja Luterana se fez presente na região, responsabilizan<strong>do</strong>-<br />

se, inclusive, pela alfabetização das crianças e pela evangelização de outr<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>.<br />

Segun<strong>do</strong> Kaulich (2003), <strong>os</strong> habitantes de Rehoboth viviam em regime de<br />

propriedade comunal e mantinham um conselho administrativo, relativamente isolad<strong>os</strong><br />

de outr<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong> até que em 1884, deu-se o início da <strong>do</strong>minação alemã. Para fortalecer<br />

seu poderio militar, <strong>os</strong> agentes coloniais alemães procuraram se aproximar d<strong>os</strong><br />

“Bastard<strong>os</strong>”, porquanto já falavam o mesmo idioma e já contavam com uma<br />

organização societária. Para tanto, concederam vantagens àquela população e, mesmo<br />

quan<strong>do</strong> houve conflit<strong>os</strong> entre outr<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong> e <strong>os</strong> agentes coloniais, este segmento foi<br />

poupa<strong>do</strong> e protegi<strong>do</strong>. Um outro exemplo, segun<strong>do</strong> Eberhard (2005), a<strong>os</strong> chamad<strong>os</strong><br />

bastard<strong>os</strong> que não tivessem participa<strong>do</strong> d<strong>os</strong> conflit<strong>os</strong> que resultaram no genocídio de<br />

1906, dispensava-se o uso <strong>do</strong> passe, e o confisco de terras não <strong>os</strong> atingiram.<br />

A pesquisa de <strong>Fischer</strong><br />

A pesquisa de <strong>Eugen</strong> <strong>Fischer</strong>, que o levou a permanecer em Rehoboth por 2<br />

an<strong>os</strong>, financiada pela Real Academia de Berlim, tinha como objetivo responder à<br />

seguinte questão: O que acontece quan<strong>do</strong> duas diferentes raças se cruzam ao longo de<br />

uma série de gerações? Surge daí uma nova raça na humanidade, com caracteres<br />

genétic<strong>os</strong> intermediári<strong>os</strong> a<strong>os</strong> d<strong>os</strong> estoques d<strong>os</strong> pais? Suas observações o convenceram<br />

de que uma nova raça humana permanente não podia ser formada pela fusão de duas<br />

diferentes formas humanas, pois, segun<strong>do</strong> a Lei de Mendel, determinad<strong>os</strong> caracteres são<br />

recessiv<strong>os</strong> e outr<strong>os</strong> <strong>do</strong>minantes. Assim, <strong>os</strong> tip<strong>os</strong> de originais tendem a reafirmar-se no<br />

decurso de gerações. Embora a média da cabeça da forma <strong>do</strong> povo Rehoboth f<strong>os</strong>se<br />

intermediária às das duas raças-mãe (hotentote e boer), em cada geração um número<br />

definitivo da deles tendiam a assumir a cabeça com a forma de um ou <strong>do</strong> outro<br />

ascendente.<br />

4


Sua pesquisa empírica partiu de 310 exames biométric<strong>os</strong>, acompanhad<strong>os</strong> de<br />

entrevistas, 300 fotografias de corpo inteiro e mais algumas centenas de r<strong>os</strong>t<strong>os</strong> (frente e<br />

perfil), 23 árvores genealógicas e entrevistas com agentes coloniais. Fotografou também<br />

utensíli<strong>os</strong> <strong>do</strong>méstic<strong>os</strong>, o interior das casas, as fachadas, vestimentas e a<strong>do</strong>rn<strong>os</strong>. Com este<br />

material, realizou uma infinidade de avaliações, tanto em crianças como em adult<strong>os</strong> e<br />

id<strong>os</strong><strong>os</strong>. Examinou também a p<strong>os</strong>sível influência <strong>do</strong> clima e da alimentação sobre a<br />

conformação de seus corp<strong>os</strong>; a cor e o formato d<strong>os</strong> olh<strong>os</strong>; a taxa de fecundidade das<br />

famílias (uma média de 7,4 filh<strong>os</strong> por família); a cor da pele; a cor e a forma d<strong>os</strong><br />

cabel<strong>os</strong>, tabulan<strong>do</strong> tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> dad<strong>os</strong> e estabelecen<strong>do</strong> parâmetr<strong>os</strong> caractereológic<strong>os</strong><br />

segun<strong>do</strong> <strong>os</strong> métod<strong>os</strong> a<strong>do</strong>tad<strong>os</strong> àquela época.<br />

Na segunda parte <strong>do</strong> relatório – que n<strong>os</strong> interessa mais de perto – analisou a<br />

economia e <strong>os</strong> c<strong>os</strong>tumes, procuran<strong>do</strong> essencialmente as diferenças deste povo com <strong>os</strong><br />

demais nativ<strong>os</strong>, com a clara intenção de analisar as p<strong>os</strong>sibilidades de aproximação entre<br />

eles e <strong>os</strong> coloniza<strong>do</strong>res alemães. Em divers<strong>os</strong> moment<strong>os</strong>, aponta como elemento chave<br />

para esta aproximação, a necessidade de convencê-l<strong>os</strong> que eram superiores a<strong>os</strong> demais,<br />

porquanto filh<strong>os</strong> da raça branca.<br />

Lamenta que <strong>os</strong> europeus não tenham manti<strong>do</strong> seus valores de origem, exceto a<br />

crença religi<strong>os</strong>a. E lamenta mais ainda o fato de <strong>os</strong> missionári<strong>os</strong> da Renânia terem se<br />

miscigena<strong>do</strong> com <strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>, alian<strong>do</strong>-se àquele povo, autodenomina<strong>do</strong> a “nação d<strong>os</strong><br />

bastard<strong>os</strong>”.<br />

A seguir, um pequeno cotejamento de seus comentári<strong>os</strong> sobre <strong>os</strong> hábit<strong>os</strong><br />

(Volkeskunde) d<strong>os</strong> “Bastard<strong>os</strong>”. Segun<strong>do</strong> <strong>Fischer</strong>, à diferença d<strong>os</strong> europeus, são muito<br />

carinh<strong>os</strong><strong>os</strong> com seus filh<strong>os</strong>, fabricam brinqued<strong>os</strong> para as crianças, <strong>os</strong> quais reproduzem<br />

o mun<strong>do</strong> adulto. Também o namoro precede o casamento, que conta sempre com a<br />

necessária autorização <strong>do</strong> pai da noiva. As bodas duram três dias, começan<strong>do</strong> pela<br />

cerimônia religi<strong>os</strong>a, ao que se sucede um almoço, o café da tarde e p<strong>os</strong>teriormente, um<br />

baile. São muito sociáveis entre si; a<strong>os</strong> <strong>do</strong>ming<strong>os</strong>, além de freqüentarem a igreja,<br />

sentam-se à frente das casas para conversarem.<br />

Trabalham pouco, somente o necessário para a subsistência, ainda que sempre<br />

suas casas sejam limpas e bem arrumadas. As mulheres se vestem com trajes europeus,<br />

portan<strong>do</strong> sempre um casquete, principalmente se casadas. Realizam muitas festas, sejam<br />

de origem cristã ou datas festivas cultivadas por hotentotes.<br />

5


Remédi<strong>os</strong> caseir<strong>os</strong> e aliment<strong>os</strong> também são de proveniência de ambas as<br />

culturas; já <strong>os</strong> utensíli<strong>os</strong> <strong>do</strong>méstic<strong>os</strong>, afora <strong>os</strong> de decoração, são adquirid<strong>os</strong> nas lojas,<br />

pois <strong>os</strong> “bastard<strong>os</strong>” não são destr<strong>os</strong> para a artesania; vivem <strong>do</strong> cultivo e comércio <strong>do</strong><br />

ga<strong>do</strong><br />

Segun<strong>do</strong> o antropólogo, o que falta a eles é o espírito de liderança, pois são<br />

incapazes de produzir cultura – falta-lhes fantasia, energia, autoconsciência, caráter,<br />

capacidade física, que são propriedades da raça branca. Têm dificuldade de marchar,<br />

não têm propensão a <strong>do</strong>minar, nem previsibilidade e muit<strong>os</strong> são regid<strong>os</strong> por paixões,<br />

como a paixão pelo álcool. São embotad<strong>os</strong>, parecem tíbi<strong>os</strong> e lerd<strong>os</strong>. Mesmo assim, são<br />

segur<strong>os</strong> de si e orgulh<strong>os</strong><strong>os</strong> de sua nação.<br />

Poderia multiplicar <strong>os</strong> comentári<strong>os</strong> de <strong>Fischer</strong>, quase tod<strong>os</strong> eles, uma reedição<br />

d<strong>os</strong> lugares comuns própri<strong>os</strong> das <strong>do</strong>utrinas racistas: a in<strong>do</strong>lência das raças inferiores,<br />

sua incapacidade de realização, necessidade de serem tutelad<strong>os</strong>, etc, o que não cabe no<br />

escopo deste trabalho.<br />

Mas uma observação é digna de ressalva: ele afirma que tu<strong>do</strong> isso pode ser uma<br />

máscara, por não quererem aproximação com <strong>os</strong> recém-chegad<strong>os</strong>. E, embora tivessem<br />

se manti<strong>do</strong> à parte quan<strong>do</strong> da guerra de 1906 (conhecida como genocídio <strong>do</strong> povo<br />

herero), tampouco aceitaram (a não ser 20 ou 30 indivídu<strong>os</strong>) alistar-se ao la<strong>do</strong> d<strong>os</strong><br />

coloniza<strong>do</strong>res.<br />

Finalmente, discorre sobre o significa<strong>do</strong> político d<strong>os</strong> bastard<strong>os</strong>.<br />

Como cientista e pesquisa<strong>do</strong>r da natureza, entende que este povo deve ser<br />

trata<strong>do</strong> de maneira diferente em relação a<strong>os</strong> outr<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>. Não adiantaria proibir <strong>os</strong><br />

casament<strong>os</strong> mist<strong>os</strong> naquele reduto, muito men<strong>os</strong> que eles procriassem, aumentan<strong>do</strong> o<br />

contingente demográfico, mesmo que bastard<strong>os</strong>. Segun<strong>do</strong> seu parecer:<br />

Para a n<strong>os</strong>sa colônia, isso é inclusive útil. Com um tratamento<br />

adequa<strong>do</strong>, coordenação, educação, o que <strong>os</strong> missionári<strong>os</strong> já estão<br />

fazen<strong>do</strong>, podem se transformar em uma classe de trabalha<strong>do</strong>res ; podem<br />

dedicar-se ao criatório e com boa instrução, à artesania. Podem<strong>os</strong><br />

capacitá-l<strong>os</strong> para ser um grupo de policiais, desde que sob a direção d<strong>os</strong><br />

branc<strong>os</strong>, pois já sabem que são diferentes desta corja de homens de<br />

cor.(...) E podem<strong>os</strong> convencê-l<strong>os</strong> de que estas três atividades podem ser<br />

6


<strong>Fischer</strong> e a política colonial<br />

de seu próprio proveito. A vida deles depende <strong>do</strong> governo alemão. A<br />

questão fundamental é fazê-l<strong>os</strong> trabalhar na colônia (...) mas se e somente<br />

se eles forem n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>, não é p<strong>os</strong>sível tratá-l<strong>os</strong> como n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> iguais<br />

(FISCHER, 1913, p. p. 299).<br />

Após realizarm<strong>os</strong> estes breves comentári<strong>os</strong> sobre o diagnóstico antropológico e<br />

político de <strong>Eugen</strong> <strong>Fischer</strong>, procurem<strong>os</strong> contextualizar as suas p<strong>os</strong>síveis motivações,<br />

ten<strong>do</strong> em vista a conjuntura em que se deu aquela intervenção.<br />

Primeiramente, é importante destacar que tanto antes quanto depois <strong>do</strong> genocídio<br />

<strong>do</strong> povo herero (mas principalmente depois), a política colonial alemã estava sofren<strong>do</strong><br />

intensa op<strong>os</strong>ição d<strong>os</strong> socialdemocratas e liberais, da<strong>do</strong> o comportamento da burocracia<br />

colonial na África. Não apenas por seu interesse em oporem-se eleitoralmente às<br />

plataformas políticas que defendiam o expansionismo como meio de se estancar a<br />

questão social; com relativa rapidez, observam<strong>os</strong> que a ênfase passará a incidir sobre<br />

outra questão, qual f<strong>os</strong>se, a violência contra <strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>. Afinal, aquelas regiões, segun<strong>do</strong><br />

<strong>os</strong> liberais e socialistas, uma vez conquistadas, pertenciam ao Esta<strong>do</strong> alemão, deven<strong>do</strong><br />

ser seus habitantes tratad<strong>os</strong> como cidadã<strong>os</strong>. Por estas razões, divers<strong>os</strong> encaminhament<strong>os</strong><br />

polític<strong>os</strong> e institucionais foram reclamad<strong>os</strong> com o intuito de propugnar, junto ao<br />

parlamento, pela elaboração de medidas legais que garantissem direit<strong>os</strong> a<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong><br />

(Eingeborenerechte).<br />

A resp<strong>os</strong>ta da burocracia colonial a<strong>os</strong> argument<strong>os</strong> em favor d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong> se<br />

caracterizou por uma radicalização discursiva cada vez mais intensa, apresentada não<br />

pela aporia esquerda versus direita, mas em torno daquilo que a escritora Frieda von<br />

Bülow denominou como a “espacialização da diferença”, ou seja, a legitimação <strong>do</strong><br />

racialismo como critério de governo.<br />

Cito Frieda von Bülow, dentre outr<strong>os</strong> atores sociais neste processo, por ter si<strong>do</strong><br />

ela uma importante articula<strong>do</strong>ra das relações entre entidades privadas conserva<strong>do</strong>ras na<br />

Alemanha e as colônias. Foi uma importante defensora <strong>do</strong> racialismo, entusiasta da<br />

política colonial, anti-semita, colabora<strong>do</strong>ra da Liga Feminina em prol da colonização (a<br />

7


qual providenciava a emigração de moças brancas para se casarem com <strong>os</strong><br />

coloniza<strong>do</strong>res). Seus escrit<strong>os</strong> representam, segun<strong>do</strong> Elisa von Joeden-Forgey, (2007), a<br />

virada racialista da política colonial alemã: conforme a autora, se n<strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> 15 an<strong>os</strong>,<br />

a linguagem <strong>do</strong>minante da administração colonial deixava-se orientar pelas noção de<br />

civilização, senso missionário e inclusão d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong> como membr<strong>os</strong> <strong>do</strong> Reich, a partir<br />

<strong>do</strong> início <strong>do</strong> século XX, em resp<strong>os</strong>ta às denúncias d<strong>os</strong> socialdemocratas, as <strong>do</strong>utrinas<br />

racistas passam a se constituir o elemento estruturante das relações entre coloniza<strong>do</strong>res<br />

e colonizad<strong>os</strong> 1 . Isso se deveu principalmente à institucionalização da “Lei d<strong>os</strong> Nativ<strong>os</strong>”,<br />

que previa a p<strong>os</strong>sibilidade de aquisição de cidadania por parte d<strong>os</strong> homens de cor.<br />

Enquanto não se naturalizavam, deviam ficar sob a proteção <strong>do</strong> governo local,<br />

seguin<strong>do</strong>-se <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> c<strong>os</strong>tumeir<strong>os</strong> de cada cultura local.<br />

Ainda que, na prática, <strong>os</strong> “direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>” (Eingeborenerechte) não<br />

representassem qualquer garantia que impedisse à administração local de surrá-l<strong>os</strong>, de<br />

tratá-l<strong>os</strong> como semi-escrav<strong>os</strong>, de excluí-l<strong>os</strong> de territóri<strong>os</strong>, a simples p<strong>os</strong>sibilidade de se<br />

tornarem cidadã<strong>os</strong> alemães e mesmo de se casarem com branc<strong>os</strong> ou brancas, açulou <strong>os</strong><br />

nerv<strong>os</strong> d<strong>os</strong> membr<strong>os</strong> da Liga Pangermânica, que passaram a arreglar para si o que eles<br />

mesm<strong>os</strong> denominariam como “luta de raças” (Rassenkampf).<br />

Com isto,<br />

Ao incluir <strong>os</strong> Eingeborene no reino <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> soberano e seu<br />

monopólio da violência, ao mesmo tempo em que excluem-lhes<br />

quaisquer instituições e tradições que pudessem protegê-l<strong>os</strong>, o esta<strong>do</strong><br />

alemão criou, na prática, ainda que não intencionalmente, uma categoria<br />

de pessoas potencialmente genocidas – pessoas que existiam inteiramente<br />

ao largo de uma comunidade em que houvesse obrigações morais; (...)<br />

para elas, muit<strong>os</strong> assassinat<strong>os</strong> não eram tecnicamente ilegais (JOEDEN-<br />

FORGEY, 2007, p. 24).<br />

Para muit<strong>os</strong> membr<strong>os</strong> da Liga Pangermânica, o genocídio não era condenável;<br />

condenável era a falta de critéri<strong>os</strong> para o castigo, a tortura ou o assassinato. Eu diria<br />

1 .<br />

8


mais: o genocídio, como p<strong>os</strong>sibilidade, podia e devia levar em conta também o uso<br />

arbitrário <strong>do</strong> corpo deste outro, que não era visto como op<strong>os</strong>itor ou mesmo estrangeiro,<br />

mas como inferior e potencialmente passível de contagiar <strong>os</strong> branc<strong>os</strong>, uma vez que,<br />

seguin<strong>do</strong> fielmente as palavras de Gobineau, o sangue ruim podia estragar o sangue<br />

bom, preceito utiliza<strong>do</strong> intensamente pela literatura panfletária e pseu<strong>do</strong>-científica das<br />

sociedades coloniais, o que prepara a des-individualização e desumanização d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>.<br />

Dentre <strong>os</strong> divers<strong>os</strong> exempl<strong>os</strong> que podem<strong>os</strong> citar e que refletem a intensificação<br />

<strong>do</strong> racialismo como elemento estruturante da política colonial, o mais conheci<strong>do</strong> deles é<br />

o genocídio <strong>do</strong> povo herero. Tratou-se de um massacre que extinguiu 80% da população<br />

nativa (cerca de 80 mil pessoas), além da prática da tortura e <strong>do</strong> abuso sexual às<br />

mulheres sobreviventes. Este massacre calou fun<strong>do</strong> na memória d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong>; tanto assim<br />

que, em 1914, quan<strong>do</strong> <strong>os</strong> alemães pretenderam recrutar tropas nativas para combater na<br />

guerra, de 50 mil nativ<strong>os</strong> passíveis de recrutamento, apenas 6 mil foram empregad<strong>os</strong>.<br />

Os demais negaram-se a participar – ainda que para tanto pudessem ganhar algum<br />

dinheiro -; não pouc<strong>os</strong>, devi<strong>do</strong> à crueldade d<strong>os</strong> castig<strong>os</strong> aplicad<strong>os</strong> para a observância da<br />

disciplina, acabavam por passar para o la<strong>do</strong> d<strong>os</strong> inimig<strong>os</strong> (ARRIFES, 2004).<br />

Mais impressionante ainda é a declaração <strong>do</strong> Comandante <strong>do</strong> ataque, o General<br />

Lothar Von Trotha. A despeito da op<strong>os</strong>ição parlamentar, não hesitou em alardear n<strong>os</strong><br />

jornais a sua p<strong>os</strong>ição:<br />

Pergunto-me agora como terminar a guerra com <strong>os</strong> herer<strong>os</strong>. O<br />

ponto de vista <strong>do</strong> governa<strong>do</strong>r, também o ponto de vista de antig<strong>os</strong><br />

african<strong>os</strong> branc<strong>os</strong>, e o meu ponto de vista estão em completo desacor<strong>do</strong>.<br />

O governa<strong>do</strong>r quer negociar por algum tempo com <strong>os</strong> herer<strong>os</strong>, e pensa na<br />

nação Herera como necessária como mão de obra para o futuro<br />

desenvolvimento <strong>do</strong> país. Eu penso que uma nação como esta deve ser<br />

totalmente aniquilada, ou se isso não for p<strong>os</strong>sível, devem ser expelid<strong>os</strong><br />

para fora <strong>do</strong> país. (apud MAMDANI, 2011, p. 11).<br />

9


Como já mencionam<strong>os</strong>, a população que não foi exterminada no que ficou<br />

amplamente conheci<strong>do</strong> por fot<strong>os</strong>, jornais e declarações oficiais como O Massacre em<br />

Ohmeke, pereceu de outra forma, sen<strong>do</strong> pres<strong>os</strong> em camp<strong>os</strong> de concentração. Os corp<strong>os</strong><br />

masculin<strong>os</strong> serviram como base de pesquisa para divers<strong>os</strong> cientistas, dentre eles, <strong>Eugen</strong><br />

Fisher.<br />

Após o massacre em Ohmeke, foram realizadas novas intervenções políticas por<br />

parte <strong>do</strong> governo alemão. De 1907 a 1914, segun<strong>do</strong> U<strong>do</strong> Kaulich (2003), a colônia foi<br />

dividida em reservas, que deveria manter, cada uma, no máximo, 10 famílias, chefiadas<br />

por um nativo de confiança d<strong>os</strong> branc<strong>os</strong>. Estas pessoas não podiam sair de suas reservas<br />

a não ser por meio de um passe que justificasse a necessidade de seu deslocamento.<br />

Tinham ainda de ter um Dienstbuch (o equivalente a uma carteira de trabalho), no qual<br />

se anotavam seus err<strong>os</strong>, suas <strong>do</strong>enças, sua oper<strong>os</strong>idade, etc, e quem não tivesse este<br />

<strong>do</strong>cumento, era castiga<strong>do</strong>. Assim, a política d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong> transformou-se em política de<br />

trabalho.<br />

O autor conclui que, neste perío<strong>do</strong>, dito “apazigua<strong>do</strong>”, pode-se observar a<br />

intensificação da repressão, transformada em repressão cotidiana, direcionada à<br />

disciplina de toda a população nativa, <strong>do</strong>ravante administrada por 500 membr<strong>os</strong> da<br />

polícia civil, a serviço de 15.000 coloniza<strong>do</strong>res branc<strong>os</strong>.<br />

Este é o contexto em que a pesquisa de <strong>Fischer</strong> sobre <strong>os</strong> Rehoboth foi realizada.<br />

Um momento em que <strong>os</strong> coloniza<strong>do</strong>res vêem sua estratégia de exploração econômica<br />

consolidada, ainda que a intensificação <strong>do</strong> policiamento <strong>do</strong> cotidiano f<strong>os</strong>se uma<br />

necessidade permanente e ademais, em <strong>do</strong>is flanc<strong>os</strong>: segun<strong>do</strong> a <strong>do</strong>cumentação, ingleses<br />

e portugueses ameaçavam as fronteiras da SWA, dentro da lógica da concorrência inter-<br />

imperialista; internamente, foc<strong>os</strong> de resistência e de revolta por parte d<strong>os</strong> nativ<strong>os</strong> não<br />

deviam ser de pequena monta, f<strong>os</strong>se pela memória <strong>do</strong> genocídio de 1906, f<strong>os</strong>se pela<br />

severidade no policiamento d<strong>os</strong> trabalha<strong>do</strong>res.<br />

Por estes motiv<strong>os</strong>, pensam<strong>os</strong> ser razoável supor que as pequenas vantagens<br />

dispensadas à nação d<strong>os</strong> bastard<strong>os</strong> se lhe apresentasse como uma parte integrante das<br />

estratégias de <strong>do</strong>minação, porquanto estes, como afirmou explicitamente <strong>Fischer</strong>,<br />

poderiam servir de “capitães” das reservas organizadas pel<strong>os</strong> agentes coloniais. Ou<br />

também (e não de forma excludente), porque tais mestiç<strong>os</strong> de língua e religião alemã,<br />

poderiam ir substituin<strong>do</strong>, gradativamente, o restante da população nativa.<br />

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Para tanto, bastava que se convencessem de sua superioridade racial. Talvez a<br />

pesquisa de <strong>Fischer</strong> f<strong>os</strong>se uma boa ajuda neste senti<strong>do</strong>.<br />

Referências bibliográficas<br />

ARRIFES, Marc<strong>os</strong> Fortunato. A Primeira Grande Guerra na África Portuguesa:<br />

Angola e Moçambique. Lisboa: C<strong>os</strong>m<strong>os</strong>, 2004.<br />

EBERHARDT, Martin. Zwischen nationalsozialismus und Apartheid. Münster: LIT<br />

Verlag, 2005.<br />

FISCHER, <strong>Eugen</strong>. Die Rehoboter Bastards und Bastardierungsproblem beim<br />

Menschen. Jena: <strong>Fischer</strong>, 1913.<br />

KAULICH, U<strong>do</strong>. Die Geschichte der ehemaligen Kolonie deutsch-Südwestafrika;<br />

1884-1914. Mainz: Peter Lang Verlag, 2003.<br />

JOEDEN-FORGEY, E. Race, power, free<strong>do</strong>m and the democracy of terror in german<br />

racialist thought. In: KING, R. & STONE, D. (org). Hannah Arendt and the uses<br />

of History; imperialism, nation, race and genocide. New York: Berghahn Books,<br />

p. 20-37, 2007.<br />

MAMDANI, Mahhmood. When victms bekome killers. Princeton: University Press,<br />

2001.<br />

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