Josiane Thethê Andrade - Uesb
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Pedro e José ao descreverem estas viagens que tantas vezes fizeram, tirando da própri a<br />
experiência o que narraram.<br />
[as mercadorias] vinha daqui de Mutuípe, nesse tempo não tinha nem estrada<br />
diretamente, a gente andava era no lombo dos animá, tanto eu quanto<br />
Maninho. A gente muntava no meio da cangalha botava panacum e tudo, aí<br />
ia buscar as coisas. 7<br />
As relações econômicas estabelecidas entre o vendeiro e seus clientes, na maioria<br />
trabalhadores rurais, eram permeadas por costumes e valores que muitas vezes dispensavam a<br />
assinatura de qualquer documento comprovante das dívidas, ou da compra e venda de<br />
qualquer produto. Bastava a “palavra”, a confiança selada num aperto de mão, num olhar ou<br />
numa simples promessa de quitação da dívida, constituindo uma espécie de “ética rural”,<br />
sustentada numa longa tradição rural.<br />
Mas como o vendeiro é um “comerciante, numa situação de pequeno capitalista, vive<br />
entre os que lhe devem dinheiro e aqueles a quem ele deve. É um equilíbrio precário, sempre<br />
à beira da derrocada” (BRAUDEL, 1998, p. 57), obrigando-o a cobrar as dívidas, uma tarefa<br />
difícil, dado os cos tumes que envolviam as relações entre ele e seus fregueses. Muitos<br />
comerciantes ficavam constrangidos em cobrar, outros temiam que os fregueses ficassem<br />
ofendidos e abandonassem seus estabelecimentos comerciais, até mesmo sem pagar a conta,<br />
como deixou claro os vendeiros, se referirem as cobranças como “uma tarefa muito difícil”,<br />
“tinha gente que queria até bater na gente,” “eu tinha vergonha de cobrar”. Situações<br />
expressas nos depoimentos abaixo:<br />
7 José Gonçalves, depoimento citado.<br />
8 Aurineide <strong>Thethê</strong> <strong>Andrade</strong> , depoimento citado.<br />
9 José Gonçalves de Oliveira , depoimento citado.<br />
Pra mim é uma tarefa muito difícil chegar pra uma pessoa e cobrar um<br />
débito, porque a gente negocia assim, na confiança. Na confiança tanto é que<br />
ninguém assina nada, ninguém faz nada disso, negocia mais e de boca, por<br />
causa da confiança que se tem nas pessoas é difícil assinar alguma coisa,<br />
difícil assinar alguma promissória, a não ser quando faz esses negócios em<br />
cacau, mas mesmo assim é difícil assinar uma promissória. 8<br />
Cobrava, uns dava pra valente, queria até bater na gente, mas a gente ia<br />
atravessando. Teve um dia que aquele Paulo Correia, me, [...] escorou na<br />
porta da venda porque eu fui cobrar uma conta, ele escorou com uma<br />
espingarda veia, que se eu saísse fora tinha ele me atirado. 9<br />
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