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Josiane Thethê Andrade - Uesb

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As palavras, “difícil”, “vergonha”, “ninguém”, repetidas várias vezes expressam como<br />

os vendeiros se sentiam constrangidos muitas vezes em cobrar as dívidas, já que poderiam<br />

estar ferindo com a tradição. O que ajuda a entender a reação violenta do cliente na última<br />

fala do senhor José Gonçalves, ao se sentir ofendido com a cobrança. Isto lembra as relações<br />

comerciais permeadas por antigos costumes na Inglaterra do século XVIII, definida por<br />

Thompson (1998, p. 13-25) como “economia moral da plebe” ao se referir às rebeliões ou<br />

ações violentas dos camponeses, na defesa de suas tradições contra as influências externas em<br />

relação aos novos controles impostos pelos “governos patrícios” e pelas transformações do<br />

mundo industrial moderno.<br />

Os próprios vendeiros esperavam do cliente uma atitude honesta saldando as dívidas,<br />

não se pode entender suas atitudes fora do processo histórico, já que também faziam parte<br />

daquele grupo e compartilhavam seus costumes e práticas sociais. Muitos vendeiros nem<br />

chegavam a cobrar as contas, que envelheciam junto com o papel onde tinham sido<br />

registradas, talvez esperando o pagamento e o cumprimento da pala vra dada, ou por temerem<br />

perder o cliente, que poderia se ofender com a cobrança e conseqüente questionamento da sua<br />

honestidade.<br />

Os laços de familiaridade que marcavam as relações entre os vendeiros e fregueses<br />

caracterizam um costume proporcionado po r práticas anteriores de convívio naquele espaço.<br />

Ou seja, os freqüentadores das vendas em sua interação com lugar criaram práticas que<br />

identificaram o espaço da venda como um ambiente propício as relações de solidariedade<br />

entre os indivíduos que o freqüen tam. Segundo Certeau (1994, p. 202) “o espaço é um lugar<br />

praticado” e são estas práticas cotidianas que dão a um lugar destinado as relações comerciais<br />

o calor da convivência humana.<br />

O vendeiro conhece os gostos de cada um, chama os fregueses pelo primeir o nome ou<br />

por apelidos, conhece as suas famílias e as crianças do lugar. A ele se recorre num momento<br />

de emergência, quando é necessário um remédio para dor de cabeça ou febre a qualquer hora<br />

do dia ou da noite. Na iminência de um problema de saúde ou fina nceiro apelava-se a um<br />

empréstimo de urgência. O vendeiro também é o confidente, àquele a quem se pede um<br />

conselho ou um favor. Muitos o chamavam num canto para pedir dinheiro emprestado ou<br />

comprar algo fiado para evitar constrangimentos. Algumas mulheres pediam para serem<br />

atendidas nos fundos da venda quando queriam comprar uma “meota” 10 de cachaça ou algum<br />

10 O termo “meota” é usado pelos freqüentadores da venda para designar uma garrafa reaproveitada que serve<br />

para conter cachaça comprada a granel.<br />

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