Edmar Honorato de Sousa – Cobrador - Oktiva

EDMAR HONORATO DE SOUSA 1
COBRADOR
TESOUREIRO
48 ANOS DE TRABALHO
Empresa São Francisco
Auto Viação Fortaleza
Idade: 64 anos
Esposa: Maria do Socorro Cavalcante de Sousa
Filhos: Marcos, Marta Maria, Mardônio, Marcio, Marcelo, Marcílio e Edmar
Comecei a trabalhar com transporte na Empresa São Francisco. Era ainda garoto,
com mais ou menos uns 14 anos. Na São Francisco, eu passei seis meses
trabalhando como cobrador. Um dia, no final da linha do ônibus, apareceu um
garoto querendo fazer encrenca comigo, fazer confusão. E eu engrossei com ele
também. Nós nos agarramos para brigar e o fiscal acabou dando parte de mim na
empresa. Aí me colocaram para fora, porque não podia brigar. Eu era mesmo
meio esquentado...
Isso foi em 1954. Depois da São Francisco, voltei para Aquiraz, onde moravam
meus avós, e passei uma temporada por lá. Fiquei ajudando meu avô na roça,
com as plantações. Um dia pensei: “- Rapaz, eu vou atrás de outra coisa! Não vou
ficar aqui não...”
Um dia, um conhecido de meu pai deu a dica: “– Rapaz, vá para a Empresa
Fortaleza e fale com uma pessoa de lá... Pode até ser que você consiga trabalhar
como cobrador de novo”. Eu fiquei todo interessado...
Cheguei na casa do Seu Lima, da Empresa Fortaleza, e falei para um senhor que
estava sentado numa rede: “- Olha, eu queria saber se tem vaga para cobrador...”
1 Depoimento à Luciana Cardoso e Patrícia Menezes, na manhã do dia 17 de dezembro de 2003, na Auto
Viação Fortaleza. Transcrito em 05 de janeiro de 2004, por Patrícia Menezes.

Num dia, o motorista do carro era o Arlindo. Eu era cobrador. O carro começou a
esquentar, porque quando dá problema no radiador, ele começa a esquentar. O
carro estava cheio de passageiros e o Arlindo disse: “- Cobrador, bota água aqui
no carro, por que está fervendo”.
Eu desci e fui colocar a torneirinha: levantei o capô e coloquei água no carro. Eu já
sentia que o carro vinha descendo e que começava encostar em minhas pernas...
Eu falei para o motorista: “- Rapaz, este carro está me imprensando aqui!” Parece
que ele não ouviu e eu comecei a ficar sufocado. Então ele percebeu o que
acontecia e se aperreou para passar até a marcha ré do carro... Era um daqueles
carros antigos, um Chevrolet 1946. Então ele conseguiu passar a marcha e
quando tirou o carro dali, eu caí. Ele ficou apavorado! Me levaram para o hospital,
que na época era a Assistência Municipal e hoje é o Frotão. Mas, graças a Deus,
não houve nada.
No ônibus, a gente encontra toda espécie de passageiros. Tem o passageiro bom,
tem aquele passageiro que irrita a pessoa e fica exigindo porque, às vezes, o
cobrador não tem o troco, outras vezes por que faltava um troquinho...e aí ficava
fazendo aquela confusão toda. Mas eu ia levando com jeito.
Com as pessoas que trabalhavam comigo eu me dava bem. Até hoje, graças a
Deus, me relaciono muito bem com os colegas. Na época de cobrador eu fiz
amigos na empresa. A gente saía junto para ir às festas - que se chamavam
“quermesses” - para paquerar. Eu era rapazinho de 18, 20 anos! Até que enfim eu
arranjei uma namorada e me casei com 22 anos.
Como cobrador, trabalhei em muitas linhas. Tinha a linha do Alto da Balança, a
linha Djalma Petit, Vila dos Sargentos, onde eu trabalhei muito tempo. Tinha
também Dias Macedo.

Mas eu gostava mesmo de trabalhar na linha do Alto da Balança, porque era um
pouco mais longa. Então, demorava mais no final e dava para bater papo com o
pessoal. Tinha até o barzinho para a gente lanchar. E eu jogava sinuca. De
sinuca a turma gostava! A hora de lanche era pequena, uns 10 ou 15 minutos...
mas quando a gente chegava no final da linha e tinha dois ou três carros parados,
eles iam saindo por vez... e demorava para o meu carro sair. Se no fim da linha
tivesse três carros parados, eu ia passar ali pelo menos uns cinco minutos. E eu
ficava feliz.
Mas eu não achava muito bom trabalhar como cobrador, não. Eu sentia que não
tinha nenhuma perspectiva de vida. Eu achava que como cobrador eu nunca ia ter
uma chance. Eu via que os outros cobradores ficavam um ano, dois anos, três
anos e depois eram postos para fora. Ou então ficavam passando de empresa
para empresa e trabalhavam sempre como cobrador. Nós temos um cobrador aqui
na empresa que começou a trabalhar em 1972 e ainda hoje é cobrador.
Além disso, naquele tempo, o pessoal discriminava muito o cobrador. A profissão
era desvalorizada. Até para conseguir um flerte com uma menina, tinha sempre
aquela barreira... Quando ela perguntava: “– Você trabalha de quê?”, eu ficava até
com vergonha de dizer que trabalhava como cobrador.
E eu tinha vontade de passar a ser motorista. Tem uma história, de quando eu fui
tirar a carteira de motorista. Coloquei na cabeça que eu tinha que tirar minha
carteira de motorista, aí eu falei com o Seu Lima - sempre quando eu queria
alguma coisa, ia falar com o Seu Lima. “- Seu Lima, eu quero tirar minha carteira
de motorista”.
Ele me ajudou nisso. Inclusive, ele tinha uma caminhonete e me ensinou a dirigir
no carro dele. Mandou eu entrar no carro - eu já sabia mais ou menos como era -,
deu umas voltas e mandou eu dirigir para pegar prática e poder tirar a carteira. Eu
só sei que tirei a carteira em 1959.

Mas nunca cheguei a trabalhar de motorista. Somente um tempo, em que eu, já
com a carteira de motorista, vi uma vaga no jornal e fui ver como era. Falei com o
homem e ele disse que eu voltasse no outro dia. Eu cheguei na Empresa
Fortaleza e avisei o rapaz do setor... não falei nem com o Seu Lima: “– Rapaz, eu
vou tentar um serviço, se der certo, eu vou ficar por lá.”
O serviço era para dirigir uma Kombi de um doutor, o Dr. Edmar... era até meu
xará. Só que eu era um motorista meio... Ainda não tinha aquela prática. Eu
trabalhei uma só semana com o Dr. Edmar, porque parece que ele notou que eu
não dirigia bem... Pagou só a minha semana, no valor de 600 cruzeiros na época.
Era pouco.
Eu voltei para Empresa Fortaleza. Quando cheguei, eu disse: “- Rapaz, o serviço
lá não deu certo, não. Acho que eu era um motorista “rabo de cabra”, um motorista
enrolado, um mau motorista. Eu tinha era que trabalhar na Fortaleza mesmo.
Apesar de um não querer ser cobrador, quando a gente é novo tudo é bom para
gente. Principalmente os amigos... E eu tinha muitas paqueras no ônibus! Só que
muitas moças só queriam paquerar para a gente dispensar a passagem delas...
Quando encontravam a gente em outro local, faziam que nem nos conheciam! Eu
cheguei a notar que era muita paquera por interesse, porque às vezes elas que
não tinham condição financeira e faziam amizade com cobrador e motorista só
para que não cobrassem a passagem delas.
Eu trabalhei até 1960 como cobrador. Até que uma vez, fui escalado para
trabalhar num carro, do meio dia até meia noite. Naquela época, os menores não
podiam trabalhar até meia noite, mas eles colocavam a gente mesmo assim.
Acontece que era um dia de futebol. Eu gostava de futebol. Furei a escala e não
fui trabalhar. No outro dia eu fui chamado pela diretoria da empresa e peguei dez
dias de suspensão, por causa deste negócio.

Quando eu estava voltando para trabalhar, o Seu Lima mandou me chamar para
ficar na gerência. Tem coisa que é coisa de Deus! Aconteceu esta suspensão e eu
já estava pronto para levar uma bronca, quando fui chamado para trabalhar na
gerência! Acho isso aconteceu devido ao meu comportamento, pois esse tempo
todo como cobrador eu nunca tinha feito mais nada que prejudicasse e empresa.
A proposta de trabalhar na gerência foi uma felicidade para mim. Era como se eu
tivesse sido promovido. Era para eu para prestar contas, à noite, com os
cobradores. Então, eu trabalhava o expediente normal e ainda trabalhava a noite
também. Tinha também outro rapaz que trabalhava comigo. E tinha um vigia, que
também trabalhava na época. Esse vigia auxiliava a gente a despejar as fichas da
caixa coletora. Ele dava uma mãozinha... tirava as fichas da caixa e trazia para o
rapaz contar.
Quando os cobradores traziam as fichas e a gente anotava num mapa: colocava o
número do carro, o número da linha e fazia a conta do cobrador. Era assim: o
cobrador saía no carro com 1.000 fichas inteiras e com 600 fichas meias. Se ele
tinha levado 1.000 fichas e trazia 500, por exemplo, então ele tinha vendido 500. E
aí a gente calculava com o valor da passagem. Se tivesse saído com 600 meias e
voltado com 400, ele tinha vendido 200 meias.
Depois eu fazia a conta das meias com as inteiras e descontava na hora o salário
do cobrador para ele poder receber o dinheiro diariamente. Naquela época, o
pagamento era pela diária, tanto do motorista como do cobrador. Motorista recebia
comissão de 10%. Do cobrador o percentual era de 5%. Era carteira assinada,
mas eles recebiam diariamente, por comissão... Como é no comércio, só que no
comércio tem salário mais comissão. Não me lembro quando foi que esse sistema
mudou, mas lembro que ficou por pouco tempo. Já o meu salário era fixo, mas eu
não tenho lembrança quanto era na época.

Muitos cobradores pegavam o dinheiro e no outro dia já estavam sem nada.
Pegavam e gastavam tudo. Eu nunca gostei de fazer isto não... Sempre eu
guardava um pouco para ter no outro dia. Eu sempre gostei de me preocupar com
o dia de amanhã, porque ninguém nunca sabe o que vai acontecer amanhã.
Ás vezes, o cobrador queria levar vantagem e enganava o passageiro: o cara
dava um valor e ele dava o troco errado... Isso acontecia muito. Não é que eu
queira ser bonzinho não, mas graças a Deus, eu tratei de fazer meu serviço
direitinho, a prova é que eu estou trabalhando até hoje na empresa. Se eu não
tivesse feito meu serviço direito, hoje eu não estaria aqui.
Na gerência nunca deu problema, porque eu prestava a conta deles aqui e já
descontava a comissão. Aí eles saíam na ordem, ficavam na fila. Um cobrador
vinha, prestava conta e saía. Depois vinha outro, prestava conta, e saía. E aí eu
guardava o dinheiro num cofre. Inclusive, o cofre está ainda aqui desde 1955,
quando cheguei na empresa. Ele ficava na sala do Seu Lima. As fichas ficavam
num caixote.
Algumas vezes eu cheguei a discutir com os cobradores por questão de dinheiro
desarrumado. Quando eles traziam o dinheiro desarrumado, com muita moeda,
dava muito trabalho para a gente conferir. Eu reclamava com o cobrador: “–
Rapaz, ajeita mais esse dinheiro aí. Tu estás trazendo este dinheiro todo
desarrumado, desorganizado...”
Nessa época, eu gostava da hora do almoço. Tinha uma senhora que fazia uma
comida muito gostosa. A empresa ficava lá na Aerolândia, em frente à Base
Aérea. O almoço a gente comprava e muitas vezes, pagava por semana.
Além desse trabalho com os cobradores, eu fazia outra tarefa também: Encerrava
a prestação de contas e pegava o dinheiro todo numa maleta, que, naquela época
era chamada de maleta 007. E eu saía, pegava um táxi e ia deixar o dinheiro no

Banco Parnaíba. Naquela época a gente andava com dinheiro tranqüilo, não tinha
nenhum problema. Eu ia de táxi todos os dias. Era como um office boy. Cheguei a
fazer esse trabalho de ônibus também, mas logo falei com o dono da empresa,
dizendo que era muito ruim andar de ônibus com aquela mala cheia de dinheiro e
perguntando se ele me autorizava ir de táxi.
Assim eu saía, depositava o dinheiro, percorria os bancos fazendo pagamentos,
quitando duplicatas e quando chegava no último, eu voltava. O pessoal dos
bancos já me conhecia, então eu deixava os papéis lá: “- Eu quero pagar uma
duplicata da Auto Viação Fortaleza”... O pessoal do banco já sabia. Aí eu não
ficava esperando, porque tinha muita fila. Depois vinha só recolhendo as
duplicatas. Era muito cansativo... quando terminava o expediente, eu ia direto para
casa, jantava e vinha trabalhar de novo. A mulher ficava em casa, cuidando dos
meninos.
Teve um dia eu saí com o dinheiro dentro da pasta 007. Cheguei no banco e
coloquei no balcão o dinheiro todo espalhado. Eu não tinha medo de ladrão,
porque naquela época tinha menos... Mesmo assim, chegou um rapaz e colocou a
mão em um dos pacotes. Então eu disse: “- Eh, rapaz... Espere aí, deixe aí!”. Aí
ele disse para mim: “- Não dê sopa, senão eu levo. “
Enfim, quando eu comecei a trabalhar na gerência, eu entrava às sete da manhã,
ia para casa almoçar e entrava de novo à uma da tarde. Ficava na empresa até às
três horas, porque eu tinha que levar o dinheiro para o banco e resolver alguma
coisa no comércio. De lá, eu ia para casa, chegava mais ou menos às cinco e
meia, tomava banho, jantava, - muitas vezes eu nem jantava, porque chegava em
cima da hora e deixava para jantar quando eu voltasse. Voltava para a empresa
às sete horas da noite e saía às nove ou dez horas... Isso era sacrificado para a
minha família.

Passei 17 anos trabalhando nesse sistema. Foi muito tempo... Inclusive hoje, eu
ainda trabalho na tesouraria. Só que mudou: antigamente chamava de gerência.
Tenho 31 anos como tesoureiro. Eu me acordo às cinco horas da manhã e entro
na empresa às seis horas. Trabalho até 11 horas, depois vou para casa, com
intervalo de duas horas. Depois, entro de volta à uma da tarde e saio às quatro.
Só que eu nunca saio às quatro... fico sempre mais um pouco, porque eu acho
que é muito cedo para estar às quatro horas em casa. Fazendo o quê?
A tesouraria tem sete pessoas. Teve uma época que eu fazia o pagamento dos
motoristas. Fazia um envelope para cada um todos os dias. Depois pagamento de
pessoal passou a ser semanal, depois quinzenal. Hoje, eu não faço mais
pagamentos de funcionários, porque essa parte ficou com o setor pessoal. Minha
responsabilidade é só com dinheiro que entra na tesouraria. Além disso, hoje os
funcionários recebem em banco, o que acho muito bom para uma empresa como
esta, com 800 pessoas...
Em computador não mexo muito, não. Meu serviço é mais fazendo conferência de
dinheiro. Faço pagamentos internos ou de empresas que prestam serviço para cá
e fornecedoras. Atendo também os cobradores, quando eles chegam com aqueles
malotes, para conferir a conta deles. Muitos querem que a gente confira logo na
hora, porque às vezes, no malote, falta dinheiro. Eu acho melhor que o cobrador
espere para sair tudo limpo.
Quem trabalha com dinheiro sempre tem momentos estressantes, e, às vezes,
cheguei a levar problemas para casa. È um ramo muito sério, pois quem trabalha
com dinheiro sempre sofre desconfianças. Mas, graças a Deus, eu procuro fazer
de uma maneira para que não haja nenhuma desconfiança. Muitas vezes, eu vou
encerrar aquela contagem de dinheiro, e aí dá problema... dá uma falta e já é um
problema! Muitas vezes você procura e encontra, mas em outras vezes você não

encontra... O responsável pela tesouraria sou eu. Eu é que tenho de prestar conta
daquele dinheiro que recebi.
Uma vez, eu estava almoçando e teve um assalto aqui. Levaram R$ 29.000,00.
Outra vez, levaram mais R$ 35.500. Renderam o diretor, o Ronaldo, no chão e
ficaram com a arma apontada para ele. Depois veio um rapaz que fez a
ocorrência. Mas o dinheiro é segurado. A gente só mostra os boletos, para checar
com a quantia que foi roubada. O seguro é só de R$ 30.000,00 e o que excede a
isso, a empresa perde.
No final de meu serviço, eu pago à contabilidade. O carro forte vem pegar uma
parte do dinheiro, mas a papelada de pagamento eu passo toda para
contabilidade. O dinheiro que cobradores trazem à tarde, eu ainda guardo no meu
cofre antigo. Agora, o da noite não coloco nele, porque é muito dinheiro. Esse, o
pessoal passa para a boca de lobo, que é um cofre muito maior, que comporta
muito mais dinheiro.
Eu me aposentei no dia 25 de Fevereiro de 1987. Foi o seguinte: eu me aposentei
proporcional, não esperei nem pelo tempo. Fui contar meu tempo de serviço e na
época deu 31 anos e dois meses. Eu conversava muito com o seu Lima e ele
disse assim: “- Rapaz, tu devias se aposentar, porque ao invés de você pagar, vai
é receber.” Aí eu disse: “- Sabe que é mesmo?!”
Então fui falar com o Ronaldo e perguntei a ele: “- Se eu me aposentar, posso
continuar trabalhando aqui?” Ele disse que eu podia, que não tinha problema
nenhum. O Seu Lima já tinha me dado luz e o Ronaldo confirmou. Então eu fui
atrás da aposentadoria.
Se eu não pudesse continuar na empresa, não tinha me aposentado. Não queria
ficar ocioso. Resolvi me aposentar e recebi meus direitos, fundo de garantia,

seguro, tudo. Fiquei na empresa. Eles assinaram minha carteira de novo no dia 1º
de Setembro de 1987 e já estou com 16 anos de carteira assinada novamente.
Hoje eu sou o tesoureiro e é bom. Graças a Deus posso trabalhar e consegui uma
vida melhor. Tenho uma casa onde morar, um carrinho para andar, tenho uma
família com quem me relaciono muito bem. Tenho 07 filhos.
Meus filhos Marcos e Marcelo também trabalham aqui na Fortaleza. O Márcio está
no setor pessoal e o Marcelo é digitador na tesouraria. Fui eu que trouxe o Marcos
para cá. Ele estava fazendo faculdade e ficava a parte da tarde sem fazer nada. Aí
eu falei com o Ronaldo, nosso diretor, perguntando se eu podia trazer um filho que
estava fazendo faculdade, para ele poder fazer alguma coisa e ajudar nos
estudos. Aí ele veio e está aí até hoje. Já tem 22 anos de empresa.
O outro filho trabalha comigo, mas está de férias. Eu tenho três filhos que
trabalham no setor dos transportes: dois estão na Fortaleza e um outro está na Via
Urbana. Cinco dos meus filhos já são formados e tem um outro que já está
chegando lá.
A gente sempre quer o melhor para os filhos... Eu gostaria que eles... Mas aqui é
bom. Se você for comparar em termos de salário, pouca gente tem o salário que a
gente tem aqui. Podemos nos considerar privilegiados.
Eu acho que a minha tarefa na empresa é importante. Há uma confiança, e, aqui,
se confia plenamente naquele setor do qual eu sou responsável. Eu acho muito
isso muito importante. Principalmente na tesouraria, onde se trabalha com
dinheiro, precisa ter muita confiança. Tem gente que não pode ver dinheiro, não. É
uma responsabilidade muito grande. Graças a Deus eu sou recompensado por
isso.

No dia 25 de março deste ano completei 48 anos e 9 meses de trabalho, contando
tudo até hoje! Eu acho que isso é até uma felicidade, porque existem poucos
casos destes. Às vezes eu paro para pensar e fico imaginado como é que pode a
pessoa passar este tempo todo trabalhando, enquanto está faltando tanto
emprego.
Essa empresa tem mais de 50 anos. Quando o Seu Lima comprou, ela já tinha
outro dono. Já tinha passado por dois donos. O primeiro dono foi o Manoel
Serafim e o segundo foi o Herculano, que é cunhado do Seu Lima. Foi do
Herculano que passou para o Seu Lima.
Nesse tempo todo aqui, vivi alguns momentos de crise, que a gente acaba
acompanhando. Mas essas crises não afetaram o meu trabalho, porque sempre fiz
a mesma coisa durante elas. Só que a gente se preocupa com as crises, porque
quem trabalha numa empresa destas tem que zelar pelo seu bem estar. Se a
empresa está bem, o funcionário tem que acompanhar; se a empresa está mal, aí
fica ruim para o funcionário também.
Na época que entrou este grupo do Seu Jacob, a empresa melhorou muito! Ele
colocou muito dinheiro aqui e melhorou muito a situação. Ele chegou em 1991. A
empresa cresceu muito mais. Veio muito sangue novo e a gente vai aprendendo
com isso.
E nunca gostei de participar de sindicato, não. Eu era apenas um contribuinte...
Até a época que eu me aposentei eu paguei trinta e tantos anos de sindicato.
Depois que me aposentei eu não paguei mais. O sindicato sempre traz algum
benefício para a gente. Ele faz aquelas greves e as empresas sempre cedem um
pouco.
Só que eu nunca participei de greve. Quando elas aconteciam, a gente ficava
sempre na empresa, só vendo e recolhendo os ônibus. Alguns funcionários iam,

mas, eu mesmo, nunca fui. E nunca ninguém reclamou por eu não ir às greves...
Cada um tinha a sua opção. Eles ficavam lá fazendo a greve e depois chegavam a
beneficiar a gente também.
Sabe, eu gosto muito de trabalhar aqui. Passei minha vida toda aqui. Só cheguei a
fazer até o primário, e esta empresa é como se fosse uma escola, um colégio para
mim. Eu aprendi muitas coisas aqui. Parece que eu fui para uma sala de aula...
Quando eu cheguei aqui, mesmo com a 5ª série, eu não sabia quase nada. Acho
que me acomodei demais... Me preocupei só com trabalho, trabalho... Aí esqueci
do futuro, esqueci de estudar. Comecei a trabalhar cedo, ganhando dinheiro e fui
me empolgando com aquele dinheirinho que ganhava. Depois veio o namoro, o
casamento, os filhos e pronto. Mas graças a Deus eu estou feliz, mesmo assim.
Eu era muito amigo do Seu Lima. Ele foi como o meu segundo pai, porque ele fez
muita coisa por mim. Me ajudou comprar uma casa, eu fiz o acordo com a
empresa para não sair....
Por isso, se eu fosse começar de novo, escolheria de novamente essa história no
transporte. Foi um caminho que eu procurei e me dei bem... mesmo com a minha
pouca escolaridade.
Hoje, nem penso nas coisas que eu gostaria de mudar no meu serviço. Acho que
não vou passar muito tempo mais por aqui... Não que eu esteja cansado, mas
porque estou aqui há tanto tempo e acho que vai chegar o dia de o dono pedir
para eu sair. Só que eu fiz um propósito comigo mesmo: assim como eu cheguei
pedindo para entrar, quero, um dia, chegar lá nos homens e pedir para sair. Não
quero nunca ser posto para fora da empresa, não. “ - Ah! Botaram o Edmar para
fora da empresa!”. Isso não. Eu quero que chegue um dia que eu vá lá e agradeça
a todos os diretores por tudo que eles fizeram por mim. E eu sei que nesse dia o
impacto vai ser grande para mim.