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6.- Um currículo de autoconhecimento, re ... - Claudio Naranjo

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psicológicos baseados na associação liv<strong>re</strong> <strong>de</strong> idéias (que <strong>de</strong>sc<strong>re</strong>vi em meu livro Ent<strong>re</strong> Meditação e<br />

Psicoterapia), e uma disciplina nova surgida da dança: o “movimento autêntico”, ensinado<br />

originalmente por Mary Whitehouse.<br />

Assim como contrapus o “pa<strong>re</strong>” e o “siga” da meditação, e <strong>de</strong>sc<strong>re</strong>vi uma polarida<strong>de</strong> ent<strong>re</strong><br />

os gestos interio<strong>re</strong>s <strong>de</strong> verter a atenção para a profundida<strong>de</strong> sagrada da mente ou até os<br />

conteúdos conc<strong>re</strong>tos <strong>de</strong>sta, po<strong>de</strong>mos comp<strong>re</strong>en<strong>de</strong>r a dimensão afetiva da mente (não menos<br />

<strong>re</strong>levante para a meditação) em termos <strong>de</strong> uma complementarida<strong>de</strong>. Muitas formas <strong>de</strong> meditação<br />

têm como assunto <strong>de</strong> base o <strong>de</strong>sapego: um dar um passo atrás, <strong>de</strong>si<strong>de</strong>ntificando-se do que está<br />

se passando, sentindo ou <strong>de</strong>sejando. Estamos nos tomando <strong>de</strong>masiado a sério, po<strong>de</strong>-se dizer,<br />

estamos <strong>de</strong>masiado imersos em nossa dor ou em nossas p<strong>re</strong>ferências, em nossas opiniões e<br />

especialmente em nossas cicatrizes – quer dizer nos melind<strong>re</strong>s do que nos aconteceu alguma vez<br />

e que, todavia, <strong>re</strong>cai sob<strong>re</strong> nós como uma sombra ou como um fantasma, separando-nos do<br />

p<strong>re</strong>sente. O que os orientais chamaram Karma não é outra coisa senão o peso do passado sob<strong>re</strong><br />

o p<strong>re</strong>sente (que não p<strong>re</strong>cisa necessariamente ser <strong>de</strong> outras vidas). Em vista do apego que<br />

caracteriza nosso estado habitual (e muito mais as perturbações emocionais) necessitamos dar<br />

um passo, às vezes em forma <strong>de</strong> humor, às vezes simplesmente <strong>de</strong> forma se<strong>re</strong>na. Naturalmente<br />

tal “atitu<strong>de</strong> filosófica”, característica da sabedoria, po<strong>de</strong> ser alcançada com o tempo através da<br />

experiência da vida, porém é parte intrínseca <strong>de</strong> certas práticas <strong>de</strong> meditação cujo fruto é o que<br />

propus chamar uma “indife<strong>re</strong>nça cósmica”.<br />

Por mais que seja um i<strong>de</strong>al da vida chegar a uma atitu<strong>de</strong> amorosa, não são<br />

incompatíveis o amor e o <strong>de</strong>sapego; e não só não são opostos, como também constituem uma<br />

misteriosa complementarida<strong>de</strong>: é mais fácil a chegada ao amoroso se somos capazes do<br />

<strong>de</strong>sp<strong>re</strong>ndimento, pois não se po<strong>de</strong> dar quando se está <strong>de</strong>masiado apegado ao que se é ou ao<br />

que se tem. E é também difícil conseguir o <strong>de</strong>sapego sem uma atitu<strong>de</strong> generosa, sem<br />

entusiasmo, amor à vida, amor ao outro, amor a algo. Esta complementarida<strong>de</strong> é similar à da<br />

vida e da morte, que tão ent<strong>re</strong>laçadas apa<strong>re</strong>cem em certas obras literárias.<br />

Se a terapia tem que ver mais com o pólo do amor, a meditação aponta mais ao<br />

<strong>de</strong>sapego, porém também é certo que, tanto na teoria da terapia como na teoria da meditação,<br />

necessitamos consi<strong>de</strong>rar ambos os assuntos e comp<strong>re</strong>en<strong>de</strong>r sua complementarida<strong>de</strong>.<br />

Porém, quão distante está <strong>de</strong> nossa prática educativa a idéia <strong>de</strong> que o silêncio mental ou<br />

a <strong>de</strong>si<strong>de</strong>ntificação das paixões (<strong>de</strong>sapego) possam constituir capacida<strong>de</strong>s fundamentais do ser<br />

humano e seu cultivo uma importante via para a consciência espiritual. E quanto mais distantes<br />

estamos <strong>de</strong> levarmos a sério essa capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ent<strong>re</strong>ga, <strong>de</strong> sintonia com a profundida<strong>de</strong> da<br />

vida, <strong>de</strong> acordo com o todo! Hoje em dia apenas se propõe combinar a instrução com uma<br />

“educação dos valo<strong>re</strong>s” porém na prática só se traduz, no melhor dos casos, em uma valoração<br />

<strong>de</strong> tais valo<strong>re</strong>s. As capacida<strong>de</strong>s que aqui proponho como facetas essenciais da vida espiritual<br />

<strong>re</strong>que<strong>re</strong>m, pelo contrário, muito mais que entusiasmo e <strong>re</strong>tórica: cultivam-se através <strong>de</strong> uma<br />

prática transformadora e <strong>re</strong>que<strong>re</strong>m a p<strong>re</strong>sença <strong>de</strong> guias que, através da disciplina<br />

cor<strong>re</strong>spon<strong>de</strong>nte, tenham chegado a encarná-las.<br />

Outro tanto se po<strong>de</strong> dizer do aspecto da meditação que se orienta para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento da capacida<strong>de</strong> sacralizante, que pa<strong>re</strong>ce haver se tornado ir<strong>re</strong>levante em nosso<br />

<strong>de</strong>sencantado mundo pós-mo<strong>de</strong>rno. Acaso então os gênios <strong>re</strong>ligiosos da humanida<strong>de</strong> foram<br />

meros sonhado<strong>re</strong>s ao nos <strong>re</strong>comendar o amor a Deus como o mais importante dos p<strong>re</strong>ceitos?<br />

Suspeito que a <strong>de</strong>terioração coletiva da consciência seja <strong>re</strong>sultado <strong>de</strong> nosso espírito<br />

excessivamente mercantil, ao que não convém que se invoquem valo<strong>re</strong>s que possam competir<br />

com as ganâncias.<br />

Porém <strong>de</strong>ixo aqui o tema da meditação e passo para a consi<strong>de</strong>ração do elemento<br />

terapêutico neste <strong>currículo</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento humano que estou propondo como complemento<br />

para a atual formação <strong>de</strong> educado<strong>re</strong>s. Ao anunciá-lo como um <strong>currículo</strong> (suplementar) <strong>de</strong><br />

“<strong>autoconhecimento</strong>, <strong>re</strong>educação interpessoal e cultivo espiritual” já aludi implicitamente ao<br />

terapêutico através <strong>de</strong> dois fato<strong>re</strong>s intimamente conexos: o do conhecimento <strong>de</strong> si ou insight, e o<br />

<strong>de</strong> promover uma mudança voluntária nas <strong>re</strong>lações humanas. E assim disse que no programa

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