uma análise das políticas sociais e sua vinculação - Unioeste
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UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS SOCIAIS E SUA VINCULAÇÃO COM O<br />
DESENVOLVIMENTO<br />
Cristiane Regina Corbari 1<br />
Jaqueline Aparecida Oliveira Santander 2<br />
Jociane Martins Pedroso 3<br />
Roseli dos Santos 4<br />
Neiva Gallina Mazzuco 5<br />
RESUMO<br />
O presente artigo pretende fazer <strong>uma</strong> <strong>análise</strong> <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>, particularmente da<br />
educação e <strong>sua</strong> <strong>vinculação</strong> com o desenvolvimento. Uma avaliação mais detalhada<br />
dessas <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> nos permite observar que as mesmas revelam as características<br />
específicas do capitalismo brasileiro, tendo em vista que emanam do Estado e, por este<br />
estar submetido aos interesses gerais do capital, se faz necessário ampliar seus<br />
mecanismos de controle social através <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>. Esse entendimento não<br />
desconsidera os aspectos contraditórios próprios do real, e, por isso, entende que, à<br />
medida em que servem ao Estado como controle e administração da lógica capitalista, as<br />
<strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> são também importantes espaços de deman<strong>das</strong> <strong>das</strong> classes<br />
trabalhadoras na busca de melhores condições de vida e trabalho. Dentro da metodologia<br />
inicialmente proposta, primeiramente nos detivemos na conceituação da categoria<br />
desenvolvimento, estudando teóricos como Furtado (1975), Prebisch (2000), Cardoso<br />
(1981) e Faletto (1981), que defendem a idéia de que os países ditos em<br />
desenvolvimento poderiam vir a ser desenvolvidos. Posteriormente, observando <strong>uma</strong><br />
vertente oposta, estudamos os teóricos Marini (2000) e Ouriques (1996), os quais<br />
argumentam, sob o prisma da teoria da Dependência, que no capitalismo os países<br />
periféricos não alcançarão o mesmo desenvolvimento que os países centrais<br />
independente <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> implanta<strong>das</strong>. Comungando com esses dois teóricos,<br />
entendemos que apesar de haver um grande avanço tecnológico nos últimos anos, a<br />
melhoria <strong>das</strong> condições de vida da maior parte da população dos países periféricos<br />
caminha em direção contrária a esse desenvolvimento.<br />
Palavras Chave: Desenvolvimento, Capitalismo, Estado e Políticas Sociais.<br />
1 Aluna PIBIC/UNIOESTE 2005/2006. Acadêmica do 3º ano de Pedagogia da UNIOESTE – Campus de<br />
Cascavel.<br />
2 Aluna PIBIC/UNIOESTE 2004/2005 e 2005/2006. Acadêmica do 2º ano de Pedagogia da UNIOESTE –<br />
Cascavel.<br />
3 Pedagoga. Pós-graduanda em Fundamentos da Educação – UNIOESTE – Campus de Cascavel. Membro do<br />
Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais e do Grupo de Pesquisa em Gestão Escolar – Gpge. Telefone: 45 -<br />
3037 3286. E-mail: jociane_martins@yahoo.com.br.<br />
4 Aluna PIBIC/CNPq 2004/2005. Acadêmica do 2º ano de Pedagogia da UNIOESTE – Cascavel.<br />
5 Professora Ms. do Colegiado de Pedagogia da UNIOESTE – Campus de Cascavel.
O presente trabalho é resultado de discussões realiza<strong>das</strong> a partir do projeto “Estudo <strong>das</strong><br />
<strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> articulado à <strong>análise</strong> dos diferentes padrões de desenvolvimento que<br />
vigoraram no Brasil após 1930”, realizado no Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais –<br />
GPPS, cuja pesquisa está sendo realizada por meio de discussões semanais, estudos<br />
bibliográficos, sistematizações, seminários internos e externos envolvendo pesquisadores<br />
com diferentes leituras, mas com raiz no materialismo histórico. Tem por objetivo analisar<br />
as <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> e <strong>sua</strong> articulação com o desenvolvimento, entendendo a educação<br />
como parte da política social. Para entender tais <strong>políticas</strong>, é fundamental percebê-las<br />
como parte do movimento do capitalismo, pois <strong>sua</strong>s raízes se localizam no mundo da<br />
produção. Dessa forma, para compreender a política social é necessário remeter-se às<br />
transformações <strong>das</strong> relações econômicas. Do mesmo modo, não se pode analisar a<br />
política econômica desvinculada da política social (Vieira, 1992). Ainda, como afirma<br />
Faleiros (1941), as <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> não podem ser entendi<strong>das</strong> em <strong>uma</strong> perspectiva<br />
mecanicista, como boas ou ruins em si mesmas, é preciso analisá-las no próprio<br />
movimento <strong>das</strong> relações <strong>sociais</strong>.<br />
Esses estudos foram realizados em dois momentos. Inicialmente exploramos a categoria<br />
desenvolvimento e, logo após, o conceito e as contradições subjacentes às <strong>políticas</strong><br />
<strong>sociais</strong> e <strong>sua</strong> <strong>vinculação</strong> com o desenvolvimento, evidenciando como tais <strong>políticas</strong> se<br />
concretizam no campo educacional.<br />
Procuramos compreender o conceito de desenvolvimento a partir de, basicamente, duas<br />
correntes distintas. A primeira, considerada por nós conservadora, defendida por teóricos<br />
como Prebisch (2000), Cardoso e Faletto (1981), restringe-se a apontar como possíveis<br />
causas da dependência as relações de classe internas e peculiares a cada país, não<br />
mostrando as relações de domínio efetiva<strong>das</strong> pelos países centrais para com os<br />
periféricos. Assim, o subdesenvolvimento é entendido como <strong>uma</strong> etapa anterior ao<br />
desenvolvimento, ou seja, é possível que os países periféricos cheguem aos mesmos<br />
patamares de desenvolvimento que os países centrais. Para esses autores, é possível a
promoção do desenvolvimento mesmo para os países que estão em situação de<br />
dependência, os quais vêem essa relação como <strong>uma</strong> característica natural do<br />
capitalismo, ou seja, ela se faz necessária para se alcançar um novo patamar nas<br />
economias dos países periféricos dependentes. Portanto, segundo esse entendimento, a<br />
situação de dependência é um estágio do desenvolvimento pelo qual to<strong>das</strong> as economias<br />
passam. Para eles, nos países em situação de dependência, o único caminho para se<br />
chegar ao desenvolvimento seria por meio de investimentos originários <strong>das</strong> economias<br />
dos países centrais. Essa “fase”, para os autores, não pode ser entendida como um<br />
período de estagnação, mas sim, como parte do processo necessário em direção ao<br />
desenvolvimento, vendo a dependência como <strong>uma</strong> etapa intermediária. Nessa direção,<br />
Cardoso (1981), Falleto (1981) e Prebisch (2000) defendem a tese de que o<br />
desenvolvimento pode acontecer mesmo para os países em situação de dependência.<br />
Posteriormente, observando <strong>uma</strong> vertente oposta, estudamos o teórico Marini (2000), o<br />
qual defende, sob o prisma da Teoria da Dependência, que no capitalismo os países<br />
periféricos não alcançarão o mesmo desenvolvimento que os países centrais,<br />
independente <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> implanta<strong>das</strong>. Nessa perspectiva marxista, o<br />
desenvolvimento é visto como resultado <strong>das</strong> relações contraditórias entre diferentes<br />
países, com predomínio <strong>das</strong> determinações econômicas dos países centrais. Dessa<br />
forma, desenvolvimento não é necessariamente <strong>uma</strong> etapa superior de evolução dos<br />
países, mas sim, <strong>uma</strong> relação de dependência.<br />
Pela <strong>análise</strong> <strong>das</strong> duas concepções de desenvolvimento já apresenta<strong>das</strong>, observamos que<br />
as relações econômicas capitalistas acontecem de modo desigual entre os países<br />
centrais, produtores de tecnologia e os periféricos/dependentes, que fornecem produtos<br />
de subsistência e mão-de-obra pesada, já que essas dinâmicas propiciaram aos países<br />
centrais o privilégio de gastarem <strong>sua</strong>s energias com os avanços científicos e<br />
tecnológicos, enquanto os outros países, entre eles os latino-americanos, foram induzidos<br />
a produzir bens de subsistência.
Com esse entendimento de dependência, Marini (1973) e Ouriques (1996) explicaram a<br />
superexploração do trabalho, compreendendo-a como conseqüência <strong>das</strong> relações<br />
desiguais de troca tecnológica entre os países centrais e os periféricos – estes últimos<br />
em invariável desvantagem, o que propiciou a redução dos seus mercados e impulsionou<br />
para baixo os preços dos seus produtos. Dessa forma, a burguesia dos países<br />
dependentes deparou-se com o acirramento em <strong>sua</strong>s relações econômicas, não lhes<br />
restando outra saída (no modo de produção capitalista) se não compensar <strong>sua</strong>s per<strong>das</strong><br />
recorrendo à superexploração do trabalho, entendido por Marini e Ouriques como rígido<br />
regime de regulação da força de trabalho, em que a acumulação de capital se dá a partir<br />
de <strong>uma</strong> intensa exploração do trabalhador e não apenas pelo aumento da <strong>sua</strong><br />
capacidade produtiva, como ocorre através do desenvolvimento tecnológico nos países<br />
economicamente hegemônicos, manifestada pela redução salarial, seguida pelo aumento<br />
da jornada ou intensidade de trabalho, em nome de um pacto desenvolvimentista que<br />
põe, sempre à frente do futuro próximo, a promessa da elevação salarial correspondente<br />
ao maior desgaste da força de trabalho.<br />
Nessa perspectiva, entendemos que a relação econômica dos países centrais com os<br />
periféricos pode ser definida pela prevalência dos interesses dos primeiros em detrimento<br />
dos segundos, tornando estes últimos dependentes, visto que os países centrais, em<br />
nome de seu desenvolvimento, apropriam-se inescrupulosamente da maior parte do<br />
excedente dos países periféricos, reduzindo-os ao estado de dependência enquanto<br />
houver capitalismo.<br />
Como resultado desse estudo, podemos destacar, dialeticamente, que o avanço de <strong>uma</strong><br />
nação se dá, necessariamente, em função do retrocesso de outra(s) e que, quanto mais<br />
desenvolvido for o mercado mundial, nessa organização capitalista, maior será a garantia<br />
de continuidade <strong>das</strong> relações econômicas que debilitam cada vez mais os países<br />
periféricos dependentes. Assim, no modo de produção capitalista não existem chances de<br />
superação da condição de dependência dos países periféricos. Conseqüentemente,
nessa sociedade de classes, jamais um país periférico alcançará o mesmo<br />
desenvolvimento que os países centrais.<br />
Nesse contexto, a origem <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> está articulada com as relações de<br />
trabalho. Nele se pode observar sérias limitações no momento de garantir à maioria da<br />
população níveis mais justos em relação à qualidade de vida, ou seja, o atendimento <strong>das</strong><br />
necessidades básicas de cada indivíduo. Quando o trabalhador apenas produz e não<br />
usufrui os resultados de seu trabalho, a desigualdade é acirrada, as necessidades<br />
básicas não são atendi<strong>das</strong>, colocando em risco o próprio movimento do capitalismo. Em<br />
razão disso, o Estado passa a fomentar <strong>políticas</strong> públicas, objetivando amenizar as<br />
conseqüências da pobreza, a fim de diminuir a insatisfação da grande massa, a qual fica<br />
à margem do acesso à qualidade mínima de vida.<br />
A Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa foram importantes momentos históricos<br />
em que a necessidade de tais <strong>políticas</strong> tornou-se mais evidente, época em que houve o<br />
acirramento da luta de classes, pois as classes populares sentiram os efeitos da guerra: o<br />
aumento da miséria e da pressão sobre os indivíduos, forçando o Estado a se<br />
reorganizar, para manter-se como garantidor e legitimador da ordem capitalista. Para<br />
acalmar as massas, a burguesia propôs um Estado que voltasse <strong>sua</strong> atenção para<br />
<strong>políticas</strong> imediatas e realizou <strong>uma</strong> certa abertura política para satisfazer as reivindicações<br />
populares, o que não foi o suficiente para acalmar os protestos da sociedade, já que no<br />
modo de produção capitalista, o Estado não visa à concretização de <strong>uma</strong> sociedade justa,<br />
o que, segundo Boron (2002), só seria possível com <strong>uma</strong> ruptura dessa organização<br />
social.<br />
Outro relevante marco histórico que retrata a existência de <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>, porém em<br />
outros moldes, foi o período posterior à crise de 29, quando o Estado intensificou seu<br />
papel de agente ativo direcionador do processo capitalista, no qual a teoria<br />
desenvolvimentista, preconizada por Keynes, defendeu a intervenção do Estado na<br />
economia como imposição necessária no enfrentamento da crise, a qual foi vista como a<br />
única forma de evitar o colapso total do sistema. Para tanto desenvolveu <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>
que visaram à estabilidade no emprego, <strong>políticas</strong> de ren<strong>das</strong> com ganhos de produtividade<br />
e de previdência social, incluindo o seguro desemprego, bem como o direito à educação,<br />
subsídio no transporte e outras medi<strong>das</strong>.<br />
Dessa forma, o Keynesianismo ganhou espaço como <strong>uma</strong> estratégia de expansão <strong>das</strong><br />
atividades econômicas com a falsa ilusão de que os lucros seriam revertidos em Bem-<br />
Estar Social para toda a população. Esse modelo de Estado benfeitor 6 volta <strong>sua</strong>s ações<br />
também para a pacificação social, por meio da expansão de serviços <strong>sociais</strong>, a fim de<br />
estabilizar e legitimar o projeto liberal (Boron, 2002), compreendendo, como Faleiros<br />
(1981), que a política social teria somente como função econômica subsidiar o consumo,<br />
para dar condições à classe explorada e excluída socialmente de também ter acesso a<br />
produtos específicos, politicamente selecionados, como forma de movimentar o<br />
capitalismo e garantir mais lucro.<br />
É preciso esclarecer que mesmo nos países centrais, o Estado de Bem-Estar Social não<br />
foi efetivamente concretizado. Ganhou mais espaço na Inglaterra, com apoio do Partido<br />
Trabalhista Britânico, fundado no começo do século XX, que nas palavras de Vieira<br />
(2001, p. 20) tinha por princípios “[...] a busca do pleno emprego; e o desenvolvimento<br />
acelerado pelo investimento do Estado em combinação com o investimento privado e com<br />
a poupança popular”. Contudo, no Brasil e nos demais países periféricos o<br />
keynesianismo não existiu. Neles, a política social aparece apenas como alguns serviços<br />
<strong>sociais</strong>, de forma pontual, fragmentada, setorizada, não se constituindo como política<br />
enquanto poder estatal, mas sim, como meios ou estratégias que o governo utiliza para<br />
manter <strong>sua</strong> dominação (Vieira, 1992). São programas e projetos setoriais de cunho<br />
assistencialista que visam apenas a manter o trabalhador vivo 7 (Marx e Engels, 1999). Na<br />
6 Há diversas denominações para o chamado Estado de Bem-Estar Social, entre elas destacamos: Welfare<br />
State, Estado benfeitor, intervencionista, Keynesianista e rede de proteção social.<br />
7 Marx e Engels (1999) não abordam a questão <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> especificamente, mas afirmam que a<br />
primeira condição de existência do homem é estar vivo e para isso precisa comer, beber, vestir, morar, enfim<br />
precisa estar vivo. Para tanto, quando o homem não é dono dos meios de produção, ele necessita vender <strong>sua</strong><br />
força de trabalho para sobreviver e, quando o resultado de seu trabalho não é o suficiente para <strong>sua</strong><br />
sobrevivência, cria-se a necessidade de <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>. Engels (1984), no livro a Origem da família, da<br />
propriedade privada e do Estado, mostra que o Estado nasceu <strong>das</strong> contradições da sociedade, como um órgão
medida em que busca controlar a população-alvo, camufla e esconde a problemática <strong>das</strong><br />
relações econômicas capitalistas. O que parecem ser medi<strong>das</strong> que visam a atender aos<br />
mais carentes, desamparados, como <strong>uma</strong> ação h<strong>uma</strong>nizadora, na realidade são<br />
iniciativas planeja<strong>das</strong> pelos representantes <strong>das</strong> classes dominantes e os tecnocratas<br />
estatais, que levam a maioria da população a ver seus efeitos imediatos (Faleiros, 1981)<br />
como serviços e programas da saúde, da assistência social, da previdência, da educação,<br />
entre outros.<br />
A partir da década de 70 do século XX, houve <strong>uma</strong> nova crise mundial do capital em que<br />
o Estado não pôde mais carregar sozinho o peso <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> e dar conta de<br />
investimentos na área econômica. Gentilli (1998) lembra que nesse período houve a crise<br />
do emprego, a queda ou estagnação do crescimento da economia, crise fiscal, tributária e<br />
cambial, o que mostrou que o Estado de Bem-Estar-Social só foi “satisfatório” enquanto a<br />
economia crescia; quando esta foi decaindo, <strong>sua</strong> continuidade tornou-se mais difícil. Vale<br />
lembrar também que o modelo intervencionista não favorecia a população em geral.<br />
No Brasil, por exemplo, no chamado “milagre econômico”, caracterizado pelo grande<br />
desenvolvimento econômico ocorrido entre 1969 e 1974, conseguido através da maciça<br />
entrada de capital externo no país, que acarretou enorme dívida, não desenvolvendo o<br />
mercado interno, já que se concentrou em grandes obras, muitas delas desnecessárias, e<br />
na produção de bens duráveis como automóveis e aparelhos eletrônicos. Bens esses<br />
inacessíveis à grande maioria da população, pois onde o crescimento aumentava a <strong>sua</strong><br />
distribuição foi desigual (Gentili, 1998), tanto que ocorreu, na época, <strong>uma</strong> <strong>das</strong> maiores<br />
concentrações de renda do mundo, onde os ricos ficaram mais ricos; os pobres, mais<br />
pobres.<br />
Os 5% mais ricos aumentaram <strong>sua</strong> participação de 30,3% para 34,7% na renda urbana; e<br />
de 23,7% para 44,2% na renda rural. Os 50% mais pobres diminuíram <strong>sua</strong> participação<br />
de 16% para 13,15% na renda urbana; de 22,4% para 14,9% na renda rural. A<br />
garantidor da continuidade <strong>das</strong> riquezas individuais. Dessa forma, as <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>, que são emana<strong>das</strong> do<br />
Estado, vêm para manter a acumulação da classe dominante.
concentração impediu a maior parte da população de usufruir o “milagre”, e o governo se<br />
justificava com a famosa teoria de que era preciso primeiro “fazer o bolo crescer para<br />
depois repartir”. Porém, o bolo cresceu, mas não foi repartido, “ficando para a maioria da<br />
população somente a promessa da distribuição de renda, tornando a situação do povo<br />
dramática, com o desemprego jamais visto, e o salário real em contínua queda”<br />
(ARRUDA; PILLETI, p. 325, 1996).<br />
Portanto, o Estado de Bem-Estar Social como sistema de regulação social e acumulação<br />
concentrou riquezas nas mãos de poucos e extrema miséria e exclusão para a maioria da<br />
população. Entretanto, no âmbito <strong>das</strong> lutas e contradições, também propiciou a aquisição<br />
de direitos <strong>sociais</strong>, os quais o neoliberalismo 8 procura, a todo custo, acabar, como forma<br />
de restaurar taxas de lucro do capital transnacional sob a égide do capital financeiro<br />
(FRIGOTTO,1994).<br />
Nesse contexto, o caminho encontrado pela burguesia foi a adoção do modelo chamado<br />
por muitos de neoliberal, o qual atribui novamente ao mercado o papel de agente motor<br />
da economia, tal como ocorria no liberalismo, pois, como lembra Boron (1999), destrói as<br />
conquistas <strong>das</strong> classes trabalhadoras e mercantiliza os serviços <strong>sociais</strong> (saúde,<br />
educação, seguridade social). Assim, quem tem acesso a esses serviços é quem<br />
consegue pagar, como escreve Faleiros (1981, p. 62): "[...] a transformação capitalista ao<br />
nível <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong>, justamente consiste na mercantilização dos serviços e<br />
benefícios" e essa mercantilização ocorre através <strong>das</strong> privatizações ou da criação de<br />
empresas priva<strong>das</strong> que prestam serviços <strong>sociais</strong> subvencionados pelo Estado. Mais <strong>uma</strong><br />
vez o fim último <strong>das</strong> <strong>políticas</strong> <strong>sociais</strong> se mostra colado com a lógica capitalista de<br />
favorecer o mercado.<br />
Concluindo, é interessante destacar que a questão da privatização vem adentrando o<br />
espaço educacional de forma mais intensa a partir da década de 90. Isso fica<br />
8 Neoliberalismo, em nosso entendimento, não significa um novo liberalismo, ou um liberalismo diferenciado,<br />
pois na realidade traz e reforça os princípios dos liberais clássicos, como o individualismo, utilitarismo,<br />
eficiência, entre outros.
evidenciado, por exemplo, no Plano Nacional de Educação (Lei n° 10 172 de janeiro de<br />
2001) quando nele é definido que, como os recursos destinados à educação são<br />
escassos, é preciso estimular a iniciativa de instituições da sociedade civil organizada.<br />
Como mostra Lima (2004), a participação desta sociedade civil organizada, na área<br />
educacional, é representada pelas instituições auxiliares da escola, como o conselho<br />
escolar, Associação de Pais e Mestres e grêmios estudantis, ou ainda através de<br />
programas como os Amigos da Escola que ganham o importante papel de auxiliar na<br />
manutenção da escola. Papel esse que reforça o pressuposto liberal de supervalorização<br />
dos indivíduos, no qual quem tem maior capacidade econômica é mais criativo, tem<br />
maior eficiência e eficácia, o que responsabiliza os sujeitos por <strong>sua</strong> situação de sucesso<br />
ou fracasso.<br />
A exemplo disso, podemos destacar a falta de priorização, por parte do Estado, da<br />
manutenção da considerada Universidade Pública. Observa-se a falta de recursos em<br />
muitos setores, desde a estrutura física, equipamentos, número de funcionários, até nos<br />
cursos de especialização, quando, na maior parte <strong>das</strong> vezes, são vistos como <strong>uma</strong> forma<br />
de prestação de serviços que devem ser pagos, em busca de recursos. As inúmeras<br />
taxas cobra<strong>das</strong> aos alunos na solicitação de documentos ou na inscrição de eventos<br />
também são indicativos de que os orçamentos dessas instituições são insuficientes para<br />
mantê-las nas três dimensões que as constituem: ensino, pesquisa e extensão. A<br />
situação ganha novo agravante ao analisarmos, ainda, os baixos salários dos<br />
professores, que os força a sobrecarregarem-se de trabalho para poderem se manter e,<br />
quando possível, investir em <strong>sua</strong> qualificação, já que também é <strong>uma</strong> área que o governo<br />
está, gradativamente, deixando de assumir.<br />
Esta precarização da Universidade Pública “coincide” com a busca/oferta desenfreada de<br />
cursos superiores privados que se adaptam à lógica do mercado. São cursos muitas<br />
vezes aligeirados, fragmentados, com ênfase no pragmatismo e utilitarismo, em nome da<br />
chamada gestão empresarial que visa à eficiência e eficácia. Tais cursos vão ao encontro<br />
<strong>das</strong> necessidades dos estudantes, estes vistos como clientes quanto às muitas
facilidades que os mesmos oferecem: duração do curso, parcelamento <strong>das</strong><br />
mensalidades, horários flexíveis, cursos à distância, ênfase na estrutura física, etc,<br />
embora alg<strong>uma</strong>s dessas características, em menor escala, também estejam presentes<br />
em instituições públicas.<br />
Como vimos, toda essa privatização interna no campo educacional é feita em doses<br />
homeopáticas, sendo que o Estado, a cada dia, fomenta novos mecanismos que<br />
propiciam a privatização da educação, sem que a sociedade perceba <strong>sua</strong><br />
intencionalidade.<br />
Como resultado da pesquisa compreendemos que a política social procura amenizar os<br />
conflitos entre as classes <strong>sociais</strong>, caracterizada como <strong>uma</strong> estratégia do governo que se<br />
compõe de planos e projetos, que objetiva atenuar as desigualdades, ou seja, ela está<br />
vinculada às necessidades populares e <strong>sua</strong>s reivindicações, sendo que o Estado atende<br />
alguns destes anseios, porém somente concede aquilo que é aceitável para os grupos<br />
dirigentes em cada época histórica. Portanto, a política social é fundamental para a<br />
conservação da desigualdade, visto que auxilia, de maneira decisiva, na manutenção e<br />
funcionamento do modo de produção capitalista (VIEIRA, 2001), embora acreditamos que<br />
ao mesmo tempo em que ela ajuda a mascarar as relações de dominação, também<br />
atende, precariamente, às necessidades emergenciais de <strong>uma</strong> parcela da classe<br />
explorada.<br />
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