Prosa 1 - Academia Brasileira de Letras
Prosa 1 - Academia Brasileira de Letras
Prosa 1 - Academia Brasileira de Letras
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
tes elementos <strong>de</strong> oralida<strong>de</strong>. Contar bem uma história, sem per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista<br />
o leitor.<br />
As últimas obras brasileiras que traduzi, Patrícia Melo, por exemplo, ou o<br />
último livro <strong>de</strong> Rubem Fonseca, são literatura absolutamente insólita na Europa.<br />
Agora, como convencer os europeus daquilo que eu prego, a saber, que o<br />
Brasil, não só em literatura, em muitas áreas (mas, para mim, por razões profissionais,<br />
fundamentalmente em literatura) está na vanguarda do mundo? Este<br />
seria um trabalho que, no melhor sentido da palavra, po<strong>de</strong>ria ser chamado <strong>de</strong><br />
político. Eu gostaria <strong>de</strong> ver em Hei<strong>de</strong>lberg, em Hanover, em Göttingen, em<br />
Florença, em Malinas, em Gand, docentes <strong>de</strong> literatura brasileira 7 como o que<br />
temos em Barcelona, que simplesmente transmite a seus alunos o amor a esta<br />
literatura e lhes revela o seguinte: que esta literatura é <strong>de</strong> vanguarda, que ela<br />
está rompendo os velhos esquemas das literaturas européias. Quando vejo que<br />
na França continuam escrevendo romances cujo tema central é saber se a Senhora<br />
Dupont vai para a cama com o pintor do lado – um assunto que não interessa<br />
nem sequer ao Senhor Dupont – parece-me que a literatura será viver as<br />
coisas, escrevê-las (e talvez eu escreva esta minha experiência <strong>de</strong> hoje, quando<br />
compartilhei meu almoço, o que foi um ato involuntário, mas, não obstante,<br />
fez com que me sentisse enobrecido; e, logo <strong>de</strong>pois, eu teria gostado <strong>de</strong> falar<br />
com aquela menina, para que ela me explicasse algumas coisas, e, talvez, <strong>de</strong>ixar-lhe<br />
algum dinheiro a fim <strong>de</strong> que, durante um mês, ela e aquele menino negro<br />
que ela carregava pu<strong>de</strong>ssem esquecer a angústia <strong>de</strong> sobreviver um dia <strong>de</strong>pois<br />
do outro).<br />
Se a literatura, portanto, tem algo importante, se ela é algo importante, ela o<br />
será nisto: <strong>de</strong>scobrir-nos mundos, <strong>de</strong>scobrir-nos novos usos da linguagem que<br />
jamais prevíramos, pôr um adjetivo novo ao lado <strong>de</strong> um substantivo com o<br />
qual esse adjetivo nunca se casara antes, provocar em nós essa emoção que às<br />
vezes, tantas vezes, traduziu-se para mim na experiência <strong>de</strong> estar lendo, sobre-<br />
40<br />
Basilio Losada<br />
7<br />
No original está “lectores <strong>de</strong> literatura portuguesa”, um evi<strong>de</strong>nte lapsus linguae corrigível pelo<br />
contexto. (N. do T.)