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artigo árido movie: transversalidade dialética - Cartaz de Cinema

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Sertão, é o ponto alto do filme, on<strong>de</strong> os conflitos internos <strong>de</strong> Jonas se tornam mais<br />

claros, tanto para ele quanto para o espectador. E é isso que dá vazão à interpretação <strong>de</strong><br />

cenas distintas que se intercalam como se fossem partes <strong>de</strong> uma só.<br />

Numa cena antológica, em que Jonas tem um clímax alucinógeno, Árido Movie<br />

tem uma quebra do enca<strong>de</strong>amento lógico. Lázaro “ressuscita” e se junta a Wedja<br />

(Suyane Moreira) – a irmã <strong>de</strong> Jurandir que causou a confusão motivo <strong>de</strong> seu assassinato<br />

– que atira em direção à câmera subjetiva, como se, ao mesmo tempo, atirasse em Jonas<br />

e no espectador. E assim, todo o retorno que se faz ao passado do jornalista durante o<br />

período <strong>de</strong> efeito da droga que ele usou é “assassinado”, como se a morte <strong>de</strong> Lázaro<br />

cortasse o último vínculo entre Jonas e a família paterna, assim como encerra o transe<br />

em que a seqüência coloca quem assiste. O peso da origem, que muitas vezes pareceu<br />

ser intransigente e não <strong>de</strong>ixar saídas a não ser ce<strong>de</strong>r às tradições, é, <strong>de</strong>finitivamente,<br />

exorcizado.<br />

Com esse pano <strong>de</strong> fundo, a obra ainda relembra o mo<strong>de</strong>lo glauberiano <strong>de</strong> criação<br />

cinematográfica, discute o papel das mídias na contemporaneida<strong>de</strong>, absorve elementos<br />

da literatura religiosa na construção dos personagens, trabalha a quebra <strong>de</strong> estereótipos<br />

construídos pelo distanciamento <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>s próximas e tem a música como parte do<br />

próprio discurso fílmico, algo já visto em Baile Perfumado.<br />

A poética<br />

Árido Movie, por ter sido produzido sobre o aglomerado <strong>de</strong> experiências<br />

realizadas ao longo da década <strong>de</strong> 90 em Recife e toda uma nova experiência<br />

cinematográfica brasileira, é tido, pelo próprio diretor, como uma evolução do que se<br />

viu em Baile Perfumado. Nesse outro longa <strong>de</strong> Lírio Ferreira, dirigido em parceria com<br />

Paulo Caldas, o passado se inseria no futuro, com o cangaço sendo midiatizado por um<br />

estrangeiro numa época em que as forças regionais (no caso do Nor<strong>de</strong>ste, os coronéis)<br />

eram a tônica <strong>de</strong> um país <strong>de</strong> industrialização tardia. Já no filme <strong>de</strong> 2006, Lírio promove<br />

um diálogo da socieda<strong>de</strong> contemporânea - on<strong>de</strong> o acesso à informação é quase<br />

instantâneo e o surgimento <strong>de</strong> novas tecnologias segue a lógica da volatilida<strong>de</strong> imposta<br />

pelo mercado - com as tradições ainda arraigadas no seio <strong>de</strong> pequenas cida<strong>de</strong>s do<br />

interior, como o arcaico mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> disputa por po<strong>de</strong>r encenado na cida<strong>de</strong> fictícia <strong>de</strong><br />

Rocha, mas sempre mantendo a veia <strong>dialética</strong> que tem influenciado a maioria das<br />

produções mais recentes, motivo pelo qual não raras vezes são <strong>de</strong>finidos como “filmes<br />

<strong>de</strong> esquerda”.<br />

Características da <strong>dialética</strong> dos opostos, on<strong>de</strong> partes distintas <strong>de</strong> um todo se<br />

complementam para dar sentido ao que se diz, constroem a ponte entre os núcleos<br />

aparentemente isolados uns dos outros. Por exemplo, a trama <strong>de</strong>senvolvida em Rocha<br />

não teria sentido se Jonas, homem da capital, não estivesse inserido nela. Do mesmo<br />

jeito que a reflexão existencial <strong>de</strong>ste personagem não se daria sem seu retorno à cida<strong>de</strong><br />

on<strong>de</strong> nascera. Até mesmo a própria edição do filme corrobora essa idéia, pela forma<br />

como as seqüências estão dispostas. Longas cenas repartidas em pequenos trechos que<br />

se intercalam entre si, sendo essenciais para a compreensão do discurso.<br />

E é, também, sobre isso que a <strong>de</strong>sconstrução dos estereótipos promovida pelo<br />

filme se assenta. Aparentemente, Árido Movie tem três núcleos <strong>de</strong>sconexos, como se<br />

existissem mais <strong>de</strong> um filme <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um só. Os amigos <strong>de</strong> Jonas (interpretados por<br />

Selton Melo, Gustavo Falcão e Mariana Lima) <strong>de</strong>screvem uma trajetória à parte durante<br />

todo o tempo, algo que, para o simples <strong>de</strong>senvolvimento da história, seria totalmente<br />

dispensável. Mas os <strong>de</strong>talhes dos diálogos, as reações diante <strong>de</strong> um mundo estranho fora<br />

da capital e o contraste que eles criam quando se inserem no contexto dos outros<br />

núcleos são as ações que dão sentido ao ponto central do filme, que é pôr em discussão

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