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34 LUZIA APARECIDA OLIVA DOS SANTOS<br />

se verá no conto Meu tio o Iauaretê, de Guimarães Rosa, em que o nativo,<br />

representado no sangue mestiço, chega ao ápice de sua des<strong>in</strong>tegração tribal,<br />

impelido a regressar à fl oresta como matador de onças, dada a <strong>in</strong>compatibilidade<br />

com o trabalho servil ao não índio. O sentido de regresso ao universo<br />

totêmico, uma vez que o jaguar assume o posto de ancestral, está ligado,<br />

concomitantemente, ao retorno à identidade, burlada pelos hábitos e ações<br />

do não índio, com os quais o mestiço não se adapta, diante da tradição herdada<br />

da mãe índia.<br />

O retorno forçado imprime o teor mais relevante na leitura dos textos<br />

apresentados aqui, enquanto aproximação do índio à sua naturalidade. Ao<br />

deparar com a última fronteira de degradação, o cam<strong>in</strong>ho se traça pela l<strong>in</strong>guagem,<br />

constituída a partir da <strong>in</strong>versão de atividade a que foi dest<strong>in</strong>ado: de<br />

“desonçar” a “desgentar” o sertão. Por esse artifício, a narrativa concede ao<br />

mestiço o poder de comunicar-se com seu ancestral, de reencontrar-se com<br />

seus hábitos, o que o reaproxima de sua condição tribal. Comparar-se às<br />

onças e agir de acordo com suas características signifi ca reaver sua identidade<br />

enquanto descendente do clã fel<strong>in</strong>o. O movimento em direção ao aspecto<br />

primitivo re<strong>in</strong>tegra-o, antes de tudo, à essência, corrompida pela <strong>in</strong>serção<br />

ao universo cozido no qual fora rejeitado, para retornar ao cru, conforme o<br />

arquétipo do mito do fogo a que está <strong>in</strong>tr<strong>in</strong>secamente ligado.<br />

Meu tio o Iauaretê polariza a <strong>in</strong>stância-limite da degradação ao representar<br />

o mestiço em meio à rejeição do não índio, ao mesmo tempo em que<br />

realiza, com maior força imagética, a via de retorno à condição <strong>in</strong>icial, se<br />

considerado o trabalho arquitetado pela l<strong>in</strong>guagem, manifestada na reconstituição<br />

do mito e na fala próxima ao código das onças. Como nos demais<br />

textos, a presença imanente do outro <strong>in</strong>terfere no curso natural da transubstanciação,<br />

imped<strong>in</strong>do-a de se consolidar, seja pela morte física ou pela cultural.<br />

Ante essas características comuns dos textos dispostos no último bloco<br />

de análise, é possível visualizar em seus traços estruturais e semânticos<br />

a proximidade da fi guração do <strong>in</strong>dígena pelo mito, regulados por um grau<br />

maior ou menor de atualização, mas que deságuam no mesmo fl uxo em que<br />

se dá a morte agônica da cultura ameríndia.<br />

Elencadas as características s<strong>in</strong>gulares das obras escolhidas para este<br />

percurso de leitura, é necessário ressaltar que o <strong>in</strong>dígena ocupou um espaço<br />

signifi cativo na literatura brasileira, em que sua presença dividiu as<br />

cenas com as demais personagens, representantes do universo não índio. O

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