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FÉ E CIÊNCIA: CIÊNCIA: UM DIÁLOGO POSSÍVEL E FECUNDO<br />
A aventura humana no mundo compõe-se<br />
<strong>de</strong> realizações variadas, <strong>de</strong> projetos,<br />
esperanças, angústias, questionamentos<br />
e incertezas. Por uma tendência<br />
inata, o homem almeja conhecer, <strong>de</strong>seja<br />
ir além <strong>de</strong> seus limites, alcançar um sentido<br />
para sua existência. Des<strong>de</strong> <strong>aqui</strong>lo<br />
que se po<strong>de</strong> dizer pequeno e simples<br />
até o grandioso e complexo, o homem<br />
busca investigar seu fundamento e seu<br />
modo <strong>de</strong> realização. Nesse itinerário,<br />
próprio <strong>de</strong> alguém incompleto e perfectível,<br />
estão presentes formas diferentes<br />
<strong>de</strong> abordagem das questões com que o<br />
sujeito humano se <strong>de</strong>para, entre as quais<br />
se po<strong>de</strong> encontrar a investigação científi<br />
ca e a fé religiosa. Ambas se propõem<br />
respon<strong>de</strong>r às múltiplas interrogações<br />
humanas. Seria possível conjugá-las?<br />
Seriam elas instâncias inconciliáveis?<br />
Po<strong>de</strong>riam encontrar-se e colaborar mutuamente?<br />
FÉ E CIÊNCIA SÃO INTOLERANTES?<br />
Não raro, ouve-se: a ciência <strong>de</strong>smente<br />
a religião; a ciência dispensa a fé. Ou<br />
senão, a fé não precisa da ciência; a religião<br />
é intolerante com as <strong>de</strong>scobertas<br />
da ciência. Ou ainda, quem se <strong>de</strong>dica<br />
aos estudos acaba per<strong>de</strong>ndo a fé. Tais<br />
afi rmações fazem transparecer a dicotomia<br />
iluminista entre fé e saber, estigmatizando<br />
a fé religiosa como ignorante e<br />
obscurantista, ao mesmo tempo em que<br />
enaltece a razão científi ca como <strong>de</strong>tentora<br />
<strong>de</strong> todo conhecimento possível e<br />
ateia por natureza. Augusto Comte, pai<br />
do positivismo, cristalizou essa visão<br />
com sua lei dos três estágios, segundo<br />
a qual a humanida<strong>de</strong> já teria superado<br />
os estágios religioso e metafísico (fi losófi<br />
co) e estaria no estágio científi co <strong>de</strong><br />
seu <strong>de</strong>senvolvimento, prescindindo totalmente<br />
dos anteriores. Curiosamente,<br />
para Comte, o que caracterizaria este<br />
último seria o “saber para po<strong>de</strong>r; po<strong>de</strong>r<br />
para dominar”, através da tecnologia.<br />
Será mesmo assim? Não há como<br />
acolher as respostas válidas da ciência,<br />
utilizar <strong>de</strong> modo a<strong>de</strong>quado a técnica e,<br />
simultaneamente, ser uma pessoa <strong>de</strong><br />
fé? A postura que <strong>aqui</strong> se <strong>de</strong>seja apresentar<br />
é aquela que vê como possível<br />
e muito importante o encontro entre<br />
essas distintas dimensões do relacionamento<br />
do homem com a realida<strong>de</strong>: fé e<br />
saber, religião e ciência.<br />
Inquestionavelmente, ambas possuem<br />
um papel fundamental na formação<br />
e consolidação do que se po<strong>de</strong>ria<br />
chamar <strong>de</strong> civilização contemporânea,<br />
notadamente a oci<strong>de</strong>ntal. O modo <strong>de</strong><br />
pensar e <strong>de</strong> viver da humanida<strong>de</strong> plasmou-se<br />
a partir <strong>de</strong> elementos oriundos<br />
<strong>de</strong>ssas vertentes. Por exemplo, mesmo<br />
quem não crê, ten<strong>de</strong> a aceitar conceitos<br />
DIOCESE DE GUAXUPÉ<br />
como o da dignida<strong>de</strong> humana, valores<br />
como os direitos humanos (fundamentados<br />
originariamente em dados <strong>de</strong> fé);<br />
mesmo alguém não cristão reconhece o<br />
valor <strong>de</strong> tantas peças <strong>de</strong> arte (literatura,<br />
pintura, escultura) inspiradas no cristianismo.<br />
Assim também, avanços da cosmologia,<br />
da psicologia, das ciências médicas,<br />
da informática, entre outros, são<br />
em geral acolhidos por pessoas religiosas.<br />
Por outro lado, não faltam aqueles<br />
que, em nome <strong>de</strong> sua fé, recorrem até<br />
mesmo à violência e ao terrorismo, em<br />
atitu<strong>de</strong>s verda<strong>de</strong>iramente irracionais<br />
que ferem o bem comum e a sadia convivência<br />
entre pessoas e povos. Não<br />
falta, igualmente, quem <strong>de</strong>fenda um<br />
ateísmo agressivo e militante, ofensivo<br />
aos crentes <strong>de</strong> qualquer religião e i<strong>de</strong>ologicamente<br />
danoso à cultura em geral.<br />
Extremismos <strong>de</strong>sse tipo são anomalias,<br />
jamais po<strong>de</strong>rão ser consi<strong>de</strong>rados como<br />
a regra da dialética fé-saber.<br />
POR UM TRABALHO DE<br />
COOPERAÇÃO<br />
Por se falar em dialética, seguindo<br />
um sábio princípio <strong>de</strong> Jacques Maritain,<br />
é necessário distinguir para unir.<br />
Deve-se dar conta da peculiarida<strong>de</strong><br />
própria da esfera do conhecimento<br />
científico (bem como das especificida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> cada área da ciência) e daquela<br />
da religião (também nas suas múltiplas<br />
formas <strong>de</strong> realização). Religião e<br />
ciência são distintos modos <strong>de</strong> ver a<br />
realida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> relacionar-se com ela;<br />
não se reduzem uma à outra; jamais<br />
po<strong>de</strong>rão igualar-se em termos <strong>de</strong> métodos,<br />
<strong>de</strong> conteúdos e <strong>de</strong> pretensões.<br />
Isso é muito importante levar em consi<strong>de</strong>ração,<br />
para que não se queira justificar<br />
uma com a outra, nem avaliar<br />
uma com os critérios da outra.<br />
Em contrapartida, ciência e religião<br />
têm muito a per<strong>de</strong>r se se isolarem<br />
mutuamente. Ambas po<strong>de</strong>m enriquecer-se<br />
com uma cooperação feita <strong>de</strong><br />
partilha <strong>de</strong> resultados e <strong>de</strong> questionamentos,<br />
na busca <strong>de</strong> elucidar o fenômeno<br />
humano em suas múltiplas<br />
dimensões. O esforço <strong>de</strong> compreensão<br />
recíproca é fundamental para que haja<br />
diálogo e respeito entre aqueles que<br />
se <strong>de</strong>dicam a uma e a outra <strong>de</strong>ssas<br />
constelações. Como escreveu o Beato<br />
João Paulo II, numa carta dirigida ao<br />
diretor do Observatório Astronômico<br />
do Vaticano, em 1988:“A ciência po<strong>de</strong><br />
purificar a religião do erro e da superstição;<br />
a religião po<strong>de</strong> purificar a ciência<br />
da idolatria e dos falsos absolutos.”<br />
É plausível afirmar sem medo que a<br />
ciência em geral dá-se bem com a interrogação<br />
do como funciona o mundo<br />
(do macro ao microcosmos), como<br />
caminha a história. A religião, por sua<br />
opinião<br />
Por Pe. Juliano <strong>de</strong> Almeida Oliveira, Mestre e Doutorando em Filosofi a pela PUC-SP, Professor da Faculda<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> Pouso Alegre<br />
vez, busca respon<strong>de</strong>r ao por quê e ao<br />
para quê <strong>de</strong> tudo, ou seja, orienta-se<br />
para a busca do sentido que se po<strong>de</strong><br />
alcançar no horizonte da transcendência.<br />
Quem sabe, um elemento mediador<br />
entre tais instâncias seja a filosofia,<br />
misto <strong>de</strong> ciência e sabedoria, cuja<br />
função no campo do saber sempre foi<br />
o <strong>de</strong> alargar as dimensões da racionalida<strong>de</strong>.<br />
É disso que hoje precisam tanto os<br />
homens <strong>de</strong> ciência quanto os fiéis das<br />
várias expressões religiosas: ampliar<br />
seus horizontes, <strong>de</strong> modo a se solidarizarem<br />
no itinerário <strong>de</strong> busca das melhores<br />
interpretações do mistério do<br />
existir, sabendo articular <strong>aqui</strong>lo que<br />
Paul Ricoeur <strong>de</strong>nominava <strong>de</strong> a crítica<br />
(o momento do pensamento reflexivo)<br />
e a convicção (a esfera dos compromissos<br />
existenciais).<br />
Nenhum tipo <strong>de</strong> conhecimento<br />
isolado esgota a verda<strong>de</strong> sobre o ser e<br />
os entes. É, pois, bem-vinda uma nova<br />
aliança entre fé e saber, pois não se<br />
está à altura <strong>de</strong> uma Palavra <strong>de</strong>finitiva<br />
e final a respeito <strong>de</strong> tudo, mas sim,<br />
<strong>de</strong> uma Palavra possível – ainda que<br />
limitada – <strong>de</strong> significação do mundo<br />
e do próprio homem, para o que muito<br />
po<strong>de</strong> colaborar o entrecruzamento<br />
das dimensões horizontal e vertical da<br />
realida<strong>de</strong>.<br />
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