27.04.2013 Views

As migrações de Brás Cubas - Légua & meia - Universidade ...

As migrações de Brás Cubas - Légua & meia - Universidade ...

As migrações de Brás Cubas - Légua & meia - Universidade ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

só aciona suas <strong>migrações</strong>, como <strong>de</strong>sloca o eixo da questão da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do i<strong>de</strong>al <strong>de</strong><br />

pureza da origem (na invenção/falsificação da linhagem familiar), e <strong>de</strong> hierarquia funcional<br />

(na própria radicalida<strong>de</strong> da inversão vida/morte) – já aponta para a estratégia<br />

“macunaímica” <strong>de</strong> formalização/problematização da nacionalida<strong>de</strong>. Diríamos, assim,<br />

que tanto Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> como Mário <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> se beneficiaram dos influxos<br />

críticos e estético-i<strong>de</strong>ológicos potencializados pelo “bruxo” do Cosme Velho.<br />

Senões <strong>de</strong> leitura<br />

Gran<strong>de</strong> parte da crítica costuma fazer na ficção <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> <strong>As</strong>sis um amplo<br />

recorte quase sempre balizado pelas locuções temporais “até” e “a partir <strong>de</strong>” Memórias<br />

póstumas <strong>de</strong> <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong>. Na leitura <strong>de</strong>sse romance, divisor <strong>de</strong> águas na própria literatura<br />

brasileira, não passa <strong>de</strong>spercebido, aos leitores “ingênuos” ou especializados, o<br />

provocativo discurso do senão do livro, aquele em que o instável narrador-<strong>de</strong>funto-autor,<br />

mais uma vez, se <strong>de</strong>sloca das peripécias narrativas em direção ao leitor-receptor (que<br />

nem sempre está <strong>de</strong>sperto ou atento às astúcias do livro, ao estilo embriagado do escritor):<br />

Começo a arrepen<strong>de</strong>r-me <strong>de</strong>ste livro. Não que ele me canse (...). Mas o livro é<br />

enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contração cadavérica, vício grave, e aliás ínfimo,<br />

porque o maior <strong>de</strong>feito <strong>de</strong>ste livro és tu, leitor. Tu tens pressa <strong>de</strong> envelhecer e o livro<br />

anda <strong>de</strong>vagar; tu amas a narração direta e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e<br />

o meu estilo são como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam,<br />

urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam, e caem... (<strong>As</strong>sis, 1994: 583)<br />

Antológica pérola retórica, essa passagem se inscreve no pórtico narrativo do<br />

livro, e no contexto crítico da época, como um passaporte para a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> literária,<br />

na qual o jogo da narrativa/produção com a leitura/recepção se insere <strong>de</strong>finitivamente<br />

no problemático espaço caracterizado por uma “crise da representação”, seja<br />

do mundo, seja do sujeito. É como se Machado nos quisesse dizer que somos frutos<br />

da nossa própria ficção, e que toda memória é mesmo um corpo morto que retorna em<br />

busca <strong>de</strong> narrativas que o resgatem do caos, revitalizando-o com novas fulgurações<br />

<strong>de</strong> sentido.<br />

A ironia, sabemos, é componente fundamental das poéticas mo<strong>de</strong>rnas, atuando<br />

como auto-consciência crítica que <strong>de</strong>sestabiliza o po<strong>de</strong>r referencial da linguagem.<br />

Nesse contexto, “o senão do livro” <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> <strong>As</strong>sis po<strong>de</strong>ria ser consi<strong>de</strong>rado não<br />

apenas na perspectiva das Memórias póstumas <strong>de</strong> <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong>, como também em relação<br />

L ÉGUA ÉGUA & & MEIA EIA EIA: EIA : R EVISTA EVISTA DE DE LLLITERATURA<br />

L ITERATURA E D DDIVERSIDADE<br />

D IVERSIDADE C CCULTURAL<br />

C ULTURAL ULTURAL,<br />

ULTURAL , V. . 4, 4, N O ° 3 , 20 2005 20 05 —<br />

— 155 155<br />

155

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!