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As migrações de Brás Cubas - Légua & meia - Universidade ...

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A este <strong>de</strong>bate, conclui o irônico narrador, dirigindo-se ao seu público: “Decida<br />

o leitor entre o militar e o cônego; eu volto ao emplasto”. (Id., ibid.) Esta passagem<br />

ganha relevo especial <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste contexto mais amplo em que estamos trabalhando<br />

a imagem <strong>de</strong> <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong>. Se consi<strong>de</strong>rarmos <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong> como uma “figura” que polariza<br />

importantes dimensões intertextuais do romance, seu diálogo com a literatura, a<br />

cultura e a história sócio-econômica e política do Brasil até então, po<strong>de</strong>mos ver nestes<br />

dous tios do protagonista uma referência a dois pilares do processo <strong>de</strong> colonização do<br />

Brasil, as armas e a catequese do império português. A referência ganha localização<br />

pontual se pensarmos num diálogo (por ausência, que não escapa à intertextualida<strong>de</strong>)<br />

<strong>de</strong> Machado com A confe<strong>de</strong>ração dos tamoios e suas polêmicas. Neste poema, Magalhães<br />

busca uma absurda conciliação entre o genocídio praticado contra os tamoios, pelas<br />

armas portuguesas, e ao mesmo tempo a re<strong>de</strong>nção <strong>de</strong>sses índios, pelo sacramento<br />

mítico da cruz. Como vimos, São Sebastião exorta o tamoio a aceitar o extermínio em<br />

nome da integrida<strong>de</strong> da pátria colonizada:<br />

Índio! Se amas a terra em que nasceste,<br />

E se po<strong>de</strong>s amar o seu futuro,<br />

A verda<strong>de</strong> da Cruz aceita e adora.<br />

Que importa quem a traz ser inimigo,<br />

Se o bem fica, e supera os males todos!<br />

(...)<br />

<strong>As</strong>sim <strong>de</strong>sses cruéis, corruptos homens,<br />

Que vos flagelam hoje, um santo germe<br />

Aqui produzirá filhos melhores.<br />

“Decida o leitor entre o militar e o cônego”. Esta expressão parece ecoar, agora,<br />

como uma perversa opção <strong>de</strong>ixada por <strong>Brás</strong> <strong>Cubas</strong>. Tal propagação discursiva<br />

redimensionaria o discurso da “história monumental”, conciliadora e teleológica, propondo<br />

a fratura <strong>de</strong> um olhar genealógico que, como disse Foucault, procura restabelecer<br />

“os diversos sistemas <strong>de</strong> submissão”.<br />

Da falsificação à invenção, teatralizados pelo olhar <strong>de</strong>slocado do <strong>de</strong>funto autor, o<br />

salto não foi muito gran<strong>de</strong>, já que o discurso normativo que busca uma “origem”<br />

mantém-se íntegro, pelos <strong>Cubas</strong>, mas na berlinda, pelos <strong>de</strong>slocamentos narrativos.<br />

Vejamos como se articula a invenção dos <strong>Cubas</strong>: “Como este apelido <strong>de</strong> <strong>Cubas</strong> lhe<br />

cheirasse excessivamente a tanoaria, alegava meu pai, bisneto <strong>de</strong> Damião, que o dito<br />

apelido fora dado a um cavaleiro, herói nas jornadas da África, em prêmio da façanha<br />

que praticou, arrebatando trezentas cubas aos mouros.”<br />

L ÉGUA ÉGUA & & MEIA EIA EIA: EIA : R EVISTA EVISTA DE DE LLLITERATURA<br />

L ITERATURA E D DDIVERSIDADE<br />

D IVERSIDADE C CCULTURAL<br />

C ULTURAL ULTURAL,<br />

ULTURAL , V. . 4, 4, N O ° 3 , 20 2005 20 05 —<br />

— 161 161<br />

161

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