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UM DESFILE ATÉ AO TOPO - Diário Económico - Sapo

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Revista distribuída com o <strong>Diário</strong> <strong>Económico</strong> nº 5128 de 04 de Março de 2011. Posteriormente vendida em banca ao preço de capa de 2,50 euros.<br />

Fora de Série,<br />

Março 2011<br />

<strong>UM</strong> <strong>DESFILE</strong><br />

<strong>ATÉ</strong><br />

<strong>AO</strong> <strong>TOPO</strong><br />

O país, o mundo e a moda<br />

por Eduarda Abbondanza depois<br />

de 20 anos de ModaLisboa.<br />

E AINDA:<br />

A China rendeu-se ao luxo e as<br />

marcas fi ntam a crise.<br />

O Guia Michelin ainda<br />

é a bíblia dos restaurantes?


À venda exclusivamente na loja Louis Vuitton. Tel. 21 358 43 20 louisvuitton.com


10<br />

CHINA<br />

RENDE-SE<br />

<strong>AO</strong> MERCADO<br />

DO LUXO<br />

Sumário<br />

20<br />

20 ANOS DE<br />

MODALISBOA<br />

POR EDUARDA<br />

ABBONDANZA<br />

34<br />

SALSA JEANS<br />

REINVENTA-SE<br />

COM “HAPPY<br />

NEW YOU”<br />

54<br />

VIAGEM A<br />

STELLENBOSCH,<br />

<strong>UM</strong>A CIDADE<br />

PERDIDA<br />

NA ÁFRICA DO SUL<br />

Presidente Nuno Vasconcellos Vice-presidente Rafael Mora Administradores Paulo Gomes, António Costa Directora Administrativa Patrícia Silva Dias (coordenadora), Ana Baptista, Carlos Caldeira, Cátia Simões, Marina Conceição e Sara Piteira Mota Finanças Tiago<br />

Propriedade S.T. & S.F., Sociedade de<br />

e Financeira Elisabete Seixo Director Geral Comercial Bruno Vasconcelos Director de Operações e Controlo Pedro Ivo de Carvalho Freire (editor), Alexandra Brito e Luis Leitão (coordenadores), Catarina Melo, Maria Ana Barroso, Marta Reis, Marta Marques Silva, Rui<br />

Publicações, Lda. Contribuinte 502642807<br />

Redacção, Administração e Publicidade Rua Vieira da Silva, nº45, 1350-342 Lisboa, Telf. 21 323 67 00/ 21 323 68 00 - Fax 21 323 68 01 Barroso, Sandra Almeida Simões e Tiago Figueiredo Silva Desporto Paulo Pereira (editor), Filipe Garcia (coordenador), Eduardo Melo<br />

Edição S.T. & S.F., Sociedade de Publicações,<br />

Delegação Porto Edifício Scala, Rua do Vilar, 235-4º, 4050-626 Porto, Telf. 22 543 90 20 - Fax 22 609 90 68<br />

Media Margarida Henriques e Rebeca Venâncio Universidades Carla Castro (coordenadora), Andrea Duarte e Ana Petronilho Outlook<br />

Lda. Registo Comercial de Lisboa<br />

Isabel Lucas (editora), João Pedro Oliveira (coordenador) António Sarmento, Angela Marques, Barbara Silva, Joana Moura e Cristina<br />

2958911033 Registo ICS 124569 Administra-<br />

Director António Costa Director-executivo Bruno Proença Subdirectores Francisco Ferreira da Silva, Helena Cristina Coelho, Pedro Borges (assistente) Projectos Especiais Irina Marcelino (editora), Ana Cunha Almeida (coordenadora), Dircia Lopes e Raquel Carvalho<br />

ção Rua Vítor Cordon, nº 19 1º 1200-482<br />

Sousa Carvalho e Vitor Costa Editores Executivos António Albuquerque e Renato Santos Editora de Fecho Gisa Martinho Fora de Opinião Ricardo da Costa Nunes (editor) e Madalena Leal DE online Pedro Latoeiro (coordenador), Rogério Junior (webdesigner),<br />

Lisboa Telefone 213236700 Redacção<br />

Série Rita Ibérico Nogueira (editora), Ana Filipa Amaro e Rita Saldanha da Gama (coordenadoras), Inês Queiroz (textos), Lurdes Cristina Barreto, Eudora Ribeiro, Mafalda Aguilar, Pedro Duarte, Rita Paz, Nuno Barreto Infografi a Susana Lopes (coordenadora), Mário<br />

e Produção Rua Vieira da Silva, nº 45<br />

Ferreira (secretariado), Inês Maia (paginação) Colaboradores Filipe Carriço, Mário Principe e Pedro Cunha Martins Produção Ana Malhão e Marta Carvalho Fotografi a Paulo Figueiredo (editor), Cristina Bernardo, João Paulo Dias, Paula Nunes e Paulo Alexandre<br />

1350-342 Lisboa Telefone 213236700 Fax<br />

Marques (chefi a), Artur Camarão, Carlos Martins, João Santos, Rui Rato Tratamento de imagem Samuel Rainho (coordenador), Paulo Coelho Assistente de Direcção Rita Rodrigues Secretariado Geral Dulce Costa Redacção do Porto Elisabete Felismino (coordenadora),<br />

213236800 Assinaturas Telf. 213236816/6771<br />

Garcia, Pedro Felipe, Tiago Maia Grandes Repórteres Ana Maria Gonçalves, Francisco Teixeira, Hermínia Saraiva, Lígia Simões, Luís António Freitas de Sousa, Elisabete Soares, Sónia Santos Pereira e Mira Fernandes (secretária) Tradutores Ana Pina e Carlos Sousa<br />

E-Mail assinaturas@economica.sgps.<br />

Rego, Maria Teixeira Alves e Nuno Miguel Silva Destaque Mónica Silvares (editora) Economia Marta Moitinho Oliveira e Mariana Adam Departamento Gráfi co Paulo Couto (director de arte), Pedro Fernandes, Maria de Jesus Correia e Rute Marcelino (coordenadores),<br />

com Impressão e Acabamento Sogapal,<br />

(coordenadora), 7 Cristina Oliveira, Denise Fernandes, Luis Reis Pires, Margarida Peixoto, Paula Cravina de Sousa Política Inês Davis Bastos<br />

Fora de Série Março 2011<br />

(coordenadora), Catarina Duarte, Catarina Madeira, Márcia Galrão Miguel Costa Nunes, Susana Represas e Pedro Quedas Empresas<br />

Ana Antunes, Carla Carvalho, Jaime Ribeiro, Patricia Castro, Sandra Costa e Vanda Clemente Exclusivos Corriere della Sera, El Mundo,<br />

Expansión e Financial Times<br />

Distribuição Logista Portugal,SA<br />

Março 2011 Fora de Série 7<br />

Tiragem<br />

média 34000 exemplares.


CARLOS RAMOS<br />

RITA IBÉRICO NOGUEIR A<br />

rita.nogueira@economico.pt<br />

MODA, CHINA E <strong>UM</strong> BLOG<br />

á se sabiam algumas coisas sobre Eduarda<br />

Abbondanza. Que já tinha sido ‘designer’ de<br />

moda. Que tem espírito combativo, pois há<br />

20 anos que consegue organizar duas ‘fashion<br />

weeks’ anuais com recurso a enormes acrobacias<br />

fi nanceiras. Que nutre um ódio de estimação<br />

por Carmona Rodrigues, responsável<br />

por, durante uns anos, transformar a ModaLisboa em ModaCascais.<br />

Que nunca digeriu muito bem a chegada de concorrência<br />

mais a norte, o PortugalFashion. Que tem nome de<br />

opulência e um visual ‘avant-garde’. É o que se pede quando a<br />

ideia é estar na moda. E ela está. Há 20 anos. Na verdade, trouxe-a<br />

para Lisboa. Espalhou-a aos quatro ventos. Reinventou-<br />

-a, revolucionou-a. Deu-lhe uma casa, ainda que itinerante, e<br />

abriu as portas aos criadores, para que ali pudessem mostrar<br />

aquilo de que são capazes. Uma espécie de fábrica, como a<br />

‘factory’ que Andy Warhol criou nos anos 60, para receber e<br />

descobrir novos talentos no mundo da arte.<br />

A moda, em Lisboa, é Eduarda Abbondanza. A força criadora,<br />

organizadora, fundadora, continuadora. Se Ana Salazar é a<br />

“mãe” da moda portuguesa, Abbondanza, com a sua Moda-<br />

-Lisboa, só pode ser a irmã. Aquela irmã rebelde, à frente no<br />

seu tempo, movida por uma vontade de ferro e pela convicção<br />

de que este é o caminho certo. E assim a ModaLisboa atingiu<br />

a maioridade. Já fez 20 anos, na verdade. E, salvo alguns percalços,<br />

foi sobrevivendo às peripécias do mundo. Desporto,<br />

política, economia, cultura, a própria moda, foram-lhe servindo<br />

de inspiração em temas e em colecções.<br />

Já não apanhou o Muro de Berlim de pé, mas assistiu ao fi m<br />

da URSS e à primeira guerra do Golfo. Viu nascer o Tratado<br />

de Maastricht e acompanhou, com um misto de interesse e<br />

diversão, a passagem de Bill Clinton pela Casa Branca. Divertiu-se<br />

ainda mais com as ‘gaffes’ de George W. Bush. Viu<br />

nascer o CCB e morrer Ayrton Senna, Marlon Brando, Ray<br />

Charles, Kurt Cobain, Frank Sinatra, Michael Jackson, Amália<br />

Rodrigues, Alexander McQueen, Gianni Versace, a Princesa<br />

Diana e Audrey Hepburn, todos, ao seu estilo, ícones de<br />

moda. Ouviu as buzinadelas na ponte 25 de Abril, assistiu à<br />

loucura das vacas, ao nascimento e morte de uma ovelha clonada,<br />

e viu ser eleito o primeiro presidente negro na África<br />

do Sul – Nelson Mandela. Exemplo seguido mais tarde, nos<br />

Estados Unidos, por Barak Obama. Assistiu, com o país, ao<br />

programa televisivo com as medidas mais perfeitas: 86-60-<br />

86, de Sofi a Aparício. Viu passar pelo poder homens como<br />

Mário Soares, António Guterres, Durão Barroso, Santana<br />

Lopes, José Sócrates, Jorge Sampaio, Cavaco Silva… Assistiu<br />

à morte do Escudo e recebeu o Euro de braços abertos. Mas<br />

antes ainda mostrou quem um dia mandou nos Oceanos,<br />

com a Expo98. Na era da televisão em movimento, acompanhou<br />

o fenómeno Big Brother. Viu crescer fenómenos ainda<br />

maiores, os que elevaram Portugal à escala planetária: Figo,<br />

Ronaldo, Mourinho. Caíram pontes que separavam rios, ditadores<br />

do Médio-Oriente e duas torres que simbolizavam a<br />

supremacia americana e transformaram em efeméride o 11º<br />

dia de Setembro. O mundo ganhou medo, perdeu gente. Morreram<br />

talentos, nasceram outros. Nasceu o iPod, o iPhone e<br />

o iPad e a tecnologia passou a comandar as vidas de todos.<br />

8 Fora de Série Março 2011<br />

Faliram bancos e começou a crise. Mais uma. Fizeram-se greves<br />

e manifestações, ídolos caíram em desgraça, apareceu a<br />

Floribella e nem a gripe A conseguiu acabar com ela. Depois<br />

casou, deu um nome estranhíssimo à fi lha e isso é castigo sufi<br />

ciente. Inventaram o Facebook, o Twitter e o Wikileaks… e<br />

veio uma enorme onda e varreu o Sudoeste asiático. Morreu<br />

um Papa, mas houve logo fumo branco para outro. Fecharam<br />

jornais míticos, inauguraram outros. Uma menina chamada<br />

Maddie desapareceu e enquanto o mundo se questiona se<br />

está viva, a natureza manifestou-se e, depois do furacão Katrina,<br />

lançou um sismo sobre o Haiti, temporais no Brasil,<br />

acordou um vulcão na Islândia e chamou o FMI à Grécia. A<br />

ModaLisboa passou por tudo isto. E isto não é nada.<br />

Numa entrevista fora do comum, e ainda que com os olhos<br />

postos no futuro - e na próxima edição da ModaLisboa, a<br />

começar já na semana que vem -, Eduarda Abbondanza ‘mixou’<br />

alguns destes acontecimentos com a sua vida e com a da<br />

moda. Deixou-se fotografar no Lux do seu amigo Manuel Reis<br />

junto dos seus 23 braços direitos. E acaba a conversa de forma<br />

enigmática, anunciando que vai mudar de vida. Será que vai<br />

aproveitar a tendência e mudar a sua ‘factory’ para a China?<br />

Sim, porque, em matéria de luxo, todos os estudos indicam<br />

que é o ‘place to be’ em 2011. O mundo da moda já percebeu:<br />

não é à toa que Ralph Lauren, na recente semana da moda de<br />

Nova Iorque, pontuou o desfi le da colecção Outono/Inverno<br />

2011 com infl uências chinesas, desde vestidos ‘cheongsam’,<br />

colares mandarins e bordados chineses com dragões. As modelos,<br />

grande parte delas de aparência oriental, desfi laram<br />

brincos de jade ao som de “China Girl”, na versão de David<br />

Bowie. A crítica fi cou louca. A colecção foi defi nida como<br />

‘East meets West’ ou ‘China through na Art Deco lens’. E, de<br />

repente, ao ler as análises do “Financial Times”, percebe-se o<br />

porquê da temática: é que o grupo Polo Ralph Lauren planeia<br />

lançar brevemente as primeiras lojas próprias naquele país.<br />

Ralph Lauren não foi inovador na tendência. Já a Louis Vuitton<br />

tinha bebido desta taça chinesa de inspiração no desenvolvimento<br />

da colecção que está agora nas lojas. E a Chanel,<br />

na colecção de pré-Outono, também já tinha referenciado a<br />

China como musa. Os tempos são de crise, e é preciso vender.<br />

E longe vão os tempos em que a China era famosa pelas lojas<br />

de 300 e pelas contrafacções. Naquele país há noções muito<br />

concretas do que é bom, do que tem qualidade, do que interessa<br />

e do que não interessa. Um mercado a manter debaixo<br />

de olho, sem dúvida.<br />

Para terminar, dois sentimentos: o de perda e o de espanto. O<br />

primeiro pela morte do ‘chef’ Santi Santa Maria, o inconveniente<br />

catalão que ousou contrariar o “deus” Ferran Adriá e<br />

a moda da cozinha molecular. O segundo pela notícia de que<br />

John Galliano foi suspenso das suas funções de director criativo<br />

da Dior. Diz que o génio se portou mal e, com uns copos<br />

a mais, num bar em Paris, teceu comentários anti-semitas a<br />

um casal presente. Foi preso, mas isso não foi o pior. A marca,<br />

detida pelo LVMH, apressou-se a repudiar o acto. E fechamos<br />

esta edição dedicada à moda sem saber como vai correr o desfi<br />

le da marca na ‘fashion week’ parisiense, marcado para…<br />

hoje mesmo. E ainda uma novidade: a chegada do ‘blog’ Fora<br />

de Série, para não ter saudades nossas o resto do mês.<br />

BLOG<br />

A PARTIR DE HOJE,<br />

ACOMPANHE<br />

TAMBÉM TODAS<br />

AS NOVIDADES<br />

FORA DE SÉRIE<br />

N<strong>UM</strong> NOVO ESPAÇO<br />

ONLINE<br />

http://foradeserie.economico.sapo.pt<br />

Capa: fotografi a de Mário Príncipe. Eduarda Abbondanza com<br />

vestido em seda Filipe Faísca, casaco em ‘shantung’ de seda Alves<br />

Gonçalves, sapatos Fendi, cinto em pele Twin-Set, no Espace<br />

Cannelle, colar em ouro amarelo Filipe Faísca, ‘collants’ Calzedonia.


10 Fora de Série Março 2011


Destaque<br />

OBJECTIVO: CHINA<br />

O que diria Mao Tsé Tung se fosse vivo? Será que usaria uma farda Armani,<br />

um Rolex no pulso e uma Louis Vuitton a tira colo? A China rendeu-se ao luxo<br />

e as marcas dão o tudo por tudo para fi ntar a crise.<br />

TEXTO DE RITA SALDANHA DA GAMA<br />

Março 2011 Fora de Série 11


Destaque<br />

AS DEZ CIDADES MAIS LUXUOSAS DA CHINA<br />

As cidades na China<br />

estão a desenvolver-<br />

-se à velocidade da<br />

luz. O luxo impera<br />

cada vez mais nas<br />

grandes metrópoles,<br />

mas também nas<br />

pequenas cidades. De<br />

acordo com a JRJ,<br />

consultora fi nanceira<br />

chinesa, umas são<br />

uma verdadeira<br />

surpresa, outras nem<br />

tanto.<br />

12 Fora de Série Março 2011<br />

XANGAI<br />

Tem mais marcas de<br />

luxo que qualquer<br />

outra cidade da<br />

China. É lá que vivem<br />

os mais ricos. Há<br />

pontos de venda para<br />

todas as grandes<br />

marcas, em centros<br />

comerciais ou ruas<br />

chiques como Nanjing<br />

Lu ou o bairro Bond.<br />

PEQUIM<br />

As lojas não são tão<br />

boas, nem tantas<br />

como em Xangai, mas<br />

estão a melhorar. Há<br />

mais milionários que<br />

N<br />

a China o ano é do Coelho. De prosperidade, sorte e sucesso<br />

fi nanceiro. Os números indicam que, em 2010,<br />

a China ultrapassou o Japão passando a ser a segunda<br />

maior economia do mundo, logo atrás dos Estados Unidos.<br />

Mas os analistas estimam que, em apenas dez anos,<br />

o país venha a ocupar o primeiro lugar do pódio.<br />

Os chineses estão bem e recomendam-se. Enquanto a crise<br />

cresce na Europa, na China são as fortunas que aumentam.<br />

E cada vez mais cedo. Um estudo do CLSA, grupo de<br />

investimento da Ásia, indica que os milionários chineses<br />

são muitos e 15 anos mais novos que os ricos do resto do<br />

mundo. Vêm de uma geração que gosta de viajar, seguir<br />

tendências e gastar. Gastar, mas gastar bem. Consumir<br />

bons produtos, grandes marcas, coisas caras e luxuosas.<br />

Depois de terem passado anos e anos a poupar, os chineses<br />

estão agora a aproveitar a vida, a compensar o tempo<br />

perdido e a mimar-se. Aprenderam a ter confi ança na<br />

sua Economia, a ter dinheiro e a sentirem-se confortáveis<br />

com isso. Existe um grande desejo de ‘status’ até porque<br />

os chineses acreditam que “as pessoas são aquilo que vestem”,<br />

diz um estudo da consultora KPMG.<br />

O crescimento da Economia do país está a impulsionar<br />

o mercado do luxo que, até 2008, crescia a uma taxa de<br />

20% ao ano e que, a avaliar pelos estudos, em 2015 de-<br />

em Xangai, mas o luxo<br />

não está tão presente.<br />

HANGZHOU<br />

Capital de uma das<br />

províncias mais<br />

ricas da China, a<br />

cidade tem muitos<br />

empresários e<br />

consumidores ricos.<br />

O centro empresarial<br />

Brand Street é um dos<br />

mais famosos e mais<br />

desenvolvidos bairros<br />

do país. Faz lembrar a<br />

via Montenapoleone,<br />

em Milão.<br />

CANTÃO<br />

O poder de compra<br />

dos habitantes de<br />

Cantão é grande mas,<br />

por uma questão<br />

histórica e geográfi ca,<br />

estes consumidores<br />

costumam fazer<br />

compras em Hong<br />

Kong. Desenvolve-se<br />

mais lentamente.<br />

SHENZHEN<br />

A cidade faz fronteira<br />

com Hong Kong e é<br />

sobretudo lá que se<br />

fazem as compras no<br />

que diz respeito aos<br />

produtos de luxo. É,<br />

rica em móveis ou<br />

lojas ‘hi-tech’.<br />

CHENGDU<br />

Representa a moda<br />

topo de gama no<br />

centro da China.<br />

É vista como uma<br />

cidade modelo da<br />

região centro. É<br />

estratégica para as<br />

marcas de luxo.<br />

CHONGQING<br />

O retrato é o mesmo<br />

que em Chengdu.<br />

DEPOIS DE ANOS<br />

A POUPAR, OS CHINESES<br />

ESTÃO A APROVEITAR<br />

A VIDA. APRENDERAM<br />

A TER DINHEIRO<br />

E A SENTIREM-SE<br />

BEM COM ISSO.<br />

QINGD<strong>AO</strong><br />

Desenvolveu-se muito<br />

nos últimos anos com<br />

a aposta das grandes<br />

marcas e carros<br />

topo de gama. É<br />

paragem obrigatória<br />

dos turistas e, por<br />

isso, capital da moda<br />

na província de<br />

Shandong.<br />

XI’AN<br />

Tem um dos centros<br />

comerciais mais<br />

CHENGDU<br />

modernos do país,<br />

o Xi’an Zhongda.<br />

Os especialistas<br />

estimam que venha<br />

a ultrapassar as<br />

cidades de Chengdu<br />

e Chongqing,<br />

em progresso e<br />

desenvolvimento.<br />

DALIAN<br />

É o centro comercial<br />

do Norte da China.<br />

Estão lá muitas<br />

marcas internacionais<br />

e asiáticas. É<br />

sobretudo uma cidade<br />

turística e ponto de<br />

passagem.<br />

XI’AN<br />

CHONGQING<br />

PEQUIM<br />

QINGD<strong>AO</strong><br />

SHENZHEN<br />

CANTÃO<br />

XANGAI<br />

HANGZHOU<br />

DALIAN<br />

verá estar no topo da pirâmide mundial com 29% do<br />

consumo a vir da China. O país passou a ser o grande<br />

fi lão das grandes marcas, o mercado onde todos querem<br />

estar e apostar. A Chanel, por exemplo – que hoje<br />

está no cimo das preferências dos consumidores chineses<br />

–, considera que a entrada no país foi estratégica<br />

para a marca. O porta-voz disse à Fora de Série que a<br />

Chanel vai continuar a investir na China e a expandirse<br />

por cidades mais pequenas. “É um mercado muito<br />

diverso. É indispensável não só escolher o local ideal,<br />

mas também perceber a cultura e o ‘lifestyle’ de cada<br />

região”, diz.<br />

INVESTIR NA CHINA<br />

Os estudos indicam que a localização é um dos principais<br />

problemas quando se parte à conquista da China.<br />

Uma má escolha pode ser determinante para o insucesso<br />

das marcas. É preciso ter em conta os vizinhos,<br />

a rua, os acabamentos da loja e tudo o mais que possa<br />

pôr em causa o prestígio da marca. Até mesmo o centro<br />

comercial. Embora sejam muitos na China, são ainda<br />

poucos os que podem ser considerados de luxo. Um<br />

problema que leva muitas marcas a preferir estabelecer-se<br />

nas lojas dos hotéis de cinco estrelas. Pequim,<br />

NA ABERTURA, FOTOGRAFIA DE RYAN PYLE/CORBIS/VMI. NESTA PÁGINA, FOTOGRAFIA DE BOBBY YIP/REUTERS


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Destaque<br />

Xangai, Hong-Kong e Macau continuam, ainda assim,<br />

a ser os ‘spots’ de eleição, mas cidades como Hangzhou,<br />

Qingdao, Xi’an ou Dalian começam agora a entrar na<br />

rota das grandes marcas.<br />

Outra dor de cabeça é encontrar as pessoas certas. Não<br />

é que haja falta de oferta, mas são ainda poucos os que<br />

têm experiência em trabalhar no exigente mundo do<br />

luxo. Quando um consumidor está disposto a gastar<br />

uma fortuna num produto está também à espera de ser<br />

bem tratado, de ter direito a atenções e serviços que não<br />

se esperam noutro tipo de lojas. “O luxo não se limita<br />

ao produto. Também pago a experiência e o ‘lifestyle’<br />

que me fazem sentir único”, disse um consumidor citado<br />

no estudo da consultora Bain & Co sobre o mercado<br />

do luxo na China. Só em formação dos colaboradores,<br />

as marcas gastam muito tempo e dinheiro. A Chanel,<br />

por exemplo, demora cerca de três anos a pôr de pé um<br />

novo estabelecimento, entre as infraestruturas, o recrutamento,<br />

o marketing, o ‘merchandising’ e a formação.<br />

Hoje, os consumidores chineses são cada vez mais exigentes.<br />

Sabem o que procuram, onde procuram e como<br />

procuram. “Antigamente uma loja que não era perfeita<br />

era aceitável. Hoje, e com todas as viagens que fazem,<br />

os chineses não querem menos que os ‘standards’ europeus”,<br />

explica no estudo da KPMG Jiam Siano, representante<br />

da Montblanc na Ásia.<br />

O LUXO COMO <strong>UM</strong>A EXPERIÊNCIA<br />

De acordo com o mesmo estudo, quando os chineses<br />

procuram uma marca, fazem-no por um impulso emocional<br />

e não só porque é ‘fashion’. Procuram-na também<br />

de acordo com as suas preocupações ambientais<br />

e éticas. E, claro está, pela qualidade e durabilidade do<br />

produto. “Os consumidores chineses não procuram o<br />

luxo só para serem admirados. Fazem-no para lhes poder<br />

dar uso de uma forma continuada e repetida”, lê-se<br />

no estudo da KPMG.<br />

A maior parte dos chineses compra luxo para uso próprio,<br />

para se recompensar, para se sentir mais auto-confi<br />

ante, para ocasiões mais formais ou simplesmente<br />

porque gosta. Mas uma grande fatia da população fá-<br />

-lo também para oferecer. O que mais procuram são os<br />

perfumes e cosméticos, relógios e malas como a Louis<br />

Vuitton, a Chanel, a Gucci, a Hermès e a Prada no topo<br />

das marcas preferidas. Bulgari, Cartier ou Tiffany<br />

estão entre as eleitas para as jóias; Dunhill, Burberry,<br />

Boss, Armani, Ermenegildo Zegna, Chanel e Gucci são<br />

o ‘must have’ da moda masculina e feminina. Embora<br />

AS MARCAS QUE FAZEM OS CHINESES PERDER A CABEÇA<br />

É da Louis Vuitton que eles gostam<br />

mais. A marca francesa representa o<br />

supra sumo do luxo para os chineses.<br />

Primeiro porque é uma marca com<br />

história, depois porque é uma marca<br />

líder, duas características que os<br />

chineses apreciam muito. Mas<br />

também porque signifi ca descoberta,<br />

requinte, criatividade e elegância,<br />

nunca passa de moda e a venda faz-<br />

-se exclusivamente nas lojas Louis<br />

Vuitton. É que, quando compram luxo,<br />

os chineses querem ter a certeza de<br />

que estão a comprar peças autênticas.<br />

Muitos preferem mesmo comprar fora<br />

do país para não correr riscos porque<br />

ter uma Louis Vuitton autêntica é<br />

sinónimo de riqueza, é o ‘top’ do<br />

‘must’: toda a gente sabe, toda a gente<br />

o diz, mas ninguém sabe explicar<br />

exactamente porquê. É o presente<br />

preferido das amantes dos milionários.<br />

Segue-se a Chanel ou Xiang Nai<br />

14 Fora de Série Março 2011<br />

A Prada optou por apresentar a última colecção em Pequim, onde privilegiou as modelos orientais para agradar ao público local.<br />

“A NTIGA MENTE<br />

<strong>UM</strong>A LOJA QUE NÃO<br />

ERA PERFEITA ERA<br />

ACEITÁVEL. HOJE,<br />

OS CHINESES NÃO<br />

QUEREM MENOS QUE OS<br />

‘STANDARDS’ EUROPEUS”,<br />

DIZ JIAM SIANO, DA<br />

MONTBLANC.<br />

Er (fragrância), como lhe chamam<br />

em Mandarim. A marca francesa,<br />

com assinatura de Karl Lagerfeld,<br />

ocupa o segundo lugar no ‘top’ das<br />

preferências dos chineses, de acordo<br />

com um estudo da consultora Bain<br />

& Co, mas não pelas colecções de<br />

‘prêt-à-porter’. Apesar de Lagerfeld<br />

se inspirar muitas vezes na cultura<br />

chinesa para as suas criações, o<br />

campeão de vendas da marca é o<br />

eterno Chanel nº 5 – daí o nome<br />

em chinês – e as famosas carteiras<br />

com os “Cs”, de Coco Chanel,<br />

entrelaçados. A marca conta já com<br />

16 lojas no território chinês e pensa<br />

expandir-se ainda mais. Até porque a<br />

facturação continua a subir na China,<br />

assim como o gosto pelo luxo.<br />

Depois, vem a Gucci. A marca italiana<br />

tem um grande prestígio na China<br />

e sabe aproveitar as oportunidades<br />

que vão surgindo. Em 2010, a Gucci<br />

Depois da Louis Vuitton, Chanel e Gucci são as<br />

marcas que se seguem nas preferências chinesas.<br />

a maioria das marcas mantenha o estilo e a identidade,<br />

algumas aproveitam a euforia do mercado chinês<br />

como podem. A Prada fez este ano pela primeira vez<br />

um desfi le exclusivo em Pequim onde reinaram as modelos<br />

orientais. A Dior criou uma campanha publicitária<br />

dedicada ao mercado chinês e a Hermès associou-se<br />

a uma ‘designer’ chinesa, Qiong-Er Jiang, para lançar<br />

uma nova marca 100% ‘made in China’, a Shiang Xia<br />

(ou, em português, “para cima e para baixo”). Só para<br />

citar algumas.<br />

Além destas marcas tradicionais, também a cirurgia estética<br />

e o vinho estão a ganhar adeptos. A maioria da produção<br />

vinícola é feita no país, mas os vinhos australianos<br />

e franceses, com os de Bordéus à cabeça, começam a conquistar<br />

o paladar dos orientais. Os números indicam que<br />

a China é já o maior importador de vinhos franceses e<br />

que o consumo de vinho vai duplicar nos próximos cinco<br />

anos. É que, como na moda, também os vinhos importados<br />

ou os carros topo de gama dão prestígio.<br />

Outro ‘boom’ do último ano é a compra de produtos de<br />

luxo pela Internet. A procura multicanal duplicou em<br />

já tinha 46 lojas abertas, um número<br />

que o CEO da marca, Patrizio di Marco,<br />

pretende duplicar nos próximos anos.<br />

É que a Gucci está espalhada por<br />

todo o país, mesmo nas cidades mais<br />

pequenas. Escolhe estrategicamente<br />

as localidades onde se vai sediar e<br />

tem apostado essencialmente em<br />

muita formação e mão-de-obra local.<br />

Mais. Os preços são cuidadosamente<br />

calculados. Ao contrário de outras<br />

marcas de luxo, a Gucci prefere<br />

acrescentar apenas dez a 13% aos<br />

valores globais, para cobrir os custos<br />

de importação. Dizem os responsáveis<br />

que é uma forma de não irritar os<br />

consumidores locais que viajam por<br />

todo o mundo e têm acesso aos outros<br />

valores. Hermès, Prada, Armani,<br />

Dunhill, Cartier, Dolce & Gabbana,<br />

Ermenegildo Zegna, entre muitas<br />

outras, são as marcas que se seguem<br />

no rol das preferências orientais.<br />

NESTA PÁGINA, FOTOGRAFIA DE PETER PARKS/GETTY IMAGES E DE THOMAS LEE/BLOOMBERG


Destaque<br />

apenas quatro anos. Hoje, são mais de 60% os consumidores<br />

que procuram luxo ou informação sobre os produtos<br />

através da Web. Uma forma de se manterem na<br />

vanguarda da moda mas também de contrariar a contrafacção.<br />

Esta é, aliás, mais uma dor de cabeça para as<br />

marcas. Os números estão a baixar mas o problema está<br />

longe de estar controlado. “A contrafacção é mesmo um<br />

problema, mas o governo chinês tem sabido agir e tomar<br />

medidas. Muito mais do que as que saem na imprensa”,<br />

diz Jiam Siano, da Montblanc. Só para se ter uma ideia,<br />

há três anos, um terço dos produtos de luxo que entrava<br />

na Europa era contrafeito na China. “Um sinal do sucesso<br />

das marcas no mercado”, acrescenta Siano.<br />

Apesar do consumo estar a crescer exponencialmente<br />

na China, 60% dos consumidores optam ainda por<br />

comprar fora do país, uma forma de ter garantia de autenticidade<br />

e de pagar menos impostos. Explica Tim<br />

King, da Dunhill, também citado no estudo da KPMG,<br />

que na China a mercadoria chega a custar mais 38% em<br />

taxas que em Hong Kong ou no resto do mundo. Mas as<br />

oportunidades continuam a ser muitas. “Os chineses<br />

estão mesmo virados para as compras e não vejo que<br />

O LUXO, ‘MADE IN CHINA’<br />

Sedentos de luxo, os chineses<br />

sempre apreciaram os bons<br />

produtos, como a seda, a jade e<br />

até o chá, por isso, as grandes<br />

marcas ‘made in China’ teriam<br />

tudo para dar certo. Mas o<br />

mercado tem tido difi culdade em<br />

descolar e muito poucas marcas<br />

nacionais têm conseguido destacar-se.<br />

Dizem os analistas que,<br />

no que toca ao luxo, os chineses<br />

preferem investir fora do país<br />

porque acreditam que dá mais<br />

prestígio. Seguem-se as marcas<br />

de luxo chinesas de mais sucesso,<br />

de acordo com a Labbrand, uma<br />

consultora especializada em marcas,<br />

sediada em Xangai.<br />

NE TIGER<br />

Considerada um ícone nos produtos<br />

de pele, a NE Tiger nasceu em 1992.<br />

16 Fora de Série Março 2011<br />

É também o supra-sumo da altacostura<br />

chinesa e muito apreciada<br />

para fatos de casamentos ou galas.<br />

CHOW TAI FOOK<br />

Fundada em 1929, a Chow Tai Fook<br />

é uma das mais famosas marcas de<br />

jóias do país.<br />

KWEICHOW M<strong>AO</strong> TAI<br />

Símbolo da cultura culinária chinesa,<br />

a Kweichow Mao Tai é a marca<br />

do licor mais famoso do país.<br />

OMNIALUO Nasceu em 1998 e é<br />

muito popular entre as mulheres.<br />

Esta marca de roupa é uma espécie<br />

de Ralph Lauren chinesa.<br />

ERDOS CASHMERE<br />

Roupa e acessórios em caxemira, a<br />

funcionar desde 1979.<br />

isso vá mudar. As possibilidades são muito boas para<br />

nós (Dunhill) e para todas as outras marcas”, acrescenta<br />

Tim King. Até mesmo na Europa, as grandes marcas já<br />

se viraram para Oriente e é frequente ouvir falar mandarim<br />

atrás do balcão. A Burberry, por exemplo, fez saber<br />

que os seus maiores clientes são turistas chineses<br />

em muitas cidades como Londres, Paris ou Nova Iorque<br />

e o mesmo acontece com outras marcas.<br />

O estudo da Bain prevê que este ano, o mercado chinês<br />

cresça ainda 30% e que o sector das carteiras, sapatos,<br />

jóias e relógios continuem no topo da procura com um<br />

aumento de vendas na ordem dos 8%, logo seguido dos<br />

perfumes, cosméticos e roupa. Com todo este poder de<br />

compra devem ou não as marcas ceder de vez a esta infl<br />

uência da China? Até onde é que devem ir para não<br />

criar um impacto negativo em mercados como os Estados<br />

Unidos ou a Europa? Dizem alguns críticos que<br />

talvez o luxo se esteja a adaptar rápido demais ao gosto<br />

oriental, que a longo prazo os prejuízos poderão ser<br />

maiores que os benefícios, que há que manter a identidade<br />

e o poder dos ‘logos’. Mas o que fazer se para já é a<br />

China que está a dar?<br />

O Silk Alley Market, em Pequim, é famoso pelas réplicas perfeitas. É a contrafacção, muitas vezes, paredes meias com as marcas originais.<br />

WULIANGYE<br />

Especialista em Baijiu, licor chinês.<br />

CHANGYU<br />

Marca de vinhos, brandy, licor e<br />

vinho com gás.<br />

YUNNAN PU’ER TEA<br />

Em 2005, 500 gramas de Pu’er<br />

Tea com 64 anos foram vendidas<br />

num leilão por um milhão<br />

de yuan (mais de cem mil euros).<br />

E isto diz tudo.<br />

DORIAN HO<br />

Nome de um ‘designer’ de Hong<br />

Kong, a empresa oferece roupa de<br />

luxo, especialmente para festas.<br />

XIANGYUNSHA SILK Fabricante<br />

de seda, baseada em Shenzhen<br />

desde 2003.<br />

INSIDER<br />

FERNANDO CORREIA DE OLIVEIRA<br />

É jornalista e especializou-se<br />

na área dos relógios. Viveu em Pequim<br />

durante dois anos.<br />

“IMPERIAL E PATO<br />

LACADO É EM PEQUIM”<br />

Cidade preferida na China.<br />

Xangai. Hoje, tem um estilo de vida mais relaxado e<br />

mais vibrante. Vivi de 1988 a 1990 em Pequim, como<br />

primeiro correspondente acreditado com carácter<br />

de permanência na República Popular da China, ao<br />

serviço da Agência LUSA.<br />

Lugar que não se encontre nos guias turísticos.<br />

Existe em Pequim uma zona adjacente à Cidade<br />

Proibida, que poucos turistas frequentam. Uma<br />

das laterais do complexo, que está entre a Cidade<br />

Proibida propriamente dita e a nova Cidade<br />

Proibida. Passa por lá o canal que rodeia a Cidade<br />

Proibida e tem-se ainda vislumbres de alguns<br />

‘hutong’, os bairros de que Pequim era feito e que<br />

desapareceram nos últimos anos, para dar lugar a<br />

construções modernas. É fácil de encontrar, a pé.<br />

Basta ir rodeando os muros principais da Cidade<br />

Proibida, seguindo pela primeira artéria à esquerda<br />

do retrato de Mao, e inflectir depois mais uma vez<br />

na primeira à direita.<br />

Restaurante que recomende.<br />

A cozinha de Pequim tem a imperial e o pato lacado<br />

como cartão de visita. O restaurante chinês do Hotel<br />

Peninsula (Wangfu Fandian, no distrito comercial<br />

de Wang Fujing) continua a ter um bom Pato à<br />

Pequim e também se pode provar a cozinha do<br />

Sichuan, especialmente para quem gosta de picante,<br />

como eu. Na zona do Templo do Céu (Tian Tan) há<br />

muitos restaurantes populares com Cozido Mongol<br />

(Mongolian Hot Pot), para quem goste de borrego.<br />

Em Xangai e na região, Suzhou e Hangzhou, todos<br />

os restaurantes servem a Galinha do Mendigo, um<br />

prato delicioso em que a ave é enrolada em folhas<br />

de couve e cozida a vapor.<br />

Se o luxo fosse um lugar era…<br />

Hong Kong! A população é das mais sofisticadas<br />

e cosmopolitas do mundo, o território continua a<br />

ser uma Nações Unidas de quadros expatriados,<br />

servidos por transportes públicos do melhor que há.<br />

Eficiência vibrante é a melhor definição que tenho.<br />

Um hábito local.<br />

Sentar de cócoras, especialmente os homens. Ficam<br />

assim horas a fio, a falar uns com os outros.<br />

É obrigatório visitar…<br />

O Templo do Céu (Tian Tan). É a estrutura mais<br />

elegante de Pequim e fica num parque gigantesco<br />

onde se pode ver o quotidiano de descanso dos<br />

chineses.<br />

Nunca passar perto de…<br />

Casas de banho públicas…<br />

Para comprar um relógio devemos ir…<br />

Pequim tem das maiores boutiques monomarca de<br />

relógios, desde Omega a Audemars Piguet. Xangai<br />

tem a maior boutique Rolex do mundo. Mas, para<br />

comprar relógios (verdadeiros), a China continental<br />

não é o sítio ideal, devido às taxas. Hong Kong ou<br />

Macau, sim. Em Macau, continua a haver casas de<br />

penhores com relógios muitas vezes a metade do<br />

preço e praticamente novos. Mas é preciso saber ver<br />

bem, pois também há falsificações muito boas.<br />

TEXTO DE ANA FILIPA AMARO<br />

FOTOGRAFIA DE PETER PARKS/GETTY IMAGES


E fs<br />

A inspiração chega<br />

do Oriente, lugar<br />

de tendências e de futuro<br />

das grandes marcas de luxo.<br />

Na Europa, corre-se atrás dessa<br />

moda que tem o cuidado de<br />

manter a sofi sticação e a elegância.<br />

Novos tempos, valores antigos.<br />

TEXTO DE ANA FILIPA AMARO<br />

SELECÇÃO DE RITA IBÉRICO NOGUEIRA<br />

Moradas: CHANEL: Rua do Carmo, Nº 42, 7ºB – Lisboa. Tel.: 21 3223140; CK na ORIVESARIA PORTUGAL: Av. Eng. Duarte Pacheco, Centro Comercial Amoreiras, piso 2, loja nº 2110 – Lisboa. Tel.: 213831986; DIOR no EL CORTE<br />

INGLÈS: Av. António Augusto de Aguiar, nº 31 – Lisboa. Tel.: 213711700; GIVENCHY na SEPHORA: Rua do Carmo, nº 2, Armazéns do Chiado, piso 5, loja nº 5.09 – Lisboa. Tel: 213225188; HERMÈS: Largo do Chiado, nº 9 – Lisboa.<br />

Tel.: 21 3242070; KANEBO: El Corte Inglès, Av. António Augusto de Aguiar, nº 31 - Lisboa. Tel.: 213711700; LOUIS VUITTON: Av. da Liberdade, nº 190 – Lisboa. Tel.: 213584320; OS BURGUESES: Calçada do Combro, nº 8 – Lisboa.<br />

Tel.: 211932688; PATRIZIA PEPE: Av. da Liberdade, nº 180 – Tivoli Fórum, Loja 3-B – Lisboa. Tel.: 213161392; TOUS: Av. Lusíada, Centro Comercial Colombo, loja nº 0.017 – Lisboa. Tel.: 217111500.<br />

18 Fora de Série Março 2011<br />

Cinto tipo<br />

cordão com<br />

missangas e<br />

berloques,<br />

100% poliéster<br />

Patrizia Pepe.<br />

Preço: 161 euros.<br />

Gabardine<br />

tipo kimono<br />

em tom<br />

fuschia de<br />

Os Burgueses.<br />

Preço: 220 euros.<br />

Colar em<br />

aço polido<br />

martelado<br />

em PVD<br />

dourado da<br />

linha “Dawn”<br />

da CK.<br />

Preço: 120 euros.<br />

Leque em<br />

renda e madeira<br />

em bronze<br />

Louis Vuitton.<br />

Preço: 1.800<br />

euros.<br />

Colar em<br />

ouro amarelo<br />

e malha<br />

de fi o de ouro<br />

18 quilates da<br />

linha “Geisha”<br />

da Tous.<br />

Preço: 5.110 euros.<br />

Pulseiras<br />

de esmalte<br />

Hermès. Preço:<br />

500 euros cada.<br />

Baton “Rouge<br />

Coco” de Chanel,<br />

no tom “Rivoli”.<br />

Preço sob consulta.<br />

Máscara de pestanas<br />

“Mister Lash Booster” de<br />

Givenchy, com uma original<br />

escova de aplicação.<br />

Preço: 27,70 euros.<br />

‘Triple Touch compact’<br />

“Sensai”, um três-em-um com<br />

dissimulador incolor, um crème<br />

corrector e um pó compacto<br />

Kanebo.<br />

Preço: 52 euros.<br />

Verniz “Haute<br />

Couleur” Dior.<br />

Preço: 22,40 euros.<br />

Sandálias<br />

Louis Vuitton.<br />

Preço: 1.100 euros.


ESSENTIALLY BRITISH<br />

HACKETT.COM


20 Fora de Série Março 2011


Personagem<br />

“É PRECISO ESTAR<br />

NO SÍTIO CERTO<br />

NA HOR A CERTA<br />

E PORTUGAL NÃO É<br />

O SÍTIO CERTO”.<br />

Abre-se a cortina para deixar entrar a força criadora<br />

da ModaLisboa. Eduarda Abbondanza. Mulher.<br />

Mãe. ‘Designer’. Actriz. Espectadora do mundo.<br />

A própria, no Lux, como em casa.<br />

Passou a fase da adolescência.<br />

A maioridade está aí. Ao fi m de 20 anos, a ModaLisboa<br />

tem mais certezas e só pensa no futuro, um futuro construído<br />

por Eduarda Abbondanza, a estilista que abdicou de<br />

uma marca própria para criar um dos mais bem sucedidos<br />

eventos de moda em Portugal.<br />

O número redondo pedia uma retrospectiva séria. Um<br />

olhar abrangente que só o distanciamento do tempo permite.<br />

Não apenas sobre a ModaLisboa, mas também sobre<br />

a política, a economia, a cultura, o desporto. Porque, afi nal,<br />

a Moda também é um espelho da história.<br />

Nem todos os eventos se podem gabar de ter assistido à primeira<br />

guerra do Golfo. De ter visto nascer o Tratado de Maastricht<br />

e morrer Kurt Cobain, Michael Jackson, Amália Rodrigues ou<br />

Alexander McQueen . De ver eleito o primeiro presidente negro<br />

na África do Sul, Nelson Mandela. Ou Barack Obama, nos Estados<br />

Unidos. De ter visto passar pelo poder homens como Santana<br />

Lopes, Carmona Rodrigues, José Sócrates, Cavaco Silva. De<br />

ter visto, até, a concorrência a chegar do Porto com o Portugal<br />

Fashion. De ter assistido à morte do Escudo e ter que se adaptar<br />

ao Euro.<br />

Viu caírem pontes que separavam rios, ditadores do Médio-<br />

-Oriente e duas enormes torres, símbolos da América. Viu o<br />

mundo ganhar medo, enquanto os bancos faliam e a crise começava.<br />

Mais uma. Bem maior do que aquela pela qual passou,<br />

quando saiu de Lisboa em direcção a Cascais. Mas um bom fi lho<br />

à casa torna e a ModaLisboa está de novo na cidade a que pertence.<br />

Este ano vai dividir-se pelo Pátio da Galé, o Terreiro do Paço e<br />

o MUDE – Museu do Design e da Moda, entre 11 e 13 de Março.<br />

Uma edição que arranca com os festejos destes 20 anos. Porque<br />

a fase da adolescência já passou. A maioridade está aí.<br />

TEXTO DE ANA FILIPA AMARO, FOTOGRAFIA DE MÁRIO PRÍNCIPE,<br />

ASSISTIDO POR SÉRGIO SANTOS E LUIS PHILIPE PRODUÇÃO<br />

E STYLING DE FILIPE CARRIÇO, ASSISTIDO POR ANA CORREIA<br />

MAQUILHAGEM DE SÓNIA PESSOA, ASSISTIDA POR SOFIA LUCAS.<br />

AGRADECIMENTO ESPECIAL A MANUEL REIS E <strong>AO</strong> LUX.<br />

Março 2011 Fora de Série 21


Personagem<br />

1991<br />

➸ MODA<br />

Primeira edição da Moda Lisboa. Como foram os<br />

preparativos?<br />

Não dormimos. Éramos muito jovens, não só tínhamos<br />

que organizar a primeira edição, como iríamos participar<br />

nela enquanto criadores. Em 91 já tínhamos uma<br />

mini-estrutura, um gabinete francês que trabalhava<br />

toda a parte de comunicação e que nos dava consultoria<br />

sobre como arrancar com esta ideia louca. Tínhamos<br />

uma direcção de produção, a Isabel Branco e o Manuel<br />

Reis, que tratavam do espaço todo e do Teatro São Luís.<br />

Não tem nada a ver com as dimensões de hoje da Moda-<br />

-Lisboa, era uma estrutura muito mais pequena. Havia<br />

um grande nervosismo, nada estava profi ssionalizado,<br />

nunca ninguém tinha feito aquilo, ninguém sabia fazer<br />

aquilo. Havia uma grande emoção, grande espírito<br />

de equipa, de inter-ajuda. Uma intensidade de trabalho<br />

muito grande porque, desde a primeira edição, sempre<br />

quisemos fazer mais do que o ‘budget’ permitia.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Estados Unidos invadem o Iraque, Guerra do Golfo.<br />

Foi assistido por toda a gente porque a televisão teve<br />

uma importância que não tem hoje em dia.<br />

1992<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

A CEE muda para Comunidade Europeia. Já tinha<br />

consciência europeia?<br />

Não havia consciência europeia nessa altura! Nem<br />

havia sequer uma percepção nacional das implicações<br />

futuras disso. Imagino que, do ponto de vista<br />

político, tenham sido coisas muito importantes, mas<br />

aquilo que era o dia-a-dia não foi relevante.<br />

➸ MODA<br />

Maria Gambina ficou em primeiro lugar no<br />

concurso “Sangue Novo”, promovido pela ModaLisboa.<br />

O “Sangue Novo” foi um concurso muito poderoso porque<br />

o conjunto de todos os concorrentes são pessoas, hoje,<br />

importantes na moda em Portugal ou internacionalmente.<br />

Para que esse fenómeno tivesse ocorrido implica<br />

que o “Sangue Novo” tivesse sido quase fundamentalista<br />

no sentido de sério, correcto, sem hipóteses de manipulação.<br />

Era um concurso vocacionado para a procura<br />

de puros sangues. Eram efectivamente os melhores que<br />

ganhavam. Vamos retomá-lo este ano.<br />

Fátima Lopes lança uma etiqueta com o seu nome.<br />

Custou-lhe vê-la a sair da ModaLisboa?<br />

A Fátima Lopes não saiu da ModaLisboa. Ela estava na<br />

ModaLisboa, mas era na plataforma do norte que estavam<br />

os fi nanciamentos todos para a internacionalização<br />

– Lisboa e Vale do Tejo fi cou vetada aos fi nanciamentos.<br />

E como estava a fazer o sétimo desfi le em Paris, pagando<br />

do próprio bolso, e havendo fi nanciamentos lá em cima,<br />

fi zemos uma reunião com o Portugal Fashion e com a<br />

Fátima Lopes, na qual pedimos ao Portugal Fashion que<br />

a recebesse para que os seus desfi les fossem fi nanciados<br />

internacionalmente. Foi fruto do bom senso.<br />

1993<br />

➸ CULTURA<br />

Morreu Audrey Hepburn. Foi uma inspiração?<br />

Ela é intemporal, não morreu nada! Existe e vai exis-<br />

22 Fora de Série Março 2011<br />

“O LUXO EM PORTUGAL<br />

NÃO É PARA OS<br />

PORTUGUESES.<br />

FUNCIONA PARA OS<br />

BRASILEIROS, CHINESES<br />

E ANGOLANOS”.<br />

Na abertura, Eduarda com casaco<br />

de ‘smoking’ em lã fria Stella Mccartney,<br />

na Fashion Clinic. Calças em algodão miu<br />

miu, na Fashion Clinic. Top em seda Barbara<br />

Bui, no Espace Cannelle. Anel em ouro<br />

amarelo H. Stern.<br />

Nesta página, Eduarda com vestido em<br />

seda, Alves Gonçalves. Colar em ouro Filipe<br />

Faísca. Sapatos em pele envernizada Pierre<br />

Hardy, na Stivali. ‘Collants’ Calzedonia.<br />

Cinto em pele Ana Salazar.<br />

tir sempre. É motivo de inspiração eterna! Não me<br />

canso de ver os seus fi lmes.<br />

1994<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Nelson Mandela torna-se o primeiro presidente<br />

negro da África do Sul.<br />

Um passo ainda mais importante para aquilo que é a<br />

História da humanidade, são conquistas de uma sociedade<br />

que está em constante mutação e evolução. Eu nasci<br />

numa família que não tinha qualquer espírito racista.<br />

Fomos todos educados com muito amor e numa base de<br />

inclusão. Não eram questões que se levantassem. Nem<br />

as questões sexuais eram postas em causa. A minha mãe<br />

era uma pessoa com uma mente muito aberta. Éramos<br />

castigados por outras coisas. Por exemplo, ela considerava<br />

ordinário andar de sandálias com os dedos de fora,<br />

só na areia é que podia pôr o pé à vontade, mas depois<br />

essas questões do racismo e da sexualidade não tinham<br />

relevância nenhuma.<br />

➸ CULTURA<br />

Kurt Cobain, vocalista e guitarrista dos Nirvana,


Personagem<br />

suicida-se em casa, em Seattle.<br />

Foi uma perda avassaladora. Ouvia imenso, e ainda hoje<br />

ouço o “Unplugged”. Ele era lindo. Toda a gente se virou<br />

contra a Courtney Love, a namorada dele, por ser a má<br />

que o introduziu às drogas. Hoje, sabemos que as pessoas<br />

fazem aquilo que decidem fazer. Toda a minha vida<br />

corri riscos, sempre estive em situações de risco. Sou<br />

uma pessoa que gosta de experimentar tudo e ver tudo,<br />

presenciar tudo e sou transversal a tudo. E estou aqui,<br />

normal. Isso tem a ver com a estrutura das pessoas.<br />

➸ MODA<br />

Ana Borges cria a Elite Portugal e estreia o programa<br />

de televisão 86-60-86, com Sofi a Aparício.<br />

Foram acontecimentos que mudaram a moda?<br />

Quando começámos só havia uma agência de modelos,<br />

a do Tó (Romano), a Central, e, portanto, signifi -<br />

cava que o país estava a desenvolver-se no que sempre<br />

quisemos: a transformação da indústria têxtil na<br />

indústria da moda. A Elite era uma agência internacional<br />

que abre em Portugal e isso faz com que haja<br />

mais intercâmbio, foi muito importante. O 86-60-86<br />

foi um programa icónico. Permitiu uma experimentação<br />

de imensos fotógrafos, realizadores, ‘videoclips’<br />

de moda, manequins… Porque a moda tem de<br />

ser praticada em todas as suas vertentes e todas as<br />

suas áreas. Este programa permitiu esse trabalho intenso,<br />

foi uma escola.<br />

1995<br />

➸ MODA<br />

Primeira edição do Portugal Fashion. Imaginava<br />

que poderia tornar-se o maior e único concorrente<br />

da ModaLisboa?<br />

Na altura, tinha outro tipo de informações sobre o<br />

aparecimento do Portugal Fashion. Esse evento é<br />

coincidente com a chegada a Portugal dos grandes<br />

fi nanciamentos comunitários para a indústria têxtil.<br />

Estava anunciado que esses fi nanciamentos iriam cá<br />

chegar e que a zona norte iria ser privilegiada. Uma<br />

coisa calha com a outra. Naquela altura não mudou<br />

nada, não imediatamente.<br />

Quando é que mudou?<br />

Quando percebemos que não havia uma complementaridade<br />

com o que já existia, era isso que esperávamos.<br />

Ou seja, já que nós tínhamos a ‘fashion week’,<br />

esperávamos que houvesse uma complementaridade<br />

noutras áreas que eram precisas ser desenvolvidas e<br />

não estavam a ser e que nós não podíamos fazer porque<br />

estávamos com a ModaLisboa. Se estivéssemos<br />

no Porto teríamos feito outra coisa, ainda mais se tivéssemos<br />

dinheiro. Passados uns anos percebi claramente<br />

que havia uma óptica de ocupação do mesmo<br />

território e isso pareceu-me estranho, não compreensível.<br />

Porque não fazer outras coisas quando havia<br />

tanto trabalho para fazer?<br />

1996<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

A União Europeia suspende a importação da carne<br />

bovina por causa da doença das vacas loucas.<br />

Teve medo? Deixou de comer carne?<br />

Acho que a minha mãe deve ter-me aterrorizado tanto<br />

que devo ter deixado! Sempre tive cuidados com<br />

a alimentação. Como de tudo desde a altura em que<br />

se descobriu que a soja também era manipulada. A<br />

partir dessa informação, passei a achar que tinha de<br />

beber água da torneira e água engarrafada, que tinha<br />

de comer arroz e comer feijão, tinha de comer carne<br />

24 Fora de Série Março 2011<br />

“AS NOSSAS LEIS SÃO<br />

ANCESTRAIS, MUITAS<br />

DELAS DA ALTUR A<br />

DO SALAZAR. É MUITO<br />

DIFÍCIL FAZER JUSTIÇA<br />

EM PORTUGAL,<br />

O PAÍS TENTA SEMPRE<br />

ESCAMOTEAR<br />

E SACUDIR A CULPA”.<br />

e peixe, tinha de comer legumes… porque era a única<br />

maneira de não falhar nada! (risos)<br />

1997<br />

Da esquerda para a direita, João Freitas<br />

Ferreira, assistente de gabinete de<br />

imprensa e comunicação; Alexander<br />

Caetano, chefe de produção; Mariana<br />

Guedes de Sousa, assessora de protocolo;<br />

Eduarda Abbondanza, presidente da<br />

ModaLisboa; Olga Barrisco, coordenadora<br />

de ‘sitting’; Gabriela Vasconcelos,<br />

‘sitting’; Pedro Curto, relações públicas;<br />

Susana Marques Pinto, responsável de<br />

comunicação com os ‘designers’; Sofi a<br />

Montereal, relações públicas; Mariama<br />

Barbosa, relações públicas.<br />

Eduarda com camisa em seda e algodão<br />

Mantu, na Stivali. Saia em renda e ‘lamé’<br />

Ana Salazar. Sapatos em camurça<br />

Prada, na Fashion Clinic. Pulseiras em<br />

metal com strass miu miu, na Fashion<br />

clinic. ‘Collants’ Calzedonia. Colar em<br />

ouro amarelo Filipe Faísca. Colar com<br />

pendente em ouro amarelo H. Stern.<br />

➸ DESPORTO<br />

Mike Tyson morde a orelha a um adversário durante<br />

um combate. O boxe é bom para aliviar a tensão?<br />

Na minha família italiana, o boxe era considerado um<br />

desporto nobre. Não havia golpes baixos, talvez por isso.<br />

Era um assunto sobre o qual se falava, que se via e que<br />

toda a gente à minha volta admirava. Continuo a achar<br />

graça até pela sua estética e pela parte cinematográfi ca.<br />

Mas não é uma coisa que eu pratique. Sou mais de andar<br />

de bicicleta “à abrir”, parto-me toda! Às vezes faço ioga e<br />

pesquei durante muitos anos para me acalmar. Só pescava<br />

à noite. Tinha uns 22 anos e estava em Itália. O grupo<br />

juntava-se com alguma frequência. Íamos para Sanreno.<br />

Tinha 16 canas e uma mala toda apetrechada, sabia<br />

tudo sobre pesca e passava a noite, até às 4 da manhã,<br />

em alto mar a pescar atum à cana. Hoje, não tenho tempo<br />

nem grupo. E deixei lá as canas, assim como a mala.<br />

Como não tinha canas para retomar cá e porque toda a<br />

gente olhava para mim como se fosse maluca quando<br />

dizia que gostava de pescar, nunca mais pesquei. Mas<br />

quero voltar. Há dois anos que digo isto.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Morreu a Princesa Diana.<br />

Lembro-me que estava em casa e fi quei presa à televisão,<br />

com a minha mãe num pranto porque amava a princesa<br />

Diana. Eu estava em estado de choque. Aquele romance<br />

com o Dodi Al Fayed parecia tão humano e tão próximo<br />

de nós. Era uma princesa extraordinária, com aqueles fi -<br />

lhos, com aquele marido que eu abominava e com aquela<br />

amante sinistra (risos). Tornou-se um ícone.<br />

Morreu Madre Teresa de Calcutá. É católica?<br />

Não praticante. Sou cristã e acredito em várias coisas.<br />

➸ CULTURA<br />

É lançado o primeiro livro do Harry Potter, a Pedra<br />

Filosofal. Leu?<br />

Comprei-os todos para a minha fi lha e nenhuma de nós<br />

os conseguiu ler! Achava aquilo uma seca, um calhamaço,<br />

estão lá todos! Fomos ver os fi lmes. Achei-os giros<br />

mas eram também uma apresentação de todos os efeitos<br />

especiais que Hollywood consegue produzir, parecia<br />

um catálogo de efeitos especiais. Hoje, leio pouco. Leio o<br />

que tenho de ler para a faculdade, para o doutoramento<br />

que estou a fazer em ‘design’ e moda, na Faculdade de<br />

Arquitectura. Não estou a ler romances. Até nas férias<br />

levei livros de economia.<br />

1998<br />

➸ NACIONAL<br />

Realiza-se a Expo 98 em Portugal.<br />

A primeira reportagem, que saiu em França, um<br />

ano e meio antes sobre a Expo 98 em Lisboa, foi feita<br />

através da ModaLisboa. A imprensa internacional<br />

quando vinha para a ModaLisboa ia acompanhando<br />

a construção e o nascer da Expo. A inauguração<br />

foi emocionante, foi um momento de união em<br />

Portugal.


➸ INTERNACIONAL<br />

É criada a empresa Google.<br />

A Internet é uma ferramenta indispensável e, em 1998,<br />

acho que já tínhamos essa noção. Comprei o primeiro<br />

Mac em 1994 e lembro-me de estar tão excitada, mesmo<br />

não sabendo trabalhar com aquilo, que na noite em que<br />

o comprei só mexi na única coisa que fazia barulho, que<br />

era quando deitava alguma coisa para o “lixo” (faz um<br />

som tipo aspirador). Só no dia seguinte é que percebi que<br />

tinha passado a noite a apagar os programas todos. Teve<br />

que ser tudo reinstalado! (risos)<br />

Tinha outros ‘gadgets’ na altura, os Tamagochis. Lembro-me<br />

de estar ao telefone em trabalho e a minha<br />

fi lha vir com o Tamagochi e dizer: “Mamã, o Tamagochi<br />

fez cocó”, e eu dizer: “Filha, limpa-o”. Quando<br />

desliguei não a ouvia. Quando fui à procura dela estava<br />

ela no bidé com o Tamagochi submerso, e disse:<br />

“Mamã, estou a limpá-lo!”.<br />

Eu e o Ricardo Mealha tínhamos cada um o seu Tamagochi,<br />

mas como não o conseguíamos manter, resolvemos<br />

fazer o contrário, ou seja, qual de nós é que mais<br />

rapidamente conseguia transformar o Tamagochi<br />

num monstro. Como não o alimentávamos, não lhe<br />

dávamos carinho, nada, ele transforma-se em monstro<br />

(risos). Éramos completamente viciados em tudo<br />

o que era ‘gadgets’.<br />

Vem a público o caso Bill Clinton e Monica<br />

Lewinsky.<br />

Isso marcou também o início das pessoas que para serem<br />

famosas desenvolvem histórias dessa natureza. Porque<br />

toda a vida houve amantes, toda a vida os homens<br />

e as mulheres tiveram histórias secretas e a Mónica<br />

Lewinsky quis ser famosa. Isso marca o início do “ser<br />

famoso a qualquer custo”.<br />

1999<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Entra em vigor o Euro. Ainda pensa em contos?<br />

Não, mas a entrada do Euro fez com que passássemos<br />

a receber metade do que recebíamos, tudo aumentou<br />

porque toda a gente aproveitou o arredondamento.<br />

➸ CULTURA<br />

Morreu Amália Rodrigues. Gosta de fado?<br />

Não sou grande apreciadora de fado, mas o fenómeno<br />

Amália percebi-o quando estava em Milão e liguei a televisão<br />

na RAI e vejo a Amália numa reportagem. Comecei<br />

num histerismo a gritar pelo nome dela casa fora,<br />

pela primeira vez, sabendo que na minha família não<br />

existia qualquer ligaçãoao fado. Foi preciso sair de Portugal<br />

para perceber o valor que ela tinha e o que podia<br />

signifi car para todos os portugueses que vivem longe.<br />

2000<br />

➸ DESPORTO<br />

Depois de 18 anos, o Sporting sagra-se campeão<br />

nacional. Gosta de futebol?<br />

Não. Mas calma! Gosto do (Cristiano) Ronaldo. Não<br />

sei bem em que ano, ainda o Ronaldo não era nada,<br />

quando abriu a loja Mousse e o Ricardo Vasconcelos<br />

pediu-me para fazer um ‘ready made’. Apresentei um<br />

banco de cozinha em madeira lacado a verde, onde<br />

cravei um assento encarnado e onde escrevi CR7. E na<br />

altura ninguém entendeu. Fico contente por ter feito<br />

isso. Também gosto quando se faz golo, daquele grito<br />

de festejo! Nessa altura, gostava de estar num campo.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

George Bush é eleito presidente dos EUA.<br />

Na altura não se sabia, mas viu-se que foi mau. Uma<br />

vez, por coincidência, tirei o som à televisão enquanto<br />

ele estava a falar. Estava ao telefone e de repente<br />

tive de interromper para olhar para a televisão e… ele<br />

era mesmo um boneco animado quando lhe tirávamos<br />

o som. Telefonei a todos os meus amigos para<br />

eles fazerem a experiência.<br />

➸ CULTURA<br />

Primeira edição do Big Brother Portugal.<br />

Acompanhei mais ou menos, mas não tenho ideia de<br />

quem eram os concorrentes. É um formato televisivo<br />

que também indiciava todo um conjunto de alterações<br />

comportamentais que não me “cheiravam” muito bem.<br />

Esse lado ‘voyeur’, de estar sempre em cima dos outros<br />

e observá-los, de que todos são VIPs e todos podem ver.<br />

Todos sabem, todos falam e todos comentam. Achei que,<br />

mais tarde iria ter contornos complexos.<br />

2001<br />

➸ NACIONAL<br />

Colapso da ponte Hintze Ribeiro, em Entre-os-<br />

-Rios, em Castelo de Paiva.<br />

Como sempre em Portugal nunca se descobre de<br />

quem é a culpa. Na ModaLisboa tentamos sempre<br />

fazer o diagnóstico para saber onde é que as coisas<br />

falharam para corrigir. Acho que o país faz sempre<br />

o contrário, tenta escamotear e sacudir a culpa, não<br />

percebendo que se fi zer um diagnóstico, não propriamente<br />

da culpabilização, mas para perceber o porquê,<br />

pode evitar-se algumas coisas.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Ataques terroristas da Al-Qaeda contra os EUA.<br />

Estava a almoçar num restaurante na Rua da Madalena,<br />

o nosso escritório era lá perto, e estava de frente<br />

para a televisão, que estava sem som mas a transmitir<br />

as imagens. Levantei-me para pedir ao empregado<br />

para pôr som, estavam a repetir o primeiro embate.<br />

Quando pedi para pôr mais alto, foi quando o segundo<br />

avião embateu na segunda torre. Nessa altura o<br />

almoço acabou e fomos a correr para o escritório, ligámos<br />

as televisões e ninguém mais trabalhou, estávamos<br />

todos em estado de choque. O mundo realmente<br />

mudou.<br />

Lançamento do iPod. Qual é o top 5 do seu iPod?<br />

Nunca tive iPod! A minha fi lha “melgava-me” tanto<br />

que acabei por comprar um para ela. Eu nunca tive.<br />

2002<br />

➸ NACIONAL<br />

Caso Casa Pia. No que acredita?<br />

Acredito que há problemas, se não nunca teria tomado<br />

as proporções que tomou. As nossas leis são ancestrais,<br />

muitas delas ainda são da altura do Salazar e<br />

não foram revistas, e é muito difícil fazer justiça em<br />

Portugal. Mas neste caso não pode haver fumaça sem<br />

fogo. As pessoas mais importantes vão ser penalizadas?<br />

Tem a ver com a justiça e nunca saberemos. O<br />

Carlos Silvino, no meio disto tudo, é o elo mais fraco<br />

e foi o mais rapidamente caçado e exemplarmente<br />

dado como grande culpado, foi crucifi cado para dar<br />

o exemplo.<br />

Março 2011 Fora de Série 25


Personagem<br />

➸ MODA<br />

Primeiro projecto internacional da ModaLisboa.<br />

“Mais Portugal”, foi a primeira e única vez que a Moda-<br />

-Lisboa trabalhou com fundos comunitários, realizou-<br />

-se em Barcelona. Quando se faz um projecto comunitário<br />

tem que se indicar logo os medidores de avaliação<br />

e dizer quais os resultados que se pretende. O projecto<br />

foi tão extraordinário que os resultados ultrapassaram<br />

largamente os objectivos a que nos tínhamos proposto.<br />

Partimos de um conceito de ‘lifestyle’ e moda mas alocámos<br />

uma série de artistas e empresas portuguesas que<br />

nada tinham a ver com moda. Foi um ponto de abertura<br />

extraordinário. A seguir, tivemos um momento de grande<br />

depressão, quando veio a lei que vetou os fundos comunitários<br />

para Lisboa e Vale do Tejo. Em todas as leis<br />

há situações de excepção e para a ModaLisboa deveria<br />

ter sido criada uma. Percebemos que fazer bem não era<br />

um património reconhecido em Portugal.<br />

A lei trouxe consequências para a ModaLisboa?<br />

Ficou em causa o crescimento internacional que iria ser<br />

grandioso porque tínhamos acabado de o provar.<br />

2003<br />

➸ MODA<br />

A ModaLisboa passou a ter quatro dias. Foi uma<br />

reacção ao que vos tinha acontecido?<br />

Sim, se não podemos trabalhar internacionalmente,<br />

então façamo-lo mais em Portugal. Vamos crescer<br />

mais localmente, e também chamar mais imprensa<br />

internacional. E foi aí que começámos a trabalhar<br />

conscientemente a ModaLisboa enquanto marca.<br />

2004<br />

➸ DESPORTO<br />

Euro 2004 em Portugal. Também pendurou a bandeira<br />

na janela?<br />

Claro! Foi outra altura em que o país se voltou a unir,<br />

depois da Expo 98. Estava fascinada com as multidões<br />

nos estádios e a emoção de gritar golo.<br />

➸ NACIONAL<br />

Pedro Santana Lopes tomou posse como primeiro-ministro,<br />

mandato que foi interrompido pouco<br />

tempo depois. Merecia ter tido mais tempo?<br />

Uma pergunta muito difícil de responder na medida em<br />

que, para nós, coloca-se outra questão. O Dr. Pedro Santana<br />

Lopes ter saído da presidência da Câmara Municipal<br />

de Lisboa para ter ido para primeiro-ministro, fez com<br />

que entrasse o Eng.º Carmona Rodrigues que fez com<br />

que a ModaLisboa deixasse de estar em Lisboa. A nossa<br />

memória está mais alavancada a essa questão.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Lançamento do Facebook. Qual é a sua relação com<br />

as novas tecnologias e com as redes sociais?<br />

No escritório fui a primeira a entrar no Facebook e eram<br />

todos contra! Mais tarde perceberam que pode ser um<br />

instrumento de trabalho extraordinário. Neste momento,<br />

o Facebook serve para editar coisas que acho interessantes,<br />

não tenho aplicação nenhuma, não jogo e não<br />

tenho por hábito pôr as minhas fotografi as de férias ou<br />

das festas onde vou. Nunca divulgo os meus amigos.<br />

Estou a fazer um diário, onde escrevo sempre às 22h, já<br />

é um ritual. Comecei a fazê-lo dia 1 de Janeiro e é uma<br />

forma de comunicar com uma imagem e com uma frase<br />

qual é o meu ‘mood’ no fi nal do dia. Edito também<br />

vídeos, coisas de criadores nacionais e internacionais. E<br />

tenho um blogue que é um arquivo de coisas que editei<br />

há uns três anos no Facebook. O Twitter ainda não ac-<br />

26 Fora de Série Março 2011<br />

tivei porque estou muito neste blogue. Estou também<br />

no Smallworld, mais para trabalho, no Star Tracker e no<br />

LinkedIn.<br />

2005<br />

➸ NACIONAL<br />

Eleições legislativas em Portugal, com a vitória do<br />

PS de José Sócrates.<br />

(silêncio) Acho que é um politico, do ponto de vista<br />

estético, carismático e que tem preocupações na maneira<br />

como se mostra, como fala e como se apresenta.<br />

Tem uma série de características que poderiam fazer<br />

dele um excelente primeiro-ministro, mas acho que<br />

é demasiadamente centrado em si.<br />

“TODA A MINHA VIDA<br />

CORRI RISCOS PORQUE<br />

SOU <strong>UM</strong>A PESSOA<br />

QUE GOSTA<br />

DE EXPERIMENTAR<br />

TUDO E VER TUDO,<br />

E ESTOU AQUI, NORMAL”.<br />

Eduarda com top em seda e blusão em linho e<br />

pele, ambos Aleksandar Protic. Calças de ganga<br />

Levi’s. Colar com pendente em ouro amarelo, fi o<br />

em ouro amarelo e pulseira em argolas, tudo em<br />

da H. Stern.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Morre João Paulo II que era um Papa muito querido.<br />

Sentia isso?<br />

Sim, usava Doc Martens, era super humanitário e era<br />

um Papa muito compreensivo e moderno e muito respeitado<br />

por todas as religiões. Tinha uma grande abertura<br />

às outras religiões que não a Católica.<br />

Angela Merkel é eleita chanceler da Alemanha. É<br />

a primeira mulher a ocupar este cargo na história<br />

do país. Fazem falta mais mulheres na política?<br />

Fazem e é urgente. Para já, porque em termos estatísticos<br />

as mulheres são mais do que os homens e depois porque<br />

as mulheres têm sempre uma perspectiva mista e podem<br />

ser tão pragmáticas quanto os homens.<br />

2006<br />

➸ NACIONAL<br />

Fim do jornal “O Independente”.<br />

Cumpriu uma função, era o outro lado da balança. O<br />

seu desaparecimento fez com que esse espaço também<br />

desaparecesse da sociedade portuguesa. Sempre<br />

que um jornal ou uma revista fecha a equipa ressente-se<br />

disso e acho que o Miguel Esteves Cardoso, que<br />

durante muitos anos esteve ausente, não se fez ver,<br />

foi a pessoa que mais sentiu, talvez por ser mais emocional.<br />

Cavaco Silva é eleito Presidente da República.<br />

Temos o homem que os portugueses escolheram.<br />

2007<br />

➸ NACIONAL<br />

Portugal aprovou em referendo a despenalização do<br />

aborto. É a favor ou contra?<br />

Eu não sou a favor do aborto, sou a favor de uma prevenção<br />

e de uma educação sexual correcta. Agora, há<br />

situações extremas que, obviamente, têm que ser contempladas<br />

e feitas em condições. E as pessoas recorriam<br />

em sistemas ilegais, correndo riscos imensos, inclusivamente<br />

de morte, pagando balúrdios indo a Espanha, e<br />

dando uma falsa imagem do país.


Novo Peugeot 508.<br />

Muitas vezes, as grandes decisões<br />

são tomadas entre duas reuniões.<br />

NOVO PEUGEOT<br />

508<br />

Consumo combinado: 4,4 a 7,1 l/100 km. Emissões de CO 2 : 115 a 164 g/km.<br />

www.peugeot.pt


Personagem<br />

Desaparecimento de Madeleine McCann, no Algarve.<br />

Qual é a sua teoria sobre este caso?<br />

Estava lá ao lado de férias, em Lagos. A morte de um fi -<br />

lho pode criar num casal situações de ruptura, inclusivamente,<br />

de desfasamento do próprio casal. Psicologicamente<br />

é uma ocorrência tão forte, tão forte... Ainda mais<br />

neste caso que nem é um fi lho que morre. É um fi lho<br />

que desaparece. Inevitavelmente, essa dor e desespero<br />

criam confl itos, tristeza, estados emocionais que podem<br />

implicar desatinos entre as pessoas – digo isto porque o<br />

meu pai morreu há um mês e dentro do escritório tive<br />

dias maus. E, realmente, aquele casal está unido, unha<br />

e carne, não demonstrou nunca nenhum sinal de fragilidade<br />

entre eles e, muitas vezes, só um grande segredo<br />

pode explicar isso. Não é uma teoria mas foi uma coisa<br />

que reparei e sempre estranhei.<br />

➸ MODA<br />

ModaLisboa vai para Cascais. Em que medida é<br />

que a entrada de Carmona Rodrigues teve infl uência?<br />

Uma infl uência catastrófi ca na medida em que não<br />

houve sequer um diálogo. Nós tínhamos um protocolo<br />

com a Câmara de Lisboa que foi interrompido e a<br />

única justifi cação ofi cial foi não haver dinheiro.<br />

O que acha que aconteceu?<br />

Não acho nada. Mas também não acho que tenha sido<br />

falta de dinheiro. Não consegui perceber. Na altura foi<br />

um choque exactamente porque não era perceptível,<br />

porque a comunicação não foi protocolar, como deve<br />

ser nestas situações. Tivemos dois ou três dias a tentar<br />

perceber, sabendo que as razões seriam políticas e não<br />

económicas. O valor em causa não são valores que justifi<br />

quem, não era por aí. Era uma falta de sensibilidade<br />

e conhecimento, um acto de total irresponsabilidade.<br />

Depois, foi perceber que a ModaLisboa tem de continuar<br />

e portanto, fomos à procura de novo porto.<br />

Se Pedro Santana Lopes tivesse continuado na<br />

Câmara de Lisboa, isto não teria acontecido?<br />

28 Fora de Série Março 2011<br />

Eduarda com calças em ganga Levi’s. Casaco<br />

em seda brocada Dries Van Noten,<br />

na Stivali. Top em malha de seda Maison<br />

Martin Margiela, na Stivali. Sapatos em<br />

camurça Prada, na Fashion Clinic.<br />

Da esquerda para a direita, Cláudia Nunes,<br />

coordenadora e editora ‘web’; Rita Costa Gomes,<br />

directora executiva; Joana Jorge, coordenadora<br />

de projectos especiais; Pedro Carvalho, director<br />

fi nanceiro; Eduarda Abbondanza, presidente da<br />

ModaLisboa; Rita Rolex, assessora da presidência;<br />

Fátima Barros, secretária da presidência; Manuela<br />

Oliveira, coordenadora do gabinete de imprensa<br />

e comunicação.<br />

“NÃO SOU NADA<br />

DESL<strong>UM</strong>BR ADA<br />

COM A FAMA. SOU<br />

FA MOSA NOS MOMENTOS<br />

DA MODALISBOA E<br />

DEPOIS DESAPAREÇO.<br />

E NÃO SOU AMBICIOSA,<br />

TENHO AMBIÇÃO,<br />

É DIFERENTE”.<br />

Tenho a certeza que não. Entretanto, uma pessoa que<br />

trabalhava connosco tinha boas relações com Cascais<br />

e falou com António Capucho, que nos chamou imediatamente.<br />

Uma das coisas boas desta mudança foi<br />

o facto de termos conseguido “limpar” do ‘mailing’<br />

uma série de pessoas que iam à ModaLisboa só por ir.<br />

Estando nós em Cascais, passaram só a ir as pessoas<br />

que realmente interessavam.<br />

2008<br />

➸ NACIONAL<br />

Manuela Ferreira Leite é eleita líder do PSD. É este<br />

tipo de mulher que faz falta à política?<br />

Acho que para se ser pragmático e duro e tomar decisões<br />

muito difíceis não é preciso ter uma pose tão dura.<br />

Pode ter-se uma pose doce e continuar a ser muito<br />

pragmático e assertivo. Decidido naquilo que se faz.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

Barack Obama é eleito presidente dos EUA. Também<br />

sentiu na altura que ele seria o “salvador”?<br />

Não é bem o salvador, até porque é muito difícil no<br />

contexto actual. Mas Barack Obama é uma super história,<br />

é um ‘case study’. Foi a primeira eleição americana<br />

em que o mundo inteiro votou.<br />

➸ CULTURA<br />

Madonna actua em Lisboa. É um ícone?<br />

Fui ver e achei que ela estava com um ‘power’ enorme.<br />

Ela tinha 50 anos e fi quei a pensar que ela marcava<br />

uma alteração paradigmática do aumento da tempo<br />

de vida e de que os 50 são os novos 40 e os 40 os<br />

novos 30. A Madonna foi sempre um ícone da moda<br />

e, aliás, a Lady Gaga hoje é o que é porque foi resgatar<br />

o Steven Klein para fazer os vídeos, era ele quem produzia<br />

também os vídeos da Madonna.


Personagem<br />

2009<br />

➸ NACIONAL<br />

Casos Face Oculta e Freeport. É isto que descredibiliza<br />

a política e os políticos portugueses?<br />

Não é só isto mas, sem dúvida nenhuma que ajuda. Se<br />

formos analisar tudo, desde esses casos até ao caso Casa<br />

Pia e por aí fora, concluímos que a justiça em Portugal<br />

nunca chega a conclusão nenhuma. É a justiça que sai<br />

mais descredibilizada e não os políticos.<br />

➸ INTERNACIONAL<br />

A OMS declara estado de pandemia com a gripe A.<br />

Teve medo?<br />

Estava um clima de terror generalizado. E como tinha tido<br />

uma pneumonia há pouco tempo, fazia parte do grupo de<br />

risco e fui obrigada a ter o Tamifl u em casa. As farmacêuticas<br />

ganharam um balúrdio mas não se confi rmou o pior<br />

cenário e ainda bem.<br />

➸ CULTURA<br />

Morreu Michael Jackson.<br />

É o rei do pop, envolvido em muitas histórias complexas,<br />

mas acho que as pessoas que se expõem muito estão sujeitas<br />

tanto à glória como a uma série de problemas. Eu reservo-me<br />

muito. Não sou nada deslumbrada com a fama.<br />

Costumo dizer que não sou ambiciosa, tenho é ambição.<br />

Sendo que sou famosa nos momentos da ModaLisboa, e<br />

depois desapareço.<br />

➸ MODA<br />

Inauguração do Museu do Design e da Moda (MU-<br />

DE). Fazia falta um museu assim?<br />

Um museu da moda e do ‘design’ é sempre um atractivo<br />

para uma cidade. Há muitos viajantes no mundo que viajam<br />

pela moda. Portanto, um museu de moda, se tiver boa<br />

programação, pode trazer muitos visitantes ao país.<br />

A ModaLisboa este ano vai passar pelo MUDE?<br />

Sim, são sete apresentações durante os quatro dias do<br />

evento. Além dos desfi les de moda, vamos ter exposições<br />

do Valentim Quaresma, da Lara Torres e da Sara Lamurias.<br />

Vamos ainda ter o ‘Workstation’, um projecto que já<br />

vai na quarta edição, para o qual convidámos alguns fotógrafos,<br />

que não são fotógrafos de moda, para fotografarem<br />

a ModaLisboa com os seus olhares, e eles vão fazendo<br />

a exposição, uma narrativa visual, num mural, que vai<br />

estar no MUDE.<br />

2010<br />

➸ NACIONAL<br />

Cavaco Silva aprova o casamento homossexual.<br />

Todas as pessoas têm direito a ser felizes mas os portugueses<br />

continuam a não aceitar. A mudança de mentalidades<br />

é a coisa que leva mais tempo.<br />

Governo anuncia subida IRS em Junho de 2010. Foi<br />

obrigada a contornar a crise?<br />

No dia-a-dia, e não é porque estamos em crise, chamo<br />

muito a atenção da minha fi lha, que é adolescente, para<br />

não deixar as luzes todas acesas, não deixar a água a correr,<br />

etc… Profi ssionalmente, nesta edição já sentimos que<br />

as coisas não estão bem. Sentimos isso com os ‘sponsors’<br />

e porque levámos um corte de 20% no protocolo. Com o<br />

aumento do IVA perdemos 100 mil euros, com o corte de<br />

20% perdemos 80, são 180 mil euros a menos. Portanto, é<br />

irrisório o que recebemos de fi nanciamento público.<br />

➸ MODA<br />

Moda Lisboa regressa a Lisboa. Um bom fi lho à casa<br />

torna…<br />

O protocolo com a Câmara de Cascais terminou e o Dr.<br />

30 Fora de Série Março 2011<br />

“PERCEBEMOS<br />

QUE FAZER BEM<br />

NÃO ERA<br />

<strong>UM</strong> PATRIMÓNIO<br />

RECONHECIDO EM<br />

PORTUGAL”.<br />

Da esquerda para a direita, Cláudia<br />

Lopes, directora de produção; Inês<br />

Megre, secretária de produção; Eduardo<br />

Cardoso Menezes, ‘sponsoring’;<br />

Tiago Miranda, assessor de imprensa<br />

internacional; Miguel Braga, assessor<br />

de imprensa/TV; Eduarda Abbondanza,<br />

presidente da ModaLisboa; Pedro Anjos,<br />

‘designer’ P-06 Atelier; Luís Pereira,<br />

director de ‘casting’ e coordenador de<br />

‘backstage’.<br />

Eduarda com vestido em seda Céline, e<br />

‘cardigan’ em malha de seda com aplicações<br />

metálicas, ambos Stella MCcartney,<br />

na Loja das Meias. Lenço em seda<br />

Hermès. ‘Collants’ Calzedonia. Cinto em<br />

pele Etro, no Espace Cannelle.<br />

Moradas:<br />

ALEKSANDAR PROTIC: Rua da Rosa,<br />

nº 112 – Lisboa. Tel.: 213235199; ALVES<br />

GONÇALVES: Travessa Guilherme<br />

Cossoul, nº 16 – Lisboa. Tel.: 213463125;<br />

ANA SALAZAR: Rua do Carmo, nº 87<br />

– Lisboa. Tel.: 213472289; CALZEDONIA:<br />

Rua do Carmo, nº 2, Armazéns do Chiado<br />

– Lisboa. Tel.: 213431366; ESPACE<br />

CANNELLE: Arcadas do Parque, nº 52<br />

H – Estoril. Tel.: 214662141; FASHION<br />

CLINIC: Tivoli Fórum, Av. da Liberdade,<br />

nº 182, loja nº 5 – Lisboa. Tel.:<br />

213549040; FILIPE FAÍSCA: Calçada<br />

do Combro, nº 99 – Lisboa. Tel.:<br />

213420699; H. STERN na MACHADO<br />

JOALHEIRO: Av. da Liberdade, nº 180,<br />

Tivoli Fórum – Lisboa. Tel.: 211543940;<br />

HERMÈS: Largo do Chiado, nº 9<br />

– Lisboa. Tel.: 21 3242070; LEVI’S: Rua<br />

Nova do Almada, nº 107 – Lisboa. Tel.:<br />

213466309; LOJA DAS MEIAS: Av. Eng.<br />

Duarte Pacheco, Centro Comercial<br />

Amoreiras, loja 2001 a 2004 – Lisboa.<br />

Tel.: 213833786; STIVALI: R. Castilho, nº<br />

71 – Lisboa. Tel.: 213860944.<br />

António Costa, sabendo disso, chamou a ModaLisboa a<br />

Lisboa outra vez.<br />

Inauguração da loja Prada em Lisboa. Foi um novo<br />

capítulo do luxo em Portugal?<br />

Sim, se bem que a Prada, como a maior parte das lojas de<br />

luxo, não está a funcionar para os portugueses, ou se funciona<br />

é para uma franja dos portugueses. Estão a funcionar<br />

para os brasileiros, chineses e angolanos. A Tod’s, por<br />

exemplo, ainda não tinha começado a estação e já tinha<br />

vendido quase tudo, a chineses. O luxo está a caminhar para<br />

os países emergentes. A Europa, apesar de continuar a<br />

consumir luxo, não está com poder de compra para isso.<br />

É fã de alguma marca de luxo?<br />

A Bottega Veneta, a Hermès… e não vou falar da Louis<br />

Vuitton porque acho que, lamentavelmente, foi uma marca<br />

muito castigada pelas cópias, o que faz com que ter uma<br />

mala Louis Vuitton seja uma postura “wanna be”.<br />

Morreu Alexander McQueen.<br />

Como é que alguém que tem tudo, a fama inerente ao talento,<br />

com um trabalho maravilhoso, se suicida? Fez-me<br />

pensar muito sobre se, em rigor, o ser humano não poderá<br />

também defi nir que já chega. Vai ser uma questão que,<br />

mais cedo ou mais tarde, vai entrar em discussão.<br />

Felipe Oliveira Baptista é nomeado novo director<br />

criativo da Lacoste. Há talento em Portugal?<br />

O Filipe nem sequer é de Portugal, está a viver em Paris e<br />

acho que qualquer pessoa, que esteja em Paris ou Londres,<br />

e tenha talento como ele, pode-lhe acontecer estas coisas.<br />

Estando em Portugal, é mais difícil. É preciso estar no sítio<br />

certo na hora certa e Portugal não é o sítio certo.<br />

2011<br />

Como está a ser o presente?<br />

A ModaLisboa está a preparar-se para comemorar os 20<br />

anos ao longo do ano. Esta edição tem como temática o arranque<br />

da comemoração. Há medida que formos fechando<br />

os eventos, vamos anunciando. O que podemos falar já é<br />

sobre o livro dos últimos 20 anos da ModaLisboa. Depois,<br />

iremos iniciar uma colecção nova com outra editora. Uma<br />

encerra o passado, outra inicia o futuro. É esse futuro que<br />

está a ser construído este ano e vai mudar muita coisa, mas<br />

que ainda não podemos falar. Pessoalmente, também está<br />

tudo a mudar. Não vou mudar de país mas vou estar menos<br />

em Portugal. Afi nal, Deus ajuda a quem muda!


32 Fora de Série Março 2011<br />

F<br />

azer uma montra é como fazer uma peça<br />

de teatro”, diz Filipe Faísca. E é com paixão<br />

que o ‘designer’ de moda, que tem a seu<br />

cargo as vitrines da Hermès e da Fashion<br />

Clinic, fala deste trabalho e da inspiração que vai<br />

buscar às artes cénicas.<br />

“Eu nunca me consegui focar numa só mensagem”, refere<br />

o criador, e explica que apesar de a moda ter sempre<br />

feito parte da sua vida, “só se tornou um projecto<br />

económico a partir de 2006”. O percurso ditou-lhe outros<br />

rumos, que o fi zeram passar pelo teatro, pela ópera,<br />

pelo cinema e pela dança. Trabalhou como fi gurinista<br />

durante 12 anos e é da bagagem que lhe trouxe este<br />

passado que retira hoje a essência das suas montras.<br />

“Fazer uma vitrine, não é mais do que pôr em cena”,<br />

explica. E vê o resultado deste trabalho como uma<br />

acção fi lantrópica, “uma forma generosa de comunicar<br />

com um público que pode muito bem não ser o<br />

da marca que ali está exposta”, porque aquilo que interessa<br />

não é apenas o lado comercial. Aliás, o ideal é<br />

mesmo “conseguir equilibrar bem as coisas de forma<br />

a que este não seja tão evidente”.<br />

Para Filipe Faísca, fazer uma montra é uma arte que<br />

vai buscar alimento ao ‘background’<br />

cultural do seu autor.<br />

Há regras, evidentemente. Cada<br />

marca tem as suas e, neste campo,<br />

a Hermès e a Fashion Clinic<br />

não são excepção. “A Hermès, por<br />

exemplo, tem regras muito rígidas<br />

em relação aos materiais que<br />

se colocam nas montras. Não podemos<br />

usar plástico, esferovite ou<br />

Artes<br />

CENÁRIOS DE RUA<br />

São pequenas encenações e contam histórias. Umas vezes surpreendem-nos, outras<br />

roubam-nos um sorriso. As melhores fazem-nos parar, olhar e depois entrar.<br />

TEXTO DE INÊS QUEIROZ FOTOGRAFIA DE PAULA NUNES<br />

“<strong>UM</strong>A BOA<br />

MONTR A É<br />

SEMPRE AQUELA<br />

QUE ME MOSTR A<br />

O QUE NÃO ESTOU<br />

À ESPERA”.<br />

pêlo falso”. De resto, o céu é o limite. Cada projecto<br />

tem obrigatoriamente que seguir o tema do ano, mas<br />

depois é dada total carta-branca ao criador.<br />

No fundo é como uma encenação em que existe um<br />

texto que é traduzido para aqueles pequenos palcos.<br />

E a opção tanto pode passar pelo ‘nonsense’ como<br />

pelo realismo absoluto em que os bonecos se transformam<br />

em pessoas “para que as pessoas se identifi -<br />

quem com eles”. Filipe Faísca recorda o dia em que se<br />

viu compelido a disfarçar uma lasca na perna de um<br />

manequim com um penso rápido, porque não havia<br />

tempo para o substituir. “Não imagina a quantidade<br />

de pessoas que entraram na loja por causa daquilo”,<br />

conta a rir. Porque é precisamente esta a fi losofi a subjacente<br />

a uma montra Hermès: “que as pessoas parem,<br />

olhem e entrem”.<br />

Quando lhe falamos do trabalho de Leïla Menchari,<br />

que desde 1977 faz das montras Hermès em Paris<br />

um verdadeiro acontecimento público, Filipe Faísca<br />

sorri: “é uma deusa”. No entanto considera o trabalho<br />

da artista tunisina um pouco ‘vieux jeu’. Na<br />

opinião de Faísca, as grandes montras desta marca<br />

estão no Japão e conjugam artes plásticas com o úl-<br />

timo grito em tecnologia. “São<br />

absolutamente fantásticas”, garante,<br />

recordando um trabalho<br />

do ‘designer’ Tokujin Yoshioka:<br />

um ecrã vídeo com a imagem de<br />

uma rapariga a soprar um lenço<br />

real, pendurado em frente. É que<br />

“uma boa montra é sempre aquela<br />

que me mostra o que não estou<br />

à espera”.<br />

Nesta página, duas montras criadas por Filipe<br />

Faísca para a Fashion Clinic e para a Hermès.<br />

Ao lado, o criador na montra da sua loja,<br />

na Calçada do Combro, em Lisboa.


Março 2011 Fora de Série 33


34 Fora de Série Março 2011


Estilo<br />

HAPPY<br />

NEW YOU<br />

É o novo lema da Salsa Jeans. A marca<br />

portuguesa aposta no optimismo e na auto-<br />

-confi ança. Reinventou-se e desafi a<br />

o mundo a reinventar-se também.<br />

TEXTO DE INÊS QUEIROZ<br />

J<br />

á quase todos passámos por isso. Chegar ao fi m do ano com uma pequena lista de decisões<br />

que, juramos a pés juntos, vamos pôr em prática com o novo ano. Uma dieta<br />

rigorosa, para perder aquele “pneu” que já vem do virar do milénio; um bom ginásio<br />

para ajudar, porque emagrecer sim, mas com estilo; mais tempo para os amigos,<br />

enquanto estes ainda o são e, já agora, um pequeno reforço na auto-confi ança que,<br />

quem sabe, poderá trazer consigo a tão sonhada promoçãozita.<br />

É fácil. Cumprir é mais difícil. Uns conseguem, outros não mas, no fundo, já quase<br />

todos passámos por isso. O que não é tão comum é que seja uma marca a assumir<br />

todo um conjunto de novas decisões e a pô-las em prática como se de uma lista para<br />

o novo ano se tratasse. Foi precisamente o que fez a portuguesíssima Salsa Jeans.<br />

AUTO-AJUDA OU <strong>UM</strong> NOVO PAR DE ‘JEANS’?<br />

Nascida há 16 anos e com uma estratégia de expansão internacional desde 2002,<br />

que faz com que esteja hoje em mais de 35 países, a Salsa chegou à conclusão de<br />

que precisava de encontrar uma nova fórmula para comunicar os seus valores e<br />

fazer vingar a missão. Em suma: ser a segunda pele de todos aqueles que por ela<br />

optam. E como cada ano começa com um voto de felicidade para os 365 dias que<br />

se seguem, a marca foi buscar aí a inspiração para o novo conceito que é doravante<br />

a sua cara: ‘Happy New You’.<br />

No fundo, trata-se de promover a capacidade do ser humano de se reinventar a si<br />

mesmo, de alimentar a auto-estima e renovar a capacidade de ser feliz. Algo que<br />

poderemos encontrar facilmente num daqueles manuais de auto-ajuda ou, quem<br />

sabe, num novo par de ‘jeans’. Porque não? É que, no fundo, aquilo que a Salsa<br />

pretende salientar aqui é a duplicidade racional/emocional do produto: o que é e<br />

o que pode fazer por si.<br />

O racional materializa-se naquilo a que João Braga, director de marketing da Salsa,<br />

chama de “‘fi t’ perfeito ou vestibilidade”, um factor que procura conjugar conforto e<br />

sensualidade em doses equilibradas, já que os ‘jeans’ são criados em função daqueles<br />

Março 2011 Fora de Série 35


Estilo<br />

que os vão vestir e não o contrário. “Nós estudamos<br />

os corpos e temos uma cultura de orientação para o<br />

cliente. Quem compra as nossas calças não são manequins,<br />

são pessoas comuns e regulares”, frisa João<br />

Braga. E foi precisamente a pensar nessas pessoas<br />

comuns e regulares que nasceram modelos como as<br />

“Push Up”, “Push In” ou “Sculpture”, inventadas para<br />

realçar atributos, disfarçar imperfeições ou até esculpir<br />

silhuetas. A isto somam-se todas aquelas características<br />

que sempre foram apanágio da marca como<br />

“os processos de lavagem, a especial atenção com os<br />

detalhes como sejam a posição de um bolso em relação<br />

à cintura, a cor da linha ou a matéria-prima em<br />

função de cada ‘fi t’”, explica João Braga.<br />

Depois, vem o factor emocional que tem a ver com<br />

aquela “auto-confi ança e optimismo” que uma peça<br />

de roupa que faz “as pessoas sentirem-se confortáveis,<br />

bonitas e elegantes” sempre traz.<br />

MUDANÇA RADICAL<br />

NA PASSADEIRA CINZENTA<br />

O resultado das grandes decisões materializa-se de<br />

dentro para fora e, claro está, a Salsa não podia ser<br />

excepção. Ninguém o é. Conta Michele Quintão, responsável<br />

de comunicação e imagem da empresa, que<br />

a mudança da Salsa foi anunciada aos colaboradores<br />

de forma a manter o mistério até ao fi m. No bar havia<br />

um painel onde se contavam os dias de forma decrescente<br />

e, na data prevista, cada um recebeu um balão<br />

com um papel onde se podia ler uma nova decisão<br />

para o futuro. No fi nal, foram todos lá para fora largar<br />

os balões e gritar em uníssono: “Happy new you!”.<br />

A mudança, foi radical? “Ainda está a ser”, responde<br />

João Braga. Porque tudo mudou. O novo logótipo:<br />

“Salsa fi ts my life”, que alude à tal “vestibilidade” da<br />

marca, está doravante visível em tudo. A marca tem<br />

um novo ícone, inspirado no pesponto cruzado dos<br />

36 Fora de Série Março 2011<br />

Em cima, as salas<br />

de reuniões e a<br />

biblioteca da Salsa<br />

Jeans, num estilo<br />

de inspiração ‘zen’.<br />

Em baixo, o edifício<br />

e o vasto ‘open<br />

space’ onde os vários<br />

departamentos<br />

se complementam.<br />

bolsos dos ‘jeans’ e o “Happy New You” é ponto de<br />

honra desde as montras das lojas aos cartões de visita,<br />

passando pelos sacos das compras, pelos catálogos<br />

ou pelo ‘site’ ofi cial da Salsa. A par disto, a campanha<br />

que personifi ca todas as novas decisões do novo ano<br />

já arrancou.<br />

Quem consegue chegar às instalações da Salsa, na<br />

Trofa sem se perder, poderá constatar com os próprios<br />

olhos: aqui, quase todos vestem um modelo da<br />

marca. “Mas não é farda”, garantem-me.<br />

É curiosa a forma como os vários departamentos se<br />

interligam, desde a investigação e desenvolvimento à<br />

concepção, passando pelo sector dos testes, o ‘marketing’<br />

ou a gestão de inventário. Espaços abertos num<br />

vasto recinto onde a passagem se faz por uma passadeira<br />

cinzenta, caminho obrigatório de quem vai daqui<br />

para ali, porque no meio trabalha-se e o respeito<br />

pelo próximo é palavra de ordem.<br />

KALASHNIKOV, CHANEL OU SALSA?<br />

A decisão da Salsa de mudar a forma de se comunicar<br />

em termos de marca passa fundamentalmente também<br />

pela estratégia de expansão.<br />

A internacionalização começou por Espanha, que é<br />

hoje o principal mercado externo da marca que aí vai<br />

abrir brevemente dez lojas. Se Portugal tem um peso<br />

de 50% no volume de negócios da Salsa, “o mercado<br />

ibérico representa 75%”.<br />

Nos restantes países a marca tem vindo a vingar através<br />

do ‘franchising’ e, actualmente, a loja online já<br />

chega a toda a Europa. Quanto aos mercados mais<br />

fortes, destacam-se a França e o Médio Oriente onde,<br />

por incrível que pareça, as “Push Up” são o sucesso<br />

do momento. “Disseram-me uma vez que por debaixo<br />

de uma ‘burka’ podem estar duas coisas: uma Kalashnikov<br />

ou um vestido Chanel”, diz João Braga. Se<br />

assim é, porque não umas Salsa ‘jeans’?<br />

FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA


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e suavemente sedosa, com uma aparência radiosa.


Estilo<br />

L OO UU II S S TTT AAA TTT TTT OOO O O O VVV UU II TT TT OO<br />

N<br />

Um dia, Marc Jacobs entrou no estúdio de tatuagens de Scott Campbell.<br />

Saiu de lá com um SpongeBob colorido no bíceps direito. Voltou mais tarde<br />

e acrescentou mais uma tatuagem. E outra. ‘Friends will be friends’<br />

e agora é Campbell que inspira a nova colecção masculina de Jacobs para<br />

a Louis Vuitton.<br />

m enorme e colorido SpongeBob.<br />

Uma personagem<br />

dos Simpson que tem a sua<br />

cara (Matt Groening caricaturou-o<br />

num dos episódios<br />

da série animada). Um coração<br />

encarnado. Dois cãezinhos<br />

que se beijam – são Albert e Daisy, os seus ‘bull<br />

terrier’ de estimação. Um sofá na barriga. Várias estrelas<br />

nos ombros. A palavra “shameless” gravada no peito.<br />

Um personagem dos chocolates M&Ms. Dois logos<br />

da revista pornográfi ca “Oui”. Um sapo verde no antebraço.<br />

Um retrato de Elizabeth Taylor. Uma ‘pin-up’ de<br />

pistola em riste. O urso de peluche roxo. A letra J (de<br />

Jacobs) na anca. Uma cena do fi lme “Poltergeist” nas<br />

costas. E, no antebraço esquerdo, a expressão “Bros Before<br />

Hos”, tatuagem que partilha com os amigos mais<br />

chegados e que signifi ca “Amigos Acima de Tudo”. São<br />

já perto de 30 as tatuagens que Marc Jacobs, o director<br />

criativo da Louis Vuitton tem no corpo. Grande parte<br />

delas conseguidas com a ajuda do talento de Scott<br />

Campbell, o tatuador que Jacobs convidou para o ajudar<br />

a desenvolver a colecção de homem da marca francesa<br />

desta primavera/verão.<br />

As parcerias criativas de que, esporadicamente, a Louis<br />

Vuitton se socorre, já são conhecidas do público. O artista<br />

japonês Takashi Murakami é o rosto mais visível<br />

desta estratégia, mas houve mais. Por isso, não é de estranhar<br />

que Scott Campbell, tatuador e amigo pessoal<br />

de Marc Jacobs (tanto que é um dos membros da irmandade<br />

“Bros Before Hos”) tenha sido o escolhido para incrementar<br />

a “Boémia Digital” – título da colecção, que<br />

se inspira no ecletismo e no choque cultural que marca<br />

o vestuário masculino de hoje.<br />

Campbell não se fez rogado: aceitou o convite e partiu<br />

para Paris, para “beber” o espírito da cidade e consultar<br />

os arquivos da ‘maison’, que conta já com mais de 150<br />

anos de tradição e inovação. Em seguida, passou uma<br />

temporada em Asnières, na casa onde foi fundada a Louis<br />

Vuitton, na companhia de Patrick Vuitton, responsável<br />

pela área de encomendas especiais da marca. Aqui,<br />

além de fi car a conhecer em profundidade o ‘know-how’<br />

da casa, pode acompanhar passo a passo o desenvolvimento<br />

da sua encomenda, um baú em tela Monogram<br />

Macassar com quatro compartimentos, a mala ideal para<br />

transportar as tintas e as agulhas, ferramentas preciosas<br />

da sua profi ssão.<br />

Campbell foi assim preparado para aplicar a sua arte no<br />

TEXTO DE RITA IBÉRICO NOGUEIRA<br />

desfi le de moda masculina para esta estação. Na ‘passerelle’,<br />

não faltaram as marcas deixadas pela sua agulha.<br />

Os modelos exibiam tatuagens (ainda que efémeras)<br />

com o famoso monograma LV. Aqui e ali, um detalhe de<br />

um tecido estampado, em ‘echarpes’, sacos, acessórios<br />

vários. O ADN de Campbell não passou despercebido,<br />

fundindo-se na perfeição com o da Louis Vuitton, que<br />

provou não ter limites na forma como se reinventa.<br />

CAMPBELL – A ARTE PARA ALÉM DA PELE<br />

Americano (tal como Jacobs), nascido numa zona rural<br />

do estado de Louisiana, Campbell foi sempre um<br />

rebelde. Aos 15 anos estreou-se na arte da tatuagem,<br />

tendo desenhado uma caveira na própria perna, para<br />

terror da mãe, que anos antes lhe tinha dito o seguinte:<br />

“Scotty, podes até matar, que eu continuarei a ter orgulho<br />

em ser tua mãe. Mas no dia em que fi zeres uma<br />

tatuagem, eu própria te mato”.<br />

Num rasgo de sensatez, decidiu estudar Bioquímica na<br />

Universidade do Texas. Mas os estudos não o entusiasmaram<br />

e acabou por desistir do curso. Uma viagem a<br />

São Francisco acabou por ditar-lhe os primeiros passos<br />

de uma carreira promissora: aprendeu a tatuar e<br />

praticava nas peles dos ‘gangs’ adolescentes da cidade.<br />

Costuma dizer que se diplomou na rua.<br />

São Francisco, tal como a sua cidade natal, pareceu-lhe<br />

pequena, e partiu pelo mundo, em busca de novas peles<br />

e novas inspirações. Europa, Ásia… e Nova Iorque,<br />

só por si um continente de misturas e infl uências. Mais<br />

precisamente Williamsburg, um bairro emergente de<br />

Brooklyn, onde abriu o seu estúdio, o Saved Tattoo. A<br />

fama deve-a a Heath Ledger, o já falecido actor de “O Segredo<br />

de Brokeback Mountain”, a quem tatuou um pássaro<br />

em voo num braço. Algures no “Tonight Show”,<br />

de Jay Leno, Heath mostrou a tatuagem e, no dia seguinte,<br />

Campbell estava a dar autógrafos e a cobrar 300<br />

dólares à hora pela sua arte. Pelo seu estúdio já passou<br />

grande parte da elite artística, cultural, da moda e do<br />

‘design’, bem como muitas celebridades que assume<br />

como suas “amigas”: Courtney Love, Robert Downey<br />

Jr., Orlando Bloom, Josh Hartnett, Sting…<br />

Das tatuagens foi transitando, gradualmente, para o<br />

mundo da arte, onde é já um artista de ‘mixed media’<br />

reconhecido, com exposições e obra vendida. Num<br />

projecto recente, foi parar ao Afeganistão para tatuar<br />

soldados em combate. E, das montanhas rochosas povoadas<br />

de barbas e AK-47 para as ‘passerelles’ parisienses,<br />

foi um pulinho.<br />

FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA


Passo a passo, a viagem ao passado<br />

e ao universo Louis Vuitton que o<br />

tatuador-estrela Scott Campbell<br />

fez para se inspirar para a sua<br />

colaboração na colecção masculina da<br />

marca desta estação. Da pesquisa no<br />

seu estúdio, em Nova Iorque, partiu<br />

para Paris, para “beber” da movida da<br />

cidade e ver desfi lar as suas tatuagens<br />

efémeras sobre a ‘passerelle’.<br />

Em Asnières, ao lado de Patrick<br />

Vuitton, herdeiro do fundador da<br />

marca, a ela ligado como responsável<br />

das encomendas especiais, viu nascer<br />

um ‘trunk’ para as suas tatuagens<br />

itinerantes.


40 Fora de Série Março 2011<br />

Dizem que o metro de Lisboa talvez não<br />

seja um bom exemplo. Porque lá não andam<br />

à solta, privando com o comum cidadão,<br />

os grandes empresários, políticos,<br />

gestores, grandes senhores do país. Naturalmente<br />

não encontramos entre Sete Rios e a Baixa-Chiado a<br />

mesma quantidade de PIB por metro quadrado que<br />

encontramos em Londres, a bordo da ‘Central line’,<br />

entre as estações Bond Street e St. Paul. Nem, certamente,<br />

a mesma quantidade de amigos do alheio.<br />

No entanto, meio cheio ou meio vazio, o metro em<br />

hora de ponta – ou o autocarro, o estádio de futebol<br />

em noite de ‘derby’, o Pavilhão Atlântico ou qualquer<br />

outra enchente – é, e sempre será, o paraíso dos<br />

carteiristas, precisamente a categoria profissional<br />

mais afectada pelo lançamento recente, por parte<br />

da marca britânica Dunhill (eles lá sabem…), da carteira<br />

biométrica.<br />

Como disse? Sim, leu bem: biométrica.<br />

Virtualmente indes-<br />

trutível, feita em fi bra de carbono,<br />

esta carteira vem programada<br />

para só se abrir para o dono,<br />

ao toque de uma impressão<br />

digital. Mais. Como fi ca ligada,<br />

via ‘bluetooth’, ao telemóvel do<br />

seu portador, esta carteira ainda<br />

tem o poder de fazer disparar<br />

um alarme no telefone (caso<br />

ambos se separem por mais de<br />

cinco metros, o que é óptimo,<br />

porque também resulta em caso<br />

de roubo do aparelho), que é<br />

audível até dez metros de dis-<br />

Estilo<br />

À PROVA DE CARTEIRISTA<br />

Aquele gesto de levar a mão ao peito para ver se está tudo bem com a carteira, seguido<br />

de um olhar em volta, de pânico instalado. Onde é que já viu isto? Tempos de crise induzem<br />

o aumento da criminalidade – logo de carteiristas. Mas, para grandes males, grandes remédios.<br />

A carteira biométrica da Dunhill inclui um ‘clip’ em aço para notas<br />

e um suporte para cartões de crédito em pele. Vem com manual<br />

de instruções, ‘software’ e cabo USB para carregar a bateria.<br />

TEXTO DE RITA IBÉRICO NOGUEIRA<br />

FEITA EM FIBRA<br />

DE CARBONO,<br />

ESTA CARTEIRA<br />

VEM PROGRAMADA<br />

PAR A SÓ SE ABRIR<br />

PA R A O DONO,<br />

<strong>AO</strong> TOQUE DE<br />

<strong>UM</strong>A IMPRESSÃO<br />

DIGITAL.<br />

tância. Assim, mesmo que algum habilidoso larápio<br />

consiga surripiar a carteira, ainda é possível apanhá-lo<br />

em fl agrante e evitar a apropriação de identidade. É<br />

que, segundo dados fornecidos pela marca, 45% destes<br />

casos resultam de episódios de roubo de carteiras<br />

(e dos documentos nelas contidos).<br />

Estatísticas à parte, há poucas coisas mais desagradáveis<br />

que passar o dia na Loja do Cidadão a refazer<br />

documentos e ao telefone com bancos a cancelar<br />

cartões. Por isso, terão pensado os ‘designers’ da Dunhill,<br />

nada como impedir, a todo o custo, que isso<br />

aconteça. Foram inspirar-se nos arquivos da marca,<br />

onde encontraram a “Mystery Box”, que se abria ao<br />

carregar simultâneamente em três botões ocultos.<br />

Aqui, usando a mais recente tecnologia biométrica,<br />

apenas o proprietário consegue abrir a carteira, com<br />

um simples deslizar de dedos pelo sensor. E, se for<br />

roubada, na pior das hipóteses, fi ca-se sem carteira. O<br />

que é mesmo pena, pois a carteira<br />

biométrica inclui um ar-<br />

rojado ‘clip’ em aço para notas<br />

e suporte para cartões de crédito<br />

em pele Dunhill… A carteira<br />

contém ainda as instruções de<br />

manuseamento e o ‘software’,<br />

bem como um cabo USB para<br />

carregamento – a bateria dura<br />

cerca de cinco dias, mas avisa<br />

quando precisar de carga. Vai<br />

custar à volta de 600 euros e,<br />

pelo sim, pelo não, a loja Dunhill<br />

de Lisboa, nas Amoreiras,<br />

já encomendou umas quantas.<br />

Não vá o metro tecê-las.<br />

FOTOGRAFIAS CEDIDAS PELA MARCA


Estilo<br />

NOVAS ROTAÇÕES<br />

DO TEMPO<br />

Chama-se “Contagiri”. O mais recente<br />

relógio criado por Giuliano Mazzuoli<br />

traz para o pulso nada mais nada<br />

menos do que um conta rotações.<br />

TEXTO DE INÊS QUEIROZ<br />

FOTOGRAFIA DE PAULA NUNES<br />

T<br />

empos houve em que o tempo se media<br />

simplesmente por tiques e taques.<br />

Segundos que se contavam pelo avançar<br />

sincopado de um ponteiro longilíneo<br />

que, meio louco, opunha o desvaire ritmado<br />

ao volteio mais discreto de outros dois. Um, mais<br />

robusto e igualmente longo, dava conta da passagem<br />

dos minutos, o outro, mais pequeno e encorpado,<br />

era o arauto das horas que passavam uma a<br />

uma, sem nunca perder o fi o à meada.<br />

E assim se passavam as horas, os minutos e os<br />

segundos, guardados numa pequena caixa que,<br />

presa por uma correia ao homem, lhe dava a<br />

posse do tempo. O homem chamou-lhe relógio,<br />

o relógio tomou-lhe o pulso e o pulso ditou<br />

mudanças de ângulo, ritmo e rotação. Porque o<br />

homem manda em tudo e sempre sonhou mandar<br />

no tempo.<br />

Por isso, inventou novas maneiras de o contar e<br />

baralhou-o com outras formas de medida, como a<br />

distância, o peso, a pressão, a rotação, e sabe-se lá<br />

mais o quê. Tudo desde que coubesse num pulso<br />

e que nunca se perdesse a noção do tempo. Giuliano<br />

Mazzuoli é um desses homens.<br />

CONTAGIRI<br />

Foi este o nome que recebeu o último relógio lançado<br />

em 2010 pelo ‘designer’ fl orentino. “Contagiri”,<br />

ou conta rotações, precisamente porque replica<br />

o conta rotações de um carro.<br />

Depois do célebre “Manometro” de 2004, inspirado<br />

num básico instrumento de leitura de pressão<br />

de água que apaixonou fi guras tão emblemáticas<br />

como Roberto Cavalli, Roberto Baggio, Lapo<br />

Elkann e até o próprio Duque de Saboia, Mazzuoli<br />

volta a desafi ar as convenções do tempo. A inspi-<br />

42 Fora de Série Março 2011<br />

“<strong>UM</strong> RELÓGIO<br />

NÃO É PARA VER<br />

AS HORAS. É PARA<br />

A PESSOA QUE ESTÁ<br />

À NOSSA FRENTE<br />

ADMIRAR. COMO<br />

<strong>UM</strong>A JÓIA. SE QUISER<br />

SABER AS HOR AS<br />

CERTAS, SUGIRO-LHE<br />

<strong>UM</strong> TELEMÓVEL”.<br />

ração foi buscá-la à Alfa Romeo, marca pela qual<br />

chegou a correr no passado e o resultado surpreende<br />

mesmo quem já vai prevenido.<br />

Encontrámo-lo quando esteve em Lisboa, em<br />

Novembro passado, para apresentar o “Contagiri”,<br />

representado em Portugal pela Anselmo.<br />

“Eu não inventei nada, já lá estava tudo”, garantiu-nos,<br />

como se a tarefa de transformar um<br />

conta rotações num relógio fosse a coisa mais<br />

simples do mundo (já lá estava tudo, é um facto).<br />

Mas diz o senso comum que a este relógio<br />

falta pelo menos um ponteiro e uma coroa.<br />

“Claro! Se os tivesse não era um conta rotações,<br />

não é?” Evidentemente.<br />

O “Contagiri” acerta-se através de uma alavanca<br />

lateral e o processo até é bastante simples. De resto,<br />

horas e minutos partilham um único ponteiro<br />

o que dita uma leitura do tempo mais ou menos<br />

“aproximada”, explica o criador. Afi nal de contas<br />

“um relógio não é para ver as horas. É para a pessoa<br />

que está à nossa frente admirar. Como uma<br />

jóia. Se quiser saber as horas certas, sugiro-lhe um<br />

telemóvel”. Fica o conselho.<br />

A ideia do “Contagiri” surgiu em 2005 mas o<br />

processo foi moroso, entre a concepção, em Itália<br />

e o fabrico na Suíça. Não é assim tão fácil<br />

adaptar um instrumento que conta rotações à<br />

contagem do tempo. “O meu relógio foi como<br />

construir uma auto-estrada”, confessa Mazzuoli.<br />

A Portugal chegaram três modelos, dois em<br />

aço e DLC e um terceiro em ouro e titânio. Mas,<br />

os eventuais interessados em comprar um Alfa<br />

Romeo 8C terão a oportunidade de adquirir<br />

um “Contagiri”, um relógio de edição tão limitada<br />

quanto a do carro (500 exemplares) e com<br />

o mesmo número de série.


FERRAN ADRIÀ EM FAMÍLIA<br />

O conceituado ‘chef’ espanhol vai<br />

publicar em Outubro mais um livro<br />

de culinária. “The Family Meal: Home<br />

Cooking at elBulli” é a primeira<br />

compilação de 100 receitas para se<br />

fazer em casa, baseadas nos menús<br />

do elBulli. Ferran Adrià juntou uma<br />

série de ideias “simples e rápidas” que<br />

permitem criar diferentes ementas, a<br />

pensar nas várias épocas do ano, e que<br />

podem ser servidas em família. Todos<br />

os dias, às 18h, a equipa do elBulli<br />

pára o que está a fazer durante 30<br />

minutos e junta-se a um jantar onde<br />

são servidos três pratos de confecção<br />

simples. Este ritual é conhecido<br />

como “refeição da família” e foi daí<br />

que surgiu a ideia para este novo<br />

livro. Se nunca conseguiu reserva no<br />

procuradíssimo elBulli, esta é uma<br />

oportunidade para ter à mesa alguns<br />

dos segredos de Adrià.<br />

.<br />

JAGUAR PREMIADO<br />

Arrancamos com a descrição:<br />

equipado com quatro motores<br />

eléctricos, que se alimentam de<br />

quatro baterias que são recarregáveis<br />

através de um novo sistema de duas<br />

microturbinas. Aceleramos agora para<br />

a apresentação: é Jaguar, é o modelo<br />

C-X75 e foi concebido para comemorar<br />

os 75 anos da marca. Prego a fundo<br />

e… foi o modelo que recebeu o “Louis<br />

Vuitton Classic Concept Award 2010”<br />

porque, segundo o conceituado<br />

júri – que junta nomes como Xavier<br />

Dixsaut, Director de Inovação da Louis<br />

Vuitton ou Gordon Murray, ‘designer’<br />

da McLaren F1 – traduz a capacidade<br />

da marca em “exibir a tecnologia do<br />

futuro num belo desenho que não<br />

precisa de evocar o passado”. É a<br />

moda cada vez mais atenta ao que se<br />

passa no mercado ao lado.<br />

.<br />

DIOR SUSPENDE GALLIANO<br />

A Christian Dior suspendeu<br />

John Galliano depois de este ter,<br />

alegadamente, feito comentários<br />

anti-semitas num bar em Paris. A<br />

decisão foi anunciada em comunicado<br />

onde se lê que a marca de luxo tem<br />

“tolerância zero para com qualquer<br />

comportamento de carácter racista”. O<br />

estilista, que trabalha há mais de uma<br />

década para a Dior, chegou mesmo a<br />

ser preso com uma taxa de álcool no<br />

sangue acima da permitida por lei. Até<br />

ao fecho desta edição não se sabia se<br />

iria ou não haver o desfi le previsto para<br />

hoje na semana da moda em Paris.<br />

44 Fora de Série Março 2011<br />

De lado, o desenho<br />

da famosa Birkin,<br />

criada pela<br />

Hermès,<br />

que está no centro<br />

da polémica.<br />

NOTAS SOLTAS<br />

HERMÈS EM DEFESA<br />

DA “BIR K IN”<br />

É o luxo na barra dos tribunais. A Hermès<br />

está a processar uma marca americana por esta ter<br />

estampado um dos seus ícones num saco de lona.<br />

Há quem ache que falta sentido<br />

de humor à marca francesa.<br />

Mas também há quem concorde<br />

com a sua indignação. A Hermès<br />

está com um processo em tribunal<br />

contra a marca americana de<br />

acessórios Thursday Friday. Em<br />

causa: a defesa da icónica mala<br />

“Birkin” com assinatura Hermès,<br />

cuja fotografia está agora estampada<br />

em sacos de lona vendidos<br />

pela marca americana.<br />

Na acusação a ‘maison’ argumenta<br />

que “criou, fabrica e vende” a<br />

icónica mala e que o facto de ser<br />

um dos seus produtos de maior<br />

procura e de sucesso de vendas<br />

– e por falar em vendas, a marca<br />

francesa apresentou os resultados<br />

fi nanceiros de 2010 o mês passado,<br />

onde registou um volume de negócios<br />

de 2,4 mil milhões de euros, o<br />

que equivale a um crescimento de<br />

O saco de lona<br />

tem vários<br />

pormenores<br />

estampados como<br />

este cadeado.<br />

25,4% –, este é imediatamente reconhecido<br />

pelas mulheres. Assim<br />

sendo, acredita a Hermès, os sacos<br />

de lona com a fotografi a da mala<br />

impressa aparentam ser uma verdadeira<br />

“Birkin”.<br />

As opiniões começam a divergir<br />

aqui. Muitos ironizam a situação<br />

e garantem que sabem distinguir<br />

uma mala em pele que custa nunca<br />

menos do que 5 mil euros, de<br />

um saco de lona que não custa<br />

mais do que 25 euros. Seja como<br />

for, a Hermès não entende assim<br />

e acusa a Thursday Friday de estar<br />

a tirar proveito do sucesso da<br />

mala, de pôr em causa a sua reputação<br />

e de confundir o público.<br />

Confuso ou não, a verdade é que<br />

os sacos em lona têm tido recordes<br />

de vendas e, tal como a “Birkin”,<br />

já têm lista de espera, pelo<br />

menos até Março.<br />

NOVA PROPOSTA<br />

POR GIANFRANCO FERRÉ<br />

A marca italiana foi das primeiras a<br />

ser arrastada pela crise. Em 2009, a<br />

empresa do estilista Gianfranco, que<br />

morreu em 2007, decretou falência<br />

tendo sido posta a leilão. A proposta<br />

mais convincente na altura partiu<br />

da divisão têxtil do grupo Samsung,<br />

no entanto, o negócio não chegou a<br />

ser concretizado. Agora, aparece um<br />

novo interessado. Uma fonte da marca<br />

revelou que o grupo Paris, distribuidor<br />

na indústria da moda, sedeado no<br />

Dubai e a operar no Médio Oriente,<br />

apresentou uma oferta que pode<br />

revelar-se decisiva.<br />

.<br />

FRANK GEHRY EM FÚRIA<br />

O arquitecto canadiano está<br />

“assombrado, chocado e com<br />

raiva” depois de ter visto o Tribunal<br />

Administrativo de Paris anular a licença<br />

de construção da Fondation Louis<br />

Vuitton pour la Création, alegando<br />

que há um caminho público a passar<br />

no meio do projecto. A revelação foi<br />

feita por Jean Nouvel, o arquitecto<br />

francês que está a colaborar com<br />

Gehry no trabalho, em entrevista<br />

ao “Le Journal du Dimanche”, onde<br />

acusou os parisienses de terem uma<br />

“mentalidade pequena” e “falta de<br />

espírito cívico e de cultura”. Já François<br />

Douady, presidente da sociedade de<br />

preservação do Bois de Boulogne, onde<br />

o projecto deveria ser erguido, acusa<br />

os arquitectos de serem “pessoas de<br />

um egoísmo cego e perverso, que vão<br />

contra o interesse geral da população”.<br />

.<br />

A CHEGADA À ÍNDIA<br />

A ideia esteve a ser amadurecida nos<br />

últimos dois anos e agora concretiza-<br />

-se. Donald Trump, o bilionário do ‘real<br />

estate’ americano, deverá apresentar<br />

o primeiro projecto na Índia ainda este<br />

mês. Um condomínio de luxo, com 60<br />

andares e 45 apartamentos, irá ser<br />

construído na parte sul de Bombaim<br />

e terá um investimento que deverá<br />

rondar os 736 mil euros. Trump tem os<br />

olhos postos na Índia, país emergente<br />

que, de acordo com o empresário,<br />

começa agora “a compreender e a<br />

apreciar o luxo”. O projecto contempla<br />

ainda um investimento em produtos<br />

topo de gama da marca Trump,<br />

pensados para aquele mercado. Roupa,<br />

acessórios de moda e acessórios para<br />

casa estão a ser criados.<br />

.<br />

TEXTO DE ANA FILIPA AMARO


Motores<br />

A MINHA,<br />

A TUA,<br />

OU A NOSSA?<br />

Amante? Eis uma palavra esquisita<br />

e com conotações complicadas.<br />

“Mistress” também as tem, mas soa muito<br />

melhor. Então se estivermos a falar<br />

de experiências partilhadas...<br />

46 Fora de Série Março 2011<br />

TEXTO DE INÊS QUEIROZ<br />

DUCATI DIAVEL<br />

CARBON<br />

A aceleração é de de 2,6<br />

segundos dos 0 aos 100 km/h.<br />

“Mais rápido só um Bugatti<br />

Veyron, que custa mais de um<br />

milhão de euros”, diz Gonçalo<br />

Henriques.<br />

CILINDRADA CM 3 - 1198<br />

POTÊNCIA CV - 162<br />

PESO KG - 207<br />

É<br />

estranho começar um texto abruptamente<br />

com uma palavra que para muitos homens<br />

é uma espécie de tabú. Uma palavra apenas<br />

pronunciável em surdina, no recanto confortável<br />

de uma tertúlia onde só cabem outros homens.<br />

O que levará uma mulher a querer abordar tal tema? E<br />

o que poderá ter ela a dizer sobre o assunto? Talvez muita<br />

coisa, talvez absolutamente nada. Mas algo de novo,<br />

podem ter a certeza. É claro que as mulheres também<br />

têm amantes, mas isso agora não interessa nada.<br />

Passando ao que interessa, foram exactamente as conotações<br />

da dita palavra que levaram, há dias, a autora deste<br />

mesmo texto a sentar-se à mesa de um café com dois<br />

membros da equipa adversária – dois homens, entenda-<br />

-se. Gravador em cima da mesa, bloco de notas, caneta e<br />

perguntas directas, para que nem sombra de rasteira ou<br />

subterfúgio toldasse a conversa. Contem-me tudo e não<br />

me escondam nada... E eles contaram tudo.<br />

Falaram da alegria dos momentos a dois que não ultrapassam<br />

o tempo de um fi m-de-semana, ou de umas<br />

férias. Das vantagens de não ter os encargos que uma<br />

ligação mais duradoura sempre acarreta. Do luxo<br />

das viagens de sonho que depois se partilham com os<br />

amigos mais íntimos em memórias, fotografi as e histórias.<br />

Conotações aparte, soa bem e parece bem.<br />

H-D SPORTSTER<br />

Uma mota de rua original,<br />

robusta e pronta para a acção.<br />

O que mais se pode dizer de um<br />

modelo destes? É uma Harley-<br />

Davidson e pronto.<br />

CILINDRADA CM 3 - 1202<br />

POTÊNCIA CV – NA*<br />

PESO KG – 251<br />

*A Harley-Davidson não<br />

divulga a po<br />

tência dos seus modelos<br />

Tão bem que talvez não fosse má ideia criar um daqueles<br />

clubes de cavalheiros à inglesa, inteiramente dedicado<br />

a explorar esta temática. Bem pensado, melhor<br />

feito, foi precisamente isso que decidiram fazer os dois<br />

senhores à mesa do café. O clube chama-se Mistress,<br />

abriu portas no primeiro dia deste mês e tem, à disposição<br />

dos novos membros, cinco verdadeiras belezas<br />

com quem será, certamente,um prazer passar nem<br />

que seja um fi m-de-semana.<br />

Ãããããããh?????? Bom, aqui talvez seja conveniente fazer<br />

uma pequena pausa para explicar que é de motas<br />

que estamos a falar. Ou o que é que pensaram?<br />

<strong>UM</strong> CLUBE DE CAVALHEIROS<br />

Voltando ao assunto, o Mistress – Gentlemen’s Motorcycle<br />

Club inaugurou há poucos dias, fruto do<br />

empenho de Gonçalo Henriques e David Seguro, dois<br />

amantes (lá está) dos motores sobre duas rodas. Amigos<br />

de longa data e cúmplices na paixão comum, lembraram-se<br />

de juntar o útil ao que tanto lhes agradava.<br />

Conta Gonçalo Henriques que um dia, a caminho de<br />

um casamento, se cruzou na estrada com uma Harley-<br />

-Davidson V-Rod. “Lembro-me de ter pensado era uma<br />

daquelas motas em que eu gostava de dar umas voltas<br />

mas que nunca na vida seria capaz de comprar, por


BMW GS 1200<br />

Um modelo muito popular entre<br />

motociclistas e viajantes que,<br />

naturalmente, nunca poderia<br />

faltar num clube de afi cionados<br />

das duas rodas.<br />

CILINDRADA CM 3 - 1170<br />

POTÊNCIA CV – 110<br />

PESO KG – 203<br />

muito dinheiro que tivesse”. É que, já para não falar da<br />

exorbitância do preço, manter uma mota com saúde<br />

365 dias por ano obriga a uma gestão difícil. “Temos<br />

muitos amigos com paixão por motas que, no Inverno,<br />

são forçados a deixá-las paradas na garagem. Elas<br />

acabam por fi car sem bateria e depois é muito complicado<br />

voltar a pô-las a andar”, explica, salientando que,<br />

muitas vezes, o que acaba por acontecer é que as ditas<br />

fi cam mesmo por ali, empatadas, sem que os proprietários<br />

tenham alguma vez a coragem de as vender.<br />

Entretanto, começou a reparar na existência, sobretudo<br />

em Inglaterra, de vários clubes de propriedade partilhada<br />

em bens de luxo: aviões, barcos, carros, motas. E<br />

lembrou-se que talvez não fosse má ideia implementar<br />

qualquer coisa do género em Portugal. Falou na ideia<br />

ao amigo e juntos puseram mãos à obra para criar um<br />

‘gentlemen’s club’ – aberto a senhoras, claro – que, ao<br />

mesmo tempo, se demarcasse de alguma conotação<br />

negativa que os clubes de ‘motards’ têm em Portugal.<br />

A ideia é oferecer aos membros do clube “uma solução<br />

chave na mão”, como diz David Seguro. Em suma,<br />

o usufruto de uma mota topo de gama, por um período<br />

determinado e sem grandes investimentos nem<br />

preocupações com seguros, carregamento de baterias,<br />

etc. Entre as marcas eleitas destacam-se naturalmen-<br />

DUCATI 1198<br />

Uma proposta desportiva da<br />

marca italiana, bastante mais<br />

leve do que as restantes rivais<br />

que com ela disputam o pódio<br />

do Mistress.<br />

CILINDRADA CM 3 - 1198<br />

POTÊNCIA CV – 170<br />

PESO KG – 171<br />

David Seguro é um dos fundadores do Mistress, um clube feito<br />

à medida dos amantes de duas rodas, desde o aluguer às viagens.<br />

TRI<strong>UM</strong>PH<br />

SPEED TRIPLE<br />

Um clássico britânico renovado,<br />

uma incansável companheira<br />

de estrada e, sem dúvida, uma<br />

opção a ter em conta na hora<br />

da escolha.<br />

CILINDRADA CM 3 - 1050<br />

POTÊNCIA CV – 135<br />

PESO KG – 214<br />

te a Harley-Davidson, mas também a Ducati, a BMW<br />

e Triumph. Os aderentes pagam 500 euros de jóia e<br />

depois poderão escolher entre duas modalidades: a<br />

‘Silver’ que, perante uma anuidade de dois mil euros<br />

lhes garante um usufruto de qualquer mota por uma<br />

média de 30 dias, ou a ‘Black’ que, por quatro mil euros,<br />

lhes permite um usufruto médio de 60 dias.<br />

Como qualquer ‘gentlemen’s club’, também o Mistress<br />

terá uma sede, que se prevê para o centro de Lisboa,<br />

e pretende ser um local de encontro e partilha de<br />

experiências entre os amantes das duas rodas. Experiências<br />

que serão, muitas vezes, iniciativa do próprio<br />

clube que, como frisam os dois amigos, vai ser “muito<br />

mais do que um ‘rent-a-motorbike’”. Entre os projectos<br />

em carteira destaca-se a organização de viagens<br />

para fazer percursos emblemáticos, como a famosa<br />

Via Aurelia, em Itália, ou assistir a grandes prémios<br />

míticos como o da Ilha de Man.<br />

Quanto ao nome escolhido, não há margem para grandes<br />

dúvidas. É isso mesmo, confessam a rir. “As motas<br />

não são um meio de transporte, são um divertimento...<br />

como uma amante”, explica Gonçalo Henriques. E a<br />

prová-lo, há para já cinco beldades à espera dos primeiros<br />

membros do clube, entre as quais, uma Ducati Diavel<br />

Carbon acabadinha de chegar ao mercado.<br />

Março 2011 Fora de Série 47


Em cima, os dois fundadores<br />

do Oobafi t. Da esquerda para<br />

a direita, John Abbott, Simon<br />

Weatherall e Andy Clark,<br />

o director fi nanceiro.<br />

48 Fora de Série Março 2011<br />

Negócio<br />

CORPINHO A QUANTO OBRIGAS<br />

S<br />

e, como eu, é um desportista nato. Se<br />

cada vez que vê uma escada só lhe apetece<br />

atirar-se para um sofá e dormir,<br />

mas mesmo assim insiste em pagar um<br />

ginásio para não pôr lá os pés, então está a ler<br />

o artigo certo. Sobretudo se, com o novo ano,<br />

resolveu mudar de vida, esquecer a preguiça e<br />

render-se ao exercício físico.<br />

A receita é simples: suar, suar, suar, sem sair de casa.<br />

Ginástica no duro, sem passadeiras ou máquinas<br />

volumosas e complicadas. Apenas exercícios feitos à<br />

medida, programas especialmente concebidos para<br />

as suas necessidades, acompanhados de uma boa alimentação.<br />

E tudo sem pagar um tostão.<br />

O “achado” chama-se Oobafit. Está na Internet, é<br />

acessível a todos e de utilização fácil. “É uma resposta<br />

à crise. Dar às pessoas uma forma mais barata de<br />

ser saudável. É melhor do que pagar mais de setenta<br />

euros por mês num ginásio”, disse ao “The Independent”<br />

John Abbott, informático e um dos fundadores<br />

do ‘site’. Conheceu o sócio, Simon Weatherall, ‘marine’<br />

reformado e agora professor de educação física,<br />

numa aula de ginástica pós-parto onde acompanhou<br />

a mulher. A empatia foi imediata. “Tivemos a ideia de<br />

construir um ‘site’ que chegasse ao maior número de<br />

pessoas possível, que fosse gratuito, divertido e simples<br />

de usar”, acrescentou Abbott.<br />

O Oobafi t nasceu há pouco mais de um mês, depois<br />

de algum investimento, muito trabalho e muitas horas<br />

sem dormir. Enquanto um entra com os conhecimentos<br />

tecnológicos, o outro fica-se pelos dotes<br />

físicos. É como um segundo emprego dos dois fundadores<br />

que se mantiveram nas empresas onde trabalhavam.<br />

Para aceder, basta registar-se em www.oobafi<br />

t.com, ou através do Facebook, e criar uma conta<br />

pessoal. Depois, é dizer ao que vem. O ‘site’ disponibiliza<br />

uma série de planos de exercícios para perder<br />

peso, ginástica pós-parto, ou simplesmente vontade<br />

de ter um corpinho à James Bond. “Não lhe vamos<br />

dar nenhum sermão, apenas bons conselhos e ferramentas<br />

para que possa perceber melhor o que está a<br />

exercitar e o que está a comer”, lê-se na apresentação<br />

do Oobafi t. Para isso, à sua espera está um ‘Personal<br />

Trainer’, Simon, que lhe vai traçar o plano de ataque.<br />

Uma série de exercícios personalizados que podem<br />

ser seguidos por imagens ou vídeo. Depois é “fechar<br />

a boca”, porque os milagres nunca vêm aos pares e o<br />

Com a crise a apertar e a confusão instalada no que diz respeito ao IVA dos ginásios,<br />

porque não apostar num ginásio virtual? Mas daqueles com exercícios<br />

à séria, porque sem suar não há milagres.<br />

TEXTO DE RITA SALDANHA DA GAMA<br />

O ‘SITE’ TEM <strong>UM</strong>A<br />

SÉRIE DE PLANOS<br />

DE EXERCÍCIOS<br />

PA R A PER DER<br />

PESO, GINÁSTICA<br />

PÓS-PARTO OU<br />

SIMPLESMENTE<br />

VONTADE DE TER<br />

<strong>UM</strong> CORPINHO<br />

À JAMES BOND.<br />

exercício físico, mesmo muito suado, não chega. “Estamos<br />

cansados de dietas chatas e exercícios malucos.<br />

Queremos dar às pessoas conselhos simples, honestos<br />

e que funcionem”, acrescentam.<br />

A pensar nisso, este ginásio virtual tem também uma<br />

Ooba nutricionista e um Ooba ‘chef’. A primeira para<br />

lhe traçar um plano alimentar para cada semana ou<br />

mês, e o segundo para lhe confeccionar pratos deliciosos,<br />

mas ‘light’. Um mimo que só se aplica a quem<br />

vive nos Estados Unidos, assim como a possibilidade<br />

de ter as compras entregues em casa. Por cá, a solução<br />

é recorrer a um qualquer cantinho ‘gourmet’, e<br />

de preferência vegetariano para não cair em tentação.<br />

Do que não se livra mesmo é de ir comprar o equipamento<br />

e começar já. É que começou a contagem<br />

decrescente para o Verão e o corpo perfeito não se<br />

consegue assim, de um dia para o outro.<br />

FOTOGRAFIA DE RUBBERBALL/ERIK ISAKSON/GETTYIMAGES


Paladares<br />

TERÃO<br />

AS ESTRELAS<br />

MICHELIN<br />

PERDIDO<br />

O SEU<br />

BRILHO?<br />

O mítico guia vermelho<br />

já foi considerado a “melhor<br />

companhia” para jantar,<br />

mas nos dias que correm as pessoas<br />

preferem o passa-a-palavra<br />

na hora de escolher um restaurante.<br />

TEXTO DE ALICE-AZANIA JARVIS<br />

© THE INDEPENDENT/THE INTERVIEW PEOPLE<br />

50 Fora de Série Março 2011<br />

Para certos ‘chefs’, há um dia do ano que é<br />

um verdadeiro “Dia D”. As horas que antecedem<br />

a agitação da hora de almoço passam-nas<br />

com a cabeça noutro lado porque<br />

no dia seguinte, ao meio-dia em ponto, são anunciados<br />

os vencedores das estrelas Michelin. No segundo<br />

a seguir, os editores do guia de restaurantes mais famoso<br />

do mundo vão revelar quem, dentre os ‘chefs’<br />

do seu país, será consagrado com uma, duas ou três<br />

das famosas estrelas.<br />

Para os nomeados, estas estrelas têm grande signifi -<br />

cado. Para William Sitwell, editor da revista Waitrose<br />

Kitchen e apresentador do documentário “Michelin<br />

Stars – The Madness of Perfection”, realizado em<br />

2010, “as estrelas são o maior reconhecimento que<br />

um ‘chef’ pode ter, apesar de serem a única coisa que<br />

consegue infundir-lhes um profundo horror”.<br />

As estrelas Michelin não só elevam os ‘chefs’ à nata<br />

da nata, à elite da alta cozinha, como contribuem<br />

para a escalada dos preços nos restaurantes vencedores.<br />

Mas que pensamos nós, comuns mortais e<br />

consumidores médios? Quando o guia é colocado à<br />

venda no dia a seguir ao anúncio dos vencedores, vamos<br />

todos a correr comprá-lo? Ou melhor, será que<br />

vamos “morder o isco”?<br />

Provavelmente, não houve êxito mais retumbante<br />

nos últimos anos na área da restauração que a inauguração<br />

de Polpo e Polpetto no Soho, no centro de<br />

Londres. O ‘staff’ da dupla de restaurantes não aceita<br />

reservas para jantar e, como tal, todos os dias tem de<br />

fazer frente à gigantesca fi la de candidatos a uma das<br />

mesas mais cobiçadas da capital britânica. Se chegar<br />

muito tarde, esqueça, não há esperança possível. Se<br />

chegar a qualquer hora dita “decente”, espera-o uma<br />

bebida ao balcão – isto se não forem várias – até conquistar<br />

um lugar ao sol.<br />

O mais extraordinário é que tudo isto foi fruto do passa-a-palavra.<br />

Nem uma linha foi escrita num guia ou<br />

na imprensa especializada. As críticas só vieram depois,<br />

quando críticos gastronómicos e editoras dedicadas<br />

à boa mesa conseguiram reserva para perceber<br />

o mistério deste duplo sucesso, que não precisou de<br />

comentários nos guias anuais da praxe para andar na<br />

boca de toda a gente.<br />

“O passa-a-palavra fez milagres”, explica Russell Norman,<br />

fundador de Polpo e Polpetto. Norman refere-se<br />

ao “método” tradicional de recomendação, essencialmente<br />

pessoal e vital para a sobrevivência e afi rmação<br />

de muitos restaurantes. Mas não só. Também se<br />

refere ao moderno passa-a-palavra na Internet. “As redes<br />

sociais e, acima de tudo, o Twitter, foram cruciais<br />

para o nosso êxito”, sublinha Norman. Esta foi uma<br />

das formas encontradas para “dar que falar”. A página<br />

do restaurante no Twitter tem vários milhares de<br />

“seguidores” e uma particularidade: convida os utilizadores<br />

e visitantes a deixar comentários sobre a sua<br />

experiência gastronómica.<br />

Quando uma pessoa que merece o nosso respeito e<br />

confi ança ‘twitta’ favoravelmente um restaurante, a<br />

ideia de ir até lá experimentar torna-se muito mais<br />

apelativa. “Pessoalmente, quando janto fora gosto<br />

de ir a um sítio que um amigo me recomende”, diz


Norman. Nem só de Twitter se faz a “cultura das recomendações”.<br />

A Internet está repleta de blogues dedicados ao prazer<br />

da mesa. Esta massa de informação, longe de ser<br />

amorfa, é uma rede que assume crescente importância<br />

nas opções de quem navega na Net. A credibilidade<br />

destes ‘sites’ tem crescido e a sua reputação<br />

está hoje mais consolidada. O ‘site’ britânico<br />

Urbanspoon.com, por exemplo, dedica-se a elaborar<br />

‘rankings’ dos blogues pessoais que existem sobre a<br />

matéria. As vantagens são muitas. Como os bloguistas<br />

têm o hábito de cruzar informação e referências,<br />

basta uns cliques para descobrir os mais credíveis<br />

e respeitados.<br />

Contrariamente aos críticos que escrevem para<br />

guias, jornais e revistas, os bloguistas dedicados à<br />

“boa mesa” colocam nos blogues fotografias dos<br />

restaurantes e pratos que mais apreciam. É uma<br />

questão de olhar para elas e decidir se o que vêem<br />

os inspira. Depois, é só ligar e reservar uma mesa.<br />

“Foi assim que descobri um dos meus restaurantes<br />

preferidos”, diz Niamh Shields, mentora do infl uente<br />

blogue Eatlikeagirl.com. “Houve uma pessoa que<br />

colocou no ‘site’ uma fotografi a do Ledbury e foi assim<br />

que comecei a frequentar o restaurante”. Ironicamente,<br />

o Ledbury, em Nothing Hill, um dos bairros<br />

mais ‘in’ de Londres, tem duas estrelas Michelin,<br />

mas Shields diz que nunca iria lá unicamente por<br />

isso. “É um pormenor, nada mais”.<br />

Além dos blogues dedicados à boa mesa, há outros como<br />

o Viewlondon e o Yelp que funcionam à base dos<br />

comentários dos utilizadores, à semelhança do que<br />

faz o TripAdvisor, onde se pode aprender com os erros<br />

e recomendações alheias. Estes fóruns encorajam os<br />

utilizadores a escolher um restaurante com base na<br />

experiência e nas impressões de terceiros. O veredicto,<br />

ao contrário dos blogues e das recomendações no<br />

Twitter, provém de entidades desconhecidas. “É por<br />

isso que não uso esses ‘sites’. Prefi ro sugestões de pessoas<br />

que conheço”, realça Shields.<br />

Talvez seja por esta razão que a crítica gastronómica<br />

continua a seduzir os mais diversos públicos. As recomendações<br />

destas “quase vedetas” funcionam, na<br />

prática, como a recomendação de um amigo – a única<br />

diferença é que estão por dentro e bem informados.<br />

“Normalmente, as pessoas consultam as críticas<br />

A EXPERIÊNCIA<br />

DE <strong>UM</strong> CRÍTICO É EM<br />

TUDO DIFERENTE<br />

DA QUE AS PESSOAS<br />

PROCURAM QUANDO<br />

VÃO JANTAR FORA. SERÁ<br />

ASSIM QUE QUEREMOS<br />

QUE NOS RECOMENDEM<br />

<strong>UM</strong> RESTAURANTE?<br />

de alguém em quem confi am. No fundo, respeitam a<br />

sua opinião”, refere Sitwell.<br />

Os inspectores do Guia Michelin, pelo contrário, são seres<br />

anónimos. A primeira vez que um deles foi entrevistado,<br />

em 2009, recusou-se a revelar a identidade. Apenas<br />

fi cámos a saber que é mulher e que usa um método de<br />

avaliação deveras peculiar: as refeições não são para desfrutar,<br />

isto é, prova apenas cada um dos pratos sem os<br />

degustar verdadeiramente. E fá-lo sozinha. Companhia,<br />

zero. Em suma, uma experiência em tudo diferente daquela<br />

que a maior parte das pessoas procura quando vai<br />

jantar fora. Sitwell questiona a abordagem – ou o método:<br />

“Será este o tipo de pessoa que queremos que nos<br />

recomende um restaurante? Não me parece”.<br />

Para todos os efeitos, importa dizer que a resposta do<br />

público é cada vez mais um rotundo “não”. A decisão<br />

de lançar um Guia de Tóquio foi muito criticada,<br />

em parte por ter cada vez menos infl uência no país e<br />

continente de origem. A publicação do Michelin dá<br />

sempre que falar, mas a última edição, que no Reino<br />

Unido coincidiu com o nº100, passou algo despercebida<br />

pela primeira vez na sua longa história. “Ninguém<br />

lhe deu particular atenção. Os mexericos que<br />

as pessoas gostam de comentar não vêm no guia. Só<br />

serve para saber se Gordon Ramsey manteve, ou não,<br />

as suas estrelas. Nada de novo. Igualzinho ao ano passado”,<br />

explica Sitwell.<br />

Numa época em que as alternativas estão à mão de<br />

semear, seja nos jornais, nas revistas ou na Internet,<br />

a auto-intitulada “bíblia dos gastrónomos” parece ter<br />

perdido o brilho de outros tempos.<br />

Março 2011 Fora de Série 51


52 Fora de Série Março 2011<br />

<strong>UM</strong>A CARREIRA SEM ESPINHAS<br />

O ‘chef’ catalão que fi cou conhecido por ter atacado Ferran Adrià e os seus pratos experimentais morreu<br />

na cozinha do novo restaurante, em Singapura. A cozinha mundial perdeu um dos seus melhores ingredientes.<br />

Santi não era um santo. Era apaixonado, logo,<br />

nunca poderia ser um santo. Viveu com estrondo<br />

e isso talvez explique o estrondo com<br />

que foi recebida a notícia da sua morte. O ‘chef’<br />

que comprou uma guerra com Ferran Adrià e seus seguidores<br />

por dizer que a cozinha experimental estava a matar<br />

a cozinha de excepção morreu a 16 de Fevereiro. Vítima<br />

de um ataque cardíaco fulminante, mas que se foi<br />

anunciando. Porque Santi foi tudo, mas nunca um santo.<br />

“Tinha o coração muito delicado. Todos nós sabíamos<br />

disso. Era um ‘bon vivant’. Gostava de comer e de beber”,<br />

disse Joana Munné, consultora gastronómica e amiga do<br />

‘chef’, aos jornalistas. Não servirá de consolo a ninguém<br />

que lhe fosse próximo, mas Santi Santamaria morreu como<br />

(arriscamos) qualquer ‘chef’ desejaria morrer. Numa<br />

cozinha, em Singapura, a comemorar a abertura de mais<br />

um restaurante, este chefi ado pela fi lha.<br />

A história deste catalão (que, deve sublinhar-se, morreu<br />

precocemente aos 53 anos) está cheia de sucessos. Foi o<br />

primeiro ‘chef’ espanhol a receber três estrelas Michelin.<br />

Antes, muito antes, Santi desenhou garrafas para a<br />

Coca-Cola. Em 1981, com a mulher, Angels, inaugurou<br />

o restaurante “El Racó de Can Fabes” em Sant Celoni, terra<br />

onde nasceu, na província de Barcelona. Em 1988, este<br />

restaurante, cujo nome passara entretanto a ser<br />

apenas “Can Fabes”, recebe a primeira estrela<br />

Michelin. Seis anos depois, é o primeiro restaurante<br />

em Espanha a ter três estrelas Michelin.<br />

Homenagem<br />

TEXTO DE ANGELA MARQUES<br />

Santi Santamaria foi o<br />

primeiro ‘chef’ espanhol a<br />

receber estrelas Michelin.<br />

Em Singapura, estava a<br />

lançar o novo restaurante.<br />

Ali, onde a refeição chega facilmente aos 230 euros (e<br />

sem as bebidas), havia sempre lugares. E isso era, para<br />

Santi, uma das razões para que se considerasse melhor<br />

que os concorrentes, como Adrià (que dirige o El<br />

Bulli, também premiado com três estrelas Michelin).<br />

A outra: Santi era um crítico da ‘nouvelle cuisine’. Em<br />

2008, no congresso de gastronomia Madrid Fúsion, foi<br />

mais cirúrgico que uma faca de cozinha a cortar salsa.<br />

Disse, a respeito da cozinha experimental (que recorre<br />

a aditivos): “Se se trata de ter experiências imaginárias,<br />

para isso já existem as drogas.” Claro que o amigo Ferran<br />

Adrià se transformou em ex-amigo. Mas até 16 de<br />

Fevereiro tudo continuou a correr bem para o catalão.<br />

No dia em que morreu estava a mostrar o restaurante<br />

da fi lha a jornalistas. “Tínhamos estado a comer pan<br />

tumaca [uma receita catalã de pão e tomate]. Quando<br />

saímos ele disse-me que estava a ter uma quebra de<br />

tensão e perdeu os sentidos”, contou o crítico da Agência<br />

EFE, Cristino Álvarez.<br />

Em poucas horas começaram a surgir elogios de dezenas<br />

de ‘chefs’. Até Ferran Adrià pediu um minuto de<br />

silêncio na abertura do Fórum Gastronómico de Girona.<br />

Mas silêncio foi tudo o que Santamaria não fez<br />

nos últimos anos. Era conhecido por estar sempre bem<br />

disposto. E por não ter papas na língua. Por<br />

criticar sem medo. Por não gostar de lumes<br />

brandos. Fez sempre muito barulho. Afi nal<br />

era tudo menos santo.<br />

FOTOGRAFIA DE JOAN PUJOL-CREUS


A NICARÁGUA É A SEGUNDA CUBA<br />

Com 600 dólares, Dom José Orlando Padrón fundou em Miami um negócio<br />

de charutos. Mas o renome e os prémios, esses, conquistou-os na Nicarágua.<br />

Afamília Padrón é originária de Cuba. Desde<br />

os primórdios do século XIX, e através<br />

de várias gerações, sempre se dedicou ao<br />

cultivo de plantas de tabaco de primeira<br />

qualidade que eram vendidas para as fábricas, então<br />

ainda privadas, de Cuba. Dom José Orlando Padrón<br />

é, hoje, com 84 anos, o patriarca da família, estando<br />

estabelecido em Little Havana, agora nos escritórios<br />

de traça colonial, que ocupam um quarteirão.<br />

Chegado a Miami no início dos anos sessenta, trabalhou<br />

durante mais de três anos como carpinteiro<br />

e jardineiro. Quando consegue juntar a quantia de<br />

600 dólares (pouco mais de 435 euros), começa a<br />

actividade como enrolador, em Setembro de 1964.<br />

Vendia os charutos na rua, que eram muito apreciados<br />

pela comunidade cubana e reconhecidos cada<br />

vez mais pelos americanos. Três anos mais tarde, foi<br />

conhecer os solos da Nicarágua e, de imediato, se<br />

deu conta que as plantas aí produzidas eram as mais<br />

MONTECRISTO<br />

PURITOS<br />

Com 106 milímetros de altura e<br />

pouco mais de um centímetro de<br />

diâmetro, a Montecristo lançou<br />

esta embalagem redonda de<br />

alumínio com as cores da marca.<br />

Vende-se em embalagens de sete<br />

unidades.<br />

PREÇO: 9,70 EUROS.<br />

charme no fumo<br />

CHARUTOS CHARU CHARUTOS TOS . ISQUE ISQUEIROS SQUEIROS SQUE ROS . C CCINZEIROS I N Z E EI R O S . ESTOJ E EESTOJOS STOJ JOS OS . H<strong>UM</strong>ID H<strong>UM</strong> H<strong>UM</strong>IDIFICADORES M DIF D FICADO F CA CADORES DORES S . TE TESOURAS ESOURAS SOOURAS . L LLIVRO LIVROS VROS VROSS<br />

. CCIGARR CCIGARRILHAS GARR LHA LHAS HAS<br />

CORTADOR COLIBRI<br />

SLYCE KNF000702<br />

A Colibri lançou Slyce. Um<br />

cortador, com ‘ring’ 64, que junta<br />

o requinte e a fácil utilização.<br />

Basta premir lateralmente para<br />

ter um corte perfeito. Em aço<br />

inoxidável e cor azul.<br />

PREÇO: 38 EUROS.<br />

TEXTO DE PEDRO CUNHA MARTINS<br />

parecidas com as que tinha trabalhado em Cuba.<br />

Decide rumar àquele país e fundar aí a primeira fábrica<br />

de charutos propriedade de um cubano.<br />

Hoje, passados mais de quarenta anos desta decisão<br />

estratégica, os charutos Padrón foram já galardoados<br />

com inúmeros prémios, inclusive o de<br />

melhor charuto do ano com o Padrón 45 Family<br />

Reserve.<br />

Dom Orlando nunca quis uma produção massiva.<br />

Os seus charutos, como dizia, “dependendo daquilo<br />

que nos dá a terra”, nunca tiveram uma produção<br />

superior a seis milhões de unidades. Atravessou a<br />

revolução sandinista – onde lhe queimaram a fábrica<br />

– e levou os seus trabalhadores algumas dezenas<br />

de quilómetros adiante, para as Honduras, onde<br />

permaneceu alguns anos. Como símbolo da “luta”,<br />

não esquece de mostrar o martelo emoldurado e<br />

símbolo da marca que representa os anos que lutou<br />

como carpinteiro até vingar como produtor.<br />

CINZEIRO COHIBA<br />

MADURO 5<br />

Manufacturado em porcelana,<br />

com as cores da Cohiba, este<br />

cinzeiro é uma homenagem à<br />

linha Maduro 5, conhecida pelas<br />

três vitolas de excelência: Genios;<br />

Magicos e Secretos, inscritos nos<br />

separadores das quatro bases de<br />

apoio. Tem 24 cm de diâmetro.<br />

PREÇO: 80 EUROS.<br />

DISNEY COM CHARUTOS<br />

Os Estados Unidos são, desde há vários anos,<br />

o maior consumidor mundial de charutos<br />

manufacturados ‘per capita’, com um índice de<br />

vendas que ultrapassa os trezentos milhões de<br />

charutos anuais. Talvez por isso, a sensibilidade<br />

comercial da Disney não tivesse fi cado alheia a<br />

este segmento e abriu o novo “Cigar Lounge”,<br />

em parceria com a família Sosa – um clã com<br />

larga tradição no mercado de charutos através<br />

da marca com o seu nome “Sosa” – produzida<br />

na fábrica dominicana Arturo Fuente.<br />

A Cigarz está estrategicamente colocada na<br />

rua mais movimentada do parque temático, a<br />

Universal Studios Boulevard e junta, assim, no<br />

Walt Disney World Resort, na Florida, às suas<br />

lojas do Mickey Mouse, do Pateta, da Lego ou da<br />

Virgin, este espaço integralmente dedicado aos<br />

charutos com um Cigar Bar e ‘walk-in humidor’,<br />

apresentando mais de trezentas vitolas entre os<br />

quais os famosos Opus XXX, da Arturo Fuente.<br />

LA FLORIDITA<br />

Anote a morada deste espaço multifacetado<br />

em Londres, no Soho: Floridita.<br />

Este restaurante e ‘cigar lounge’ recria o mítico<br />

local de visita diária do escritor Ernest Hemingway,<br />

em La Havana, fundado na década de 1900.<br />

A decoração, a música, as bebidas e os pratos<br />

servidos neste local londrino foram elaborados<br />

para recordar e reviver a paixão de Cuba, e<br />

especialmente o primitivo restaurante, ainda em<br />

funcionamento, famoso pelos ‘cockails’, que lhe<br />

deram o sobrenome de “Capital do Daiquiri”.<br />

La Floridita<br />

Morada: 100 Wardour St., Londres.<br />

Telefone: +44 20 7314 4000<br />

Março 2011 Fora de Série 53


54 Fora de Série Março 2011<br />

Evasão<br />

STELLENBOSCH,<br />

MUITO MAIS<br />

DO QUE VINHAS<br />

As fi leiras de vinha estendem-se<br />

até ao horizonte, fazendo da mais antiga cidade<br />

da África do Sul um dos principais centros<br />

vinhateiros do país. Mas o vinho não é tudo.<br />

Stellenbosch esconde pequenos tesouros<br />

nas ruas preservadas, onde o tempo parece<br />

ter parado.<br />

TEXTO DE MÓNICA SILVARES, EM STELLENBOSCH


N<br />

as encostas de ligeira inclinação, ou nas planícies,<br />

as fi leiras de videiras dão uma geometria à paisagem<br />

a perder de vista. Sob o sol abrasador, os cachos<br />

ganham corpo à espera da vindima e dos meses de<br />

descanso em cascos de madeira. O néctar vai-se<br />

formando lentamente com o desenrolar dos dias<br />

na maior região vinhateira da África do Sul. Com<br />

o mesmo vagar, será depois saboreado pelos apreciadores<br />

em bonitas esplanadas arrelvadas, com as<br />

vinhas como cenário, onde as crianças aproveitam<br />

as tardes em brincadeiras e os pais desfrutam dos<br />

prazeres da vida.<br />

Stellenbosch é assim. Um pequeno canto do globo,<br />

onde Deus parece ter dado mais atenção aos pormenores.<br />

Com condições climatéricas ideais para<br />

a produção de vinhos, esta pequena região, mesmo<br />

ao lado da cosmopolita Cidade do Cabo, consegue<br />

produzir quase todos os tipos de vinhos, desde os<br />

Portos, os Sherries, o Champanhe ou o Brandy, passando<br />

por uma panóplia de vinhos de mesa brancos<br />

ou tintos que, em muitos casos, nada fi cam a dever<br />

aos concorrentes franceses, portugueses, chilenos<br />

ou californianos.<br />

Mas Stellenbosch não se resume aos vinhos, embora,<br />

segundo o “New York Times”, seja uma das rotas<br />

vinhateiras mais visitadas em todo o mundo. A pequena<br />

cidade pitoresca pulula de vida com a universidade,<br />

que lhe garante uma quase juventude eterna,<br />

e é fi el guardiã da sua história e das suas raízes.<br />

A vontade de preservar é tão grande que existem<br />

diversos clubes de carros antigos que alugam as suas<br />

máquinas. Numa autêntica viagem no tempo, é<br />

possível percorrer as estradas solarengas, ladeadas<br />

de vinhas até ao horizonte, num belo jaguar, que é<br />

disponibilizado, por exemplo, pelo Classic-Cats, que<br />

se especializou em Jaguares montados na África do<br />

Sul. Os carros luzidios, sempre estacionados na praça<br />

principal, dão um ar ainda mais ‘vintage’ à cidade.<br />

Mas a melhor forma de conhecer esta encantadora<br />

pequena cidade é estacionar junto ao posto de turismo<br />

e solicitar um guia – Sandra Krige, por exemplo,<br />

faz visitas guiadas à cidade cheias de humor e<br />

conhecimento –, ou simplesmente um mapa, onde<br />

surgem os pontos mais emblemáticos. Antes de começar,<br />

um aviso: nesta cidade os nomes das ruas estão<br />

inscritos nos lambris dos passeios, muitas vezes<br />

ocultos pelos carros estacionados.<br />

Março 2011 Fora de Série 55


Evasão<br />

Os exemplares de arquitectura holandesa estão espalhados<br />

por todo o lado, construções desenvolvidas<br />

de acordo com letras (L, H) que vão evoluindo<br />

de acordo com as necessidades da família crescente.<br />

Já não são tantas como os moradores gostariam,<br />

mas são ainda muitas tendo em conta que a cidade<br />

foi abalada por um violento terramoto em 1809 e<br />

devastada por três grandes fogos em 1710, 1803 e<br />

1878, que acabaram por moldar a sua morfologia.<br />

Outra das interessantes características desta cidade<br />

centenária é o sistema de irrigação (Leiwater) que<br />

ainda funciona na perfeição e é gerido de forma comunal.<br />

A água que corre nas valas, usada para regar<br />

os jardins, é exactamente a mesma que abastece as<br />

torneiras, agora de uma forma mais moderna. Além<br />

do aspecto prático, a límpida água corrente ajuda a refrescar<br />

as ruas, ainda que a sombra dos carvalhos seja<br />

também uma bênção nos quentes meses de Verão.<br />

O orgulho nestes carvalhos é grande. Na Dorp Street,<br />

talvez a mais longa da cidade já que, no total, se estende<br />

por mais de 500 quilómetros, para lá da “fronteira”<br />

da cidade, o tronco destas árvores foi tapado<br />

com cobertores vermelhos para dar as boas vindas<br />

aos visitantes. O efeito visual é inesquecível.<br />

O facto de Stellenbosch ser tão próxima da Cidade<br />

do Cabo é, simultaneamente, uma bênção e uma<br />

maldição. Os turistas têm maior apetência em vi-<br />

56 Fora de Série Março 2011<br />

Relaxar é a palavra de ordem. Com a paisagem deslumbrante das<br />

vinhas e um sol convidativo, todas as quintas vinhateiras oferecem<br />

espaços para os visitantes desfrutarem o que de melhor a região tem.<br />

Após um passeio pela cidade, onde o nome das ruas está inscrito no<br />

lambril dos passeios, guiado pelo antigo sistema de águas (que ainda<br />

hoje funciona), não há nada como alugar um belo automóvel antigo<br />

no centro e ir, estrada fora, à descoberta das adegas nos arredores.<br />

NA DORP STREET,<br />

O TRONCO DOS<br />

CARVALHOS FOI<br />

TAPADO COM<br />

COBERTORES<br />

VERMELHOS<br />

PA R A DA R AS<br />

BOAS VINDAS <strong>AO</strong>S<br />

VISITANTES. O<br />

EFEITO VISUAL É<br />

INESQUECÍVEL.<br />

<strong>UM</strong>A TARDE DIFERENTE<br />

Para um almoço diferente, a poucos<br />

quilómetros de distância – até pode<br />

apanhar um comboio e desfrutar das<br />

magníficas paisagens vinhateiras –,<br />

mesmo em frente à estação de Spier, fica<br />

no Parque de Moyo. É turístico, ponto<br />

assente. Mas o lago de margens relvadas<br />

é muito atractivo para um piquenique.<br />

A cesta é comprada nas próprias<br />

instalações do parque, assim como as<br />

estruturas construídas em árvores, ou as<br />

tendas onde se pode almoçar, em estilo<br />

‘buffet’, e que permite apreciar múltiplas<br />

variedades culinárias do país. E, claro,<br />

como não poderia deixar de ser, diversos<br />

tipos de vinhos. Ao longo da tarde e da<br />

refeição vão sendo apresentados vários<br />

espectáculos culturais. Além disso, o<br />

parque tem um importante programa<br />

de recuperação de chitas que são<br />

posteriormente libertadas.<br />

sitar as caves desta zona, mas são poucos os que fi -<br />

cam na cidade durante alguns dias. E se mais razões<br />

fossem necessárias, pode fi car no mais velho hotel<br />

da África do Sul: o Ouwe Wer Hotel, erguido em<br />

1802, que vale por si só uma visita, mesmo que não<br />

se possa fi car aí hospedado. Com tempo, pode-se almoçar,<br />

beber um café ou um copo de vinho num<br />

dos pátios, ou junto à piscina.<br />

Relaxar é quase obrigatório. Com ruas vedadas ao<br />

trânsito é possível ir satisfazendo o gosto pelas<br />

compras – o artesanato local é de perder a cabeça<br />

– ou, simplesmente, respirar o ar de clima mediterrânico<br />

do outro lado do hemisfério. Este clima explica<br />

a existência de umas borboletas únicas que<br />

dão origem a uma seda mais escura, mas mais rara.<br />

Cada casulo produz apenas um grama de seda.<br />

Outra “produção” local é o artista Dylan Lewis. Numa<br />

das muitas galerias de arte da cidade é possível<br />

ver os seus trabalhos mais recentes onde mistura a<br />

componente animal e humana. Este jovem artista<br />

sul-africano já teve o mérito de apresentar uma exposição<br />

a solo na Christie’s de Londres.<br />

A visita não fi caria completa sem uma passagem<br />

pelo Museu da Cidade, pela casa mais antiga, pelo<br />

Palácio da Justiça, pelo bonito rio ou ainda pelo<br />

Campus universitário, uma espécie de versão sul-<br />

-africana da Ivy League.<br />

NA ABERTURA, FOTOGRAFIA DE MARK VAN AARDT/GETTY IMAGES. NESTA PÁGINA FOTOGRAFIAS DE PAULO GUERRINHA


evasao.com<br />

VOOS . DESTINOS . HOTÉIS . COMPRAS . VIAGENS . SPAS . NOVIDADES . LOJAS . TUDO ONLINE<br />

www.heritage.pt/pt/hotel_britania.html<br />

CHARME PORTUGUÊS<br />

PREMIADO<br />

O charme e o estilo ‘Art Deco’ do Hotel<br />

Britania conquistaram os internautas<br />

e aqueles que dão opiniões no ‘site’<br />

TripAdvisor. Tanto, que o hotel no<br />

centro de Lisboa, junto à Avenida da<br />

Liberdade, foi distinguido como o<br />

10º melhor hotel do mundo, no top<br />

25, e o 6º no top 25 na Europa, nos<br />

TripAdvisor Travellers’ Choice Awards<br />

2011. O Hotel Britania é um projecto<br />

do arquitecto Cassiano Branco que<br />

recuperou todo o edifício sem lhe<br />

retirar os traços e o ambiente dos anos<br />

40. Este é já o nono ano consecutivo<br />

que o ‘site’ atribui este prémio graças<br />

à forte participação dos viajantes que<br />

fazem questão de fazer uma avaliação<br />

dos hotéis por onde passam.<br />

.<br />

www.zilianchoose.com/<br />

marca/zilian-app<br />

JÁ SABE O QUE VAI<br />

CALÇAR AMANHÃ…?<br />

Se não sabe, a Zilian ajuda com a<br />

nova ferramenta que acaba de lançar.<br />

“Your Day is Zilian” é uma aplicação<br />

que inclui um ‘weather advisor’ que<br />

aconselha o par de sapatos ideal para<br />

o dia seguinte consoante as previsões<br />

meteorológicas e com imagens de<br />

modelos da marca disponíveis nas<br />

lojas e no ‘site’. A mesma aplicação<br />

funciona como ‘screensaver’, integra<br />

as novidades da marca, os vídeos e<br />

imagens do universo Zilian. Na Zilian<br />

App, é ainda possível aceder a outras<br />

plataformas, como Facebook, Twitter<br />

ou Flickr.<br />

.<br />

www.armanihotels.com<br />

PRÓXIMA PARAGEM: RÚSSIA<br />

Giorgio Armani continua a incursão<br />

pela hotelaria. O próximo projecto,<br />

anunciou, será um hotel de cinco<br />

estrelas na região russa do Cáucaso.<br />

O local exacto ainda não foi escolhido<br />

mas deverá ser em Kislovodsk,<br />

Yessentuki ou Pyatigorsk, num<br />

investimento que deverá rondar os<br />

110 milhões de euros. A cordilheira<br />

do Cáucaso é famosa pelas suas<br />

nascentes de água mineral, no entanto,<br />

a região ainda tem poucas infra-<br />

-estruturas, o que leva ao afastamento<br />

dos turistas. O Armani Hotels & Resorts<br />

pretende preencher esse vazio.<br />

VAN GOGH EM ‘GIGAPIXEL’<br />

Art Project é o mais recente projecto lançado<br />

pela Google, para ver obras de arte<br />

num passeio virtual.<br />

São mais de mil obras, de mais de<br />

400 artistas, que estão expostas em<br />

17 museus e galerias, espalhadas por<br />

onze cidades de nove países. São estes<br />

os números que retratam o novo<br />

projecto da Google. O Art Project,<br />

lançado o mês passado, permite passear<br />

virtualmente pelos corredores<br />

dos museus, num sistema parecido<br />

com o do Street View, que através de<br />

um clique torna possível expandir as<br />

obras de arte e vê-las detalhadamente<br />

com toda a informação. Tão detalhadamente<br />

quanto permite uma super<br />

resolução de sete biliões de píxeis,<br />

onde até é possível ver as pinceladas<br />

de Van Gogh na obra “A Noite Estrelada”,<br />

ou de Rembrandt no “Regresso<br />

do Filho Pródigo”, duas das 17 obras<br />

digitalizadas com gigapixel.<br />

Um pequeno ‘trolley’ com uma câmara<br />

registou imagens a 360º das<br />

salas e das obras de arte expostas no<br />

Museu Rainha Sofi a, em Madrid; no<br />

MoMa, em Nova Iorque; no Museu<br />

Van Gogh, em Amesterdão; na Tate<br />

Britain e na National Gallery, em<br />

Londres; no The State Hermitage,<br />

em São Petersburgo; na galeria Uffi -<br />

zi, em Florença; no Palácio de Versailles,<br />

em França; no Museu Kampa,<br />

em Praga; entre outros. Nesta extensa<br />

lista sente-se a falta de nomes<br />

como o Louvre, em Paris, ou o Museu<br />

do Prado, em Madrid, no entanto,<br />

Amid Sood, director e mentor do<br />

projecto, garantiu que o Art Project<br />

terá, no futuro, mais participantes.<br />

No dia da apresentação, realizada em<br />

Londres, na Tate Britain, Sood aproveitou<br />

para contar como surgiu a<br />

ideia: “Começou quando um grupo<br />

de funcionários da Google, apaixonado<br />

por arte, se juntou para pensar<br />

como poderia usar a tecnologia para<br />

ajudar os museus a tornarem as obras<br />

de arte mais acessíveis”.<br />

Mais informações em www.googleartproject.com<br />

Nicholas Serota, director da Tate Britain, onde, em Fevereiro, foi apresentado o Art Project.<br />

www.landrover.com<br />

IPAD INCLUÍDO<br />

Vai valer a pena viajar nos bancos de<br />

trás do Range Rover Autobiography<br />

Ultimate Edition, uma edição limitada<br />

do modelo mais luxuoso da marca<br />

britânica. Esta, aliás, garante que este<br />

jipe é o primeiro automóvel a incluir um<br />

iPad nos extras. O iPad está acoplado<br />

na parte de trás dos bancos da frente,<br />

o que permite a quem viajar atrás ver<br />

fi lmes, ouvir música ou navegar na<br />

Internet. O iPad pode ainda ser retirado<br />

do banco e ser utilizado de qualquer<br />

outra maneira. Uma inovação que só<br />

foi possível com a parceria<br />

.<br />

que a Range<br />

Rover fez com a Apple e que só foi<br />

extensível a 500 veículos.<br />

www.modaoperandi.com<br />

DA ‘PASSERELLE’<br />

PARA O ‘CLOSET’<br />

Moda Operandi é a solução pela qual<br />

muitos esperavam, para deixarem<br />

de desesperar. A ideia surgiu depois<br />

de Aslaug Magnusdottir, fundadora<br />

do ‘site’ de moda Gilt Group, ter<br />

ouvido várias queixas de estilistas<br />

que reclamavam que as suas criações<br />

mais exclusivas nunca passavam<br />

das ‘passerelles’ para os ‘closets’<br />

das clientes, já que as lojas nunca as<br />

encomendavam. Magnusdottir juntou-<br />

-se a Lauren Santo Domingo, ex-editora<br />

da Vogue americana, para acabar com<br />

este problema e criaram o ‘site’ Moda<br />

Operandi, que disponibiliza as peças<br />

exclusivas 48 horas depois de estas<br />

terem desfi lado nas ‘passerelles’ de<br />

Nova Iorque, Londres, Milão e Paris.<br />

.<br />

www.onebag.com<br />

VIAJANTE FELIZ...<br />

… É aquele que viaja sem muito<br />

peso. Vá para onde for, o ideal é<br />

conseguir optimizar a mala sem, no<br />

entanto, deixar o imprescindível em<br />

casa. É exactamente para o ajudar<br />

nesta missão que o ‘site’ One Bag foi<br />

criado. Um espaço todo ele dedicado<br />

a dicas para viajar sem ir carregado,<br />

mesmo que a viagem seja por tempo<br />

indeterminado. Como escolher a<br />

mala de viagem certa, como se faz<br />

uma lista detalhada do que se precisa<br />

de levar ou como arrumar a roupa<br />

sem que ela chegue ao destino toda<br />

amarrotada, são alguns dos “segredos”<br />

desvendados nesta página ‘online’.<br />

.<br />

TEXTO DE ANA FILIPA AMARO<br />

Março 2011 Fora de Série 57


58 Fora de Série Março 2011<br />

Nua és tão simples como uma de tuas mãos. O<br />

primeiro verso do primeiro poema que<br />

lhe ofereceu. Lembrava como se fosse<br />

ontem, ainda há pouco, agora mesmo,<br />

como se o verso fosse seu. Não era. E não<br />

era que temesse arriscar a escrita. Mas<br />

também não enjeitava viver a crédito das<br />

palavras dos outros e foi naquele verso<br />

que domesticou o sobressalto de a ver pela primeira vez assim,<br />

nua, o corpo inteiro que tantas noites calculara, corolário das mãos<br />

que o prendiam desde o primeiro dia. Porque a equação começou<br />

nas mãos, constante entre todas as incógnitas que a vida a dois foi<br />

deduzindo. Sempre as mãos. Depois a voz, os olhos, as formas, o<br />

sorriso, as palavras, o toque e a pele, os dias e as noites. Mas sempre<br />

as mãos. Lisas, certas, delicadas, terrenas, simples, sempre nuas. Nua<br />

és tão simples como uma de tuas mãos. Do poema do Neruda não lhe<br />

sobrava outro verso na memória de tudo isto que lembrava como<br />

se fosse ontem, ainda há pouco, agora mesmo.<br />

- Parece-me bem. Só não percebo porque escreves na terceira pessoa. É<br />

para te esconderes?<br />

Respondi que não, que saíra assim, sem pensar muito no assunto,<br />

que era um exercício como outro qualquer, talvez para me pôr fora<br />

da história e contá-la melhor, levá-la aonde me desse na real gana,<br />

sabia lá eu. E tudo aquilo era apenas vagamente verdade. Palavras<br />

confi ccionais, expliquei--lhe. Qualquer coisa a meio caminho<br />

entre a confi ssão de uma memória e a fi cção de uma estória.<br />

Ela encolheu os ombros como quem fi zesse pouco das<br />

minhas fronteiras.<br />

- A fi cção é a verdade dentro da mentira. Esta frase<br />

também não é minha, mas não recordo de quem é.<br />

Pouco importa, sou como tu, não vejo problema de usarme<br />

das palavras dos outros. Mas vá, continua.<br />

Continuei.<br />

Do poema do Neruda não me sobrava outro verso na<br />

memória de tudo isto que lembrava como se fosse ontem,<br />

ainda há pouco, agora mesmo. Lembrava como<br />

ela corou na longa pausa em que a olhei inteira antes<br />

de inaugurar o toque. Não me olhes assim. A vergonha<br />

de se ver despir depois de já estar nua. E lembrava<br />

agora como o elogio da nudez nos tatuou em cores<br />

diferentes ao longo de toda essa vida a dois em que<br />

as incógnitas se foram deduzindo. O elogio que<br />

ela nunca percebeu ou eu nunca soube explicar.<br />

Não sei. Sei que mais tarde haveria de me cobrar o<br />

poema que não escrevi. Nua: foi sempre assim que me<br />

viste, cama e pouco mais. Talvez ela recordasse todos<br />

os outros versos do poema que eu esqueci. Nua és,<br />

nua és, nua és, todas as coisas que o poeta descobriu<br />

na nudez. E eu a querer dizer apenas que as mãos<br />

me agarraram os olhos muito antes dessa primeira<br />

vez em que se demoraram a desabotoar o corpo para<br />

mim. Lisas, certas, delicadas, terrenas, simples, sempre<br />

nuas. Agora lamentava não lhe ter oferecido apenas<br />

o verso que não esqueci. Nua és tão simples como uma<br />

de tuas mãos.<br />

- Pensando bem, tens razão. Quando falas na primeira<br />

pessoa deixas-me demasiado agarrada à<br />

tua imagem. Prefi ro que fales dele e não ti. A ele<br />

Opinião<br />

Isto é como tudo . João Pedro Oliveira<br />

AS MÃOS<br />

sempre o posso construir livremente na minha cabeça. Às tantas ainda<br />

me apaixono, quem sabe. A ti já não te posso nem ver à frente, nem quero<br />

imaginar nu.<br />

Depois riu e pediu que continuasse. Continuei.<br />

Nua és tão simples como uma de tuas mãos. Repetia a frase para se confortar.<br />

Talvez ela assim se devolvesse numa imagem por inteiro, talvez<br />

aquele és fosse presente de aconchego para o pretérito imperfeito da<br />

ausência, de quando eles eram o que deixaram de ser depois de todas<br />

as incógnitas que a vida a dois foi deduzindo. Ou talvez nada disso,<br />

só melancolia dorida. Não era importante. Por ele, nem precisava que<br />

deixasse de doer. Apenas que doesse no sítio certo. E o último lugar<br />

onde ele queria que doesse era a cama.<br />

- Quero só avisar que já vais a dois terços da página e ainda não percebi como<br />

é que vais fazer disto um texto sobre moda. Era essa a ideia, não era?<br />

Não era, na verdade. Apenas me tinha comprometido a aproximar-me de<br />

algum modo de uma ideia de moda. Era o tema daquela edição. Não era<br />

que fosse perorar sobre o assunto, logo eu. Mas tivesse ela sido um<br />

pouco paciente e percebia que estava precisamente a chegar lá.<br />

- Peço desculpa, continua.<br />

Continuei.<br />

O último lugar onde ele queria que doesse era a cama. Seria<br />

como negar a sinopse que ele fez daquela história e confi rmar<br />

a autópsia com que ela enterrou toda a memória. Nua:<br />

foi sempre assim que me viste, cama e pouco mais. Onde lhe doía<br />

mesmo era no quarto ao lado, o que ela chamava de vestir,<br />

uma sala ampla com dois guarda--fatos e um espelho com<br />

tamanho de gente. Era ali que a espreitava todas as manhãs, a<br />

vê-la ver-se de frente, às vezes clandestino, outras denunciando<br />

a presença para que se repetisse a delícia da vergonha. Não me<br />

olhes assim. Depois ela corava, consentia uns instantes e acabava<br />

a enxotá-lo aos beijos porta fora. Deixa-me despachar, não me<br />

olhes assim. Sublime intimidade. Vê-la vestir. A roupa poderia<br />

sempre cair por qualquer um a qualquer momento por qualquer<br />

impulso. Vê-la nua era apenas vê-la. Vê-la vestir era compreendêla,<br />

seguir as mãos simples naquele ritual sem tempo, peça por<br />

peça a construir-se para o mundo. Nada mais sincero que aquela<br />

vaidade. E a vaidade fazia-se feminino do orgulho.<br />

- E a moda? Resta-te meia dúzia de linhas… pronto, vá, não é preciso<br />

essa cara, eu calo-me. Continua.<br />

Continuei.<br />

A vaidade fazia-se feminino do orgulho. Porque para ele a moda<br />

do mundo ditava-se ali e os bastidores eram todos seus. Naquele<br />

quarto de alquimia onde tudo se construía a preceito, peça por<br />

peça, gesto por gesto, toque por toque, da roupa mais íntima à<br />

pintura mais descarada, entre adereços de uma exuberância<br />

castelhana e pormenores de uma descrição conventual, era<br />

ali que ela se construía para o mundo, tal como ele a viu<br />

nessa primeira vez em que as mãos despidas lhe agarraram<br />

os olhos. Moda era o que ela trazia, fora de moda era o que<br />

o resto do mundo trazia lá fora. Moda era ela, o centro estatístico<br />

da maioria das observações. A moda que começava<br />

e acabava nas suas mãos. Sempre as mãos. Depois a voz, os<br />

olhos, as formas, o sorriso, as palavras, o toque e a pele, os<br />

dias e as noites. Mas sempre as mãos. Carpo, metacarpo<br />

e dedos, duas vezes vinte e sete ossos com que tudo se<br />

fez e desfez.<br />

FOTOGRAFIA DE IMAGE SOURCE/GETTY IMAGES


Uma Marca da Daimler<br />

A economia é automática.<br />

E 250 CDI com nova caixa 7G-TRONIC.<br />

Mais rapidez. Menos CO2. Menos preço.<br />

A tecnologia presente na nova caixa automática 7G-TRONIC, disponível no Classe E 250 CDI, é responsável<br />

por maior rapidez, redução do consumo e emissões de CO₂ e consequente redução de preço. Se a tudo isto<br />

juntar a sensação que terá ao volante, a sua decisão será automática. www.mercedes-benz.pt/classe-e<br />

Consumo (combinado l/100Km): 5,5. Emissões de CO2 (g/Km): 143

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