07.05.2013 Views

Revista da Abordagem Gestáltica - ITGT

Revista da Abordagem Gestáltica - ITGT

Revista da Abordagem Gestáltica - ITGT

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

A Linguagem Poética e a Clínica Fenomenológica Existencial: Aproximação a Partir de Gaston Bachelard<br />

223<br />

Como psicoterapeutas queremos, no fundo, libertar<br />

nossos pacientes para si mesmos (...). Por isso, com<br />

a libertação psicoterápica, queremos levar nossos<br />

pacientes ‘apenas’ a aceitar suas possibili<strong>da</strong>des de<br />

vi<strong>da</strong> como próprias e a dispor delas livremente e com<br />

responsabili<strong>da</strong>de. Isto quer dizer também, que nós<br />

queremos que eles criem coragem de levar a termo<br />

suas possibili<strong>da</strong>des de relacionamento co-humanos<br />

e sociais de acordo com sua consciência intrínseca<br />

e não como uma pseudo-consciência imposta por<br />

qualquer um (Boss, 1972/1981, p. 61).<br />

A imaginação poética pode contribuir para a prática<br />

psicológica por oferecer imagens de rico significado humano<br />

para o psicólogo, e por deixá-lo mais sensível para<br />

compreender e legitimar os devaneios de seus pacientes.<br />

Estes, embora não escrevam sobre seus devaneios tornando-os<br />

poemas escritos, devaneiam, por exemplo, ao lembrar<br />

de sua infância e revivê-la, ou mesmo ao se entregarem<br />

a um momento contemplativo ou terem um insight.<br />

No plano de contribuições para pensar uma clínica<br />

numa perspectiva fenomenológica existencial, as imagens<br />

poéticas podem ampliar as possibili<strong>da</strong>des compreensivas<br />

do discurso do cliente. A poética é a linguagem<br />

que mais possibilita e amplia a capaci<strong>da</strong>de de compreensão,<br />

e por isso, é uma mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de de linguagem possível<br />

na clínica fenomenológica existencial. Boss (1972/1981)<br />

defende que as contribuições ver<strong>da</strong>deiramente importantes<br />

<strong>da</strong> abor<strong>da</strong>gem existencial para a prática clínica<br />

fun<strong>da</strong>mentam-se na compreensão mais aprofun<strong>da</strong><strong>da</strong> <strong>da</strong><br />

existência humana e não em técnicas psicoterápicas.<br />

As imagens poéticas, por serem do âmbito <strong>da</strong> compreensão,<br />

diferentemente dos conceitos que são do âmbito <strong>da</strong><br />

explicação, podem ser referências importantes para um<br />

terapeuta existencial.<br />

O gesto humano de se comunicar, de buscar significados<br />

de criar e alimentar seu mundo está plenamente<br />

contemplado pela leitura de uma imagem poética. Este<br />

modo de se relacionar com a linguagem – a imaginação<br />

poética – nos volta para o sentido fun<strong>da</strong>mental <strong>da</strong> linguagem,<br />

que é criar e significar o mundo, estabelecendo<br />

uma relação viva consigo e com os outros. É prestando a<br />

esta finali<strong>da</strong>de que a linguagem deixa de ser objeto revelar-se<br />

como um modo de estar no mundo com os outros.<br />

Um estudo sobre a imagem poética nos provoca, no<br />

entanto, uma sensação de insegurança que atribuímos<br />

ao seu caráter de não encerrar questões em conceitos,<br />

não permitindo, por exemplo, o estabelecimento de saberes<br />

fun<strong>da</strong>mentais. Mas são os saberes infinitos sobre<br />

o ser humano e sua condição que são ditos pela imagem<br />

poética. É preciso aceitar a inesgotável possibili<strong>da</strong>de de<br />

saberes como condição humana de inconclusivi<strong>da</strong>de.<br />

O tipo de estudo que a imagem poética exige, apresenta<br />

contribuições para pensar uma clínica fenomenológica<br />

existencial que não se apoia em conceitos estabelecidos<br />

ou em categorias.<br />

* Agradecemos ao Fundo de Amparo à Ciência e à Tecnologia do Estado<br />

de Pernambuco (FACEPE) pela concessão de bolsa de Doutorado<br />

que nos permitiu a realização do presente artigo.<br />

Referências<br />

Bachelard, G. (1996). A Poética do Devaneio. São Paulo: Martins<br />

Fontes (Original publicado em 1960).<br />

Bachelard, G. (2000). A Poética do Espaço. São Paulo: Martins<br />

Fontes (Original publicado em 1957).<br />

Bachelard, G. (2001). A Terra e os Devaneios <strong>da</strong> Vontade. São<br />

Paulo: Martins Fontes (Original publicado em 1948).<br />

Boss, M. (1981). Angústia, culpa e libertação (ensaios de psicanálise<br />

existencial). São Paulo: Livraria Duas Ci<strong>da</strong>des<br />

(Original publicado em 1972).<br />

Merleau-Ponty, M (1999). Fenomenologia <strong>da</strong> Percepção. São<br />

Paulo: Martins Fontes (Original publicado em 1945).<br />

Pessanha, J. A. M. (1994). Introdução à coletânea póstuma de<br />

artigos de Gaston Bachelard. Em G. Bachelard, O Direito de<br />

Sonhar (pp. 5-31). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.<br />

Pompéia, J. A., & Sapienza, B. T. (2004). Na Presença do Sentido.<br />

São Paulo: Paulus.<br />

Sá, R. N. (2009). Psicoterapia, cientifici<strong>da</strong>de e interdisciplinari<strong>da</strong>de:<br />

a propósito de uma discussão sobre a suposta necessi<strong>da</strong>de<br />

de uma regulamentação <strong>da</strong>s práticas psicológicas<br />

clínicas, Portal do Conselho Regional de Psicologia de<br />

São Paulo [online]. Disponível na World Wide Web: http://<br />

www.crpsp.org.br/psicoterapia/textos_6.aspx<br />

Rafael Auler de Almei<strong>da</strong> Prado - Mestre e Doutorando em Psicologia<br />

Clínica pela Universi<strong>da</strong>de Católica de Pernambuco (Unicap).<br />

Email: rafaelpradoauler@gmail.com<br />

Marcus Tulio Cal<strong>da</strong>s - Doutor em Psicologia pela Universi<strong>da</strong>de de<br />

Deusto-Espanha; Professor <strong>da</strong> Graduação e Pós-Graduação do Curso<br />

de Psicologia <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Católica de Pernambuco (Unicap).<br />

Email: marcus_tulio@uol.com.br<br />

Karl Heinz Efken - Doutor em Filosofia pela Pontifícia Universi<strong>da</strong>de<br />

Católica do Rio Grande do Sul; Professor e Coordenador do Curso<br />

de Filosofia <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Católica de Pernambuco (Unicap).<br />

Email: khefken@hotmail.com<br />

Carmem lúcia Brito Tavares Barreto - Doutora em Psicologia Clínica<br />

pela Universi<strong>da</strong>de de São Paulo (USP). Professora e Coordenadora do<br />

Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de<br />

Católica de Pernambuco (Unicap). Coordenadora do Laboratório em<br />

Psicologia Clínica Fenomenológica Existencial- LACLIFE. Endereço<br />

Institucional: Universi<strong>da</strong>de Católica de Pernambuco, Centro de Ciências<br />

Biológicas e Saúde. Rua do Príncipe, 526 - Bloco B (Boa Vista).<br />

CEP 50050-410 - Recife/PE. Email: carmemluciabarreto@hotmail.com<br />

Recebido em 16.10.12<br />

Primeira Decisão Editorial em 07.12.12<br />

Aceito em 26.12.12<br />

<strong>Revista</strong> <strong>da</strong> Abor<strong>da</strong>gem <strong>Gestáltica</strong> – XVIII(2): 216-223, jul-dez, 2012<br />

A r t i g o

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!