Rua Ferrer, 15 de julho de 1906 - Bangu.net

Rua Ferrer, 15 de julho de 1906
Apresentamos o primeiro craque banguense
Corria o ano de 1906. O campo da Rua
Ferrer tinha acabado de ser construído, com
grama inglesa retirada do jardim da Fábrica
por Augusto Ferreira, português, minucioso
jardineiro que cuidou para que o tapete verde
do Bangu ficasse pronto a tempo do início do
primeiro Campeonato Carioca da história.
Não havia muros, então, também não
havia cobrança de ingresso. Quem quisesse
ver o jogo bastava se debruçar na grade que
rodeava o campo e apoiar ininterruptamente o
time do Bangu.
Nesse cenário, em que o futebol ainda era
uma surpresa para muitos, em que time bom
era composto por muitos ingleses, o Bangu
recebeu o Botafogo para um match do returno
do campeonato.
O Botafogo vinha bem. Derrotara
sucessivamente o Rio Cricket por 3 a 1 e o
Football & Athletic por 5 a 0. O Bangu, por
sua vez, estava mal: tinha perdido os três
últimos confrontos: para o próprio Botafogo
no turno (0 x 1), para o Fluminense (0 x 4) e
para o Paysandu (0 x 3). A situação era
crítica. Tanto que, pela primeira vez, a
diretoria se importou em organizar uma
comissão para dirigir o time.
O Ground Committee foi formado por
cinco experts: os diretores José Villas Boas,
James McGregor e Thomas Donohoe, e os
jogadores Thomas Hellowell e James Hartley.
O sistema de “comando” é que ainda era
incipiente: a cada semana um dos membros
do comitê treinaria o time...
A partida superou as expectativas. Foi
uma demonstração de força do Bangu sobre
um adversário perigoso.
“As forças acharam-se equilibradas e,
apesar da falta de treino, principalmente dos
jogadores que foram à última hora incluídos
nos times, notou-se bastante calma e alguma
combinação nas linhas de forwards, tanto do
Bangu como do Botafogo. O primeiro,
digamos, jogou bem e com tática, a sua defesa
foi heróica, salientando os backs James
Hartley, que deu belos e fortes kicks e Charles
Hill, que se salientou bastante, rebatendo
belas bolas. Raul Maranhão, como half,
esteve soberbo, ora auxiliando o ataque, ora a
defesa. O seu jogo está muito modificado,
como se verificou, isto é, abandonou, e
registremos com satisfação, o jogo bruto de
então. Os outros dois halves portaram-se
galhardamente. Na linha de forwards
destacamos, em primeiro lugar, o inside-right
Alexander Leigh, a quem muito deve o Bangu
pela sua vitória, porque foi ele quem marcou
os gols com chutes certeiros, esteve admirável
e jogou como ainda não vimos. Também se
salientaram Robert Cross e Itamar Tavares,
que são jogadores de futuro. Vê-se, pois, que
o Bangu tem bons elementos, o que falta é
treino e mais nada.” – escreveu o Jornal do
Brasil, ao analisar a partida para seus leitores.
O inside-right Alexander Leigh, a quem muito deve o
Bangu pela sua vitória, porque foi ele quem marcou os
gols com chutes certeiros. Esteve admirável.

Assim que o juiz Victor Etchegaray, do
Fluminense, apitou o início da partida, o
Bangu fez um gol após 20 minutos, graças ao
inglês Alexander Leigh. E o 1º tempo
terminou com essa vantagem mínima.
No 2º tempo, o Botafogo deu mais
trabalho. Aos 15 minutos, Ataliba Sampaio
empatou o jogo. Era hora de correr atrás da
vitória e novamente, Alexander Leigh
balançou as redes de Álvaro Werneck: Bangu
2 a 1.
Mas, se o ataque vinha bem, a defesa
acabou cedendo à pressão alvinegra e Paulino
de Souza empatou novamente: 2 a 2.
Eis que, faltando 10 minutos para o
término, Alexander Leigh – decidido de que
aquele seria o seu dia – assegurou a vitória
alvirrubra, marcando o terceiro gol. O
Botafogo teve que pegar o trem, na estação
logo em frente ao campo, levando para a
Voluntários da Pátria mais uma derrota.
Alexander Leigh foi apenas o primeiro
atacante banguense a marcar três gols sobre o
Botafogo numa mesma partida. Depois dele,
Ladislau (1926), Antenor (1927), Bahiano
(1938), Joel Rezende (1948), Menezes (1952)
e Hilton Vaccari (1955) repetiram seu feito.
A frase
“Dizem os que entendem mais da matéria do
que este vosso criado, que o match
tecnicamente não foi bom, mas eu achei-o
excelente, pois gosto é de vê-los, os alegres
rapazes, a saltarem de um para outro lado do
campo, em perseguição da bola doidivanas,
para depois de tanto trabalho, lhe prepararem
a entrada triunfal no gol inimigo”.
Zé Cosme,
Cronista do Correio da Manhã, revelando
candidamente que era apenas um curioso do
que um verdadeiro conhecedor do futebol.
Detalhe de um jogo na Rua Ferrer antes da construção
das arquibancadas, do Pavilhão que serviria como
vestiários e do muro ao redor do campo. Assistir uma
partida requeria disposição para ficar em pé, apoiado
na grade durante 90 minutos.
Domingo, 15 de julho de 1906
3 x 2
Competição: Campeonato Carioca
Local: Rua Ferrer (RJ)
Juiz: Victor Etchegaray
Bangu: Manuel Maia, William Hellowell e
James Hartley; Tom Harrison, Charles Hill e
Raul Maranhão; Itamar Tavares, Alexander
Leigh, Robert Cross, Victor Faria e Oscar
Villas Boas.
Botafogo: Álvaro Werneck, Otávio Werneck e
João Leal; Luiz Baena, Raul Rodrigues e
Carlos Bernaud; Norman Hime, Flávio Ramos,
Ataliba Sampaio, Gilbert Hime e Paulino de
Souza.
Gols: No 1º tempo: Alexander Leigh. No 2º
tempo: Ataliba Sampaio, Alexander Leigh,
Paulino de Souza e Alexander Leigh.
Campeonato Carioca 1906
Classificação Pts J V E D GP GC SG
1 Fluminense 8 4 4 ‐ ‐ 26 1 25
2 Botafogo 6 6 3 ‐ 3 12 17 ‐5
3 Rio Cricket 4 3 2 ‐ 1 8 3 5
4 Paysandu 4 4 2 ‐ 2 9 8 1
5 Bangu 4 5 2 ‐ 3 6 11 ‐5
6 Athletic 0 4 ‐ ‐ 4 1 22 ‐21