11.05.2013 Views

Ode Marítima, de Fernando Pessoa Claude Régy e - Companhia de ...

Ode Marítima, de Fernando Pessoa Claude Régy e - Companhia de ...

Ode Marítima, de Fernando Pessoa Claude Régy e - Companhia de ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

No Festival <strong>de</strong> Almada <strong>de</strong> 2009, Matthias Langhoff surpreen<strong>de</strong>u o público com <strong>de</strong>us como paciente,<br />

<strong>de</strong> Lautréamont, espectáculo <strong>de</strong> uma exuberância imagética absolutamente invulgar. Este ano, regressa<br />

ao Festival – que, em <strong>de</strong>clarações à Folha Informativa, consi<strong>de</strong>rou «o mais interessante e agradável da<br />

Europa» – com Cabaret hamlet, uma encenação da peça <strong>de</strong> Shakespeare, que – no seu surpreen<strong>de</strong>nte<br />

excesso músico-dramático – torna actualíssimo o maneirismo <strong>de</strong>sencantado do dramaturgo.<br />

Matthias langhoff:<br />

um tesouro nacional vivo<br />

Bruno Tackels<br />

Des<strong>de</strong> o seu tumultuoso princípio <strong>de</strong> carreira no Berliner<br />

Ensemble, Matthias Langhoff trabalha unicamente uma<br />

questão: o drama do problema nacional, que, <strong>de</strong> tesouro<br />

(a nação como espaço <strong>de</strong> abertura) veio a tornar-se num<br />

pesa<strong>de</strong>lo portador da morte (a nação como i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

exclusiva). Todo o seu teatro testemunha o horror das<br />

nações mo<strong>de</strong>rnas.<br />

ele permanece inteiro diante do abismo que o século XX, em abalos sucessivos,<br />

abriu na Europa: as duas guerras mundiais, os genocídios que culminaram na<br />

Shoah, a bomba atómica, o estalinismo, os nacionalismos e todas as suas<br />

sequelas integristas. <strong>de</strong> todas as formas <strong>de</strong>ste trauma bárbaro alojado em pleno<br />

coração da civilização humana, o palco barroco e profusamente preenchido <strong>de</strong><br />

matthias langhoff continua a dar testemunho. Com uma obstinação sem concessões,<br />

toma a sério aquilo em que a nossa Europa se tornou, um território por duas vezes<br />

incendiado num cenário <strong>de</strong> ruínas da <strong>de</strong>mocracia parlamentar e <strong>de</strong>ixando o campo<br />

livre a todas as valas comuns da história.<br />

o teatro <strong>de</strong> langhoff é uma máquina <strong>de</strong> guerra, equipada com toda a mordacida<strong>de</strong><br />

necessária. E o encenador – um dos fiéis <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes do <strong>de</strong>us hefesto – é o ferreiro<br />

rebel<strong>de</strong> que se ri dos <strong>de</strong>uses e dos seus po<strong>de</strong>res sagrados. Encenar assume-se como<br />

um gesto provocador que mostra ao mundo esse mundo que ele não vê, que pinta<br />

uma tela à escala do atelier, entre o <strong>de</strong>senho e a escultura, entre o boulevard e o<br />

construtivismo, entre a figuração e a abstracção, entre uma sitcom e o cinema <strong>de</strong><br />

Kubrick. E esta pintura acontece <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que haja tema, qualquer espécie <strong>de</strong> tema,<br />

com todas as histórias que ele encerra e que liberta pouco a pouco, para formar o<br />

gigantesco «panorama» que se reconhece em muitos dos seus espectáculos, no<br />

fundo <strong>de</strong> cena, como um fresco <strong>de</strong>smedido que vigia a vala humana.<br />

a radicalida<strong>de</strong> que langhoff propõe não é mero exercício cénico ou um vulgar jogo<br />

<strong>de</strong> salão. o criador aplica-a em todos os campos da sua vida: na sua relação com o<br />

teatro, no trabalho, com os alunos, nos espaços, na actualida<strong>de</strong>, nas viagens. <strong>de</strong> cada<br />

vez – e se se quiser impor a arte no centro da comunida<strong>de</strong>, propondo ponto por ponto<br />

soluções para inverter a jogada – trata-se <strong>de</strong> refundar, <strong>de</strong> <strong>de</strong>smontar o que existe,<br />

peça por peça, <strong>de</strong>monstrando magistralmente como toda a realida<strong>de</strong> já não funciona.<br />

langhoff disse-o quando retomou a direcção da Comédie <strong>de</strong> Genebra, num livro que<br />

escreveu no qual projecta com gran<strong>de</strong> precisão as transformações que o teatro <strong>de</strong>ve<br />

sofrer para que a utopia ganhe uma forma física. obviamente, langhoff jamais assumirá<br />

a direcção <strong>de</strong> um teatro <strong>de</strong>sse tipo. atitu<strong>de</strong> semelhante tomou no Théâtre national<br />

<strong>de</strong> Bretagne, em Rennes: propôs soluções drásticas e incrivelmente inovadoras para<br />

«transformar um teatro que funcione bem» (é o título <strong>de</strong> um relatório encomendado pelo<br />

director do teatro e que rapidamente foi enfiado na gaveta). Po<strong>de</strong>r-se-ia acrescentar:<br />

para fazer <strong>de</strong>le um tesouro nacional. mas este género <strong>de</strong> coragem clarivi<strong>de</strong>nte não<br />

quadra com o nosso tempo. Tê-lo-emos compreendido. a proposta está no ar. E ela já<br />

enerva alguns – nós compreen<strong>de</strong>mo-los. Eles não terão a última palavra.■<br />

in mouvement, Out./Nov. 2008 (adaptado)<br />

Nascido em Zurique, em 1941, matthias<br />

langhoff ingressa no Berliner Ensemble<br />

em 1961, on<strong>de</strong> montou, a partir <strong>de</strong> 1962,<br />

as suas primeiras peças com o cúmplice manfred<br />

Karge, que com ele co-assinaria quase todos os seus<br />

espectáculos durante o período em que permaneceu<br />

na alemanha <strong>de</strong> leste (dirige, <strong>de</strong> Brecht, Poemas e<br />

canções, A pequena Mahagonny, A compra do cobre,<br />

A venda do pão; e, <strong>de</strong> Ésquilo, Sete contra Tebas). Em<br />

1969, langhoff dirige na Volksbühne autores como<br />

ostrovski (A floresta), Shakespeare (Otelo) ou Schiller<br />

(Die Räu<strong>de</strong>r). Entre 1978 e 1979 começa a apostar em<br />

produções <strong>de</strong>ntro e fora da alemanha, encenando em<br />

hamburgo O príncipe <strong>de</strong> Homburgo, <strong>de</strong> heinrich von<br />

Kleist, em Genebra Prometeu agrilhoado, <strong>de</strong> Ésquilo,<br />

e Rei Lear, na holanda. no início dos anos 80, passa<br />

Matthias Langhoff, encenador <strong>de</strong> Cabaret-hamlet<br />

a encenar normalmente em língua francesa, pondo<br />

em cena Tchecov (O cerejal), Merce<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> Brasch,<br />

ou Stichtag, <strong>de</strong> Thomas hürlimann. É nesta época<br />

que se muda para a Suíça, país on<strong>de</strong> nasceu, <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> seu pai, Wolfgang langhoff, ter fugido do regime<br />

nazi (também ele foi um gran<strong>de</strong> encenador alemão,<br />

que regressa à alemanha em 1945, tornando-se<br />

director do <strong>de</strong>utsches Theater). Entretanto, dirige o<br />

Théâtre Vidy, em lausanne, fixando-se <strong>de</strong>pois em<br />

França, on<strong>de</strong> ainda hoje vive e trabalha (dirigindo a<br />

partir <strong>de</strong> 1987 a Comédie <strong>de</strong> Genebra, experiência<br />

que dará origem ao seu livro famoso Le rapport<br />

Langhoff / Project pour la Comédie <strong>de</strong> Genève).<br />

Em 1988 monta em alemão uma das suas criações<br />

mais impressionantes, para a qual assina também o<br />

cenário: Édipo rei, a partir <strong>de</strong> Sófocles, höl<strong>de</strong>rnin e<br />

heiner müller, no Burgtheater <strong>de</strong> Viena. no Festival <strong>de</strong><br />

avignon do ano seguinte apresenta A missão, também<br />

<strong>de</strong> müller. Em 1993, assume a direcção partilhada do<br />

Berliner Ensemble, cargo em que se manterá até 1997.<br />

Esta é uma das suas épocas áureas, apresentando<br />

espectáculos nos principais palcos europeus (Berliner<br />

Ensemble, naturalmente, mas também no Festival<br />

<strong>de</strong> avignon, na Comédie Française, no Théâtre <strong>de</strong><br />

la Ville, em Paris, ou no Epidauro). neste período,<br />

o gran<strong>de</strong> reportório greco-latino, mas também<br />

Shakespeare, o expressionismo <strong>de</strong>sfigurado <strong>de</strong> Gogol<br />

ou Büchner ou o <strong>de</strong>sencanto inquieto e provocatório<br />

<strong>de</strong> müller ganham cada vez mais importância no<br />

percurso estético <strong>de</strong> langhoff, que submete estes<br />

textos canónicos à virulenta <strong>de</strong>sconstrução <strong>de</strong> uma<br />

arte reveladora e profundamente comprometida.■

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!