O masoquismo e a relação com o feminino* - Escola Letra Freudiana
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O masoquistno e a <strong>relação</strong> <strong>com</strong> o feminino<br />
plando os fenômenos do <strong>masoquismo</strong> social desde este ângulo, <strong>com</strong>prova-se também<br />
aqui a apresentação das tendências primárias através de inversões. A ilimitada submissão<br />
expressa uma rebeldia inconsciente; a renúncia, a obstinação, o servilismo, o<br />
desafio, a auto-humilhação e a ignorância.<br />
Mas, <strong>com</strong>o nasce este caráter inconsciente burlão ou de paródia que, secreta,<br />
embora distintamente, adota a fantasia ou prática masoquista? Este caráter se origina<br />
em drffersas fontes. Aqui quero limitar-me a assinalar o aspecto histórico, que se revela<br />
ao observador psicanalítico simplesmente observando os fenômenos durante o tempo<br />
suficiente e <strong>com</strong> baftpnte atenção. Este aspecto não o explica todo, mas esclarece um<br />
bom número de traços grotescos e burlões de algumas práticas e idéias masoquistas.<br />
Estas cenas e fantasias não são somente inversões dè idéias sádicas, mas também<br />
uma reanimação e reprodução das figuras infantis em <strong>relação</strong> às atividades sexuais dos<br />
adultos. Retorna inconscientemente às idéias infantis sobre o curso da <strong>relação</strong> sexual.<br />
A grotesca mescla de verdade e erro destas teorias sexuais infantis reaparece aqui na<br />
teoria e na prática. O caráter infantil, a que se apega inconscientemente o homem<br />
adulto, se traduz miA vezes em alguns detalhes destas fantasias e ações. Exemplo<br />
disto é a parte importante que desempenham neles os excrementos e a urina, assim<br />
<strong>com</strong>o a falta de vergonha ou de asco que só aparecem tardiamente na criança, <strong>com</strong>o<br />
conseqüência da educação. Assim, o elemento da paródia se origina em idéias infantis<br />
já esquecidas há muito tempo, <strong>com</strong>o por exemplo a de que a mulher é tratada <strong>com</strong><br />
crueldade pelo homem, que este urina ou defeca sobre ela, etc.<br />
Em todas estas idéias, invertidas <strong>com</strong>o aparecem na prática masoquista, existe a<br />
vibração de uma nota agressiva e violenta. A mulher aparece <strong>com</strong>o um ser dominado,<br />
sofredor, submetido à vontade do homem.<br />
Quero provar esta suposição <strong>com</strong> um só exemplo significativo que trago à memória<br />
do leitor. Referi-me a ele ao descrever o <strong>masoquismo</strong> feminino na discussão da teoria<br />
de Freud. Trata-se do enfermo cuja satisfação sexual consistia em colocar-se em certa<br />
posição vestindo, para a execução desta cena, um par de calças negras. Discuti<br />
previamente a origem psíquica de suas condições específicas para o prazer, ou seja a<br />
inversão de uma cena infantil. O menino havia irrompido no banheiro de sua mãe no<br />
momento em que esta, <strong>com</strong> as pernas cobertas de lama, se inclinava para levantar algo<br />
do solo. À vista das nádegas de sua mãe, o menino sentiu um impulso de dar-lhe uma<br />
palmada. Isto eqüivaleria a uma ação sádica, manifestação de um precoce impulso<br />
agressivo e sensual. Além disso, o menino se identificava assim <strong>com</strong> seu pai, que<br />
costumava fazer a mesma carícia em sua mãe ou na criada.<br />
Nos encontramos, pois, diante de uma atitude definidamente masculina no mesmo<br />
menino que mais tarde, na cena masoquista, adota outra inteiramente passiva e<br />
feminina. Nesta cena desempenha o papel feminino, e em lugar de bater faz <strong>com</strong> que<br />
batam nele. Mas estaria já esclarecido o significado da cena perversa? Não, é preciso<br />
aprofundar algo mais. O que faz o enfermo é desempenhar o papel que, segundo seus<br />
desejos e idéias, a mulher deveria representar. Ele o representa em lugar dela. É aqui<br />
que devemos buscar a conexão <strong>com</strong>o feminino, e a inversão nos resulta <strong>com</strong>preensível.<br />
LETRA FREUDIANA - Ano XI - a» 10/11/12 159