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Notas para o Cantos das Aves em Eugénio de Andrade e em Três ...

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(Keats, 1988: 171)<br />

No entanto, nos últimos dois versos da o<strong>de</strong>, ocorre uma reviravolta, tão ao gosto<br />

<strong>de</strong> Keats, e o escritor romântico pergunta-se se não estará a imaginar toda a cena<br />

bucólica. O simples facto <strong>de</strong> colocar essa hipótese contradiz a <strong>de</strong>dução anterior do<br />

poeta, e mostra que a força da fantasia e da criativida<strong>de</strong> pod<strong>em</strong> igualar, mesmo que<br />

apenas por instantes, o efeito mágico do canto do rouxinol: “Was it a vision, or a<br />

waking dream? / Fled is that music: — do I wake or sleep?” (Keats, 1988: 169-171).<br />

Similarmente, <strong>Eugénio</strong> conclui que a melodia do pássaro po<strong>de</strong> ser cantada pelo<br />

poeta, graças à imaginação: “É <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> ti / que toda a música é ave” (Andra<strong>de</strong>, 2005:<br />

353). Uma i<strong>de</strong>ia análoga surgira anteriormente no po<strong>em</strong>a “Pequena Elegia <strong>de</strong><br />

Set<strong>em</strong>bro”, do livro Coração do Dia (1958):<br />

Que música escutas tão atentamente<br />

que não dás por mim?<br />

Que bosque, ou rio, ou mar?<br />

Ou é <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> ti<br />

que tudo canta ainda?<br />

(Andra<strong>de</strong>, 2005: 92)<br />

Nesta linha, o canto é, ao mesmo t<strong>em</strong>po, o do rouxinol e o do escritor; o do céu<br />

e o da terra; o do mundo e o do íntimo; o da passag<strong>em</strong> e o da permanência. Simboliza,<br />

enfim, a própria poesia, que im<strong>em</strong>orialmente t<strong>em</strong> trazido beleza e alívio à vida humana<br />

(Sousa, 1992: 86). Acerca da associação entre verbo e música na escrita eugeniana,<br />

Eduardo Lourenço nota:<br />

a “palavra” é uma palavra com sujeito, a palavra que canta, o po<strong>em</strong>a,<br />

o verso, o canto, a qu<strong>em</strong> confere um po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> transfiguração, <strong>de</strong><br />

subversão e mesmo <strong>de</strong> vitória sobre a realida<strong>de</strong>, pois através <strong>de</strong>la<br />

rasuramos o seu signo incontornável, o da nossa mortalida<strong>de</strong>.<br />

(Lourenço, 2005: 92)<br />

2.3. William Butler Yeats<br />

Os cisnes s<strong>em</strong>pre ocu<strong>para</strong>m um lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque no imaginário do mito, nas<br />

tradições populares, na literatura e nas restantes artes. Os ex<strong>em</strong>plos abundam: <strong>para</strong> os<br />

antigos gregos, um casal <strong>de</strong>stas aves puxava a carruag<strong>em</strong> <strong>de</strong> Afrodite, a <strong>de</strong>usa do amor;<br />

Zeus adoptou a forma <strong>de</strong> cisne <strong>para</strong> seduzir a bela Leda, que lhe quatro filhos,<br />

Clit<strong>em</strong>nestra, Castor, Pólux, e Helena, saídos <strong>de</strong> dois ovos (Saun<strong>de</strong>rs, 1997: 122); no<br />

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