Estratégias de Conservação da Biodiversidade no Brasil - cesnors
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comum em outros países me<strong>no</strong>s atrasados <strong>no</strong> tema, está permitindo que se constitua um fundo <strong>de</strong> administração (espécie <strong>de</strong> trust fund)<br />
bancado por – raros ain<strong>da</strong> – empresários engajados, que permitirá salvar esta inestimável área protegi<strong>da</strong> <strong>da</strong> miserabili<strong>da</strong><strong>de</strong> que afeta quase<br />
todo o resto do sistema <strong>de</strong> UCs brasileiras. É iniciativa a ser profusamente elogia<strong>da</strong> e replica<strong>da</strong> em to<strong>da</strong>s as UCs em que isso for possível.<br />
Por outro lado, a Área <strong>de</strong> Proteção Ambiental <strong>da</strong> Baleia Franca está sendo consoli<strong>da</strong><strong>da</strong> graças à existência <strong>de</strong> um Conselho Gestor em<br />
que boa parte <strong>da</strong>s instituições constituintes busca formar efetivas vias <strong>de</strong> colaboração com sua chefia – já seja apoiando a organização<br />
dos pescadores e comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s locais em busca <strong>de</strong> padrões <strong>de</strong> sustentabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, ou acionando judicialmente o órgão fe<strong>de</strong>ral gestor para<br />
obrigar à realização <strong>de</strong> seu Pla<strong>no</strong> <strong>de</strong> Manejo. Tomando diversas formas, a experiência brasileira mostra que o envolvimento <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
civil po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser força motriz <strong>de</strong> consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s áreas marinhas protegi<strong>da</strong>s, e só não evolui mais rapi<strong>da</strong>mente porque o Estado<br />
<strong>de</strong>ixa, sistematicamente, <strong>de</strong> cumprir sua parte, ou tenta con<strong>de</strong>nar essa participação a intermináveis seminários, conferências e workshops<br />
ao invés <strong>de</strong> privilegiar as ações práticas necessárias a fazer conservação.<br />
Engajar e valorizar setores <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> marginalizados pela i<strong>de</strong>ologização excessiva dos processos <strong>de</strong> discussão e<br />
implantação <strong>de</strong> áreas marinhas protegi<strong>da</strong>s. Ain<strong>da</strong> que marginalmente o Estado permita a setores específicos <strong>de</strong> usuários dos recursos<br />
marinhos opinar e participar dos processos <strong>de</strong> gestão – caso dos pescadores artesanais em Reservas Extrativistas, por exemplo - o mesmo<br />
Estado é draconia<strong>no</strong> ao impedir que segmentos que <strong>de</strong>sfrutam dos recursos marinhos <strong>de</strong> maneira essencialmente não-pre<strong>da</strong>tória (por<br />
exemplo, os mergulhadores recreativos, dos quais se estima haver mais <strong>de</strong> 150.000 cre<strong>de</strong>nciados <strong>no</strong> país) recebam a mesma consi<strong>de</strong>ração<br />
quando se <strong>de</strong>termina a proteção <strong>de</strong> áreas marinhas. Esses usos essencialmente não-pre<strong>da</strong>tórios, que abrangem inter alia mergulho contemplativo,<br />
observação <strong>de</strong> fauna, vela e náutica or<strong>de</strong>nados, são irracionalmente consi<strong>de</strong>rados “elitistas”, uma visão míope que recusa-se a<br />
ver os benefícios econômicos, amplamente provados, <strong>da</strong> promoção or<strong>de</strong>na<strong>da</strong> <strong>de</strong>ssas ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s para as comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s do entor<strong>no</strong> on<strong>de</strong> são<br />
pratica<strong>da</strong>s. A<strong>de</strong>mais, se essas ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s não são mais dissemina<strong>da</strong>s <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, é justamente porque não há espaços <strong>de</strong> promoção <strong>de</strong> sua<br />
prática or<strong>de</strong>na<strong>da</strong> para segmentos mais amplos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, o que po<strong>de</strong>ria e <strong>de</strong>veria ser parte <strong>da</strong> missão <strong>de</strong> áreas naturais protegi<strong>da</strong>s em<br />
que o acesso <strong>de</strong>mocratizado ao <strong>de</strong>sfrute do lazer educativo <strong>no</strong> mar fosse promovido ativamente. Não é outra, senão a antipatia oficial pelo<br />
tema, a razão pela qual o Pla<strong>no</strong> <strong>de</strong> Uso Público do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos encontra-se literalmente encalhado em Brasília<br />
há tempos; a burocracia fe<strong>de</strong>ral vigente não consi<strong>de</strong>ra priori<strong>da</strong><strong>de</strong> a gestão dos usos não-pre<strong>da</strong>tórios e sua promoção. Integrar a gestão e<br />
promoção <strong>de</strong>sses usos ao planejamento e criação <strong>de</strong> áreas marinhas protegi<strong>da</strong>s é absolutamente vital para <strong>da</strong>r equi<strong>da</strong><strong>de</strong> e racionali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
ao Sistema e, mais ain<strong>da</strong>, fazer com ele receba recursos diretamente advindos do or<strong>de</strong>namento <strong>de</strong>ssas ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />
Universalizar o Programa <strong>de</strong> Observadores <strong>de</strong> Bordo nas ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s pesqueiras e acelerar a adoção obrigatória <strong>de</strong><br />
medi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> capturas inci<strong>de</strong>ntais <strong>de</strong> fauna marinha. O Estado <strong>de</strong>ve acelerar a adoção compulsória do programa <strong>de</strong> observadores<br />
<strong>de</strong> bordo e, à medi<strong>da</strong> em que os conhecimentos técnico-científicos assim o recomen<strong>da</strong>rem, <strong>de</strong> medi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> redução e mitigação<br />
<strong>de</strong> capturas inci<strong>de</strong>ntais <strong>de</strong> fauna em to<strong>da</strong>s as ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> pesca industrial exerci<strong>da</strong>s em águas jurisdicionais brasileiras. Isso <strong>de</strong>ver vir,<br />
evi<strong>de</strong>ntemente, acompanhado <strong>de</strong> a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> capacitação dos observadores e, principalmente, <strong>da</strong> construção <strong>de</strong> garantias coercitivas que<br />
assegurem a integri<strong>da</strong><strong>de</strong> física e tranquili<strong>da</strong><strong>de</strong> profissional dos mesmos contra a intimi<strong>da</strong>ção que, sabe-se, é constante on<strong>de</strong> quer que esse<br />
programa tenha sido implementado.<br />
Capacitar as autori<strong>da</strong><strong>de</strong>s ambientais e reaparelhar a Marinha do <strong>Brasil</strong> para a fiscalização <strong>da</strong>s extensões jurisdicionais<br />
marinhas brasileiras. Para que quaisquer programas <strong>de</strong> conservação <strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong><strong>de</strong> marinha brasileira tenham êxito, o Estado<br />
precisa retomar sua presença soberana <strong>no</strong> espaço marítimo. Essa presença foi abandona<strong>da</strong> quase que completamente, não apenas pelas<br />
autori<strong>da</strong><strong>de</strong>s ambientais mas também pelo Ministério <strong>da</strong> Defesa, ao permitir o continuado sucateamento <strong>da</strong> Marinha. É preciso pactuar um<br />
programa integrado que permita fazer com que a Marinha do <strong>Brasil</strong> volte a projetar <strong>no</strong>ssa soberania nas águas jurisdicionais, patrulhando<br />
efetivamente os espaços protegidos em estreita parceria com as autori<strong>da</strong><strong>de</strong>s ambientais fe<strong>de</strong>rais e mesmo outros atores sociais engajados,<br />
bem como assegurar que o or<strong>de</strong>namento pesqueiro seja efetivamente cumprido.<br />
Durante muito tempo a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> civil brasileira permitiu ao Estado <strong>da</strong>r as costas ao mar do <strong>Brasil</strong>, ou a seus gestores<br />
temporários <strong>de</strong>terminar priori<strong>da</strong><strong>de</strong>s políticas que não condizem com a necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> proteger <strong>no</strong>sso mar, tendo em vista as<br />
responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s globais do país com a conservação dos ocea<strong>no</strong>s e, concomitantemente, o direito <strong>da</strong>s futuras gerações <strong>de</strong> brasileiros<br />
a <strong>de</strong>sfrutar <strong>da</strong> biodiversi<strong>da</strong><strong>de</strong> marinha. É tempo <strong>de</strong> reverter esse abando<strong>no</strong>. Sabemos sermos poucos os que se preocupam<br />
em resgatar <strong>no</strong>sso mar do <strong>de</strong>scaso e do laissez-faire para os seus <strong>de</strong>pre<strong>da</strong>dores, mas temos esperança <strong>de</strong> que esse quadro po<strong>de</strong> ser<br />
revertido, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que mais atores sociais rompam o silêncio cúmplice com que tais <strong>de</strong>scalabros até agora vêm sendo recebidos.<br />
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