28.05.2013 Views

capa v17.indd - Escola de Música da UFMG

capa v17.indd - Escola de Música da UFMG

capa v17.indd - Escola de Música da UFMG

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

44<br />

ROSA, S. A. Primeiros tratados italianos do século XVII sobre baixo contínuo... Per Musi, Belo Horizonte, n.17, 2008, p. 41-47<br />

Utilizando explicações sobre como enca<strong>de</strong>ar as partes em<br />

relação ao movimento do baixo, os autores nos indicam o<br />

movimento contrário como o mais apropriado, procedimento<br />

este que será um dos pilares <strong>de</strong> todo o <strong>de</strong>senvolvimento do<br />

baixo contínuo e <strong>da</strong> harmonia por mais <strong>de</strong> três séculos 10 .<br />

Também ensinam como conduzir a mão direita em casos<br />

<strong>de</strong> notas pontua<strong>da</strong>s, tiratas e diminuições, <strong>de</strong>notando uma<br />

inflexão didática e técnica. Esse tipo <strong>de</strong> posicionamento<br />

nos leva a concluir que, apesar <strong>da</strong>s dimensões pequenas<br />

<strong>de</strong>sses trabalhos 11 , esses autores tinham a intenção <strong>de</strong><br />

produzir manuais, métodos <strong>de</strong> execução musical, e assim<br />

torna-se compreensível serem <strong>de</strong>nominados <strong>de</strong> “tratados”,<br />

como o faz Arnold (1965, p. 67).<br />

Notamos que na décima recomen<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> Via<strong>da</strong>na,<br />

ele nos diz que esses concertos não soarão bem se<br />

<strong>de</strong>sacompanhados, fazendo-nos <strong>de</strong>duzir que na época<br />

ain<strong>da</strong> se pensaria tal tipo <strong>de</strong> música sem acompanhamento,<br />

num alongamento do estilo próprio <strong>da</strong> Renascença. Na<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, nesse período, encontramos raras indicações<br />

<strong>de</strong> como os instrumentos eram utilizados, e apenas<br />

contamos com a evidência <strong>de</strong> que eram utilizados, como<br />

observa LANG (2007) em seu comentário estilístico sobre<br />

os Concerti <strong>de</strong> Via<strong>da</strong>na. Desse modo, po<strong>de</strong>mos perceber<br />

a rápi<strong>da</strong> aceitação e evolução que teve a nova maneira<br />

<strong>de</strong> executar música, pois poucos anos mais tar<strong>de</strong> nem<br />

encontramos mais citação <strong>de</strong>ssa possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>. Agazzari<br />

e Bianciardi sempre se referem ao acompanhamento<br />

ao órgão, provavelmente se esten<strong>de</strong>ndo aos <strong>de</strong>mais<br />

instrumentos <strong>de</strong> teclado. Nesse contexto, é notável a<br />

enorme atenção que Agazzari <strong>de</strong>dica em seu trabalho<br />

aos instrumentos que executam o acompanhamento:<br />

classifica-os come fon<strong>da</strong>mento [<strong>de</strong> base] – aqueles<br />

que embasam todo o grupo <strong>de</strong> vozes e instrumentos -<br />

ou come ornamento [<strong>de</strong> ornamentação] – aqueles que,<br />

num estilo contrapontístico, enriquecem a harmonia. No<br />

primeiro grupo o autor coloca o órgão e o cravo, e em<br />

situações on<strong>de</strong> há menos vozes solistas, o alaú<strong>de</strong>, a tiorba<br />

e a harpa. No segundo grupo enumera alaú<strong>de</strong>, tiorba,<br />

harpa, lirone 12 , cetera 13 , espineta, chitarrina 14 , pandora.<br />

Discorrendo longamente sobre essas funções e <strong>de</strong>dicandose<br />

pormenoriza<strong>da</strong>mente a ca<strong>da</strong> instrumento, ele disserta<br />

sobre a maneira <strong>de</strong> tocá-los, suas particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>s e o<br />

comportamento do músico no conjunto. Nesse aspecto,<br />

po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar que Agazzari produziu um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro<br />

tratado estilístico <strong>da</strong> época, <strong>de</strong>ixando-nos algumas <strong>da</strong>s<br />

raras indicações <strong>da</strong>s características do acompanhamento<br />

instrumental na Itália dos primeiros anos do século XVII.<br />

No último conselho <strong>de</strong> Via<strong>da</strong>na, verificamos uma<br />

menção ao cui<strong>da</strong>do que se <strong>de</strong>ve ter com a textura do<br />

acompanhamento, e conseqüentemente com a massa<br />

sonora que ele representará. Sugere-nos evitar o registro<br />

agudo ao trabalhar a voci pari 15 , e propõe utilizá-lo ao<br />

acompanhar vozes agu<strong>da</strong>s - a não ser nas cadências,<br />

on<strong>de</strong> se dobra a oitava - procedimento que, segundo ele,<br />

faz a música soar melhor. Encontramos aqui um ponto<br />

conflitante entre os autores, apesar <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificarmos<br />

preocupação semelhante em Agazzari, quando ele nos fala<br />

especificamente dos instrumentos <strong>de</strong> base, salientando o<br />

cui<strong>da</strong>do que se <strong>de</strong>ve ter para não encobrir as vozes; ao<br />

contrário <strong>de</strong> Via<strong>da</strong>na, recomen<strong>da</strong>-nos, quando o soprano<br />

canta, tocar num registro mais grave, a fim <strong>de</strong> não<br />

obscurecê-lo. Essa parece ser uma atitu<strong>de</strong> mais sensata<br />

em termos <strong>de</strong> resultado sonoro, porém <strong>de</strong>vemos observar<br />

que a colocação <strong>de</strong> Via<strong>da</strong>na está em acordo com o que ele<br />

nos havia dito no seu quarto parágrafo, quando nos falou<br />

sobre a altura em que se realizam as cadências.<br />

Um assunto que não chegou a ser abor<strong>da</strong>do por Via<strong>da</strong>na,<br />

mas o foi por seus sucessores, é o <strong>da</strong> transposição. Cita<strong>da</strong><br />

como uma <strong>da</strong>s técnicas que o músico <strong>de</strong>ve dominar para<br />

acompanhar com proprie<strong>da</strong><strong>de</strong>, Bianciardi chega a inserir<br />

em seu trabalho uma tabela <strong>de</strong> transposição a todos os<br />

tons (Fig.4). Foi provavelmente criticado por Agazzari, que<br />

recomen<strong>da</strong> a transposição à 4ª ou à 5ª, algumas vezes um<br />

tom abaixo ou acima, examinando pelas consonâncias<br />

naturais quais as transposições apropria<strong>da</strong>s, e segundo<br />

suas próprias palavras “não como é feito por alguns que<br />

preten<strong>de</strong>m tocar em todos os tons”.<br />

5 - Consi<strong>de</strong>rações finais<br />

Através do estudo <strong>de</strong>talhado <strong>da</strong>s primeiras fontes<br />

históricas sobre Baixo Contínuo, fica claro que os primeiros<br />

compositores a se <strong>de</strong>bruçarem sobre o assunto o fizeram<br />

imbuídos <strong>da</strong> intuição - ou talvez mesmo <strong>da</strong> convicção - <strong>de</strong><br />

que estavam li<strong>da</strong>ndo com idéias novas, porém profun<strong>da</strong>s,<br />

modificando aspectos estruturais <strong>da</strong> linguagem musical<br />

e, portanto, inovando com a indicação <strong>de</strong> novas direções<br />

para a música. Ain<strong>da</strong> que estas não sejam constatações<br />

inéditas, são importantes e necessárias para uma total<br />

compreensão <strong>da</strong> essência do assunto.<br />

Os aspectos teóricos estu<strong>da</strong>dos <strong>de</strong>monstram que a<br />

música <strong>da</strong>quele período necessitava ser compreendi<strong>da</strong><br />

como discurso horizontal. As linhas musicais, vocais<br />

ou instrumentais, é que produzem a harmonia, e não o<br />

contrário. Portanto, a linha do baixo <strong>de</strong>ve ser entendi<strong>da</strong><br />

como direcionadora, tanto quanto a linha do cantor ou<br />

do instrumento melódico solista. Os números colocados<br />

indicando a harmonia que preenche o espaço entre as duas<br />

linhas <strong>de</strong>vem expressar o caminho lógico e claro para que<br />

o conjunto soe compreensível, ou seja, bem resolvido <strong>de</strong><br />

acordo com as regras harmônicas que começavam a se<br />

estruturar. Des<strong>de</strong> o princípio, como expressado por Via<strong>da</strong>na,<br />

Agazzari e Bianciardi, é evi<strong>de</strong>nte a preocupação com a<br />

condução <strong>da</strong>s vozes e com os dobramentos <strong>de</strong> notas.<br />

A fun<strong>da</strong>mentação teórica e os ensinamentos contidos<br />

nos textos dos três autores abor<strong>da</strong>dos po<strong>de</strong>m atualmente<br />

parecer muito singelos, se comparados às publicações<br />

mo<strong>de</strong>rnas sobre baixo contínuo ou mesmo aos gran<strong>de</strong>s<br />

tratadistas do século XVIII. Contudo, se analisados<br />

sob uma ótica histórica e didática, tornam-se úteis<br />

para o entendimento dos princípios que nortearam o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>sta prática, fazendo com que se<br />

possa encarar com mais simplici<strong>da</strong><strong>de</strong> seu aprendizado e<br />

aplicação. Tal análise levou à conclusão <strong>de</strong> que o princípio

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!