DossiÊ - comumLAB - DOSSIE - Giseli Vasconcelos
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134<br />
#redes locais e Autonomia<br />
muirAquitã<br />
De acordo com sua ideologia de desenvolvimento<br />
sustentável e autonomia, eles desenvolveram<br />
um sistema alternativo de pagamento para a participação<br />
nos cursos. Em Santarém, o lixo é um problema<br />
sério. Nunca vi tantos urubus – uma ave-derapina<br />
da família do Condor, cuja dieta é composta<br />
de carcaças, matéria de plantas mortas e lixo – nas<br />
ruas urbanas. Puraqué reconheceu a importância<br />
de criar consciência sobre essa questão, além de<br />
achar uma solução sustentável para esse problema.<br />
Também querem que o curso seja acessível a todos.<br />
Eles não queriam cobrar dinheiro pela participação.<br />
Então decidiram criar uma moeda social específica,<br />
chamada Muraquitã 7 , que simultaneamente provê<br />
uma solução para o problema do lixo da cidade. O<br />
Muraquitã equivale a vinte garrafas PET. Espera-se<br />
que os participantes tragam uma quantidade suficiente<br />
de garrafas PET para pagar pelo curso (um curso<br />
de três meses custará por volta de 30 muraquitãs)<br />
e o Puraqué vende 8 o plástico para um reciclador<br />
de plástico. Assim, o lixo plástico nas ruas diminuirá,<br />
as pessoas tomarão consciência do problema do<br />
lixo e todos poderão participar dos cursos. Eles estão<br />
tentando disseminar a moeda pela cidade, mais ainda<br />
poucos lugares estão realmente dispostos a reconhecer<br />
a moeda como uma forma de pagamento.<br />
7 Muiraquitã (do tupi mbïraki'tã, "nó das árvores", nó<br />
das madeiras", de muyrá ou mbyra, "árvore", "pau", "madeira"<br />
e quitã, "nó", "verruga", "objeto de forma arredondada"), para<br />
os índios brasileiros do Baixo Amazonas, é um artefato talhado<br />
em pedra (na maior parte das vezes feito a partir do jade, pela<br />
cor esverdeada) ou madeira, representando pessoas ou animais<br />
(uma rã, peixe, tartaruga, por exemplo), ao qual são atribuídas<br />
as qualidades sobrenaturais de amuleto. Também é conhecido<br />
pelos nomes de pedra-das-amazonas e pedra-verde.<br />
8 Para cada quilo de garrafas PET (que equivale a 20 garrafas)<br />
eles ganham um real. Em média, custa a eles 33 centavos<br />
para criar a moeda e eles têm que cortar e prensar manualmente<br />
cada garrafa. Assim, eles não têm nenhum lucro significativo<br />
nesse processo.<br />
Quando o primeiro passo é criar um conhecimento<br />
técnico profundo das TICs para estimular um<br />
engajamento social e autonomia, eles eventualmente<br />
buscam aumentar o conhecimento crítico como um<br />
recurso valioso na região. Ao contaminar e educar<br />
os outros, esse conhecimento crescerá exponencialmente.<br />
Como os puraquean@s são ativistas, sua<br />
ideologia de fato é o seu bastão principal no processo<br />
de inclusão digital. Eles lutam contra o capitalismo<br />
que explora a região, destrói o meio-ambiente e causa<br />
pobreza. De acordo com as teorias presentes no<br />
“capitalismo digital olhando para o Sul” e “capitalismo<br />
informacional” introduzido no capítulo 2, eles<br />
são cautelosos com o setor privado e tendem a criar<br />
autonomia através de tecnologias de código aberto<br />
(hardware e software). Eles querem que as pessoas<br />
tomem consciência disso e, de forma colaborativa,<br />
trabalhem nessa alternativa ao modelo existente,<br />
aumentando o conhecimento colaborativo e usando<br />
isso para pensar e criar alternativas sustentáveis. Isso<br />
também inclui uma forma de participação ativa, em<br />
que os usuários são capazes de produzir conteúdo ou,<br />
criticamente, analisar informação, ao invés de ser um<br />
consumidor passivo. O mais importante, no entanto,<br />
é socialmente elevar o indivíduo, partindo da ideia de<br />
que o usuário pode decidir o que é benéfico para ele<br />
sem implicar com isso certas regras ou ideias 9 .<br />
9 Veja em: BUZATO, M., "Inclusão digital como<br />
invenção do quotidiano: um estudo de caso". IN: Rev. Bras.<br />
Educ. [online], vol.13, (38), 2008, pp.325-342. Fonte: http://<br />
www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-<br />
24782008000200010&lng=pt&nrm=iso em 11/12/2009. Ele<br />
mostra uma série de exemplos concretos de um colaborador<br />
de Telecentro que tem uma determinada visão sobre como<br />
“incluir” um usuário e como ensiná-lo, desde a perspectiva de<br />
um “já incluído”. O usuário, de outro lado, muitas vezes usa a<br />
tecnologia de uma forma diferente, que diretamente beneficia<br />
suas necessidades.