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O conceito do político em Carl Schmitt - Curso de Filosofia - UFC

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diverso tratamento e estatuto na teoria <strong>do</strong><br />

po<strong>de</strong>r schmittiana: dá-se primazia ao ontológico-existencial<br />

como instância matriz<br />

<strong>de</strong> qualquer norma, pois é necessário uma<br />

“normalida<strong>de</strong> fática (que) não é somente um<br />

mero pressuposto que o jurista po<strong>de</strong> ignorar.<br />

Ao contrário, pertence à sua valida<strong>de</strong> imanente.”<br />

(SCHMITT, 2004, p.19). Dessa forma,<br />

as relações ontológico-existenciais, ou seja,<br />

vínculos comuns que envolv<strong>em</strong> o ser humano<br />

enquanto forma <strong>de</strong> vida escapam aos<br />

princípios normativos, sejam eles morais ou<br />

jurídicos, porque a discriminação entre amigos<br />

e inimigos é existencialmente política e<br />

ontologicamente concreta. O antagonismo<br />

característico da existência humana é um<br />

comportamento estruturalmente polêmico e<br />

não uma norma universal:<br />

[...] na realida<strong>de</strong> concreta da existência<br />

política não reinam or<strong>de</strong>ns e normas<br />

abstratas, sen<strong>do</strong>, ao contrário, s<strong>em</strong>pre<br />

pessoas ou associações concretas que governam<br />

outras pessoas e associações concretas,<br />

também aqui, naturalmente, visto<br />

<strong>de</strong> uma perspectiva política, o ‘<strong>do</strong>mínio’<br />

da moral, <strong>do</strong> Direito, da economia e da<br />

‘norma’ possui apenas um senti<strong>do</strong> <strong>político</strong><br />

concreto. (SCHMITT, 2002a, p.72).<br />

Especificamente, <strong>Schmitt</strong> utiliza alguns<br />

termos, cuja análise é bastante significativa<br />

para o caso <strong>em</strong> questão. São as<br />

palavras seinsmäßig, maßgebend e nomos<br />

que pod<strong>em</strong> ajudar na compreensão <strong>do</strong> que<br />

significa a contraposição entre po<strong>de</strong>r e normas<br />

e sua dimensão existencial. Em vários<br />

textos, o autor utiliza a palavra seinsmäßig<br />

ou maßgebend e suas variações no senti<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>, respectivamente, algo conforme o ser e<br />

daquilo que dá a medida para o caso concreto.<br />

Por caso con creto, entenda-se uma<br />

situação existencial, na qual estão envolvidas<br />

gran<strong>de</strong>zas onto lógicas e históricas e<br />

não simplesmente lógicas ou normativas.<br />

Ao <strong>em</strong>pregar o adjetivo seinsmäßig, <strong>Schmitt</strong><br />

enfatiza sua compreensão <strong>do</strong> conflito <strong>político</strong><br />

e da unida<strong>de</strong> política como algo concreto e<br />

histórico <strong>em</strong> contraposição à algo apenas<br />

normativo (sollensmäßig). Da mesma forma,<br />

quan<strong>do</strong> <strong>em</strong>prega o adjetivo maßgebend, por<br />

ex<strong>em</strong>plo, na passag<strong>em</strong> a seguir, não quer se<br />

referir a uma gran<strong>de</strong>za normativa, isto é, algo<br />

abstrato e formal, mas sim a uma relação<br />

concreta que dá a medida: “aquilo que dá a<br />

medida continua sen<strong>do</strong> apenas a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sse caso <strong>de</strong>cisivo, <strong>do</strong> combate real,<br />

e a <strong>de</strong>cisão acerca se este caso está da<strong>do</strong> ou<br />

não” (SCHMITT, 2002a, p. 35), ou ainda:<br />

Político é, <strong>em</strong> to<strong>do</strong> caso, s<strong>em</strong>pre o agrupamento<br />

que se orienta pelo caso crítico.<br />

Destarte, ele é s<strong>em</strong>pre o agrupamento<br />

humano que dá a medida e, por conseguinte,<br />

a unida<strong>de</strong> política s<strong>em</strong>pre quan<strong>do</strong><br />

existe <strong>em</strong> absoluto, sen<strong>do</strong> a unida<strong>de</strong> que<br />

dá a medida e é “soberana” no senti<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong> que, por necessida<strong>de</strong> conceitual, a<br />

<strong>de</strong>cisão sobre o caso que dá a medida,<br />

mesmo quan<strong>do</strong> este for um caso <strong>de</strong> exceção,<br />

s<strong>em</strong>pre haverá <strong>de</strong> residir nela.<br />

(SCHMITT, 2002a, p.39).<br />

Ambas as passagens não <strong>de</strong>v<strong>em</strong> ser<br />

traduzidas como “normativo”, pois, <strong>de</strong>ssa forma,<br />

tornaria o texto cheio <strong>de</strong> inconsistências<br />

e contradições, uma vez que não é possível<br />

haver, por ex<strong>em</strong>plo, um caso excepcional<br />

que exija uma <strong>de</strong>cisão a partir da norma ou<br />

então um “agrupamento humano normativo”<br />

ou ainda a possibilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> caso <strong>de</strong>cisivo e<br />

a guerra como normativas. Para <strong>Schmitt</strong>, a<br />

guerra, a <strong>de</strong>cisão, a ord<strong>em</strong>, etc., são gran<strong>de</strong>zas<br />

históricas e concretas, b<strong>em</strong> como o <strong>político</strong><br />

e a unida<strong>de</strong> política são caracteriza<strong>do</strong>s<br />

como seinsmäßig e maßgebend, ou seja, o<br />

<strong>político</strong> “conforme o ser” e a unida<strong>de</strong> política<br />

“que dá a medida.” 6<br />

Para <strong>Schmitt</strong>, a palavra nomos, por sua<br />

vez, <strong>de</strong>signa “a apropriação da terra como<br />

participação e divisão fundamental <strong>do</strong> espaço.”<br />

(SCHMITT, 1997, p. 36). Nesse senti<strong>do</strong>,<br />

nomos seria o “ato originário que funda o<br />

direito” (SCHMITT, 1997, p.16), ou seja, o momento<br />

histórico concreto da constituição da<br />

ord<strong>em</strong> e da norma. Assim, o senti<strong>do</strong> original<br />

<strong>de</strong> nomos, que ele se esforça por recuperar,<br />

revela a íntima relação com o <strong>conceito</strong> <strong>de</strong><br />

espaço (Raum). Entretanto, diante <strong>do</strong> uso<br />

impróprio, a palavra nomos per<strong>de</strong>u seu sen-<br />

6 O Prof. Bernar<strong>do</strong> Ferreira expôs <strong>de</strong> forma lúcida a compreensão <strong>do</strong>s termos seinsmäßig e maßgebend nos textos <strong>de</strong> <strong>Carl</strong> <strong>Schmitt</strong> (cf.<br />

FERREIRA, 2004, p. 290-291).<br />

Ar g u m e n t o s , Ano 3, N°. 5 - 2011 171

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