As várias artes poéticas contemporâneas Fabiano ... - Jornal O Lince
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<strong>As</strong> <strong>várias</strong> <strong>artes</strong> <strong>poéticas</strong> <strong>contemporâneas</strong><br />
<strong>Fabiano</strong> Fernandes Garcez<br />
Discorrer sobre a produção poética contemporânea não é uma tarefa fácil. Dessa maneira, discorrer<br />
sobre a produção poética contemporânea, sem incorrer em erro, de qualquer espécie, é uma tarefa árdua.<br />
É quase impossível tentar “mapear” a poética contemporânea. Primeiro, devido ao grande número de<br />
poetas brasileiros, que, sobretudo após a internet, torna, a cada dia, a tarefa mais difícil; no entanto, alguns<br />
poetas ganham destaque nos meios de comunicação, na crítica ou na própria internet. Segundo, porque é<br />
extremamente difícil fazer uma análise de qualquer estrato do tempo em que estamos inseridos.<br />
Neste texto, tentarei apresentar os diversos tipos de <strong>poéticas</strong> existentes, mas não citarei nenhum poeta<br />
como representante, porque cada um carrega uma enorme palheta de diferentes influências, pois não é o<br />
objetivo do texto criar rótulos literários para a poesia contemporânea. <strong>As</strong>sim, prefiro fazer uma breve análise<br />
das <strong>várias</strong> tendências <strong>poéticas</strong> ou, como gostam alguns críticos, famílias <strong>poéticas</strong>, uma vez que essa<br />
separação, ou aglutinação de poeticidades, pode ser, no mínimo, enganosa, pois são raros os poetas que<br />
se mantêm em apenas um estilo de texto.<br />
Com isso, sem muitas idas e vindas, chamaremos de contemporânea toda a produção de poetas que<br />
publicaram após os anos de 1945 do século passado. Dessa forma, antes de apresentar esses estilos ou<br />
famílias <strong>poéticas</strong>, vejamos algumas definições do mais cultuado e conceituado crítico brasileiro, Antonio<br />
Cândido, que, em seu livro O estudo analítico do poema, define o emprego da palavra como imagem ou<br />
símbolo.<br />
A base de toda imagem, metáfora, alegoria ou símbolo é a analogia, isto é, a semelhança entre<br />
coisas diferentes. E aqui encontramos, no plano dos significados, um problema que já encontráramos no<br />
plano das sonoridades como sinestesia: o da correspondência. Com base na possibilidade de<br />
estabelecer analogias o poeta cria a sua linguagem, oscilando entre a afirmação direta e o símbolo<br />
hermético. Raramente o poema é feito apenas com um ou outro destes ingredientes polares, e na<br />
sequência dos versos somos capazes de notar a gradação que os separa. Muitas vezes, o elemento<br />
simbólico não está na peculiaridade das palavras, ou na seqüência de imagens, mas no efeito final do<br />
poema tomado em bloco. E em tudo observamos a capacidade peculiar de sentir e manipular palavras.<br />
(Cândido, 1993).<br />
<strong>As</strong>sim, tendo como base a figuração das palavras, Antonio Cândido aponta três tipos de poemas. Para o<br />
primeiro tipo, o poeta usa todas as palavras em seu sentido próprio, mas a combinação dessas palavras<br />
cria um conceito figurado.<br />
Pode, mesmo, dar-se o caso de o poeta não usar uma só palavra figurada, mas combinar de tal modo<br />
as palavras em sentido próprio, que elas se ordenam como um conceito figurado, uma realidade diversa<br />
do que as palavras exprimem em sentido próprio. [...] O sentido geral do poema é figurado, talvez um<br />
símbolo, enquanto o sentido de cada palavra é próprio. (Cândido, 1993).<br />
O segundo tipo é o que traz a maioria das palavras em sentido figurado, sendo usadas como imagens ou<br />
símbolos. Entretanto, mesmo as que estão em seu sentido próprio ganham valor de imagens simbólicas.<br />
<strong>As</strong>sim, todos esses símbolos são p<strong>artes</strong> de um todo no poema.<br />
Outro caso é o dos poemas em que praticamente todas as palavras são figuradas, embora umas se<br />
apresentem como tais, outras não. São usadas de modo que, mesmo sem parecerem imagens, sofrem<br />
uma alteração de significado, que vai resultar na alteração geral mencionada nos casos anteriores. […]<br />
Os demais apresentam realidades não figuradas, mas próprias. No entanto, a direção de mistério que<br />
orienta o poema faz com que cada palavra pareça figurada. O sentido figurado geral já esta prefigurado<br />
nestas palavras usadas como imagens sem o serem propriamente, pois todas são provavelmente<br />
símbolos. (Cândido, 1993).<br />
Logo, Cândido define a alegoria desta maneira:<br />
[...] alegoria, isto é, num tipo de linguagem figurada que, por meio da sequência das imagens, ou dos<br />
conceitos, resulta numa distorção geral do sentido. (Cândido, 1993).<br />
Além desses dois tipos de poemas, Antonio Cândido chama a atenção para um terceiro: aquele que traz<br />
em cada palavra, ou verso, um sentido figurado, mas o poema, como um todo, é claro e explícito.<br />
[...] temos um processo comum na poesia, que consiste em organizar logicamente, racionalmente, um<br />
pensamento poético que em si é ilógico, pois está baseado na alteração dos significados normais das
palavras. Resulta ao mesmo tempo, no fim do poema, um sentido geral claro e expressivo, e um sentido<br />
figurado em cada parte, ambos colaborando para o efeito poético total. (Cândido, 1993).<br />
Dessa maneira, nem é apenas de metáforas que se faz um poema. Com isso, Ezra Pound (1934-1972)<br />
indica três procedimentos básicos para sua criação:<br />
1) Melopeia: musicalidade dos versos a partir dos recursos sonoros e fonéticos, como o ritmo do poema,<br />
a aliteração, assonância, entre outros;<br />
2) Fanopeia: a criação de imagens por meio das palavras dos versos; é o apelo à imaginação visual do<br />
leitor;<br />
3) Logopoeia: é a criação da mensagem do poema; recursos lingüísticos intelectuais ou emocionais.<br />
Portanto, para a produção poética requer-se a manipulação da linguagem, e é por meio de recursos<br />
linguísticos do significante (palavra) e do significado (ideia) que o poeta cria, ou recria, o seu mundo,<br />
dialogando com ele. <strong>As</strong>sim, Décio Pignatari afirma que o poema é um ser de linguagem.<br />
O poema é um ser de linguagem. O poeta faz linguagem, fazendo poema. Está sempre criando e<br />
recriando a linguagem. Vale dizer: está sempre criando o mundo. Para ele, a linguagem é um ser vivo, O<br />
poeta é radical (do latim, radix, radicis = raiz): ele trabalha as raízes da linguagem. Com isso, o mundo<br />
da linguagem e a linguagem do mundo ganham troncos, ramos, flores e frutos. É por isso que um poema<br />
parece falar de tudo e de nada, ao mesmo tempo. É por isso que um (bom) poema não se esgota: ele<br />
cria modelos de sensibilidade. É por isso que um poema, sendo um ser concreto de linguagem, parece o<br />
mais abstrato dos seres. É por isso que um poema é criação pura — por mais impura que seja. É como<br />
uma pessoa, ou como a vida: por melhor que você a explique, a explicação nunca pode substituí-la. É<br />
como uma pessoa que diz sempre que quer ser compreendida. Mas o que ela quer mesmo é ser amada.<br />
(Pignatari, 2004).<br />
Entretanto, esse diálogo nem sempre é harmônico. Sobre isso, Roman Jakobson afirma:<br />
A poesia vive em conflito com o tempo e o pensamento e manifesta essa tensão na linguagem,<br />
construção estética que dialoga com a história, pessoal e coletiva, ao mesmo tempo em que afirma sua<br />
própria identidade como artefato artístico [...] (Toledo, 1971).<br />
Dessa forma, é essa construção estética que interessa ao nosso estudo. Se a poesia vive em conflito<br />
com tempo e o pensamento, como afirma Jakobson, de que forma a poesia brasileira sobrevive em uma<br />
sociedade capitalista de consumo?<br />
Sociedade esta que torna o homem anônimo, mais um em uma grande massa de manobra do sistema<br />
de capital. E esse homem está sem voz. A poesia tenta restaurar, nesse homem, a sua individualidade.<br />
Talvez seja por isso o visível aumento das publicações de poesia, por pequenas ou médias editoras;<br />
edições financiadas pelo próprio autor; suplementos; periódicos; e até mesmo publicações em vários<br />
formatos nos meios virtuais.<br />
Sobre essa produção poética contemporânea, o crítico Manuel da Costa Pinto afirma haver duas<br />
vertentes:<br />
Existem duas ideias sobre a poesia brasileira que são consensuais, a ponto de terem virado lugarescomuns.<br />
A primeira diz que um de seus traços dominantes é o diálogo cerrado com a tradição. Mas não<br />
qualquer tradição. O marco zero, por assim dizer, seria a poesia que emergiu com a Semana de Arte<br />
Moderna de 22. A segunda ideia, decorrente da primeira, é que essa linhagem modernista se bifurca em<br />
dois eixos principais: uma vertente mais lírica, subjetiva, articulada em torno de Mário de Andrade,<br />
Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade; e outra mais objetiva, experimental, formalista,<br />
representada por Oswald de Andrade, João Cabral de Melo Neto e a poesia concreta. (Pinto, 2004).<br />
O jornalista e poeta Rodrigo Garcia Lopes, em seu artigo “Muito além da academídia: Poesia brasileira<br />
hoje”, publicado na revista Coyote, fez severas críticas aos critérios adotados por Manuel da Costa Pinto:<br />
A presença de uma palavra como "consenso", logo na segunda linha de um livro que promete mostrar<br />
"a diversidade da nossa história poética e ficcional" (p. 10) é no mínimo perigosa. Como vimos com<br />
Noam Chomsky, o conceito de consenso, nas sociedades democráticas, é manufaturado, escamoteado,<br />
quase sempre para favorecer instituições (fundações, universidades, imprensa, academias, editoras) e<br />
os interesses dos grupos dominantes e hegemônicos da sociedade. A fabricação desse consenso se dá<br />
todos os dias, e a mídia é quem cuida disso, através de fórmulas prontas e muitas vezes subliminares. É<br />
a lógica do mercado interferindo na mente dos cidadãos. Ideias não são consensuais. São um campo de
atalha. A poesia não pode ser consensual, pois sua prática, idealmente, é ser não conformista. (Lopes,<br />
2005).<br />
Mais adiante, o doutor em literatura, Fábio Cavalcante de Andrade, estabelece quatro tendências:<br />
1. Poesia Marginal, surgida como resposta direta ao clima opressivo do regime militar, buscando<br />
espontaneidade e o retratismo do cotidiano político;<br />
2. Poesia Visual, herdeira e continuadora de determinados procedimentos do concretismo, bem<br />
como de outras vanguardas;<br />
3. Poesia de Renovação das formas tradicionais e do cotidiano, indicando obliquamente uma forte<br />
presença de <strong>poéticas</strong> como as de Drummond e Manuel Bandeira, mas onde também se pode encontrar<br />
certo classicismo;<br />
4. Poesia Hermética, acrescentando ao cânone brasileiro uma série de poetas difíceis, obscuros,<br />
apresentando ainda grande parentesco com valores da alta modernidade. (Andrade, 2008).<br />
Portanto, é sobre essas quatro tendências que tentarei discorrer, mesmo sabendo que toda e qualquer<br />
classificação é arbitrária e provisória, porém necessária para uma tentativa de mapear as <strong>várias</strong> linhas ou<br />
estilos da poética contemporânea.<br />
POESIA MARGINAL<br />
A poética denominada Marginal, também conhecida como geração mimeógrafo, nasceu nas décadas<br />
de 1970 e 1980, anos da ditadura militar. É uma poética engajada, rebelde e revolucionária, sem<br />
preocupações estéticas e de acentuada informalidade. Essa poética também é marcada pelos recortes do<br />
cotidiano. Heloísa Buarque de Hollanda, na antologia Esses Poetas, primeiro registro dessa poética, acaba<br />
inserindo a poética surrealista paulistana pautada pelo registro espontâneo às experiências com a escrita<br />
automática. Os poetas marginais participavam de todo o processo do livro, da criação, manufatura e venda.<br />
A este respeito, no prefácio da coletânea da segunda edição, Heloísa escreve:<br />
Frente ao bloqueio sistemático das editoras, um circuito paralelo de produção e distribuição<br />
independente vai se formando e conquistando um público jovem que não se confunde com o antigo leitor<br />
de poesia. Planejadas ou realizadas em colaboração direta com o autor, as edições apresentam uma<br />
face charmosa, afetiva e, portanto, particularmente funcional. Por outro lado, a participação do autor nas<br />
diversas etapas da produção e distribuição do livro determina, sem dúvida, um produto gráfico integrado,<br />
de imagem pessoalizada, o que sugere e ativa uma situação mais próxima do diálogo do que a oferecida<br />
comumente na relação de compra e venda, tal como se realiza no âmbito editorial. A esse propósito,<br />
convém lembrar a tão freqüente presença do autor no ato da venda o que de certa forma recupera para<br />
a literatura o sentido de relação humana. (Hollanda, 1998).<br />
POESIA VISUAL<br />
Essa poética é herdeira da vanguarda concretista, mais principalmente do poeta francês Mallarmé, e<br />
próxima das <strong>artes</strong> plásticas e dos meios tecnológicos. Faz a união entre a cultura pop, de massa, com a<br />
publicidade, a música, sobretudo o videoclipe. Poética que utiliza a escrita como elementos gráficos, além<br />
de outros recursos visuais, como as colagens, os grafismos e os diferentes alfabetos. Segundo o crítico e<br />
poeta Claudio Daniel, em seu artigo, “Pensando a Poesia Brasileira em Cinco Atos”, publicado na revista<br />
paranaense Coyote, é uma linguagem de futuro promissor, devido ao avanço tecnológico.<br />
É possível supor que, dentro de uma ou duas décadas, as novas gerações possam unir o<br />
conhecimento dos livros com o manejo tecnológico, tendo condições ideais para desenvolverem poemas<br />
interativos, aprofundando as propostas das vanguardas históricas. Será essa, porém, a única via para a<br />
experimentação poética? Ou é possível prosseguir com o ideal de invenção no poema-texto? (Daniel,<br />
2005).<br />
POESIA DE RENOVAÇÃO DAS FORMAS TRADICIONAIS E DO COTIDIANO<br />
Conforme descrito por Manuel da Costa Pinto, essa poesia está ligada ao cânone modernista,<br />
principalmente a dupla Bandeira e Drummond; é de uma vertente mais lírica e subjetiva da experiência da<br />
vida comum e cotidiana, também marcada por uma forte intertextualidade, e apresenta <strong>várias</strong> formas: a fixa<br />
(sonetos, odes etc.) ou a livre. É conhecida por geração 60, mesmo que alguns de seus representantes<br />
tenham publicado antes ou depois. Sobre essa vertente, Fábio Cavalcante afirma:
Na geração de 60 é possível reconhecê-los, aqueles que cultivaram o lirismo, através de formas fixas<br />
ou livres, ressaltando ou ocultando o sujeito lírico, e mantendo a experiência humana como fonte<br />
fundamental de suas inquietações e órbita incontornável do poema. Do ponto de vista técnico,<br />
apresentam diversidade e facilidade de locomoção entre registros formais diferentes. Do soneto a uma<br />
canção, dos versos livres à criação de novas formas fixas. Em todos, porém, sente-se a proximidade de<br />
uma experiência vital de vida, que não desaparece no formalismo de vanguarda nem na facilidade da<br />
expressão espontânea. Nem o fetiche da inovação nem a suposta liberdade do engajamento. São<br />
poetas responsáveis pela manutenção, ao longo de três décadas, do terreno literário, protegendo-o<br />
contra a infertilidade na qual muitos marginais caíram, e contra as experiências malogradas da<br />
vanguarda mais radical. (Andrade, 2008).<br />
POESIA HERMÉTICA<br />
Essa poética é chamada de hermética por apresentar uma linguagem elaborada, sem articulação léxica,<br />
por vezes obscura ou enigmática. Com isso, Fábio Cavalcante afirma:<br />
O Hermetismo poético é senão a principal, uma das principais formas da expressividade moderna,<br />
uma espécie de platonismo às avessas: quanto mais distante do retratismo, da mera cópia da realidade,<br />
mais verdadeiro aos olhos dos poetas. (Andrade, 2008).<br />
Essa poética ganha força a partir dos anos 1990. É herdeira de <strong>várias</strong> fases do Modernismo,<br />
principalmente das mais radicais e experimentais, como a poesia concreta; dos poetas João Cabral de Melo<br />
Neto e Murilo Mendes; dos poetas marginais; e também das culturas primitivas, orientais, bem como da<br />
cultura pop. Claudio Daniel, em seu artigo “Uma escritura na zona de sombra”, afirma:<br />
A diversidade de linhas de pesquisa e processos de criação, signo dinâmico da nova poesia, requer<br />
não o estático, mas o mutável, sem a hegemonia de uma única concepção, e aponta ainda em outras<br />
direções luminosas. O tempo exige <strong>poéticas</strong> em mandala, arco-íris, cauda de pavão, e desencasula<br />
formas e cores como um tapete marroquino [...].<br />
Os poetas atuais não comungam de um mesmo credo, mas têm como princípio básico a noção do<br />
poema como um elaborado artefato de linguagem — e não apenas isso. O meticuloso <strong>artes</strong>anato das<br />
palavras soma-se à investigação de novos repertórios simbólicos e culturais do Ocidente e do Oriente,<br />
da escritura e de outros códigos de expressão, de um passado remoto ou da atualidade — como<br />
resistência. (Daniel, 2000).<br />
O poeta e ensaísta continua sua afirmação e, em seu artigo “Geração 90: uma pluralidade de <strong>poéticas</strong><br />
possíveis”, divide essa poética em quatro grupos. São eles:<br />
NEOBARROCO – A POÉTICA DA “PÉROLA IRREGULAR”<br />
De elevado grau de elaboração de linguagem algumas similaridades formais, como o uso da<br />
metáfora, a riqueza imagética, as referências à pintura, à fotografia e ao cinema, o vocabulário erudito e<br />
a sintaxe fraturada, que não elimina o discurso, mas o redimensiona de maneira inventiva. São poemas<br />
que se afastam da espacialização gráfica e da fragmentação léxica do concretismo e também da<br />
linguagem coloquial e prosaica da “geração mimeógrafo”, aproximando-se de uma construção mais<br />
hermética ou barroquizante que exige do leitor uma cumplicidade de repertório e uma não menos árdua<br />
estratégia de leitura. O verso não é abolido, mas reconstruído para além da camisa-de-força da métrica e<br />
das facilidades oferecidas pelo verso livre, abrindo um campo de experimentação para a poesia<br />
enquanto elaboração verbal.<br />
MINIMALISMO – A POÉTICA DA ARQUITETURA CONCENTRADA<br />
A construção poética concisa, fragmentária, que condensa os recursos da linguagem e se choca com<br />
violência contra a sintaxe discursiva e a própria noção de verso define a tendência minimalista. O<br />
principal recurso estilístico utilizado por essa tendência é a metonímia, aliada à elipse, embora apareçam<br />
também metáforas de sabor surrealizante, que derivam dos tender buttons de Gertrude Stein. A esse<br />
respeito, Manuel da Costa Pinto fala em “justaposição de frases nominais, refratárias às correlações<br />
lógicas”, e ainda de uma “língua desconexa”.<br />
A POÉTICA DO FORMALISMO INFORMAL<br />
Incorpora elementos implícitos do cinema em suas próprias estruturas — cortes, fusões, sequências,<br />
closes, flashbacks, silêncios, ruídos (idem). A influência do cinema, da música popular, da filosofia
oriental, da mitologia beat e das histórias em quadrinhos é visível. São poetas que mesclam referências<br />
cultas às linguagens da comunicação de massa, explorando também o imaginário e as formas estéticas<br />
de culturas não ocidentais, como os mitos indígenas e a poesia chinesa e japonesa. O resultado desse<br />
sincretismo é uma poesia de dicção coloquial, melódica e fluente, com o uso eventual de rimas,<br />
aliterações e do verso longo, próximo à prosa, mas sem desprezar o uso espacial das linhas na página.<br />
A imagem é um elemento importante para a articulação do seu pensamento, com o uso de closes e<br />
cortes metonímicos para a descrição de cenários da natureza.<br />
ETNOPOESIA – A POÉTICA DA MISCIGENAÇÃO TRANSISTÓRICA<br />
A recriação de formas <strong>poéticas</strong> de culturas antigas e não ocidentais, como o oriki africano, o sijô<br />
coreano ou os cantos xamânicos de tribos esquimós corresponde a uma tendência conhecida como<br />
etnopoesia. (Daniel, 2008).<br />
Portanto, esta análise tem como propósito apresentar algumas das possibilidades <strong>poéticas</strong><br />
<strong>contemporâneas</strong>, porém sabendo de sua pluralidade criativa, e que essas possibilidades são e estão vivas,<br />
crescendo, metamorfoseando e frutificando-se, impossível de alocar-se em prateleiras estáticas<br />
reducionistas.<br />
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São Paulo: Perspectiva.<br />
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Cultrix, 1990.<br />
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DANIEL, Claudio. “Geração 90: uma pluralidade de <strong>poéticas</strong> possíveis”. In: Protocolos críticos. São Paulo:<br />
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set.-dez. 2000.<br />
OLIVEIRA, Solange Ribeiro de. “Do poema ao vídeo e à instalação: o poético nas <strong>artes</strong> <strong>contemporâneas</strong>”.<br />
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Fontes, 1991.<br />
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HOLLANDA, Heloisa Buarque de. 26 Poetas Hoje, (organização, 2ª edição) RJ, Aeroplano Editora, p. 270.<br />
RJ, 1998.<br />
___________._______________. Esses Poetas – uma antologia dos anos 90, (organização), p. 318.<br />
Aeroplano Editora, RJ, 1998.<br />
JAKOBSON, R. e TYNIANOV, J. “Os problemas dos estudos literários e linguísticos”. In: TOLEDO, Dionísio<br />
de Oliveira. (org.). Teoria da literatura — formalistas russos. Porto Alegre: Globo, 1971.<br />
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PIGNATARI, Décio. O que é comunicação poética. São Paulo, Ateliê Editorial, 2004.<br />
PINTO, Manuel da Costa. Literatura brasileira hoje. São Paulo: Publifolha, 2004.<br />
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Revista de estudos de literatura, 6. Poesia Brasileira Contemporânea. Faculdade de Letras da UFMG, CEL,<br />
1999, pp. 18-25.<br />
<strong>Fabiano</strong> Fernandes Garcez nasceu a 3 de abril de 1976, na cidade de São Paulo. Formou-se em Letras, é<br />
professor de língua portuguesa e redação, é autor dos livros: Poesia se é que há (2008) e Diálogos que
ainda restam (2010), participou das antologias: São Paulo Quatrocentona (2005) e Poemas que latem ao<br />
coração! (2009). Desenvolveu o Ateliê de poesia para a Casa de Cultura Tremembé. Palestra no I Fórum da<br />
Juventude: A ideologia do curinga – Um paralelo sobre a falta de ideologia da atual sociedade brasileira e o<br />
livro: O dia do curinga do autor norueguês Jöstein Gaarder; Palestra na Biblioteca Monteiro Lobato<br />
Guarulhos: A poesia contemporânea em debate. Jurado pela cidade de Guarulhos da fase municipal do<br />
Mapa Cultural Paulista – Edição 2009/2010 (Poesia).