Franciane Micheletto reúne Terceira Idade A benzedeira que ...
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ERCEIRA IDADE Fevereiro de 2013<br />
Uma <strong>benzedeira</strong> <strong>que</strong> também<br />
conserta guarda-chuva<br />
Muitas das dores de cabeça é mal olhado. Coisa de gente <strong>que</strong> tem inveja de você. Só sai com oração”<br />
or Clóvis de Almeida<br />
maioria dos jovens de hoje nunca foram<br />
idos contra "mal olhado", "ventre virado"<br />
spinhela caída". Nem sabem o <strong>que</strong> é isso.<br />
bém, grande parte dos mais velhos <strong>que</strong><br />
eram sendo benzidos pensam <strong>que</strong> as beniras<br />
não existem mais. Enganam-se!<br />
a Avenida Industrial, no Jardim Proso,<br />
mora a dona “Dica”, uma remanese<br />
das famosas <strong>benzedeira</strong>s do século<br />
ado. Essa vovó de 90 anos, <strong>que</strong> há mais<br />
inco décadas benze crianças e adultos<br />
sua “reza” para espantar doenças espiis.<br />
“Eu não curo, <strong>que</strong>m é cura é Deus,<br />
enino Jesus e a Virgem Maria”,<br />
nta ela.<br />
ona Dica faz o benzimento com<br />
amo de folhas verdes, apanhado<br />
a planta no quintal, um copo de<br />
e alguns fragmentos de carvão.<br />
ando o ramo verde molhado na<br />
diante a face do benzido, ela vai<br />
ndo sua oração <strong>que</strong> diz ter feito<br />
inspiração da Bíblia. “Pai nosso<br />
enino, Deus te leve em bom<br />
inho. Sete anjos te acompanha,<br />
velas te ‘alumeia’. Jesus Cristo<br />
padrinho, Virgem Maria sua<br />
rinha, <strong>que</strong> te ‘pois’ a cruz na testa pro<br />
ônio não te 'atentar'. Nem de dia, nem<br />
oite, nem na hora do ‘cê’ deitar”, ensina,<br />
anto benzia esse repórter.<br />
o mesmo tempo em <strong>que</strong> demonstra<br />
er em orar pelos <strong>que</strong> procuram suas benras,<br />
dona Dica, num rompante, diz <strong>que</strong><br />
arar de benzer. “É o dia todo gente me<br />
urando. Eu tenho <strong>que</strong> largar as coisas de<br />
pra atender. Tem dia <strong>que</strong> não consigo nem<br />
r almoço e nem comer direito”, reclama,<br />
contando nos dedos as 12 pessoas atendidas<br />
só na<strong>que</strong>le dia, até às cinco da tarde.<br />
Após encher um copo com água da torneira,<br />
ela coloca três pedrinhas de carvão<br />
<strong>que</strong> vão fundo. Explica <strong>que</strong> após benzer a<br />
água diante do benzido, o líquido é jogado<br />
fora para levar junto o mal olhado. “Muitas<br />
das dores de cabeça é mal olhado. Coisa de<br />
gente <strong>que</strong> tem inveja de você. Só sai com<br />
oração”, garante.<br />
Dona Dica, uma pioneira<br />
“Dica” é apenas o apelido dessa mineira<br />
de nome difícil <strong>que</strong> veio muito cedo com o<br />
marido João para o Paraná. Batizada como<br />
Izorádia Maria de Jesus, mora sozinha depois<br />
<strong>que</strong> ficou viúva, há poucos anos. Mãe de dez<br />
filhos, vovó Dica não se lembra a cidade de<br />
Minas onde nasceu. Se orgulha dos filhos <strong>que</strong><br />
tem, dentre eles, um barbeiro e um mecânico.<br />
“Todo ano eu tinha um filho. Nunca fui no<br />
médico e todos nasceram de parto normal, em<br />
casa, só com eu e Deus. Com tantos filhos, eu<br />
tive <strong>que</strong> aprender a benzer as crianças”, revela.<br />
Esse aprendizado levou dona Dica a benzer<br />
pessoas de fora da família. “Já atendi gente<br />
<strong>que</strong> chegou vomitando sangue e saiu, feliz,<br />
sorrindo, boazinha de tudo”, garante, lembrando<br />
<strong>que</strong> “<strong>que</strong>m cura é Deus, Jesus, Nossa<br />
Senhora e todos os santos” <strong>que</strong> ela ostenta<br />
figurados em dezenas de quadros espalhados<br />
por todas as paredes da casa de madeira.<br />
Calculando benzeduras<br />
Numa conta simples, atendendo a 10<br />
pessoas ao dia nos últimos 50 anos, significa<br />
<strong>que</strong> dona Dica já fez a oração do “Pai Nosso<br />
Pe<strong>que</strong>nino” em mais de 180 mil benzidos.<br />
Somados os ramos verdes, são algumas<br />
árvores inteiras, sem contar o carvão e os<br />
copos d’água, <strong>que</strong> não deixam de ser um<br />
prejuízo nas contas do mês, já <strong>que</strong> dona<br />
Dica nada cobra pelos benzimentos. “Eu<br />
não cobro nada. Não se pode cobrar por<br />
oração. Mas fico feliz por<strong>que</strong> as pessoas<br />
agradecem com doações e presentes. Não<br />
peço nada, mas aceito o <strong>que</strong> derem de<br />
bom coração”, avisa a <strong>benzedeira</strong>.<br />
Os pacientes da hora<br />
Quando nossa reportagem chegou<br />
à casa de dona Dica, a pe<strong>que</strong>na Maria<br />
Eduarda, de três anos de idade, estava<br />
recebendo o “benzimento” da vovó <strong>benzedeira</strong>.<br />
“Hoje é o segundo dia <strong>que</strong> trago<br />
ela para ser benzida. É mesmo uma benção,<br />
por<strong>que</strong> pra amanhecer ontem, a Maria Eduarda<br />
(foto) não dormiu a noite toda e ficava<br />
se debatendo e virando os olhos. Com o<br />
benzimento de ontem, essa noite ela dormiu<br />
<strong>que</strong> nem um anjo. Amanhã eu trago ela para<br />
completar os três dias necessários para tirar<br />
todo o mal olhado”, revela a mãe da menina,<br />
Daiane Cristina Pinto de Souza.<br />
Uma funcionária de uma grande indústria<br />
em Assis, <strong>que</strong> preferiu não ser identificada,<br />
6<br />
estava aguardando para receber o benzim<br />
de dona Dica contra uma dor de cabeça<br />
“Já fui benzida de outros problemas e é<br />
maravilha receber essa benção”, gara<br />
trabalhadora <strong>que</strong> também não quis ser<br />
grafada, temendo gozações dos companh<br />
de firma, em razão de preconceito<br />
Hora do conserto<br />
Viúva depois de 68 anos de casam<br />
dona Dica resolveu incrementar a aposen<br />
ria <strong>que</strong> recebe com um trabalho diferenc<br />
Ela conserta guarda-chuvas, um se<br />
<strong>que</strong> aprendeu com um vizinho. O es<br />
de guarda-chuva e sombrinhas “doen<br />
bastante grande, <strong>que</strong> ela espalha por tod<br />
cômodos da casa. Até no quarto de dorm<br />
peças aguardando reparos. “Eu não co<br />
nenhuma peça nova. Tiro de um pra p<br />
outro. De dois estragados faço um b<br />
assim vai”, conta ela, abrindo orgulhos<br />
sombrinha estampada <strong>que</strong> havia conse<br />
na manhã, antes do primeiro atendim<br />
de benzedura do dia. “Dinheiro nã<br />
não. Cobro só dois reais por conser<br />
reclama.