Franciane Micheletto reúne Terceira Idade A benzedeira que ...
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TERCEIRA IDADE Fevereiro de 2013 5<br />
A saga de um pioneiro solitário<br />
Zé Maria garante <strong>que</strong> conheceu os “jagunços”<br />
Por Clóvis de Almeida<br />
Rumo ao Paraná, o paulista<br />
José Maria deixou a<br />
cidade natal, Getulina, no<br />
fim dos anos 50. Depois de<br />
tentar a vida como peão em<br />
várias cidades e muitas tentativas<br />
de volta a São Paulo,<br />
acabou por fincar raízes em<br />
Assis Chateaubriand, em<br />
1967, mais precisamente<br />
na região do bairro Santa<br />
Rita, conhecido na<strong>que</strong>les<br />
tempos como “Pé de Galinha”.<br />
Derrubando mato<br />
Peão de profissão, já com<br />
38 anos de idade, veio para<br />
a lida no cabo da enxada,<br />
única formação <strong>que</strong> tem<br />
até hoje.<br />
Seu maior orgulho é ter<br />
participado da colonização<br />
do município, <strong>que</strong> se<br />
chamou primeiro Tupãssi.<br />
Se considera um verdadeiro<br />
pioneiro e cita nomes<br />
das primeiras famílias <strong>que</strong><br />
colonizaram essa <strong>que</strong> foi a<br />
última fronteira agrícola<br />
do estado. Fala também<br />
dos famosos jagunços <strong>que</strong><br />
permeiam nossa história,<br />
lembrando de pelo menos<br />
uns oito nomes. “Se aqui<br />
tinha jagunços? Minha<br />
Nossa Senhora, e como<br />
tinha! Derrubei muito<br />
mato aqui e conheci quase<br />
todos os jagunços; Narcisão,<br />
os irmãos Bigode,<br />
Tonho Baiano, Cláudio e<br />
muitos outros”, lembra.<br />
Ao falar de como eram<br />
esses personagens, Zé<br />
Maria faz <strong>que</strong>stão de dizer<br />
<strong>que</strong> eram todos “muito<br />
gente boa”. Ressabiado,<br />
conta <strong>que</strong> nunca soube<br />
de nenhuma maldade de<br />
nenhum deles. “Pra mim<br />
eles eram gente boa. Eu gostava<br />
muito deles. Mas tinha<br />
uma coisa: Se entrasse fora<br />
do sério, o bicho pegava...”,<br />
confessa.<br />
Enfim, Zé casado<br />
Depois de alguns anos<br />
resolveu arrumar uma<br />
companheira para encerrar<br />
os longos anos de solteiro<br />
e de solidão. “Arranjei uma<br />
doida <strong>que</strong> aceitou<br />
casar comigo. Vivemos 19<br />
anos, até <strong>que</strong> ela, sempre<br />
muito doente, morreu e<br />
me deixou sozinho novamente”,<br />
conta Zé Maria,<br />
lamentando não ter tido<br />
filhos com a esposa e nem<br />
com dois outros relacionamentos<br />
posteriores.<br />
Da segunda tentativa<br />
de ter uma mulher em<br />
casa, Zé Maria não tem<br />
saudades. “Com 15 dias<br />
morando comigo ela me<br />
colocou uma ‘galhada’ na<br />
cabeça, ‘pulando a cerca’<br />
com outro homem”, conta<br />
e dá gargalhadas, rindo da<br />
própria desgraça.<br />
Com a terceira com-<br />
panheira viveu oito anos.<br />
Sem contar por <strong>que</strong> não<br />
deu certo, o velho Zé não<br />
esconde as lágrimas nos<br />
olhos, afirmando <strong>que</strong> ainda<br />
sente saudades. “Eu não<br />
tenho vergonha de falar,<br />
eu gosto muito dela”, confirma.<br />
E os anos se foram<br />
Hoje, aos 75 anos de<br />
idade, cabeça branca e voz<br />
cansada, Zé Maria mora<br />
sozinho em um barraco <strong>que</strong><br />
ele mesmo construiu em<br />
um lote cedido temporariamente<br />
por um amigo.<br />
Com madeira e telhas<br />
de amianto recicladas, o<br />
pe<strong>que</strong>no casebre de um<br />
só cômodo não possui<br />
banheiro e nem privada<br />
no quintal. Para tomar<br />
banho, Zé Maria utiliza um<br />
balde. Sua privada é uma<br />
lata velha <strong>que</strong> ele mesmo<br />
explica como usa. “Faço na<br />
latinha e a noite eu jogo o<br />
‘serviço’ no mato. Vou fazer<br />
o quê? Não tem outro jeito”,<br />
ri novamente, constrangido<br />
e envergonhado por ter <strong>que</strong><br />
se submeter a tal situação,<br />
mas fazendo <strong>que</strong>stão de<br />
contar a verdade por necessitar<br />
de ajuda para resolver<br />
um problema por falta de<br />
recursos financeiros.<br />
Com a pe<strong>que</strong>na aposentadoria<br />
e uns biscates<br />
na limpeza de quintais,<br />
Zé Maria sobrevive para<br />
alimentos, água, roupas,<br />
remédios e o vício de fumar<br />
<strong>que</strong> aprendeu aos sete<br />
anos de idade. José Maria<br />
mantém a esperança de<br />
obter ajuda da comunidade,<br />
de uma empresa ou<br />
dos poderes constituídos<br />
para construir pelo menos<br />
uma privada ao lado do<br />
barraco.<br />
O "toba" do doutor<br />
De vez<br />
em quando,<br />
Zé Maria<br />
ainda toma<br />
uma cachacinha,<br />
mas<br />
o cigarro<br />
de palha<br />
é companheiroinsep<br />
a r á v e l ,<br />
garante ele.<br />
“Aprendi a fumar escondido<br />
do meu pai, catando<br />
‘bitucas’ pelas estradas.<br />
Um médico, certa vez, me<br />
disse <strong>que</strong> meu pulmão<br />
estava estragado por causa<br />
do fumo. Eu respondi <strong>que</strong><br />
estragado estava o ‘toba’<br />
dele”, gargalha novamente,<br />
esmurrando o peito para<br />
dizer <strong>que</strong> não sente dores<br />
nos pulmões, mas escancarando<br />
a ausência da dentadura<br />
superior, na espera<br />
de um auxílio também<br />
para recuperar os dentes<br />
perdidos.<br />
Providências - Nossa<br />
reportagem levou ao<br />
conhecimento da Secretaria<br />
Assistência Social, a<br />
situação do velho Zé Maria.<br />
Gentilmente atendido por<br />
a<strong>que</strong>la pasta, do governo<br />
municipal, fomos informados<br />
de <strong>que</strong> todas as<br />
providências possíveis por<br />
parte da prefeitura seriam<br />
tomadas para conhecer de<br />
perto a situação do idoso.<br />
“Estamos encaminhando<br />
um assistente social da<br />
Secretaria para verificar a<br />
situação e avaliar uma possível<br />
intervenção no caso,<br />
respeitando os costumes,<br />
valores e as reais necessidades<br />
de seu Zé Maria”,<br />
garantiu Janaina Helfenstein,<br />
diretora de Promoção<br />
Social do município.<br />
Janaina Helfenstein, diretora de<br />
Promoção Social do município