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Ruskin e o trabalho da arquitetura - Instituto de Arquitetura e ...

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pelo próprio José Mariano Filho<br />

já apontava o <strong>de</strong>sconhecimento<br />

<strong>da</strong>s ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras características<br />

<strong>da</strong> <strong>arquitetura</strong><br />

colonial brasileira, o empalhamento<br />

<strong>de</strong> suas formas em<br />

uma <strong>arquitetura</strong> <strong>de</strong> estufa, a<br />

incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> atualizar-lhe<br />

as soluções mais peculiares,<br />

em suma, <strong>de</strong> apreen<strong>de</strong>r-lhe<br />

“as boas lições” <strong>de</strong> simplici<strong>da</strong><strong>de</strong>,<br />

a<strong>da</strong>ptabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, horizontali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e funcionali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Cf. L. Costa, “Consi<strong>de</strong>rações<br />

sobre o nosso gosto e estilo”,<br />

in A Noite, Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

18/06/1924; I<strong>de</strong>m, “A Situação<br />

do Ensino <strong>da</strong>s Belas<br />

Artes” in O Globo, Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

29/12/1930.<br />

34 I<strong>de</strong>m, “Notas sobre a evolução<br />

do mobiliário luso-brasileiro”<br />

in Revista do Serviço<br />

do Patrimônio Histórico e Artístico<br />

Nacional, n.3, Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, Ministério <strong>da</strong> Educação<br />

e Saú<strong>de</strong>, 1939.<br />

35 J. B. Vilanova Artigas, “Os<br />

Caminhos <strong>da</strong> <strong>Arquitetura</strong><br />

Mo<strong>de</strong>rna” (1952), in Caminhos<br />

<strong>da</strong> <strong>Arquitetura</strong>, 4 ª ed.,<br />

São Paulo, Cosac Naify,<br />

2004, p.42.<br />

36 I<strong>de</strong>m, “O Desenho” (1967),<br />

in Caminhos <strong>da</strong> <strong>Arquitetura</strong>,<br />

op.cit., p.113.<br />

37 I<strong>de</strong>m, “Uma Falsa Crise”<br />

(1965), in, Caminhos <strong>da</strong> <strong>Arquitetura</strong>,<br />

op. cit., p.105.<br />

38 Lina Bo Bardi, “Um balanço<br />

<strong>de</strong>zesseis anos <strong>de</strong>pois” in<br />

Tempos <strong>de</strong> Grossura: o <strong>de</strong>sign<br />

no impasse, São Paulo,<br />

<strong>Instituto</strong> Lina Bo e Pietro<br />

Maria Bardi, 1994, pp.11-14.<br />

39 Sérgio Fer ro, O Canteiro e<br />

o Desenho, São Paulo, Projeto,<br />

1979, p.63.<br />

rsco<br />

4 2[2006<br />

este vinha atrasado, importado, pre<strong>da</strong>tório e sem<br />

planificação. A inexistência aqui <strong>de</strong> um ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro<br />

“artesanato como corpo social” é que impedia <strong>de</strong><br />

recomendá-lo como antídoto a uma mo<strong>de</strong>rnização<br />

<strong>de</strong> todo alheia à “civilização brasileira popular”,<br />

com suas riquezas antropológicas e tragédias<br />

históricas “ao alcance <strong>da</strong>s mãos”. Mais ain<strong>da</strong>, a<br />

revisão <strong>de</strong>ste estado periférico <strong>de</strong> “pré-artesanato”<br />

revelava as próprias “contradições do gran<strong>de</strong><br />

equívoco oci<strong>de</strong>ntal contemporâneo, com os traços<br />

violentos <strong>de</strong> uma situação falimentar”. O balanço<br />

<strong>da</strong> história recente do fazer nas artes integrava,<br />

assim, pela primeira vez, um programa <strong>de</strong> <strong>de</strong>smistificação<br />

do <strong>de</strong>sign contemporâneo, o que, para<br />

nós, <strong>de</strong> novo excluiria “as visões <strong>de</strong> <strong>Ruskin</strong> e<br />

Morris” 38 .<br />

Em nenhum momento, contudo, a divisão do<br />

<strong>trabalho</strong> na história do projeto mo<strong>de</strong>rno e do<br />

<strong>de</strong>senho industrial seria investiga<strong>da</strong> na seqüência<br />

<strong>de</strong> exclusões que operava, tema central do ensaio<br />

<strong>de</strong> <strong>Ruskin</strong>. Libera<strong>da</strong> dos compromissos <strong>de</strong> fundo<br />

com a racionali<strong>da</strong><strong>de</strong> técnica que autorizava tanto<br />

Costa quanto Artigas a sau<strong>da</strong>r uma suposta<br />

harmonização, pós-colonial e pós-artesanal, entre<br />

forma estática e função simbólica, nem mesmo Lina<br />

avançaria na explicação <strong>da</strong>s contradições peculiares<br />

ao <strong>trabalho</strong> <strong>da</strong> <strong>arquitetura</strong>. A contribuição <strong>de</strong> Sérgio<br />

Ferro neste ponto evoca o caminho prenunciado<br />

por <strong>Ruskin</strong>. Ain<strong>da</strong> que a fala tranquilizadora do<br />

velho medievalista <strong>de</strong>vesse ser <strong>de</strong>svia<strong>da</strong> para uma<br />

análise minuciosa <strong>da</strong>s engrenagens capitalistas <strong>da</strong><br />

arte e <strong>da</strong> técnica. Afinal o <strong>de</strong>senho corporificava a<br />

heteronomia do canteiro porque era o “caminho<br />

obrigatório para a extração <strong>de</strong> mais valia”. Na<br />

passagem do <strong>de</strong>senho que sugeria possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

ao bom artesão ao <strong>de</strong>senho analítico que coman<strong>da</strong>va<br />

o operário, a sua fenomenologia novamente implicaria<br />

em uma pergunta acerca <strong>da</strong> divisão: “O que<br />

constrange a história do <strong>de</strong>senho é a divisão<br />

<strong>de</strong>sigual do <strong>trabalho</strong> que avança – e seu outro<br />

polo, o acordo a ser imposto aos componentes<br />

produzidos pelos trabalhadores divididos. Por baixo,<br />

sorrateiramente, o império do valor coman<strong>da</strong> a<br />

reforma” 39 . Não haveria como avaliar corretamente<br />

o <strong>de</strong>senho, hierárquico, codificado, exclusivo, ca<strong>da</strong><br />

vez mais comprometido com a produção, sem<br />

questionar o lugar dos artesãos, mestres e operários,<br />

elos minoritários e ain<strong>da</strong> inevitáveis dos sistemas<br />

mo<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> representação. Se o ângulo <strong>da</strong> crítica<br />

<strong>Ruskin</strong> e o <strong>trabalho</strong> <strong>da</strong> <strong>arquitetura</strong><br />

é certamente outro, <strong>de</strong>purado <strong>de</strong> moralismo e<br />

profecia e eivado <strong>de</strong> marxismo, a preocupação com<br />

as relações recentes entre o canteiro e o <strong>de</strong>senho<br />

reenviava à perplexi<strong>da</strong><strong>de</strong> anterior dos coletivistas<br />

ingleses. A nostalgia organicista na base <strong>da</strong> crítica<br />

ruskiniana <strong>da</strong> separação como alienação; a sua<br />

estética <strong>da</strong> aspereza como expressão <strong>de</strong> uma ética<br />

<strong>da</strong> cooperação; reinseri<strong>da</strong>s neste arco temporal que<br />

vai <strong>da</strong> invenção <strong>da</strong> perspectiva à codificação do<br />

<strong>de</strong>senho industrial, <strong>de</strong> Miguelângelo a Niemeyer,<br />

não <strong>de</strong> todo <strong>de</strong>stoavam <strong>da</strong> severa con<strong>de</strong>nação do<br />

<strong>de</strong>spotismo do projeto em nome <strong>de</strong> uma nova<br />

poética <strong>da</strong> economia. Se não por outra razão, ao<br />

menos pelo que nos informam <strong>da</strong> i<strong>de</strong>ologia do<br />

arquiteto.<br />

Para o leitor brasileiro contemporâneo, é sintomático<br />

o <strong>de</strong>saparecimento <strong>de</strong> <strong>Ruskin</strong> como estágio obrigatório<br />

<strong>de</strong> enfrentamento <strong>da</strong>s questões fun<strong>da</strong>mentais<br />

<strong>da</strong> <strong>arquitetura</strong> na mo<strong>de</strong>rni<strong>da</strong><strong>de</strong>. Não que a sua<br />

obra tenha <strong>de</strong>ixado <strong>de</strong> suscitar qualquer interesse.<br />

Mas ele certamente se tornou menos incômodo.<br />

Não por acaso, na história <strong>da</strong> crítica <strong>de</strong> arte e <strong>da</strong><br />

<strong>arquitetura</strong> hoje ocupa o lugar <strong>de</strong> um clássico, chefe<br />

<strong>de</strong> fila <strong>de</strong> um movimento perfeitamente <strong>da</strong>tado,<br />

ain<strong>da</strong> que reanimado por outras duas ou três<br />

gerações seguintes <strong>de</strong> artistas e arquitetos. O fato<br />

é que entre as recusas e revisões <strong>de</strong> suas idéias, a<br />

posteri<strong>da</strong><strong>de</strong> profissional saberia enquadrá-lo muito<br />

bem em sua produtivi<strong>da</strong><strong>de</strong>: no campo do patrimônio,<br />

tornou-se incontestavelmente a principal<br />

referência <strong>de</strong> uma teoria <strong>da</strong> conservação; na prática<br />

projetual e <strong>de</strong> ambientação, um epígono dos estilos<br />

pitorescos e arts-&-crafts; na crítica, um mestre do<br />

culturalismo, em seu apreço pelo artesanal, o<br />

vernacular, o medieval e o regional; e mesmo nas<br />

pautas profissionais e políticas do inconformismo,<br />

passaria a autenticar um imaginário <strong>de</strong> evasão -<br />

anti-urbano ou cooperativista, naturalista ou comunitarista<br />

- não inteiramente <strong>de</strong>scartado pela marcha<br />

do capitalismo.<br />

Este <strong>trabalho</strong> <strong>de</strong> início não tinha maiores pretensões,<br />

senão a tradução <strong>de</strong> um texto <strong>de</strong> referência para<br />

uso <strong>de</strong> meus alunos <strong>de</strong> história <strong>da</strong> <strong>arquitetura</strong> no<br />

curso <strong>de</strong> graduação <strong>da</strong> Escola <strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong><br />

São Carlos. É importante recuperar a intenção<br />

primeira também para frisar meu reconhecimento<br />

ao colega Prof. Dr. Carlos Roberto Monteiro <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong>, que com o apoio <strong>da</strong> Pró-reitoria <strong>de</strong><br />

referência<br />

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