Memória e Cultura - Tribunal Superior Eleitoral
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<strong>Tribunal</strong> <strong>Superior</strong> <strong>Eleitoral</strong><br />
IV Encontro da Rede de Bibliotecas da<br />
Justiça <strong>Eleitoral</strong><br />
Palestra:<br />
<strong>Memória</strong> e <strong>Cultura</strong> – Uma experiência<br />
no interior de Minas Gerais<br />
Palestrantes:<br />
Jacinto Guerra<br />
Mineiro de Bom Despacho. Bacharel em Letras pela<br />
UFMG, com pós-graduação em Administração<br />
Educacional e cursos de Extensão Universitária na<br />
UnB e na Universidade de Évora, Portugal.<br />
Professor e escritor com várias obras publicadas,<br />
entre os quais JK – Triunfo e Exílio −um estadista<br />
brasileiro em Portugal;.O gato de Curitiba –<br />
crônicas de viagem, Uma casa navega no mar –
contos, crônicas e pequenos ensaios − e Gente de<br />
Bom Despacho – histórias de quem bebe água da<br />
Biquinha.<br />
Foi pesquisador do Memorial JK, assessor da<br />
Secretaria de <strong>Cultura</strong> do Distrito Federa e secretário<br />
de <strong>Cultura</strong> e Turismo de Bom Despacho-MG. Em<br />
sua terra natal, organizou o Conselho Municipal do<br />
Patrimônio <strong>Cultura</strong>l e é um dos fundadores do<br />
Museu da Cidade e da Biblioteca Municipal.<br />
Guerra<br />
Nilce Coutinho<br />
Mineira de Tapiraí. Estudou em Belo Horizonte, no<br />
Instituto de Educação e na Escola Guignard,<br />
formando-se em Educação Artística pelas UnB, em<br />
Brasília. Como professora, lecionou em diversas<br />
cidades de Minas Gerais − Tapiraí, Bom Despacho,<br />
Patos de Minas e Belo Horizonte − e no Distrito<br />
Federal.<br />
Como escritora, publicou a coleção Baú de<br />
Brincadeiras, com os livros Palavra de Saci,<br />
Vamos brincar, criança e Como brincar e fazer<br />
brinquedos, editados em Brasília, pela Thesaurus,<br />
com incentivo do Fundo de Apoio à <strong>Cultura</strong>-<br />
FAC/Governo do Distrito Federal. Participou de<br />
duas antologias organizadas pelo escritor Ronaldo<br />
Cagiano: Antologia do Conto Brasiliense (Projecto
Editorial) e Todas as Gerações − o conto brasiliense<br />
contemporâneo(LGE Editora).<br />
Artista plástica, realizou e participou de exposições<br />
de arte em Brasília, Minas Gerais e Vila Verde,<br />
Portugal. Fez diversos cursos de Museologia<br />
promovidos pelo Ministério da <strong>Cultura</strong>. Idealizou,<br />
organizou e dirige o Museu da Cidade, em Bom<br />
Despacho, Minas Gerais.<br />
<strong>Memória</strong> e <strong>Cultura</strong> – Uma experiência no<br />
interior 1<br />
de Minas Gerais<br />
Jacinto Guerra e Nilce Coutinho<br />
As bibliotecas, os arquivos e os museus são<br />
instituições que preservam e divulgam o patrimônio<br />
cultural de uma cidade e de um povo, de maneira<br />
sistemática, técnica e científica. Temos uma<br />
experiência interessante na organização e no<br />
desenvolvimento da Biblioteca Municipal e do<br />
Museu da Cidade, instituições onde começa a nascer<br />
o Arquivo Público da pequena Bom Despacho, no<br />
interior de Minas Gerais.
Carlos Drummond de Andrade, com a lucidez e a<br />
beleza de sua prosa poética, lembra que<br />
“Nos livros, estamos todos nós, está a humanidade,<br />
estão os registros de tudo que somos, que amamos,<br />
que esperamos, que queremos transmitir ao futuro”.<br />
O que o poeta encontra nos livros podemos,<br />
também, ver nos arquivos e nos museus, instituições<br />
que se modernizam e começam a usar os mais<br />
avançados recursos da tecnologia em benefício da<br />
cultura e da educação.<br />
Como disse o poeta Tiago de Melo, “o futuro<br />
começa na manhã que nasce”. A ideia de presente e<br />
futuro se manifesta com muita força em nosso<br />
conceito de Museu. Vemos o museólogo como um<br />
educador moderno, entusiasmado com a arte, a<br />
ciência, a cultura e os desafios do conhecimento. Em<br />
sua concepção mais atual, ele deve ser, ao mesmo<br />
tempo, um pesquisador, um comunicador e um<br />
educador criativo, interessado sempre em aprender e<br />
divulgar os valores da cultura.<br />
2<br />
Na medida do possível, utilizando recursos e<br />
linguagens modernas, o Museu é o guardião de<br />
peças, objetos e documentos que comprovam as<br />
conquistas do homem através dos tempos. Tanto o<br />
museólogo como os educadores que atuam nos
museus devem estudar e conhecer o passado numa<br />
relação dinâmica com o presente. E seu objetivo é o<br />
futuro, com as exigências cada vez maiores de<br />
domínio dos conhecimentos e das técnicas que<br />
construíram as civilizações.<br />
Ao visitar um Museu, o cidadão entra num universo<br />
da arte e do conhecimento. Nesse fantástico<br />
ambiente, ele aprende e pode ter a oportunidade de<br />
ensinar, porque nenhum educador ou profissional de<br />
um museu domina todos os aspectos do<br />
conhecimento, principalmente nas áreas específicas<br />
da experiência pessoal e profissional de cada um.<br />
Podemos dizer que, no Museu, estudamos,<br />
aprendemos e, também, nos divertimos, com as<br />
curiosidades da ciência, da história e do folclore.<br />
Ao enriquecer sua experiência pessoal, quando visita<br />
um Museu, o estudante, o turista ou o morador da<br />
cidade adquire novos conceitos e diferentes formas<br />
de ver, sentir e analisar informações. É o momento<br />
mágico, em que o visitante entra no espaço onde a<br />
Educação e a <strong>Cultura</strong> se encontram no grande abraço<br />
com a realidade e o sonho daquilo que o homem foi<br />
capaz de aprender, criar e desenvolver.<br />
3<br />
Um objeto exposto, apenas um objeto, pode<br />
despertar ideias mil, provocar uma série infinita de
indagações capazes de levar a novas pesquisas na<br />
busca incessante do saber e da cultura. A visita a um<br />
Museu pode, ainda, determinar vocações, estimular a<br />
criatividade, abrir caminhos novos na direção do<br />
futuro. Um Museu pode e, quando possível, deve<br />
incentivar e desenvolver vocações para áreas<br />
diversas do trabalho e da realização pessoal. É o seu<br />
grande encontro com a Educação que se realiza não<br />
apenas na família e na Escola, mas, também, nas<br />
instituições sociais e seus instrumentos de<br />
comunicação que, hoje, surpreendem e encantam o<br />
homem moderno.<br />
Em sua concepção moderna, o Museu deve ser um<br />
espaço de beleza e de cultura, a serviço da educação.<br />
O Museu é um fascinante território da emoção,<br />
sobretudo para a criança, em seu amanhecer na<br />
busca do universo, mas também para homens e<br />
mulheres de todas as idades, das elites e do povo.<br />
Todos, enfim, são tocados pelo fascínio de um<br />
Museu bem organizado, bonito e representativo da<br />
cultura e das conquistas de um povo.<br />
Costuma haver uma forte identificação entre o<br />
visitante e a peça ou documento que ele vê e admira<br />
na vitrine de um Museu. Esta interação de olhar,<br />
sentir, captar e obter respostas é um lúdico e<br />
interessante aprendizado, relembrança de coisas que<br />
se encontravam adormecidas em sua memória. Isto
se enquadra na educação e integra os espaços da<br />
cultura.<br />
Chegamos agora ao Museu da Cidade, que<br />
organizamos em Bom Despacho, no interior de<br />
Minas Gerais. Estamos numa cidade de porte médio,<br />
menos de 50 mil habitantes , com o seu casario<br />
espalhado por três colinas históricas, que têm como<br />
sua acrópole o Alto da Cruz do Monte, de onde, nos<br />
fins do século XVIII, os colonizadores portugueses<br />
encantaram-se com a imensidade e a beleza de seus<br />
horizontes.<br />
4<br />
É uma cidade e um município que possui<br />
interessante potencial turístico, com a bela Igreja<br />
Matriz de N. Sra do Bom Despacho, em estilo neogótico,<br />
a Vila Militar, de arquitetura inglesa do<br />
início do século XX e outras atrações, entre elas o<br />
próprio Museu da Cidade e o Museu Ferrroviário<br />
com sua Maria Fumaça, uma locomotiva belamente<br />
restaurada. Suas casas antigas, de estilo simples, dão<br />
lugar aos altos edifícios. Na zona rural, existem<br />
pedreiras e algumas cavernas inexploradas, além de<br />
antigos garimpos de cristal, que deram origem a uma<br />
florescente indústria de produtos com pedras semipreciosas<br />
de boa aceitação no mercado internacional<br />
e nas cidades turísticas do Brasil.
Um encanto para os visitantes são as cachoeiras rio<br />
Lambari – e lá, mais adiante, as águas do rio São<br />
Francisco ainda próximas de suas nascentes na<br />
vizinha Serra da Canastra..Há criação de gado, que<br />
os portugueses trouxeram das ilhas de Cabo Verde.<br />
Na cultura de Bom Despacho, existe influência de<br />
antigos colonos e imigrantes europeus e orientais<br />
que vieram de países diversos, principalmente<br />
Portugal, Espanha, Itália, Alemanha, Áustria e<br />
Líbano.<br />
Vigorosa é a nossa cultura popular de origem<br />
africana, com o Reinado de N. Sra. do Rosário e a<br />
chamada Língua da Tabatinga, idioma afroportuguês,<br />
que se transformou em tese universitária,<br />
depois no livro “Pé preto no barro branco”, da<br />
professora Sônia Queiroz, Universidade Federal de<br />
Minas Gerais. Esta curiosa língua começa a ser<br />
utilizada na literatura e nas empresas e roteiros de<br />
turismo, como um valioso diferencial de cultura.<br />
5<br />
Em Bom Despacho, o Museu da Cidade, que hoje é<br />
uma referência importante da museologia no interior<br />
de Minas, surgiu do sonho de um casal de<br />
educadores do ensino público em fazer pela<br />
Educação e a <strong>Cultura</strong> algo mais do que ministrar<br />
suas aulas, promover oficinas, organizar exposições<br />
ou administrar uma escola.
Nesse fazer um pouco mais para seus alunos e a<br />
comunidade, instituíram, em 1964, a Biblioteca<br />
Municipal, com apoio da Prefeitura, que lutava com<br />
dificuldades enormes, até para instalar o gabinete do<br />
Prefeito, mas que abraçou a ideia, adotando como<br />
lema da nova instituição uma frase muito conhecida<br />
de Monteiro Lobato:”Um país se faz com homens e<br />
livros”.<br />
No ano seguinte, 1965, organizamos um pequeno<br />
Museu Municipal, anexo à Biblioteca. Apesar de<br />
todas as dificuldades, principalmente a falta de<br />
espaço adequado, além de recursos financeiros e<br />
humanos, foi possível desenvolver a Biblioteca e o<br />
Museu, em razão do apoio de um prefeito<br />
entusiasmado com a cultura: o Dr. Roberto de Melo<br />
Queiroz, que faleceu em 1999, com 75 anos. Foi ele<br />
a primeira personalidade da Vitrine da <strong>Memória</strong>,<br />
projeto que o Museu da Cidade instituiu em 2007.<br />
com a finalidade de “promover ações de educação,<br />
arte e cultura em homenagem a cidadãos que, pelo<br />
seu exemplo de vida e de trabalho, contribuíram para<br />
construir o edifício social da comunidade”.<br />
6<br />
Merecedor de todas as homenagens, Roberto de<br />
Melo Queiroz foi um grande brasileiro do interior de<br />
Minas,“uma das mais notáveis personalidades da
Bom Despacho contemporânea, em razão de seu<br />
espírito público, sua generosidade e sua atuação em<br />
áreas diversas do desenvolvimento econômico e<br />
social de sua terra”.<br />
No entanto, o Museu que fundamos em 1965<br />
desapareceu quase completamente no início dos<br />
anos 1970, quando, por razões profissionais,<br />
mudamos de Bom Despacho para Patos de Minas.<br />
Enquanto a Biblioteca desenvolveu-se em<br />
decorrência de sua grande utilidade para os<br />
professores e estudantes, o Museu, que tinha um<br />
acervo interessante e bem organizado, esvaziou-se<br />
por completo, porque a cidade, muito pequena<br />
naquela época, não possuía, principalmente no<br />
exercício do poder público, lideranças mais<br />
interessadas em cultura, muito menos em<br />
Museologia.<br />
35 anos depois, em 1997, após reunir novas e ricas<br />
experiências nas áreas da Educação e da <strong>Cultura</strong>, em<br />
Belo Horizonte e em Brasília, estávamos de volta a<br />
Bom Despacho, com muitas ideias e sonhos. É<br />
interessante lembrar que, mesmo nos tempos em que<br />
residimos em outras cidades, continuamos com<br />
nossa presença na vida cultural de Bom Despacho,<br />
escrevendo, planejando e desenvolvendo projetos de<br />
interesse para a cidade, algumas vezes tropeçando,<br />
caindo, mas levantando, de novo, “caminhando e
semeando”, como diz Cora Coralina num de seus<br />
inspirados poemas.<br />
7<br />
Estávamos, com isto, preparando o terreno para<br />
outras iniciativas, principalmente a mais fascinante<br />
delas: o Museu da Cidade. Como a primeira<br />
experiência de um Museu Municipal não deu certo,<br />
criamos a Associação Museu da Cidade (AMC) que<br />
se tornou a instituição mantenedora da nova unidade<br />
museológica. Nosso Museu tem uma frase-símbolo,<br />
que vem de um poema de Carlos Drummond de<br />
Andrade: “Depois da cidade, o mundo; depois do<br />
mundo, as estrelas”.<br />
Organizado e mantido com apoio da Prefeitura, que<br />
cede o espaço para o Museu e alguns funcionários, o<br />
Museu da Cidade (MdC) tem suas atividades de<br />
planejamento, administração e desenvolvimento de<br />
projetos, sob a responsabilidade de pequeno grupo<br />
de voluntários que atuam, principalmente sob nossa<br />
orientação técnica. Desde o ano 2000, fazemos isto,<br />
como moradores de Brasília, usando a internet e o<br />
telefone, além de viagens periódicas no eixo<br />
Brasília-Bom Despacho, para desenvolver um<br />
trabalho que, para nós, é a realização de um projeto<br />
de vida.
Isto nos custa tempo e dinheiro, as dificuldades não<br />
são poucas, mas é muito gratificante ajudar uma<br />
cidade a caminhar para o futuro, sobretudo em<br />
setores fundamentais para o seu desenvolvimento.<br />
Acreditamos, com isto, que estamos ajudando a<br />
construir um Brasil melhor para as novas gerações.<br />
É uma pedra muito pequena que estamos colocando<br />
nas paredes que se erguem para a modernidade do<br />
Brasil, mas que tem a sua importância como<br />
exemplo do que cada um pode fazer em beneficio de<br />
uma grande Nação, ideia e sonho maior de<br />
Tiradentes e de seus companheiros da Inconfidência<br />
Mineira.<br />
Além da Vitrine da <strong>Memória</strong>, que se consolidou<br />
imediatamente como um projeto de reconhecido<br />
alcance educacional, o Museu da Cidade desenvolve<br />
outras iniciativas importantes, em articulação com a<br />
Secretaria Municipal de <strong>Cultura</strong> e Turismo,<br />
principalmente a Exposição de Arte Infantil de Bom<br />
Despacho, projeto que iniciamos em 1989, bem<br />
antes da criação do Museu.<br />
8<br />
Inspirados em eventos desta natureza, já realizados<br />
no Japão, na Argentina e na antiga Tchecoslováquia,<br />
pesquisados no Ministério da <strong>Cultura</strong>, realizamos<br />
naquele ano, 1989, a I Exposição de Arte Infantil de
Bom Despacho, reunindo mais de mil trabalhos de<br />
crianças de todas as regiões do Brasil.<br />
Com isto, Bom Despacho foi a primeira cidade<br />
brasileira a promover uma Exposição Nacional de<br />
Arte Infantil. Para divulgar a Expoarte, conseguimos<br />
em Brasília os endereços das Secretarias de<br />
Educação e de <strong>Cultura</strong> de todos os Estados, assim<br />
como dos jornais que abriam espaços para a cultura<br />
em todo o País. Muito antes do fax, do computador e<br />
da internet chegarem a Bom Despacho, este grande<br />
esforço de uma cidade pequena chamou a atenção da<br />
Secretaria da <strong>Cultura</strong> de Minas Gerais que editou um<br />
belo catálogo da nossa Exposição.<br />
As Exposições de Arte Infantil movimentam as<br />
escolas e as colocam em sintonia com o Museu, no<br />
intercâmbio das visitas guiadas, com agendamento<br />
prévio e pesquisa dos professores, tendo em vista um<br />
bom aproveitamento no processo do ensinoaprendizagem.<br />
Para realizar a Expoarte Infantil, o<br />
MdC prepara um regulamento que incentiva a<br />
criatividade, a originalidade e o aprimoramento<br />
estético dos trabalhos, apresentando temáticas e<br />
técnicas diversificadas, o que leva às crianças a<br />
experiência de novas formas de criação artística.<br />
9
Com um número sempre elevado de participantes,<br />
fica muito difícil expor todos os trabalhos, por falta<br />
de espaço no Museu e outras instituições culturais da<br />
cidade. Como as crianças e suas famílias fazem<br />
questão de ver os trabalhos em exposição, o MdC<br />
orienta as escolas para que, também, organizem sua<br />
Mini-Exposição de Arte Infantil.<br />
A Expoarte Infantil e as visitas escolares ao Museu<br />
constituem as iniciativas mais importantes do<br />
Projeto Museu-Escola. Ainda não conseguimos<br />
alcançar nossos grandes objetivos nesta área, mas<br />
estamos caminhando nesta direção. Em 1989,<br />
promovemos aquela Exposição de Arte Infantil que<br />
teve caráter nacional e reuniu trabalhos de todas as<br />
regiões do País, registrando-se bela participação de<br />
Brasília, Goiás, Amazônia, Nordeste, Santa<br />
Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, de Minas,<br />
naturalmente – e. até mesmo do Rio de Janeiro.<br />
Depois disto, as Exposições passaram a ser<br />
regionais. e municipais. Por ocasião da Expoarte<br />
Infantil, tivemos dificuldades quando vimos que<br />
famílias de participantes de lugares distantes ,<br />
inclusive de Brasília e do Espírito Santo, desejam<br />
visitar a cidade, que ainda não tinha as condições<br />
mínimas para bem receber turistas.<br />
Pretendemos, agora, promover em 2010 uma<br />
expoarte regional, abrangendo 50 municípios do<br />
Alto São Francisco, preparando-se para uma
exposição nacional, em 2011, culminando em 2012,<br />
centenário da cidade, com a I Mostra Internacional<br />
de Arte Infantil de Bom Despacho; um sonho<br />
possível com a internet e alguns apoios que<br />
esperamos conseguir, inclusive da Unesco, tendo em<br />
vista os projetos que estamos elaborando. No âmbito<br />
local, o evento perdeu expressão, porque as próprias<br />
escolas passaram a promover suas exposições de arte<br />
infantil, o que representa um êxito de nossa<br />
iniciativa no Museu da Cidade. Com isto, vamos<br />
agora procurar horizontes mais amplos na região, no<br />
país e no mundo.<br />
10<br />
Nesta mesma linha, realizamos anualmente a Mostra<br />
de Arte da Juventude e, em 1999, coordenamos a<br />
participação de jovens artistas da cidade na Bienal<br />
de Arte Jovem de Vila Verde, no Minho, Portugal,<br />
com seus trabalhos expostos ao lado de outros da<br />
Espanha, França e Alemanha. Desenvolvemos outras<br />
ações desta natureza, lembrando a saga dos<br />
colonizadores que vieram daquela província, nos<br />
fins do século XVIII, e povoaram vasta região de<br />
Minas Gerais, inclusive o sítio onde se edificou a<br />
pequena aldeia que se transformou na moderna Bom<br />
Despacho, hoje conhecida como a cidade da Senhora<br />
do Sol.
Outro evento de grande sucesso, há mais de 10 anos,<br />
é o Concurso de Presépios de Bom Despacho, que<br />
mobiliza toda a cidade na preservação da mais bela<br />
das tradições do mundo cristão. Para se ter uma ideia<br />
da importância e do alcance deste evento, basta dizer<br />
que ele chegou a ser divulgado pela Rádio Vaticano,<br />
a emissora do Papa, conforme as cópias do noticiário<br />
arquivadas no Museu como um documento<br />
importante do nosso trabalho. Além dos presépios<br />
tradicionais, incentivamos os presépios criativos,<br />
tendo em vista possibilitar e incentivar artesãos e<br />
artistas a usarem sua criatividade a partir dos<br />
recursos naturais e disponíveis ao seu lado, no meio<br />
ambiente em que vivem, criando, a partir da arte,<br />
uma fonte nova de trabalho, de renda, de inclusão<br />
social.<br />
Nosso objetivo em pesquisas de campo vai além da<br />
procura de documentação histórica do homem<br />
urbano e rural, que realizamos com o Projeto<br />
Garimpeiro da <strong>Memória</strong>, iniciativa do engenheiro<br />
Ítalo Coutinho Agora seguimos, também, na direção<br />
da Arqueologia, com a descoberta de grandes vasos<br />
de cerâmica pré-colombiana, além de outros<br />
vestígios da presença, na região, de habitantes<br />
primitivos. Eram ainda caçadores e coletores, que<br />
viveram antes do aparecimento da agricultura.<br />
Diante disso, entramos em contato com o IPHAN de<br />
Minas Gerais, para conseguir a colaboração de<br />
arqueólogos, tendo em vista a ampliação das
pesquisas e a datação exata dos achados<br />
arqueológicos, cujos estudos preliminares estimam<br />
sua idade em mais de 1500 anos.<br />
11<br />
Para encerrar, lembramos que, em 1999, ao visitar<br />
Bom Despacho, o então Secretário de <strong>Cultura</strong> de<br />
Minas Gerais, Ângelo Oswaldo de Araújo, hoje<br />
prefeito de Ouro Preto, registrou em uma carta<br />
dirigida a Nilce Coutinho Guerra, que “uma das<br />
características mais interessantes do Museu da<br />
Cidade é a diversidade de seu acervo, que sinaliza<br />
perspectivas empolgantes”.<br />
De fato, nesse Museu, algumas surpresas aguardam,<br />
principalmente os turistas, que poderão conhecer<br />
registros da cultura afro-brasileira como a<br />
mencionada Língua da Tabatinga, bairro de<br />
descendentes quilombolas e o trabalho das<br />
Lavadeiras da Biquinha, que constituem saberes e<br />
conhecimentos do patrimônio imaterial da nossa<br />
cultura.<br />
Os estudos de Sônia Queiroz têm repercussão<br />
internacional e, nos meios universitários, a<br />
Tabatinga, periferia da cidade, chega a ser mais<br />
conhecida que a própria Bom Despacho. Quem<br />
deseja conhecer melhor o assunto poderá ler, na<br />
internet, em sites do Brasil e de Portugal, o conto-
ensaio “Uma língua afro-portuguesa em Bom<br />
Despacho”, de Jacinto Guerra. Para isto, basta<br />
acessar no Google o título do trabalho e o nome do<br />
autor.<br />
Outro registro importante no MdC é o Reinado ou<br />
Festa do Rosário, uma tradição de 200 anos,<br />
festividade religiosa e folclórica que o Correio<br />
Braziliense, em matéria da jornalista Paloma<br />
Olivetto, relaciona entre as mais belas festas<br />
populares do interior do Brasil.<br />
O Museu possui peças muito antigas como um<br />
tronco de madeira petrificada há milhões de anos,<br />
encontrada em Brotas, no interior de São Paulo e<br />
doada ao Museu pelo empresário Julio Benigno<br />
Fernández – cidadão argentino que foi presidente da<br />
AMC- Associação Museu da Cidade –, além de duas<br />
grandes igaçabas ou urnas cerâmicas précolombianas,<br />
encontradas na região com tampa e<br />
ossos humanos. A primeira, em 1991, na Fazenda<br />
Indaiá, imediações da cidade, e a outra, em 2009, na<br />
região da Extrema, perto do rio São Francisco. No<br />
ano 2000, a Igaçaba da Fazenda Indaiá, um dos<br />
primeiros bens culturais tombados pelo Conselho do<br />
Patrimônio <strong>Cultura</strong>l de Bom Despacho, participou<br />
em Belo Horizonte, no Palácio das Artes. da Grande<br />
Exposição dos 500 anos do Brasil, promovida pelo<br />
Ministério da <strong>Cultura</strong>.
12<br />
Destacam-se, ainda, na exposição permanente do<br />
Museu da Cidade os antigos projetores do Cine<br />
Regina, importados da Holanda, peças que<br />
despertam grande interesse pelo fascínio que o<br />
cinema exerce e porque equipamentos<br />
cinematográficos são muito raros em museus<br />
brasileiros.<br />
O visitante poderá, também, conhecer e admirar,<br />
obras interessantes do artesanato de Bom Despacho<br />
e de Vila Verde, Portugal, especialmente o Lenço<br />
dos Namorados, outra raridade em museus do Brasil<br />
e uma bela tradição da província do Minho,<br />
sobretudo na aldeia de Aboim da Nóbrega.<br />
Ainda de Vila Verde, existem fotos e informações<br />
sobre o famoso Santuário de Nossa Senhora do Bom<br />
Despacho, na freguesia de Cervães, uma das mais<br />
belas e antigas igrejas barrocas do mundo.<br />
Completando seu pequeno mas expressivo acervo de<br />
peças e objetos de outros países, podemos conhecer<br />
obras do Peru, da Bolívia, da Grécia e dos Estados<br />
Unidos. Mas não se pode falar sobre Bom Despacho<br />
e seu patrimônio cultural sem lembrar da “Biquinha<br />
de nossos avós e de todos nós”, como disse a Nilce,<br />
um lugar mágico, cantado em prosa e verso por<br />
várias gerações e imortalizado num provérbio muito<br />
popular naquelas paragens de Minas Gerais: “Quem
ebe água da Biquinha nunca mais esquece Bom<br />
Despacho”.<br />
Mas, para encerrar nossa conversa com um toque de<br />
poesia, vamos a Lisboa antiga encontrar o poeta<br />
Fernando Pessoa a dizer; ‘Da minha aldeia vejo<br />
quanto da terra se pode ver no Universo.../ Por isso a<br />
minha aldeia é tão grande como outra qualquer./<br />
Porque eu sou do tamanho do que vejo e não do<br />
tamanho da minha altura.”