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Sobre as Ciências Sociais - FEP - Universidade do Porto

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Carlos Pimenta Complexidade e Interdisciplinaridade n<strong>as</strong> Ciênci<strong>as</strong> <strong>Sociais</strong> Versão 02<br />

Para terminar est<strong>as</strong> breves considerações um comentário adicional: para a interdisciplinaridade ajudar<br />

a uma melhor leitura da complexidade é necessário que ela seja a interdisciplinaridade de uma<br />

nova disciplinaridade.<br />

Relembremos o que anteriormente dissemos sobre o trabalho de Durlauf 56 . A conclusão que retiramos,<br />

não apen<strong>as</strong> pelo que ele diz, m<strong>as</strong> pela análise crítica da Ciência Económica que se pratica, é que a<br />

interdisciplinaridade entre a Economia e qualquer outra ciência (Sociologia? Psicologia? Antropologia?<br />

...) só é susceptível de reflectir a complexidade, se cada uma d<strong>as</strong> ciênci<strong>as</strong> intervenientes também o fizer.<br />

A “multi-referencialidade” poderá ser relativamente captada através <strong>do</strong> encontro de diversos referenciais<br />

teóricos, m<strong>as</strong> a complexidade, ou a consciência da complexidade exige um trabalho prévio ao nível de<br />

cada uma d<strong>as</strong> disciplin<strong>as</strong>.<br />

Na Economia o interveniente nos modelos não são os indivíduos m<strong>as</strong> os agentes económicos,<br />

entenden<strong>do</strong>-se estes como os “indivíduos” exercen<strong>do</strong> uma certa função tipo. Esta situação condiciona a<br />

leitura que se faz daqueles. A diversidade de característic<strong>as</strong> e comportamentos <strong>do</strong>s indivíduos – “La<br />

pluralité humaine est la para<strong>do</strong>xe pluralité d’êtres uniques” (Arendt, in Bellefleur, 2002, 127) – não<br />

permite que ignoremos a pluralidade e os consideremos iguais. Cada um de nós é a síntese d<strong>as</strong> relações<br />

sociais (actuais e p<strong>as</strong>sad<strong>as</strong>, culturais, económic<strong>as</strong>, polític<strong>as</strong> e outr<strong>as</strong>), universalmente caldead<strong>as</strong> n<strong>as</strong><br />

especificidades d<strong>as</strong> relações de vizinhança e institucionais, e d<strong>as</strong> idiossincr<strong>as</strong>i<strong>as</strong> que a liberdade humana<br />

permite manifestar, provavelmente tanto mais fortes quanto a sociedade em que vivemos, ou o grupo<br />

social a que pertencemos, nos permite p<strong>as</strong>sar d<strong>as</strong> estratégi<strong>as</strong> de sobrevivência às decisões plen<strong>as</strong> como<br />

cidadãos e indivíduos. Considerar exclusivamente o homem como o produto histórico de uma sociedade<br />

ou a sociedade exclusivamente como a soma de indivíduos iguais são diferentes postur<strong>as</strong> teóric<strong>as</strong> que<br />

conduzem a uma simplificação artificial <strong>do</strong>s “factos económicos”.<br />

O “agente económico” não é um homem económico com um conjunto de característic<strong>as</strong> pré-definid<strong>as</strong>,<br />

ainda por cima b<strong>as</strong>tante distanciad<strong>as</strong> da realidade, negad<strong>as</strong> pelos estu<strong>do</strong>s da Psicologia Económica.<br />

Também não é um agente representativo cujos resulta<strong>do</strong>s da sua acção já estão conti<strong>do</strong>s nos pressupostos<br />

da sua representatividade. É certo que numa certa medida est<strong>as</strong> simplificações contribuíram para o<br />

aparecimento da Economia Política, promoven<strong>do</strong> uma certa descodificação <strong>do</strong>s comportamentos<br />

humanos, ajustan<strong>do</strong> os modelos interpretativos às capacidades cognitiva então existentes, m<strong>as</strong> hoje<br />

estamos em condições de reconhecer <strong>as</strong> limitações de tais análises e procurar rumos alternativos. Temos<br />

que aban<strong>do</strong>nar os protótipos. A nossa atenção pode concentrar-se n<strong>as</strong> médi<strong>as</strong> estatístic<strong>as</strong>, m<strong>as</strong> não pode<br />

esquecer ou subvalorizar <strong>as</strong> diferenç<strong>as</strong>, pois est<strong>as</strong> são o âmago. Antes pelo contrário 57 .<br />

M<strong>as</strong> substituir a semelhança pela diferença não se faz por adaptação de modelos. Faz-se construin<strong>do</strong><br />

modelos radicalmente diferentes. O ceteris paribus perde operacionalidade tenden<strong>do</strong> a ser envia<strong>do</strong> para o<br />

cesto d<strong>as</strong> velhari<strong>as</strong>. Conceitos tão queri<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s economist<strong>as</strong> como “utilidade marginal”, “equilíbrio”,<br />

“optimização”. “óptimo de Pareto”, “oferta”, “procura”, “merca<strong>do</strong>”, “comportamento racional”,<br />

“preferência revelada”, “custo de oportunidade”, e muitos, muitos outros, têm que ser objecto de uma<br />

crítica radical, quiçá aban<strong>do</strong>na<strong>do</strong>s.<br />

Certamente que entre os modelos estático-compara<strong>do</strong>s e os dinâmicos; entre os paradigm<strong>as</strong> ultraliberais e<br />

os institucionalist<strong>as</strong> ou os marxist<strong>as</strong>; entre os pressupostos da racionalidade olímpica e os da<br />

racionalidade limitada de Simon; entre a optimização de ofelimidades de agentes universalmente<br />

semelhantes e a teoria <strong>do</strong>s jogos; entre a grande diversidade de leitur<strong>as</strong> e modelos que atravessam a<br />

Economia 58 haverá uns que são mais adequa<strong>do</strong>s que outros, há uns que conterão conceitos que são mais<br />

importantes que outros.<br />

Será escusa<strong>do</strong> perguntarem-me quais devem ser <strong>as</strong> característic<strong>as</strong> desses modelos, pois não saberei<br />

acrescentar muito mais <strong>do</strong> que afirmei anteriormente sobre a diversidade social, a diversidade<br />

institucional, a diversidade individual, logo a diversidade de ser e existir <strong>do</strong>s “agentes económicos”. Será<br />

escusa<strong>do</strong> perguntarem-me quais <strong>as</strong> b<strong>as</strong>es para esse novo tipo de modelos económicos pois terei<br />

dificuldade em ir além da justificação da importância d<strong>as</strong> lógic<strong>as</strong> alternativ<strong>as</strong> que hoje possuímos 59 e da<br />

reafirmação já feita por Bachelard de que o cartesianismo não será adequa<strong>do</strong> ao estu<strong>do</strong> da<br />

complexidade. 60<br />

Admito mesmo que estejamos nos primórdios de uma nova era em que nos falte ainda descobrir como<br />

lidarmos com a totalidade e que tem que haver uma árdua caminhada de aproximação entre a<br />

matematização <strong>do</strong> económico e a sensibilidade social da linguagem matemática.<br />

Pág. 21

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