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Acesse a íntegra do voto de vista do Dr. Randolpho Gomes

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VOTO DE VISTA NA INDICAÇÃO 041/2010<br />

Relatório<br />

O ilustra<strong>do</strong> ex-presi<strong>de</strong>nte <strong>do</strong> Instituto <strong>do</strong>s<br />

Advoga<strong>do</strong>s Brasileiros, <strong>Dr</strong>. CELSO DA SILVA SOARES, formulou a indicação<br />

cujo número encima este <strong>voto</strong>, manifestan<strong>do</strong> sua apreensão ante <strong>de</strong>cisões<br />

judiciais que vêm sen<strong>do</strong> tomadas, cercean<strong>do</strong> a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa,<br />

impon<strong>do</strong> censura velada, após a <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral<br />

que, em julgamento <strong>de</strong> Ação <strong>de</strong> Cumprimento <strong>de</strong> Preceito Obrigatório,<br />

julgou não acolhida pelo or<strong>de</strong>namento constitucional vigente a Lei Fe<strong>de</strong>ral<br />

5.250/67, que dispunha sobre a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> manifestação <strong>do</strong><br />

pensamento e da informação.<br />

Após citar exemplos recentes <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>scumprimento <strong>do</strong> preceito maior da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> manifestação <strong>do</strong><br />

pensamento e <strong>de</strong> sua veiculação pela imprensa, emana<strong>do</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões<br />

judiciais, conclui que a <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> STF:<br />

"...teria <strong>de</strong>ixa<strong>do</strong>, enquanto o Legislativo não aprova uma<br />

lei que a substitua - como temia em seu <strong>voto</strong> divergente o<br />

Ministro Marco Aurélio - um vácuo que fez crescer o po<strong>de</strong>r<br />

discricionário <strong>do</strong>s juízes <strong>de</strong> primeira instância, levan<strong>do</strong> ao<br />

incremento da chamada censura prévia judicial mediante<br />

interpretações <strong>do</strong> art. 21 <strong>do</strong> Código Civil que afetam a<br />

liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa."<br />

Tal conclusão foi formulada pelo ilustre indicante<br />

como indagação ao Instituto <strong>do</strong>s Advoga<strong>do</strong>s Brasileiros, para que se<br />

<strong>de</strong>bruçasse sobre o tema e formulasse uma solução. A indicação foi


encaminhada à Comissão Permanente <strong>de</strong> Direito Constitucional e lá distribuída<br />

para relato à Eminente Consócia Leila Maria Bittencourt da Silva.<br />

A culta Relatora redigiu seu brilhante parecer,<br />

submeteu-o ao colegia<strong>do</strong> da Comissão Constitucional, on<strong>de</strong> foi acolhi<strong>do</strong> e,<br />

posteriormente, o trouxe à consi<strong>de</strong>ração <strong>do</strong> Plenário <strong>de</strong>sta Casa. Conclui a<br />

Relatora seu opinamento com o seguinte enuncia<strong>do</strong>:<br />

" Resta hoje, após a ADPF n. 130, uma imprensa<br />

liberta das amarras <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, conforme ensejo <strong>do</strong><br />

constituinte <strong>de</strong> 1988 ao erigir uma Constituição que<br />

<strong>de</strong>volveu ao povo sua real <strong>de</strong>stinação <strong>de</strong>mocrática.<br />

Conclusão: Conflitos entre liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa e<br />

vida privada são resolvi<strong>do</strong>s em concreto, sob critérios<br />

objetivos, e não subjetivos <strong>de</strong> quem julga. Decisões<br />

judiciais são vinculadas à lei e à Constituição. Or<strong>de</strong>m<br />

jurídica brasileira é suficiente na solução <strong>de</strong> conflitos entre<br />

liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Imprensa e direito à vida privada. Aplicação<br />

correta <strong>do</strong> art. 21 <strong>do</strong> Código Civil não constitui censura<br />

prévia."<br />

Em que pese a erudição <strong>do</strong> <strong>do</strong>uto parecer, ouso<br />

discordar <strong>de</strong> sua conclusão, motivo que me levou a pedir <strong>vista</strong> da matéria.<br />

VOTO<br />

Sem sombra <strong>de</strong> dúvida, subsistia, como um<br />

penduricalho <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> ditatorial, a Lei 5.250, <strong>de</strong> 09.02.67. Sua<br />

incompatibilida<strong>de</strong> com a nova or<strong>de</strong>m constitucional vigente a partir <strong>de</strong> 1988 era<br />

patente. Destarte, foi <strong>de</strong> muita felicida<strong>de</strong> a propositura da Ação <strong>de</strong><br />

Cumprimento <strong>de</strong> Preceito Constitucional pelo Parti<strong>do</strong> Democrático Trabalhista,<br />

sob o patrocínio <strong>do</strong> Deputa<strong>do</strong> Miro Teixeira, advoga<strong>do</strong> e jornalista, <strong>de</strong><br />

insuspeitadas formação e convicção <strong>de</strong>mocráticas. Outras iniciativas são<br />

esperadas no senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> total remoção <strong>do</strong> entulho autoritário, epíteto que se


emprestou à legislação incompatível com a Carta <strong>de</strong> 1988, <strong>de</strong> que serve <strong>de</strong><br />

exemplo a ainda vigente Lei <strong>de</strong> Segurança Nacional<br />

Elogiável, também, seu acolhimento pelo Egrégio<br />

Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, quan<strong>do</strong> julgou totalmente proce<strong>de</strong>nte o pedi<strong>do</strong><br />

abriga<strong>do</strong> na ação referida. Vale <strong>de</strong>stacar os seguintes excertos da conclusão<br />

<strong>do</strong> julga<strong>do</strong>:<br />

"Aplicam-se as normas da legislação comum,<br />

notadamente o Código Civil, o Código Penal, o Código<br />

<strong>de</strong> Processo Civil e o Código <strong>de</strong> Processo Penal às<br />

causas <strong>de</strong>correntes das relações <strong>de</strong> imprensa. O direito<br />

<strong>de</strong> resposta, que se manifesta como ação <strong>de</strong> replicar ou<br />

<strong>de</strong> retificar matéria publicada é exercitável por parte<br />

daquele que se vê ofendi<strong>do</strong> em sua honra objetiva, ou<br />

então subjetiva, conforme estampa<strong>do</strong> no inciso V <strong>do</strong> art.<br />

5º da Constituição Fe<strong>de</strong>ral. Norma, essa, "<strong>de</strong> eficácia<br />

plena e <strong>de</strong> aplicabilida<strong>de</strong> imediata", conforme<br />

classificação <strong>de</strong> José Afonso da Silva. "Norma <strong>de</strong> pronta<br />

aplicação", na linguagem <strong>de</strong> Celso Ribeiro Bastos e<br />

Carlos Ayres Britto, em obra <strong>do</strong>utrinária conjunta.<br />

PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. Total procedência da ADPF,<br />

para o efeito <strong>de</strong> <strong>de</strong>clarar como não recepciona<strong>do</strong> pela<br />

Constituição <strong>de</strong> 1988 to<strong>do</strong> o conjunto <strong>de</strong> dispositivos da<br />

Lei Fe<strong>de</strong>ral nº 5.250, <strong>de</strong> 09. <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1967." (Grifos<br />

nossos).<br />

Anote-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, que enten<strong>de</strong>u o S.T.F.<br />

serem aplicáveis para a solução das questões oriundas da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

imprensa, as normas <strong>do</strong> direito comum, exemplifican<strong>do</strong> com os Códigos<br />

Civil, Penal, Processual Civil e Processual Penal. Não <strong>de</strong>clarou, em<br />

momento algum, que fossem os aludi<strong>do</strong>s códigos as únicas regras das


quais <strong>de</strong>verão se valer os opera<strong>do</strong>res <strong>do</strong> direito, referin<strong>do</strong>-se, em primeiro<br />

lugar, à legislação comum. Quais seriam, no entanto, tais coman<strong>do</strong>s<br />

legais? Já existem eles em nosso acervo legislativo? São necessários para<br />

a solução <strong>do</strong>s conflitos? Que natureza <strong>de</strong>vem ter? Estas são as questões<br />

<strong>de</strong> fun<strong>do</strong> da indicação, a nosso ver irrespondidas a contento pelo <strong>do</strong>uto<br />

parecer, que se limita a advogar a aplicação <strong>do</strong>s referi<strong>do</strong>s códigos,<br />

contrarian<strong>do</strong> até a recomendação <strong>do</strong> Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, quan<strong>do</strong><br />

alu<strong>de</strong> aquele pretório, em primeiro lugar, à legislação comum,<br />

nomean<strong>do</strong>, como exemplo, os codicis menciona<strong>do</strong>s.<br />

As normas hoje contidas nos Códigos Civil e Penal<br />

e em suas correspon<strong>de</strong>ntes disposições codificadas <strong>de</strong> natureza adjetiva<br />

não dizem respeito a regras assecuratórias <strong>do</strong> exercício da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

imprensa; cuidam <strong>do</strong>s eventuais abusos <strong>de</strong>ssa liberda<strong>de</strong>, dan<strong>do</strong><br />

instrumentos aos prejudica<strong>do</strong>s para cobrar suas consequências, seja na<br />

or<strong>de</strong>m civil, seja na esfera penal. É o <strong>de</strong> que tratam os artigos 21 <strong>do</strong><br />

Código Civil e aqueloutros <strong>do</strong> Código Penal, quan<strong>do</strong> tipifica os crimes<br />

contra a honra, contra a violação da intimida<strong>de</strong> ou da privacida<strong>de</strong>.<br />

Destarte, no que tange à repressão aos abusos eventualmente cometi<strong>do</strong>s<br />

sobre o pálio da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa, aí sim, não há mais necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> qualquer legislação. Até mesmo o direito <strong>de</strong> resposta foi erigi<strong>do</strong> pelo<br />

STF em condição autônoma para a propositura <strong>de</strong> ação reivindican<strong>do</strong>-o<br />

<strong>do</strong>s ofensores.<br />

Mas, o que dizer da proteção ao exercício da<br />

ativida<strong>de</strong> jornalística, <strong>de</strong> suas prerrogativas, <strong>do</strong> resguar<strong>do</strong> da integrida<strong>de</strong><br />

física e intelectual <strong>de</strong> seus agentes, <strong>do</strong>s atenta<strong>do</strong>s à circulação <strong>de</strong> livros e


periódicos, da censura velada ou expressa, da preservação <strong>do</strong> sigilo das<br />

fontes? Há normas que <strong>de</strong> tais percalços protejam a imprensa? É<br />

forçoso concluir que não! Essa é a legislação <strong>de</strong> que carecemos e cuja<br />

necessida<strong>de</strong> foi <strong>de</strong>clarada pela própria <strong>de</strong>cisão <strong>do</strong> STF. O Ministro Ayres<br />

<strong>de</strong> Brito, em seu relatório e <strong>voto</strong>, não <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> alertar:<br />

"Logo, não cabe ao Esta<strong>do</strong>, por qualquer <strong>do</strong>s seus<br />

órgãos, <strong>de</strong>finir previamente o que po<strong>de</strong> ou o que não<br />

po<strong>de</strong> ser dito por indivíduos e jornalistas. As matérias<br />

reflexamente <strong>de</strong> imprensa, suscetíveis portanto, <strong>de</strong><br />

conformação legislativa, são as indicadas pela própria<br />

Constituição, tais como: direitos <strong>de</strong> resposta e <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nização proporcionais ao agravo; proteção <strong>do</strong><br />

sigilo da fonte; ... ... in<strong>de</strong>pendência e proteção<br />

remuneratória <strong>do</strong>s profissionais <strong>de</strong> imprensa como<br />

elementos <strong>de</strong> sua própria qualificação técnica,<br />

composição e funcionamento <strong>do</strong> Conselho <strong>de</strong><br />

Comunicação Social (art. 224 da Constituição)<br />

Não necessita a sistemática jurídica nacional <strong>de</strong><br />

novas regras cercea<strong>do</strong>ras da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa. Precisa <strong>de</strong> normas<br />

protetoras. Assim, afastem-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, os sucessivas intentos <strong>do</strong><br />

Po<strong>de</strong>r Executivo <strong>de</strong> por freio à mídia em geral, através da criação <strong>de</strong><br />

"Conselhos" ou <strong>de</strong> "Agências Regula<strong>do</strong>ras", ainda que utilizan<strong>do</strong> a<br />

previsão <strong>de</strong> regulamentação <strong>do</strong> chama<strong>do</strong> Conselho <strong>de</strong> Comunicação<br />

Social, pre<strong>vista</strong> no art. 224 da Carta Maior. Tais órgãos, cria<strong>do</strong>s e dirigi<strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong> cima para baixo, reforçariam o cerceio à liberda<strong>de</strong>, submeten<strong>do</strong>-a a


obstáculos repeli<strong>do</strong>s pelo art. 5º, incisos IV, IX e XIV da Constituição da<br />

República.<br />

Constate-se que a Carta Magna, quan<strong>do</strong><br />

enunciou o direito <strong>de</strong> resposta, a proteção à honra, à privacida<strong>de</strong> e à<br />

intimida<strong>de</strong>, criou, em seu próprio texto, os mecanismos para coibir os<br />

abusos, instituin<strong>do</strong> o direito <strong>de</strong> formulação da réplica e <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong><br />

in<strong>de</strong>nizações pelos danos morais ou materiais produzi<strong>do</strong>s. É o que se lê<br />

da <strong>íntegra</strong> <strong>do</strong>s incisos V e X <strong>do</strong> menciona<strong>do</strong> art. 5º.<br />

Não se <strong>de</strong>clarou porém, quan<strong>do</strong> ofendi<strong>do</strong>s os<br />

incisos IV, IX e XIV, que meios ou recompensas teriam os prejudica<strong>do</strong>s<br />

para por cobro aos ataques sofri<strong>do</strong>s. Tais dispositivos, portanto, carecem<br />

<strong>de</strong> regulamentação em lei, pois, embora autoaplicáveis por princípio,<br />

po<strong>de</strong>m se tornar inócuos ou sujeitos a interpretações subjetivas <strong>do</strong>s<br />

aplica<strong>do</strong>res <strong>do</strong> direito.<br />

E não é esdrúxula tal regulamentação. O sistema<br />

jurídico nacional já a contempla. Analise-se o princípio conti<strong>do</strong> no art. 133<br />

da Constituição: "O advoga<strong>do</strong> é indispensável à administração da justiça,<br />

sen<strong>do</strong> inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão,<br />

nos limites da lei."<br />

Que seria <strong>de</strong>ssa indispensabilida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ssa<br />

inviolabilida<strong>de</strong> não houvesse a completá-la a Lei Fe<strong>de</strong>ral institui<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />

Estatuto <strong>do</strong>s Advoga<strong>do</strong>s? As prerrogativas seriam ditadas pela<br />

jurisprudência? Em cada caso concreto o juiz seria chama<strong>do</strong> a dizer se o


ato ofen<strong>de</strong>u ou não a indispensabilida<strong>de</strong> ou a inviolabilida<strong>de</strong> <strong>do</strong> causídico?<br />

E se o ofensor for o próprio juiz, como amiú<strong>de</strong> soe acontecer? Quem<br />

<strong>de</strong>cidiria o conflito?<br />

O princípio da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa não conta<br />

com a proteção legislativa que merece. Apenas foi <strong>de</strong>clara<strong>do</strong> na<br />

Constituição, mas não se criaram mecanismos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa em face das<br />

ofensas granjeadas, nem se instituíram punições a<strong>de</strong>quadas aos<br />

agesssores. A faina jornalística se <strong>de</strong>s<strong>do</strong>bra em várias ativida<strong>de</strong>s. Há o<br />

colunista, o comentarista, o repórter, o editor, o redator-chefe, <strong>de</strong>ntre<br />

outros. Os campos <strong>de</strong> atuação também se espraiam: <strong>do</strong> jornalismo <strong>de</strong><br />

diversão, social, <strong>de</strong> lazer, das reportagens <strong>de</strong> rua até o jornalismo<br />

investigativo, que exige <strong>de</strong> seu ator coragem pessoal, <strong>de</strong>spreendimento,<br />

discernimento e, sobretu<strong>do</strong>, proteção e garantia, não só para sua<br />

integrida<strong>de</strong> física, como para seus arquivos e fontes. Não há lei que tal<br />

assegure. O suprimento jurispru<strong>de</strong>ncial é insuficiente e perigoso e não foi<br />

sequer recomenda<strong>do</strong> pelo STF para a solução <strong>do</strong>s conflitos advin<strong>do</strong>s das<br />

relações <strong>de</strong>correntes da imprensa. Ao contrário, o eminente Ministro<br />

Relator da ACPF 130, em recentíssima entre<strong>vista</strong>, alerta:<br />

"O Po<strong>de</strong>r Judiciário está se comportan<strong>do</strong> <strong>de</strong> forma<br />

sau<strong>do</strong>sista. Não como um to<strong>do</strong>. Há nichos que<br />

parecem laborar no passa<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> a Lei 5.204<br />

estava em vigor, a mal-afamada Lei <strong>de</strong> Imprensa. A Lei<br />

<strong>de</strong> Imprensa, autoritária, consagra<strong>do</strong>ra <strong>de</strong> um projeto<br />

<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e inimiga da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa. Ela foi<br />

sepultada <strong>de</strong> ponta a ponta, não sobrou nada, pedra


sobre pedra. E uma parte <strong>do</strong> Judiciário parece não<br />

enten<strong>de</strong>r isso." (O GLOBO, 27.11.2010, pág. 12).<br />

Não é <strong>de</strong>mais aduzir que é inóspita a tendência<br />

que se manifesta em alguns setores, sobretu<strong>do</strong> judiciais, <strong>de</strong> dar à<br />

jurisprudência e aos prece<strong>de</strong>ntes força tão gran<strong>de</strong>, equivalente ou até<br />

superior à lei. Tal procedimento teria legitimida<strong>de</strong> on<strong>de</strong> vigora o sistema<br />

da "common law", sen<strong>do</strong> imprópria on<strong>de</strong> se a<strong>do</strong>ta o "statute law". Esse<br />

<strong>de</strong>feito, abram-se parêntesis, é um <strong>do</strong>s que pa<strong>de</strong>ce o projeto <strong>de</strong> Código <strong>de</strong><br />

Processo Civil em <strong>de</strong>bate, como bem alertou em sua exposição perante<br />

este plenário o insigne consócio Duval Vianna.<br />

O <strong>voto</strong> <strong>do</strong> Ministro Relator, no julgamento da<br />

ACPF 130, ressaltou a importância da autorregulação da imprensa. Diz o<br />

texto pretoriano:<br />

"AUTORREGULAÇÃO E REGULAÇÃO SOCIAL DA<br />

ATIVIDADE DE IMPRENSA. É da lógica encampada pela<br />

nossa Constituição <strong>de</strong> 1988 a autorregulação da<br />

imprensa como mecanismo <strong>de</strong> permanente ajuste <strong>de</strong><br />

limites <strong>de</strong> sua liberda<strong>de</strong> ao sentir-pensar da socieda<strong>de</strong><br />

civil."<br />

Ora, a autorregulação, em nosso sistema jurídico,<br />

passa, necessariamente, pela edição <strong>de</strong> lei. É preciso, porém, que o<br />

projeto <strong>de</strong> regulação exsurja da própria categoria, construí<strong>do</strong> em <strong>de</strong>bates<br />

<strong>de</strong> seus órgãos <strong>de</strong> representação, como a ABI - Associação Brasileira <strong>de</strong>


Imprensa, Sindicatos patronais e <strong>de</strong> emprega<strong>do</strong>s e outros, sem<br />

interferência <strong>do</strong> Po<strong>de</strong>r Constituí<strong>do</strong>. Tome-se como exemplo a história da<br />

Or<strong>de</strong>m <strong>do</strong>s Advoga<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Brasil. Imaginada pelo Instituto <strong>do</strong>s Advoga<strong>do</strong>s,<br />

veio a se converter em realida<strong>de</strong> no Governo Vargas, quan<strong>do</strong> o Chefe <strong>do</strong><br />

Po<strong>de</strong>r Executivo encomen<strong>do</strong>u a um grupo <strong>de</strong> juristas, capitanea<strong>do</strong>s por<br />

Levy Carneiro, a elaboração <strong>de</strong> seu estatuto, converti<strong>do</strong> no Decreto<br />

22.478, <strong>de</strong> 20.02.1933. Confira-se que o mandatário nacional da época<br />

não impingiu à categoria <strong>do</strong>s advoga<strong>do</strong>s, <strong>de</strong> cima para baixo, um projeto<br />

regulatório; nem o fez através <strong>de</strong> seus juristas prediletos.<br />

Posteriormente, já por iniciativa da própria Or<strong>de</strong>m, o antigo regulamento<br />

foi substituí<strong>do</strong> pela Lei 4.215, <strong>de</strong> 27.04.63, cujo projeto também foi<br />

elabora<strong>do</strong> pela entida<strong>de</strong> e leva<strong>do</strong> ao Congresso Nacional. Sobrevin<strong>do</strong> a<br />

ditadura militar <strong>de</strong> 1964, resistiu a Or<strong>de</strong>m, bravamente, a qualquer<br />

tentativa <strong>de</strong> modificação <strong>de</strong> seu estatuto basilar, temen<strong>do</strong> a<br />

<strong>de</strong>squalificação <strong>do</strong> Congresso existente, acua<strong>do</strong> e <strong>de</strong>sfalca<strong>do</strong> por força das<br />

cassações <strong>de</strong> mandatos. Restaurada a <strong>de</strong>mocracia, preparou a Or<strong>de</strong>m um<br />

novo projeto estatutário, conti<strong>do</strong> na atual Lei 8.906/94, que rege nossa<br />

categoria profissional. É um exemplo clássico <strong>de</strong> autorregulação que <strong>de</strong>ve<br />

ser a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> em prol da permanente garantia da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa.<br />

Por to<strong>do</strong>s os motivos que foram expostos, não<br />

po<strong>de</strong>mos concordar com a conclusão <strong>do</strong> ilustra<strong>do</strong> parecer, que proclama a<br />

<strong>de</strong>snecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> legislação nova.<br />

seguintes conclusões:<br />

Propomos, em substituição, as<br />

1. O artigo 21 <strong>do</strong> Código Civil não é suficiente para assegurar a liberda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> imprensa, pois serve apenas a coibir seus eventuais abusos; <strong>de</strong> igual


forma, as disposições <strong>do</strong> Código Penal, que tipificam as condutas <strong>do</strong><br />

eventual abuso <strong>de</strong>ssa liberda<strong>de</strong>, não cuidan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s ataques que a própria<br />

imprensa po<strong>de</strong> sofrer;<br />

2. Os princípios constitucionais previstos no art. 5º, incisos IV, IX e XIV,<br />

apenas enunciam o prima<strong>do</strong> da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> imprensa, <strong>de</strong> produção<br />

intelectual e <strong>de</strong> livre exercício da profissão e acesso à informação, não<br />

anuncian<strong>do</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, sanções em caso <strong>de</strong> violação, como o faz a Carta<br />

Magna em relação aos incisos V e X, que tratam <strong>do</strong> direito <strong>de</strong> resposta e<br />

da ofensa à honra e intimida<strong>de</strong>;<br />

3. Medidas permanentes assecuratórias <strong>do</strong> livre exercício da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

imprensa e das prerrogativas profissionais, intelectuais e físicas <strong>do</strong>s<br />

jornalistas são indispensáveis, já que os coman<strong>do</strong>s constitucionais não<br />

trazem instrumentos que coíbam os ataques em seu <strong>de</strong>sfavor;<br />

4. Tais medidas <strong>de</strong>vem ser imaginadas em projeto <strong>de</strong> autoria <strong>do</strong>s próprios<br />

exercentes da ativida<strong>de</strong> jornalística, no exercício da autorregulação, nunca<br />

em projetos <strong>de</strong> cunho autoritário, que culminam por trazer novas<br />

restrições à prática da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> informação.<br />

Voto neste senti<strong>do</strong>, submeten<strong>do</strong>-me ao Colen<strong>do</strong><br />

Plenário.<br />

Sala das Sessões <strong>do</strong> IAB, 1º <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2010<br />

Ran<strong>do</strong>lpho <strong>Gomes</strong>

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