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Revista Digital - Instituto dos Advogados Brasileiros

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Neste cenário, o Estado expande suas funções, criando uma demanda para a regulação do<br />

risco. Não se trata, aqui, da regulação <strong>dos</strong> riscos priva<strong>dos</strong> através <strong>dos</strong> contratos de seguros, nem<br />

da reparação <strong>dos</strong> riscos calculáveis através de mecanismos indenizatórios do direito civil e do direito<br />

administrativo, como os institutos da responsabilidade subjetiva e objetiva. O grande desafio vem<br />

da regulação <strong>dos</strong> riscos sociais e globais de difícil quantificação. O Estado assume o dever de<br />

proteção contra riscos, lançando mão de novos princípios jurídicos, como o princípio da prevenção e<br />

o da precaução (Ewald, Gollier & de Sadeleer, 2001).<br />

Essa nova atividade estatal enfrenta diversas dificuldades. A característica <strong>dos</strong> novos riscos<br />

é a incerteza e a imprevisibilidade. A ciência se torna cada vez mais reflexiva, questionadora de si<br />

mesma. Consensos científicos não são alcança<strong>dos</strong> com facilidade, e essa brecha é explorada com<br />

avidez pelas partes interessadas, que tentam, através de seus próprios lobbies científicos,<br />

convencer ou colocar em dúvidas os reguladores. A reflexividade científica retira a legitimidade<br />

puramente técnica da regulação do risco, demandando novos instrumentos de democratização<br />

(Beck, 1992).<br />

No estado constitucional contemporâneo, a politização <strong>dos</strong> riscos se transforma rapidamente<br />

em judicialização <strong>dos</strong> riscos. As partes que não obtiveram sucesso no procedimento regulatório, ou<br />

que foram simplesmente excluídas desse processo, buscam no judiciário a modificação ou<br />

paralisação de políticas, valendo-se das diversas cláusulas constitucionais que protegem o meioambiente,<br />

a saúde, o consumidor e a livre-iniciativa.<br />

A regulação do risco também gera novas colisões entre direitos fundamentais. A<br />

conscientização social sobre os riscos dá justificação a novos direitos fundamentais de proteção por<br />

parte do Estado (Pascual, 2006). Contudo, a limitação de atividades potencialmente geradoras de<br />

riscos impõem restrições às liberdades clássicas e até a certos fins próprios do modelo de Estado<br />

social. O desenvolvimento deixa de ser, por si só, uma coisa boa. Catástrofes podem levar a<br />

reações desproporcionais e ao estabelecimento de Esta<strong>dos</strong> de exceção (Beck, 2009).<br />

Como catalisadora de todas essas dificuldades, a globalização torna ainda mais complexa a<br />

tarefa do Estado. Os riscos globais não respeitam fronteiras e a ausência de mecanismos de<br />

democracia global acabam por impor a algumas nações os riscos produzidas por outras (Beck,<br />

1999).<br />

Os fenômenos acima descritos apontam para a necessidade de reconstrução teórica do<br />

Estado de Direito frente ao paradigma social do risco. No atual estágio da pesquisa, trabalhamos<br />

com a hipótese de que o Estado de Direito, na transformação ocorrida na sociedade frente aos<br />

riscos tecnológicos, assume uma configuração de Estado de Risco, que se caracteriza por tomar a<br />

idéia de risco como um <strong>dos</strong> principais elementos de definição e medida para justificação e atuação<br />

<strong>dos</strong> governos.<br />

Esta hipótese parte da premissa de que os riscos cria<strong>dos</strong> na sociedade pós-industrial<br />

impõem uma estrutura dinâmica e especializada para a regulação da sociedade, provocando uma<br />

gradativa transferência da função de elaboração de políticas públicas a corpos técnicos sem<br />

representação democrática. Paralelamente ao aumento da regulação do risco, ocorre uma alteração<br />

na prática judicial. Os tribunais passam a se orientar não somente pelas regras e princípios<br />

jurídicos, atribuindo crescente importância às consequências das decisões judiciais. Os tribunais<br />

também são força<strong>dos</strong> a decidir levando em conta questões sobre as quais não existe consenso na<br />

comunidade científica, sendo leva<strong>dos</strong> a conformar discricionariamente os fatos inerentes às causas<br />

(Pardo, 1999, p. 25-27).<br />

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