UN AMOUR DE JEUNESSE - DI_final.pdf - Alambique Filmes
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Johnny Flynn e Laura Marling). Depois, vem a tão temida<br />
separação, as primeiras cartas de Sullivan, religiosamente<br />
aguardadas, mas que se vão inexoravelmente espaçando,<br />
até serem interrompidas, momento em que a rapariga<br />
tenta pôr fim à sua própria vida.<br />
No segundo acto, com data de 2003, entramos de repente<br />
no processo silencioso do luto. Este salto temporal carrega<br />
o sofrimento do tempo que passa e a restauração que<br />
pode trazer. Sullivan nunca mais regressou, os pais de<br />
Camille separaram-se, a rapariga tem agora o cabelo<br />
curto e está a estudar arquitectura.<br />
Este momento do filme, ainda mais lacónico que o<br />
anterior, parece-se com aquilo a que chamamos “túnel”,<br />
uma figura de estilo atribuída a Hollywood, composta<br />
por uma sequência de cenas com pouco ou nenhum<br />
diálogo, geralmente musicais e de entretenimento, que<br />
tem por objectivo comprimir a acção. Excepto que, aqui,<br />
acontece o inverso. O tempo dilata-se, enche-se de uma<br />
gravidade perturbante, de uma melancolia radiosa.<br />
O que está em jogo é mostrar como, ao mergulhar de<br />
cabeça no trabalho, Camille se vai libertando, pouco<br />
a pouco, do fantasma de Sullivan. O filme tem tanto mais<br />
êxito quanto mais se aproxima formalmente do estado<br />
de espírito da jovem. As considerações sobre arquitectura,<br />
as visitas às depuradas obras da Bauhaus na Europa,<br />
acertam aqui o passo com a resignação da perda.<br />
A inteligência da realização não reside unicamente na<br />
escolha da arquitectura como símbolo da reconstrução<br />
pessoal e da abertura ao colectivo. Há também laços<br />
de parentesco com esta disciplina, tal como a definiu<br />
com tanta precisão o movimento Bauhaus, com o cinema,<br />
e com o seu valor de manifesto: o casamento da arte<br />
com a técnica colocado ao serviço da democracia, e<br />
definição do estilo, e, consequentemente, da beleza, em<br />
consonância com a função. Esta dimensão, pragmática<br />
e idealista, da arte desemboca logicamente no encontro<br />
amoroso de Camille e Lorenz, um dos ensinamentos que<br />
a inicia na descoberta estética.<br />
Resta ainda descrever o que acontece, depois de<br />
uma nova elipse, em 2007, num terceiro acto em<br />
que encontramos Camille duradoiramente instalada<br />
com Lorenz. O respeito que este filme comporta pelo<br />
lancinante suspense sentimental incita-nos a ficar por<br />
aqui. Diremos simplesmente que sendo a alma humana<br />
aquilo que é e tendo os fantasmas uma pele mais dura<br />
do que imaginamos, o acto III toma a direcção oposta<br />
do acto II. Será o regresso do titubeante Sullivan, oito<br />
anos depois do seu desaparecimento, ao centro dos<br />
acontecimentos, anunciando a última provação através<br />
da qual Camille se libertará da sua infância.<br />
Assim se conclui o último tomo do romance de formação<br />
cinematográfica da menina Hansen-Løve, magnífica<br />
trilogia da juventude que nos segreda que a perda, por<br />
mais irremediável que seja, nos ajuda, sem dúvida, a viver.