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Tribuna Livre<br />
O voto,<br />
a bola e as prateleiras<br />
O brasileiro, acredito eu, é o mais apaixonado<br />
dos seres humanos. Vive intensamente<br />
suas paixões – com as consequências naturais<br />
<strong>de</strong> cegar-se diante da realida<strong>de</strong>, incapaz <strong>de</strong> ver<br />
<strong>de</strong>feitos no seu objeto <strong>de</strong> adoração.<br />
E neste 2014 teremos inúmeras oportunida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> colocar o nosso coração à prova, ver se<br />
ele ainda está cumprindo a mais nobre <strong>de</strong> todas<br />
as funções: suportar a emoção diante <strong>de</strong> situações<br />
extremas.<br />
É ano <strong>de</strong> Copa e ainda vivemos os estertores<br />
dos regionais: já está em andamento a Libertadores,<br />
a Copa do Brasil e se avizinha o Brasileirão.<br />
Mais alguns dias, é o Mundial da Fifa e, no<br />
segundo semestre, sulamericana e outras competições.<br />
Há ainda os aficionados por outros esportes<br />
– sendo que a F1 per<strong>de</strong>u a atração para<br />
nós brasileiros pelo fato <strong>de</strong> nossos pilotos não<br />
passarem <strong>de</strong> meros coadjuvantes <strong>de</strong> um circo<br />
on<strong>de</strong> nós já dominamos com Emerson, Senna<br />
e Piquet.<br />
Na primeira quinzena <strong>de</strong> agosto, voltará<br />
o horário eleitoral – quando os magos do marketing<br />
eleitoral vão tratar <strong>de</strong> transformar candidatos<br />
em produtos palatáveis para um consumidor<br />
(o eleitor) cada vez menos propenso a<br />
aceitar passiva e pacificamente gato por lebre.<br />
Eu fico fascinado pelo talento dos nossos<br />
marqueteiros – tanto assim que muitos <strong>de</strong>les<br />
são chamados e contratados por candidaturas<br />
<strong>de</strong> outros países. São verda<strong>de</strong>iros magos que,<br />
a partir <strong>de</strong> informações colhidas em pesquisas,<br />
tratam <strong>de</strong> projetar o candidato X ou Y como o<br />
mais a<strong>de</strong>quado para aten<strong>de</strong>r às aspirações do<br />
eleitor.<br />
O problema é a realida<strong>de</strong> – exatamente<br />
como acontece nas propagandas <strong>de</strong> sabão em<br />
pó. Ao longo da vida, nunca soube <strong>de</strong> nenhuma<br />
dona <strong>de</strong> casa que tenha dito que <strong>de</strong>terminada<br />
marca realmente cumpre aquelas maravilhas<br />
prometidas em esmeradas produções. Claro<br />
que a culpa será sempre <strong>de</strong>la, afinal <strong>de</strong> contas...<br />
quem manda ela querer que a vida real seja<br />
igual às promessas da propaganda?<br />
E então voltamos aos nossos candidatos.<br />
Todos eles perfeitos. Todos eles <strong>de</strong>tentores<br />
<strong>de</strong> todas as mágicas soluções <strong>de</strong> nossos ancestrais<br />
problemas nas áreas <strong>de</strong> educação, saú<strong>de</strong>,<br />
segurança, transporte público, moradia e salário.<br />
Todos eles se apresentam como símbolos<br />
do “novo”, amparados em velhas e arcaicas práticas.<br />
Olhando para o quadro já posto, é tudo do<br />
mesmo outra vez. Por vezes com outro verniz,<br />
mas sempre a repetição enfadonha dos milagres<br />
e dos tempos <strong>de</strong> fartura que“ele” terá como<br />
entregar – claro que <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> eleito.<br />
Quando uma dona <strong>de</strong> casa compra um sabão<br />
em pó e esse não serve, ela tem duas ou<br />
três opções: ou usa entre resmungos e muxoxos,<br />
jurando nunca mais comprá-lo; relega-o<br />
para a lavagem <strong>de</strong> panos <strong>de</strong> chão e piso <strong>de</strong> sanitários<br />
ou então vai até o local on<strong>de</strong> o adquiriu<br />
e tenta <strong>de</strong>volver.<br />
Essa é a diferença em relação ao voto: não<br />
tem como empurrar o eleito para outra função<br />
e nem <strong>de</strong>volvê-lo para seu estado.<br />
Por isso, muito cuidado com as magias dos<br />
marqueteiros eleitorais...<br />
20 <strong>Leitura</strong> <strong>de</strong> <strong>Bordo</strong> | Março 2014 | www.leitura<strong>de</strong>bordo.com.br