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Edição em PDF - Fapemig

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EXPEDIENTE<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA<br />

Assessora de Comunicação Social e Editora Geral:<br />

Ariadne Lima (MG09211/JP)<br />

Editor Executivo: Fabrício Marques<br />

Assessora Editorial: Vanessa Fagundes<br />

Redação: Ariadne Lima, Fabrício Marques, Vanessa<br />

Fagundes, Juliana Saragá, Maurício Guilherme Silva Jr.,<br />

Ana Flávia de Oliveira, Marcus Vinicius dos Santos,<br />

Hely Costa Jr., Kátia Brito (Bolsista de Iniciação Científica).<br />

Diagramação: Beto Paixão<br />

Revisão: Glísia Rejane<br />

Projeto gráfico: Hely Costa Jr.<br />

Editoração: Fazenda Comunicação & Marketing<br />

Montag<strong>em</strong> e impressão: Lastro Editora<br />

Tirag<strong>em</strong>: 20.000 ex<strong>em</strong>plares<br />

Capa: Hely Costa Jr.<br />

Uma grande<br />

oportunidade<br />

AO LEITOR<br />

Redação - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar, São<br />

Pedro - CEP 30330-080<br />

Belo Horizonte - MG - Brasil<br />

Telefone: +55 (31) 3280-2105<br />

Fax: +55 (31) 3227-3864<br />

E-mail: revista@fap<strong>em</strong>ig.br<br />

Site: http://revista.fap<strong>em</strong>ig.br<br />

Blog: http://fap<strong>em</strong>ig.wordpress.com/<br />

Facebook: http://www.facebook.com/FAPEMIG<br />

Twitter: @fap<strong>em</strong>ig<br />

GOVERNO DO ESTADO<br />

DE MINAS GERAIS<br />

Governador: Antonio Augusto Junho Anastasia<br />

SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA<br />

E ENSINO SUPERIOR<br />

Secretário: Narcio Rodrigues<br />

Fundação de Amparo à Pesquisa<br />

do Estado de Minas Gerais<br />

Presidente: Mario Neto Borges<br />

Diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação: José<br />

Policarpo G. de Abreu<br />

Diretor de Planejamento, Gestão e Finanças: Paulo<br />

Kleber Duarte Pereira<br />

Conselho Curador<br />

Presidente: João Francisco de Abreu<br />

M<strong>em</strong>bros: Antônio Carlos de Barros Martins, Dijon<br />

Moraes Júnior, Evaldo Ferreira Vilela, Giana Marcellini,<br />

José Luiz Resende Pereira, Magno Antônio Patto<br />

Ramalho, Paulo César Gonçalves de Almeida, Paulo<br />

Sérgio Lacerda Beirão, Ricardo Vinhas Corrêa da Silva,<br />

Rodrigo Corrêa de Oliveira<br />

Um projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional, o Código Nacional<br />

de Ciência, Tecnologia e Inovação, pode trazer, se aprovado, mudanças positivas<br />

para o País. Como observa o presidente da FAPEMIG, Mario Neto Borges, <strong>em</strong> artigo<br />

nesta edição, “importantes avanços foram feitos na política da área e também<br />

nos investimentos – mas ainda existe um obstáculo fundamental a ser superado.<br />

A legislação vigente é fragmentada, ultrapassada e inadequada ao contexto do<br />

Século do Conhecimento”.<br />

Em outro artigo, o secretário de C&T do Amazonas e presidente do Conselho<br />

Nacional de Secretarias Estaduais para Assuntos de C,T&I (Consecti),<br />

Odenildo Sena, observa que a proposta para o novo “Código da Ciência” “significa<br />

uma revolução nos marcos regulatórios que reg<strong>em</strong> a vida de instituições<br />

e pessoas que faz<strong>em</strong> Ciência no país. Agora está nas mãos do Congresso e do<br />

Executivo”. Trata-se de uma grande oportunidade para o País avançar nas áreas<br />

científica, tecnológica e de inovação.<br />

Cientistas, pesquisadores e professores universitários afirmam, <strong>em</strong> consenso,<br />

que a chamada Lei de Licitações, as subvenções, os financiamentos e as<br />

compras no exterior são as maiores dificuldades impostas pela legislação vigente.<br />

Se aprovada a nova Lei, por ex<strong>em</strong>plo, as aquisições e contratações observarão o<br />

primado da qualidade sobre o preço. Esta nova etapa da política científica nacional é<br />

o t<strong>em</strong>a da reportag<strong>em</strong> de capa, que procura apresentar ao leitor a importância desse<br />

novo arcabouço legal.<br />

Outro destaque deste número promove um recuo no t<strong>em</strong>po, mais precisamente<br />

para 1981, quando o mundo enfrentava uma doença misteriosa, que<br />

intrigava a comunidade científica. Naquele ano, estudiosos descobriram que se<br />

tratava de um vírus causador da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, <strong>em</strong><br />

português, Sida, ou Aids, nome <strong>em</strong> inglês, como ficou internacionalmente conhecido.<br />

Ao longo de três décadas, o HIV mostrou que não escolhe idade, raça,<br />

crença ou classe social. Ele está aí e a prevenção é o meio mais importante para<br />

combatê-lo. Em um esforço de reportag<strong>em</strong>, Ana Flávia de Oliveira apresenta algumas<br />

das principais pesquisas e ações relacionadas ao combate à Aids.<br />

Também na área de Saúde, Marcus Vinicius dos Santos conversou com<br />

um dos mais reconhecidos geneticistas do Brasil, o mineiro Sérgio Danilo<br />

Pena, que t<strong>em</strong> a firme convicção de que os avanços na tecnologia pod<strong>em</strong><br />

promover uma mudança substancial na Medicina ainda mais rapidamente, na<br />

medida <strong>em</strong> que a sociedade e a comunidade médica absorv<strong>em</strong> os avanços da<br />

ciência genômica e os incorporam às informações preditivas e preventivas na<br />

rotina de manutenção da saúde.<br />

Mas há muito mais nesta edição da MINAS FAZ CIÊNCIA que, fiel à sua<br />

linha editorial, cont<strong>em</strong>pla diversas áreas do conhecimento, cobrindo assuntos<br />

que vão da Biologia à Engenharia, da Agricultura à História.


6<br />

Especial<br />

Aids: 30 anos de luta, esperança<br />

e descobertas científicas que<br />

transformaram a sociedade e a vida<br />

dos portadores da doença<br />

ÍNDICE<br />

12<br />

Casas resistentes<br />

Pesquisa desenvolve projeto<br />

de construção alternativa<br />

economicamente viável e<br />

resistente, principalmente a<br />

ventos fortes<br />

36<br />

Pulverizador<br />

agrícola<br />

Insumo utiliza princípios da<br />

Física Eletrostática para aumentar<br />

eficiência do equipamento<br />

16<br />

Postes<br />

fotovoltaicos<br />

Pesquisadores estudam<br />

aplicações e aperfeiçoamento de<br />

materiais da cadeia de produção<br />

de energia solar<br />

38<br />

Entrevista<br />

O médico e cientista Sérgio Pena<br />

avalia como os avanços no estudo<br />

do genoma pod<strong>em</strong> auxiliar na<br />

prevenção e manutenção da saúde<br />

26<br />

Artigos<br />

Odenildo Sena, secretário de<br />

C&T do Amazonas e presidente<br />

do Consecti, e o presidente da<br />

FAPEMIG e Confap, Mario Neto<br />

Borges, opinam sobre o Novo<br />

Código da Ciência<br />

42<br />

Jovens de futuro<br />

Estudantes vencedores do III<br />

S<strong>em</strong>inário de Iniciação Científica<br />

da FAPEMIG se destacam pelo<br />

ineditismo dos trabalhos e também<br />

pela garra, foco e superação<br />

28<br />

Som e imag<strong>em</strong><br />

Projetos da Escola de Belas da<br />

UFMG dedicam-se à pesquisa das<br />

artes digitais e computacionais,<br />

permitindo inovadoras interações<br />

poéticas entre sons e imagens<br />

45<br />

Dicionário operário<br />

Livro reúne diversos<br />

momentos históricos do<br />

trabalho <strong>em</strong> Minas Gerais<br />

35<br />

L<strong>em</strong>bra dessa?<br />

Propriedades fitoterápicas do<br />

repolho são utilizadas na produção<br />

de pomadas e bálsamo que têm a<br />

capacidade de cicatrizar feridas<br />

48 Leituras<br />

Ciência de cabeceira: “Uma história<br />

da Ciência: experiência, poder e<br />

paixão; e “Design e Método”<br />

49<br />

5 perguntas para...<br />

Rodrigo Mendes, pesquisador da<br />

Embrapa, que encontrou um novo<br />

mecanismo de defesa para as<br />

plantas, livre de agrotóxicos


20<br />

Lei mais moderna<br />

Proposta de “Novo Código”<br />

promete avanços para a<br />

Ciência no Brasil, estimulando<br />

pesquisadores e cientistas<br />

Esta é uma revista voltada para um público<br />

inteligente que se interessa principalmente<br />

por t<strong>em</strong>as discutidos na atualidade.<br />

T<strong>em</strong> uma diagramação b<strong>em</strong> limpa<br />

que chama a atenção do leitor para os<br />

textos que, <strong>em</strong> sua maioria, são longos,<br />

porém interessantes.<br />

Karina Marques<br />

Estudante / Curso de Comunicação Social<br />

Instituto Metodista Izabela Hendrix<br />

Belo Horizonte/MG<br />

CARTAS<br />

31<br />

Taxonomia<br />

Espécie de moluscos<br />

terrestres na região da<br />

Zona da Mata mineira é<br />

mapeada e classificada por<br />

pesquisadores da UFJF<br />

Lendo “novos t<strong>em</strong>pos para os resíduos”,<br />

aprendi que, para haver redução no consumo,<br />

e assim a consequente redução<br />

de lixo, primeiramente precisamos ter a<br />

consciência de que somos responsáveis<br />

por nossas escolhas, por nossos resíduos,<br />

pois ele v<strong>em</strong> do que consumimos e<br />

que nossa existência t<strong>em</strong> um impacto no<br />

ambiente <strong>em</strong> que viv<strong>em</strong>os.<br />

Marilia Soldatelli Britto<br />

Estudante / Curso de Comunicação Social<br />

Instituto Metodista Izabela Hendrix<br />

Belo Horizonte/MG<br />

Estou me formando agora <strong>em</strong> dez<strong>em</strong>bro de<br />

2011, e desde o inicio do meu curso <strong>em</strong><br />

2008 recebo as edições da MINAS FAZ CI-<br />

ÊNCIA. Quero parabenizar a revista por tantas<br />

reportagens importantes, artigos ricos,<br />

que me ajudaram tanto na minha formação e<br />

no crescimento do meu conhecimento.<br />

Francismeire dos Santos de Souza<br />

Estudante de Licenciatura<br />

<strong>em</strong> Ciências Biológicas<br />

Fundação Helena Antipoff<br />

Ibirité/MG<br />

Um diferencial da revista é a gratuidade. Isto<br />

prova que conteúdo de qualidade não precisa<br />

ser o fator que eleva o custo do produto.<br />

A ideia de que publicações gratuitas não<br />

prezam pela boa informação não se encaixa<br />

com a linha editorial da publicação.<br />

Luis Felipe Amaral<br />

Produtor<br />

Rádio Inconfidência<br />

Belo Horizonte/MG<br />

Gostei! Sinceramente gostei da revista MINAS<br />

FAZ CIÊNCIA. Só de olhar a capa eu fiquei feliz.<br />

Depois de 15 anos vivendo de produção de<br />

revistas, vi nessa publicação um aglomerado<br />

raro de pontos que muito me agradam.<br />

Mas não adianta ser bonitinha, t<strong>em</strong> que ter<br />

conteúdo. Aí a MINAS FAZ CIÊNCIA fala alto.<br />

Com textos escritos de modo claro e acessível,<br />

a revista explora todos os conteúdos que todo<br />

mundo adora: tecnologia, inovação, sustentabilidade,<br />

crescimento e conhecimento.<br />

A revista Faz Ciência e fez a minha cabeça.<br />

Não deu para dividir a leitura, parei tudo e<br />

li toda de uma só vez. E claro, entrei no site<br />

e me cadastrei assinante. Agora vou esperar<br />

a próxima edição <strong>em</strong> casa.<br />

José Ary Stambassi Jr.<br />

Assessor de Comunicação<br />

Belo Horizonte/MG<br />

Para receber gratuitamente a revista MINAS FAZ CIÊNCIA, envie seus dados (nome, profissão, instituição/<br />

<strong>em</strong>presa, endereço completo, telefone, fax e e-mail) para o e-mail: revista@fap<strong>em</strong>ig.br ou para o seguinte<br />

endereço: FAPEMIG / Revista MINAS FAZ CIÊNCIA - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar - Bairro São Pedro -<br />

Belo Horizonte/MG - Brasil - CEP 30330-080<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA t<strong>em</strong> por finalidade divulgar a produção científica e<br />

tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é<br />

permitida, desde que citada a fonte.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 5


ESPECIAL<br />

Aids, 30 anos:<br />

um desafio<br />

permanente<br />

Ana Flávia de Oliveira<br />

Ao longo de três<br />

décadas, o HIV<br />

mostrou seu poder<br />

de destruição. Saiba<br />

o que t<strong>em</strong> sido feito<br />

para entender e<br />

prevenir essa ameaça<br />

No final dos anos 1970 e início dos<br />

anos 1980, o mundo soube do surgimento<br />

de uma nova doença misteriosa, que<br />

intrigava a comunidade científica. Os primeiros<br />

casos foram registrados nos Estados<br />

Unidos, Haiti e África Central. Várias<br />

pesquisas foram realizadas para entender<br />

o que estava acontecendo e os primeiros<br />

estudos apontaram que homossexuais,<br />

h<strong>em</strong>ofílicos, usuários de heroína e profissionais<br />

do sexo, hookers, <strong>em</strong> inglês,<br />

eram os grupos mais vulneráveis à doença,<br />

t<strong>em</strong>porariamente denominada 5H. Os<br />

pesquisadores concluíram, ainda, que a<br />

contaminação acontecia pelo contato sexual,<br />

compartilhamento de agulhas entre<br />

usuários de drogas e exposição a sangue<br />

e seus derivados. Ninguém sabia direito o<br />

6 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


que provocava tais reações e mortes, mas,<br />

<strong>em</strong> 1981, estudiosos descobriram que se<br />

tratava de um vírus causador da Síndrome<br />

da Imunodeficiência Adquirida, <strong>em</strong> português,<br />

Sida, ou Aids, nome <strong>em</strong> inglês,<br />

como ficou internacionalmente conhecido.<br />

No Brasil, o primeiro caso foi registrado<br />

no Estado de São Paulo <strong>em</strong> 1980 e<br />

classificado como Aids, dois anos depois.<br />

A partir daí, o País, ainda assustado com o<br />

surgimento de um grave probl<strong>em</strong>a de saúde,<br />

viu os primeiros casos <strong>em</strong> uma mulher<br />

e criança, <strong>em</strong> 1983. Dois anos mais tarde,<br />

foi registrado o primeiro caso de transmissão<br />

vertical, ou seja, passado de mãe para<br />

filho. Diante da nova realidade, foi criado<br />

nesse mesmo ano, o Grupo de Apoio à<br />

Prevenção da Aids (Gapa), a primeira ONG<br />

do Brasil e da América Latina de luta contra<br />

a doença. No ano seguinte, foi criado o<br />

Programa Nacional de DST (Doenças Sexualmente<br />

Transmissíveis) – Aids.<br />

Em 1987, quando o Brasil registrava<br />

2.775 casos notificados da doença, o<br />

AZT, medicamento utilizado <strong>em</strong> tratamento<br />

de câncer, foi indicado também para o<br />

controle do HIV, uma esperança para os<br />

pacientes. No ano seguinte, com a criação<br />

do Sist<strong>em</strong>a Único de Saúde, o SUS,<br />

os medicamentos que evitam infecções<br />

oportunistas começam a ser distribuídos<br />

gratuitamente no País. No início dos anos<br />

1990, o governo brasileiro passou a distribuir<br />

gratuitamente os medicamentos para o<br />

tratamento do HIV/Aids pelo SUS.<br />

Um dos fatores de destaque no programa<br />

brasileiro de controle e combate<br />

do HIV/Aids é o acesso universal ao tratamento.<br />

Desde 1996, o SUS disponibiliza<br />

medicamentos para todos os pacientes.<br />

Isso só é possível porque o Brasil passou<br />

a produzir localmente, por meio de laboratórios<br />

públicos, antirretrovirais de qualidade,<br />

sendo que hoje, dos 20 medicamentos<br />

distribuídos, dez são produzidos aqui. Um<br />

deles, o Efavirenz, foi através de licença<br />

compulsória ou “quebra de patente”, enquanto<br />

outro, o Tenofovir, após o não reconhecimento<br />

da solicitação de patente.<br />

Em 1999, Marylin, um chimpanzé fêmea,<br />

ajudou a confirmar que o SIV (simian<br />

immunodeficiency virus ou vírus da imunodeficiência<br />

dos símios) foi transmitido<br />

para seres humanos e sofreu mutações,<br />

transformando-se no HIV. Testes genéticos<br />

mostram que o HIV é bastante similar ao<br />

SIV, que infecta os chimpanzés, porém não<br />

os deixa doentes.<br />

No ano de 2001, o Brasil ameaça quebrar<br />

patentes e consegue negociar com a<br />

indústria farmacêutica internacional a redução<br />

no preço dos medicamentos para Aids.<br />

Em 2006, o País reduz <strong>em</strong> mais de 50% o<br />

número de casos de transmissão vertical e<br />

um acordo reduz <strong>em</strong> 50% o preço do antirretroviral<br />

Tenofovir, representando uma<br />

economia imediata de US$ 31,4 milhões<br />

por ano. Dois anos mais tarde, o Brasil, que<br />

é referência mundial no combate e controle<br />

do HIV/Aids, investe US$ 10 milhões na<br />

instalação de uma fábrica de medicamentos<br />

antirretrovirais <strong>em</strong> Moçambique.<br />

Mesmo com as políticas públicas no<br />

que diz respeito à doença, o Brasil registra<br />

atualmente, <strong>em</strong> média, 35.000 novos casos<br />

todos os anos. Desde 1980, quando se tomou<br />

conhecimento do probl<strong>em</strong>a, 229.222<br />

mortes foram registradas <strong>em</strong> decorrência da<br />

doença. Teoricamente, ser soropositivo hoje<br />

<strong>em</strong> dia não significa viver com a ideia de<br />

morte iminente, e apesar de todos os avanços<br />

da medicina nesses últimos 30 anos, falar<br />

e conviver com a Aids, ainda hoje, é uma<br />

questão delicada. O assunto continua sendo<br />

um tabu na nossa sociedade, apesar de sabermos<br />

que o HIV não é transmitido pelo<br />

ar, por um aperto de mão ou por compartilhamento<br />

do mesmo espaço físico. Ainda<br />

assim, vários portadores ainda escond<strong>em</strong><br />

o probl<strong>em</strong>a a fim de evitar o preconceito. É<br />

o caso de Juan (nome fictício), um jov<strong>em</strong><br />

de 23 anos, que descobriu ser portador do<br />

vírus aos 21, quando foi fazer exames pré-<br />

-operatórios para a realização de uma cirurgia.<br />

“Quando recebi a notícia, fiquei <strong>em</strong><br />

estado de choque e desde então entrei <strong>em</strong><br />

depressão porque não tenho o apoio da minha<br />

família, conto apenas com a ajuda de<br />

pouquíssimos amigos”, relata.<br />

Atualmente, o jov<strong>em</strong> faz o tratamento<br />

pela rede pública de saúde <strong>em</strong> Belo Horizonte<br />

e diz que é b<strong>em</strong> tratado pela equipe<br />

que o acompanha, mas não conseguiu se<br />

livrar da depressão e confessa que já tentou<br />

o suicídio uma vez porque, segundo ele, os<br />

efeitos colaterais dos medicamentos “tiraram<br />

a sua alegria de viver”. “Um conselho<br />

que posso dar é dizer que todos se previnam<br />

s<strong>em</strong>pre, pois infelizmente esse é o tipo<br />

de coisa que não dá pra voltar atrás, então<br />

cuid<strong>em</strong>-se antes para não se arrepender<strong>em</strong><br />

amargamente depois”, ensina.<br />

O caso de Juan ilustra uma constatação<br />

feita pela professora Maria Imaculada de<br />

Fátima Freitas, da Escola de Enfermag<strong>em</strong> da<br />

Universidade Federal do Estado de Minas<br />

Gerais (UFMG). De acordo com ela, a condição<br />

social dos pacientes é determinante na<br />

adesão do tratamento. “A nossa experiência e<br />

as pesquisas mostram que pessoas que são<br />

mais desfavorecidas, financeira e socialmente,<br />

sofr<strong>em</strong> muito e têm mais dificuldade de<br />

adesão. Há muito mais tristeza, descrença e<br />

desmotivação, isto é inegável, além da discriminação<br />

da sociedade”, lamenta.<br />

Uma pesquisa que deu jogo<br />

Entre 1988 e 1991, a pesquisadora<br />

mineira Virgínia Schall desenvolveu um trabalho<br />

no Laboratório de Educação <strong>em</strong> Ambiente<br />

e Saúde do Instituto Osvaldo Cruz, no<br />

Rio de Janeiro, de educação com crianças<br />

e adolescentes de escolas do município. O<br />

objetivo era saber quais doenças os alunos<br />

conheciam. Foi quando Virgínia, <strong>em</strong><br />

parceria com duas outras pesquisadoras e<br />

psicólogas, Simone Monteiro e Sandra Rebello,<br />

introduziu questões referentes à Aids.<br />

Os estudantes, com idade entre 9 e 18 anos,<br />

desconheciam o termo, muito menos os<br />

sintomas e forma de contágio com o vírus.<br />

Após experimentos com textos didáticos, a<br />

equipe criou um jogo, o Zig Zaids. “Quando<br />

desenvolv<strong>em</strong>os o protótipo do jogo, nós já<br />

sabíamos quais eram as dúvidas dos jovens.<br />

Nós mesmas desenhamos os tabuleiros,<br />

plastificamos, compramos os dados e pinos<br />

<strong>em</strong> papelarias. As cartas de baralhos fiz<strong>em</strong>os<br />

no computador, imprimimos e levamos<br />

para as escolas, onde jogávamos com as<br />

crianças. À medida que testávamos o jogo,<br />

fazíamos mudanças, até que chegamos nesse<br />

protótipo”, conta. O Zig Zaids chegou a<br />

ser comercializado, e a pesquisadora l<strong>em</strong>bra<br />

que grandes lojas de departamento com<br />

seção de brinquedos colocaram-no à venda,<br />

mas houve uma polêmica: a sociedade reagiu<br />

negativamente. Por isso as lojas tiveram<br />

que retirá-lo das suas prateleiras.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 7


“Os jovens conhec<strong>em</strong> pouco<br />

sobre a camisinha f<strong>em</strong>inina.<br />

N<strong>em</strong> meninos n<strong>em</strong> meninas<br />

sab<strong>em</strong> que ela pode ser<br />

colocada até oito horas antes<br />

da relação sexual, o que<br />

daria a elas maior chance de<br />

negociação com os parceiros”<br />

Virgínia Schall<br />

Pesquisadora<br />

Apesar da polêmica, Virgínia Schall<br />

conta que o jogo foi solicitado por escolas<br />

e <strong>em</strong>presas. “Quando fiz<strong>em</strong>os, tiv<strong>em</strong>os<br />

recursos de projeto de pesquisa, deu para<br />

fazermos alguns ex<strong>em</strong>plares. Posteriormente,<br />

tiv<strong>em</strong>os o auxílio do Sesc Nacional,<br />

que nos deu 250 ex<strong>em</strong>plares. Essas<br />

unidades foram doadas às instituições que<br />

nos pediam”, recorda. A editora que fez a<br />

primeira edição recebeu encomendas por<br />

parte de grandes <strong>em</strong>presas, como Petrobras,<br />

Volkswagen, Cenibra (que fabrica<br />

celulose) e o Ministério da Saúde, que<br />

comprou 100 mil ex<strong>em</strong>plares. O jogo teve<br />

muitas variações e hoje está disponível no<br />

site do Instituto Osvaldo Cruz. Basta fazer o<br />

donwload no site: http://www.fiocruz.br/<br />

piafi/zigzaids/index.html<br />

O jogo é composto por um tabuleiro<br />

e 23 cartas com perguntas e respostas.<br />

Onde aparece uma camisinha, há um baralho<br />

surpresa, com informações adicionais<br />

sobre o HIV e a Aids. As cartas tratam<br />

desde questões relativas ao sist<strong>em</strong>a imune<br />

até questões sociais. Tudo com uma linguag<strong>em</strong><br />

b<strong>em</strong> simples, porque ele é voltado<br />

para crianças de 9 a 12 anos. “Entend<strong>em</strong>os<br />

que eles precisam ter informações antes de<br />

começar<strong>em</strong> a vida sexual. A pesquisa avaliou<br />

o conhecimento, 30 dias, seis meses<br />

e um ano após o exercício do jogo. Verificamos<br />

que os alunos que jogaram<br />

tiveram mais conhecimento”,<br />

explica.<br />

O papel da educação<br />

Virgínia Schall acredita que os jovens<br />

dev<strong>em</strong> receber as orientações sobre<br />

formas de contágio e prevenção das DSTs<br />

antes do início da vida sexual. Atualmente,<br />

a professora coordena o Programa de Pós-<br />

-Graduação <strong>em</strong> Ciências da Saúde do Centro<br />

de Pesquisa René Rachou, da Fiocruz,<br />

<strong>em</strong> Belo Horizonte. Entre um dos trabalhos<br />

orientados por ela, está a dissertação de<br />

Helena Campos, coordenadora do Programa<br />

Afetivo Sexual de Juventude da Secretaria<br />

de Estado de Educação. A pesquisa foi<br />

desenvolvida com jovens com idade entre<br />

13 e 15 anos de escolas estaduais. “O que<br />

nós perceb<strong>em</strong>os é que eles conhec<strong>em</strong><br />

pouco sobre a camisinha f<strong>em</strong>inina. N<strong>em</strong><br />

os meninos e n<strong>em</strong> as meninas sab<strong>em</strong> que<br />

ela pode ser colocada até oito horas antes<br />

da relação sexual, o que daria a elas maior<br />

chance de negociação com os parceiros e<br />

evita probl<strong>em</strong>as na “hora H”, porque n<strong>em</strong><br />

s<strong>em</strong>pre o preservativo está por perto ou, se<br />

está, eles não usam”, diz Schall.<br />

O estudo usou como referência informações<br />

da Pesquisa Nacional de Saúde<br />

do Escolar (Pense), feita pelo Instituto Brasileiro<br />

de Geografia e Estatística (IBGE). O<br />

acesso à informação sobre DSTs/Aids na<br />

escola foi outro fator analisado. Em Belo<br />

Horizonte, a proporção de alunos que receberam<br />

orientação sobre DSTS/Aids foi de<br />

89,1% nas escolas públicas e de 91,2%<br />

nas escolas privadas. Os altos percentuais<br />

suger<strong>em</strong> que a maioria dos alunos do 9º<br />

ano do Ensino Fundamental recebeu algum<br />

tipo de orientação. O estudo aponta<br />

que existe um consenso de que o uso<br />

da camisinha, masculina ou f<strong>em</strong>inina,<br />

é a única forma de<br />

evitar as doenças sexualmente<br />

transmissíveis<br />

(DSTs),<br />

incluindo<br />

o HIV/<br />

8 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Aids. Entretanto, como a saúde sexual e reprodutiva<br />

das mulheres depende, <strong>em</strong> grande<br />

medida, da habilidade <strong>em</strong> negociar com<br />

seus parceiros o sexo seguro, a saúde das<br />

mulheres pode estar ameaçada.<br />

Dados da Pesquisa Nacional de D<strong>em</strong>ografia<br />

e Saúde da Criança e da Mulher,<br />

realizada <strong>em</strong> 2006, revelam que 90% das<br />

mulheres brasileiras sab<strong>em</strong> que existe um<br />

preservativo f<strong>em</strong>inino, no entanto, apenas<br />

3,1% das entrevistadas já fizeram uso da<br />

camisinha f<strong>em</strong>inina, pelo menos uma vez na<br />

vida. Um fator de proteção à saúde sexual<br />

e reprodutiva seria tornar o conhecimento<br />

e o acesso à camisinha f<strong>em</strong>inina universal.<br />

“Acho que precisa de uma mídia forte<br />

para a familiarização com o preservativo<br />

f<strong>em</strong>inino, que a mulher pode colocar antes<br />

e não depende do parceiro aceitar usar. Ela<br />

chega dizendo que está protegida e que não<br />

vai tirar a sua proteção. Dá para fazer uma<br />

negociação com o parceiro, com mais segurança.<br />

Nas entrevistas, as meninas falam<br />

muito mal do preservativo f<strong>em</strong>inino, acham<br />

grande, difícil de colocar. Se os postos tivess<strong>em</strong>,<br />

distribuíss<strong>em</strong> e ensinass<strong>em</strong> como<br />

usar, seria um avanço”, argumenta.<br />

O Programa Saúde e Prevenção nas<br />

Escolas (SPE) é uma iniciativa conjunta<br />

entre os ministérios da Saúde e Educação.<br />

Criado <strong>em</strong> 2003, hoje está presente <strong>em</strong> cerca<br />

de 66 mil instituições de ensino do País.<br />

Além de distribuir camisinhas, o programa<br />

insere a t<strong>em</strong>ática de prevenção e promoção<br />

da saúde sexual e reprodutiva e a discussão<br />

dos diversos aspectos da sexualidade<br />

no cotidiano das escolas públicas.<br />

A Aids na vida de casais<br />

Doenças graves, mas que têm tratamento,<br />

como hanseníase e tuberculose,<br />

afetam a vida do portador e de sua família.<br />

Com o vírus HIV e a Aids, a situação se repete.<br />

As alterações interfer<strong>em</strong> <strong>em</strong> questões<br />

como relacionamentos sociais, adesão ao<br />

tratamento, perspectiva e qualidade de vida.<br />

Pensando no dia a dia dos infectados pelo<br />

HIV, a professora da Escola de Enfermag<strong>em</strong><br />

da UFMG, Maria Imaculada de Fátima Freitas,<br />

iniciou, nos anos 1990, estudos ligados<br />

ao t<strong>em</strong>a. Em 1993, havia realizado estudo<br />

sobre as interações de cônjuges quando um<br />

deles estava <strong>em</strong> tratamento para hanseníase<br />

e, <strong>em</strong> 1996/1997, quando os antirretrovirais<br />

foram introduzidos no Brasil, realizou a mesma<br />

pesquisa com casais com Aids, para, <strong>em</strong><br />

seguida, comparar os resultados dos dois<br />

estudos. A partir daí, desenvolveu diversas<br />

pesquisas sobre questões psicossociais de<br />

pessoas vivendo com HIV ou Aids, como<br />

aquelas relativas à adesão ao tratamento,<br />

maternidade e HIV, experiências sociais considerando<br />

faixas etárias, além de outras.<br />

“Antes só se usava o AZT, mas o<br />

governo brasileiro passou a distribuir gratuitamente<br />

os antirretrovirais e houve uma<br />

diferença no controle da infecção e no tratamento<br />

dos pacientes”, diz. Durante o estudo<br />

acompanhou casais da rede pública<br />

de saúde, <strong>em</strong> que o marido, a mulher ou os<br />

dois estavam infectados, <strong>em</strong> Belo Horizonte.<br />

Foram ouvidos casais com relacionamentos<br />

com mais de um ano até aqueles que estavam<br />

juntos há mais de duas décadas <strong>em</strong><br />

que os dois estavam infectados. O objetivo<br />

era acompanhar uma narrativa das vidas<br />

dessas pessoas com a finalidade de saber<br />

como viviam. Enfim, a ideia era fazer com<br />

que pensass<strong>em</strong> sobre os seus probl<strong>em</strong>as.<br />

Dez anos depois, <strong>em</strong> 2006, uma nova<br />

pesquisa foi feita com outros casais, e o<br />

que se constatou é que houve mudança no<br />

perfil epid<strong>em</strong>iológico <strong>em</strong> decorrência da<br />

queda das taxas de mortalidade e das melhorias<br />

no controle da doença. Ambos os<br />

estudos evidenciaram que a revelação do<br />

diagnóstico é s<strong>em</strong>pre um grande susto. “A<br />

pergunta que eles se faz<strong>em</strong> é: ‘por que eu?’.<br />

O sentimento de culpa também existe e, no<br />

momento da revelação, o medo da morte<br />

ainda é muito forte”, comenta. De acordo<br />

com a professora, os homens, <strong>em</strong> geral,<br />

descobr<strong>em</strong> primeiro.<br />

Nas duas pesquisas, notou que eles<br />

têm muito receio de falar sobre o assunto.<br />

“Há s<strong>em</strong>pre um silenciamento inicial.<br />

O cônjuge percebe que algo está errado,<br />

mas não sabe o que é. É um momento de<br />

muita fragilidade no casal. Quando há a<br />

revelação, leva-se mais susto, e eu digo<br />

que a Aids é um revelador de traição, do<br />

que já se sabia antes, mas não tinha certeza.<br />

Um revelador da fragilidade ou da<br />

força da relação, do desamor. A Aids se<br />

torna naquele momento uma tela <strong>em</strong> que<br />

ambos enxergam o relacionamento. É um<br />

momento de muito questionamento e sofrimento”,<br />

observa. A pesquisa mostra que<br />

a grande questão <strong>em</strong> todo o t<strong>em</strong>po da Aids<br />

é a gestão do segredo, não apenas sobre a<br />

doença, mas sobre os medos, fragilidade,<br />

culpa, como cada um se vê diante do mundo,<br />

não é só o t<strong>em</strong>or de ser excluído.<br />

O diagnóstico da Aids obriga o casal<br />

a se reestruturar, como <strong>em</strong> qualquer outra<br />

doença grave, como um Acidente Vascular<br />

Cerebral (AVC) ou um infarto do miocárdio,<br />

explica a pesquisadora. O modo como cada<br />

pessoa vai tratar o assunto com seu parceiro<br />

é que pode mudar. Segundo Maria Imaculada,<br />

exist<strong>em</strong> três possibilidades: fugir; esperar<br />

o impacto da notícia passar s<strong>em</strong> aprofundar<br />

verdades que não se quer (ou não<br />

se pode) encarar; ou enfrentar o probl<strong>em</strong>a,<br />

restabelecendo ou terminando o relacionamento.<br />

Os que continuaram juntos foram os<br />

casais que participaram das duas pesquisas.<br />

Nelas, houve relatos de mulheres sobre a<br />

descoberta do diagnóstico do marido, como<br />

a que só ficou sabendo porque, precisando<br />

de dinheiro, mexeu na carteira do marido,<br />

quando ele dormia, e encontrou o resultado<br />

aí guardado há mais de um mês. Estarrecida,<br />

sentindo-se duplamente traída, essa mulher<br />

viveu um período de sentimentos contraditórios<br />

entre raiva e medo de estar infectada.<br />

Fazer o exame e esperar o resultado neste<br />

caso é considerado uma tortura na relação<br />

do casal. O hom<strong>em</strong> se sente culpado, “não<br />

t<strong>em</strong> o que dizer” e sente fort<strong>em</strong>ente o desejo<br />

de morrer, na maioria dos casos.<br />

Em 1996, era o conflito da dor do<br />

sentimento, do medo da morte rápida, e este<br />

medo continua existindo hoje, mas agora<br />

há um jogo interativo mais fácil de ser feito,<br />

porque se vive mais t<strong>em</strong>po mesmo com a<br />

doença. Nessa reestruturação da vida a dois,<br />

o que se percebe é que os casais que permanec<strong>em</strong><br />

juntos, após o diagnóstico, vão<br />

buscar a mesma lógica interativa que eles tinham<br />

antes, como observa a pesquisadora:<br />

“Se havia negação, silenciamento, conflitos<br />

explícitos e uma interação conflituosa, após<br />

a descoberta do diagnóstico e após um período<br />

há uma ‘acalmada’ na relação porque<br />

aparece naquele momento o sofrimento do<br />

outro e uma solidariedade amorosa. Mas,<br />

com o passar do t<strong>em</strong>po, a lógica anterior de<br />

‘tapas e beijos’ volta como antes”.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 9


A doença t<strong>em</strong> o poder de reorganizar<br />

o relacionamento, mas isso aconteceria<br />

por causa do impacto da notícia. Já nas<br />

relações <strong>em</strong> que havia uma solidariedade<br />

entre o casal, diálogo, vida amorosa e sexual<br />

estável e alegre, tudo isso se perde no<br />

momento da revelação da doença. “É um<br />

conflito, e quando eles se entend<strong>em</strong> voltam<br />

para a fase anterior. Isso é muito forte nas<br />

duas pesquisas. Há um período mais longo<br />

ou curto de calmaria ou de caos na relação,<br />

e isso é determinado pelo grau do adoecimento<br />

de um dos cônjuges”, destaca.<br />

Entre os casais de 1996, a atividade<br />

sexual estava comprometida, não havia<br />

desejo, e sim raiva, impotência e descaso,<br />

diferent<strong>em</strong>ente das entrevistas de 2006. As<br />

pessoas ouvidas dez anos depois estariam<br />

mais dispostas fisicamente e menos adoecidas.<br />

“Não pod<strong>em</strong>os afirmar, mas a possibilidade<br />

de alcançar uma vida melhor inclui<br />

o sexo porque existe mais disposição física<br />

e também porque os medicamentos foram<br />

aprimorados. Ao mesmo t<strong>em</strong>po, o desejo<br />

do outro, a atividade sexual prazerosa não<br />

existe só porque você t<strong>em</strong> vigor, ela v<strong>em</strong><br />

pelo desejo <strong>em</strong>ocional e psicológico do<br />

relacionamento”, conta.<br />

Outro fator diretamente ligado à<br />

adesão do tratamento é a condição social<br />

dos pacientes. Na pesquisa realizada pela<br />

professora Maria Imaculada Freitas foram<br />

entrevistados desde casais de classe média<br />

alta até pessoas menos favorecidas economicamente.<br />

Mesmo que sejam assistidos<br />

por um médico particular ou vinculado<br />

a um plano de saúde, todos também são<br />

acompanhados no serviço público, que faz<br />

a distribuição dos antirretrovirais. “Casais<br />

mais sólidos tend<strong>em</strong> a aderir melhor ao<br />

tratamento. O casal que é mais unido vive<br />

a sua história com mais força e se ajuda<br />

nos momentos difíceis”, diagnostica.<br />

Durante as entrevistas, a professora<br />

encontrou uma situação, que ela caracteriza<br />

como anedota. Maria Imaculada Freitas<br />

conheceu um casal jov<strong>em</strong>, que tinham um<br />

relacionamento longo, de aproximadamente<br />

oito anos. Eles se destacavam pela beleza,<br />

aparência “saudável” e boa condição<br />

financeira, mas o rapaz descobriu que era<br />

soropositivo. “A namorada dele não tinha<br />

corag<strong>em</strong> de fazer o exame e, quando se decidiu,<br />

soube que não estava contaminada.<br />

Eles continuaram juntos, principalmente<br />

quando ele teve uma fase mais doente,<br />

e depois terminaram. T<strong>em</strong>pos depois,<br />

este hom<strong>em</strong> conheceu uma outra mulher,<br />

não-infectada, casaram-se, hoje têm uma<br />

criança nascida por meio de ins<strong>em</strong>inação<br />

artificial e eles têm um casamento feliz.<br />

Isso mostra que houve um acordo entre<br />

este casal de só ter<strong>em</strong> relação sexual<br />

protegida e porque ele teve corag<strong>em</strong> de se<br />

abrir com ela. Chamo de anedota por ser<br />

um caso raro <strong>em</strong> vários aspectos, e parte<br />

desta história só foi possível graças à boa<br />

condição financeira dele”, destaca.<br />

Pesquisas e Vacina Anti-HIV<br />

Entre os anos de 2004 e 2010, o Ministério<br />

da Saúde financiou 244 projetos<br />

de pesquisa, totalizando R$ 55,9 milhões,<br />

a partir de 15 editais de pesquisa lançados<br />

<strong>em</strong> todas as áreas de conhecimento do<br />

HIV, por meio de editais públicos anuais.<br />

De acordo com o coordenador do Departamentode<br />

DST/AIDS e Hepatites Virais,<br />

Dirceu Greco, o Estado de Minas Gerais<br />

t<strong>em</strong> contribuição relevante <strong>em</strong> todas as<br />

pesquisas executadas pelo Ministério da<br />

Saúde. “Pod<strong>em</strong>os citar como ex<strong>em</strong>plo<br />

o estudo de prevalência entre conscritos<br />

das Forças Armadas, o estudo de sentinela<br />

parturientes, Qualiaids, e estudos de sobrevida,<br />

além de estudos de coortes que<br />

vêm sendo executado há muitos anos <strong>em</strong><br />

Minas. Estes estudos traz<strong>em</strong> dados importantes<br />

a fim de definir políticas específicas<br />

para prevenção, melhora da qualidade de<br />

vida e também para futuros ensaios com<br />

vacinas candidatas anti-HIV”, explica.<br />

Além disto, a FAPEMIG e o Departamento<br />

de DST, Aids e Hepatites Virais da Secretaria<br />

de Vigilância <strong>em</strong> Saúde do MS estão<br />

<strong>em</strong> processo de estabelecer um acordo<br />

para editais de pesquisa <strong>em</strong> Aids, financiado<br />

pelas duas instituições.<br />

Segundo Greco, de 2006 a 2010, o<br />

Departamento de DST/AIDS e Hepatites<br />

Virais financiou 16 projetos de pesquisa<br />

relacionadas às vacinas e microbicidas,<br />

totalizando R$ 5,4 milhões. Também foi<br />

lançado o “Plano Brasileiro de Vacinas anti-HIV<br />

2008-2012”. “O objetivo é fortalecer<br />

a participação do Brasil no esforço global<br />

para descobrir, avaliar, produzir e propiciar<br />

acesso a vacinas anti-HIV. O Plano propicia<br />

maior integração da comunidade científica<br />

e tecnológica brasileira no esforço<br />

internacional e na estratégia global para o<br />

desenvolvimento de uma vacina anti-HIV”,<br />

conta. Esta iniciativa deverá viabilizar, também,<br />

a inserção da pesquisa e desenvolvimento<br />

nesta área, na política tecnológica<br />

e industrial brasileira, envolvendo-o numa<br />

perspectiva multisetorial. O médico destaca<br />

que, para que se uma vacina eficaz seja<br />

desenvolvida, é necessário considerar os<br />

aspectos logísticos, comportamentais, de<br />

custo e disponibilidade, as implicações na<br />

prevenção e éticos, entre outros el<strong>em</strong>entos.<br />

Efeitos colateriais<br />

A qualidade de vida e as condições<br />

de saúde das pessoas que viv<strong>em</strong> com HIV<br />

e Aids são b<strong>em</strong> melhores do que há alguns<br />

anos, graças à medicação disponível. Uma<br />

pessoa recém-diagnosticada <strong>em</strong> t<strong>em</strong>po<br />

adequado, que se utilizar dos medicamentos<br />

de maneira correta e constante (adesão<br />

ao tratamento), provavelmente não evoluirá<br />

para a Aids no Brasil. No entanto, exist<strong>em</strong><br />

impactos no uso prolongado de antirretrovirais.<br />

Se, por um lado, eles reduziram a<br />

taxa de mortalidade diretamente causada<br />

por Aids, por outro, o aparecimento de<br />

efeitos adversos e suas consequências pod<strong>em</strong><br />

fazer parte da vida do paciente.<br />

Entre essas consequências estão o<br />

aumento do risco de eventos cardiovasculares<br />

(como infartos, devido às alterações<br />

metabólicas, como elevações de colesterol),<br />

lipodistrofia, que pode afetar a autoestima, toxicidade<br />

renal e hepática (fígado). “É preciso<br />

que o paciente tenha acesso a cuidados profissionais<br />

de qualidade, com capacidade para<br />

ajudá-lo a enfrentar as dificuldades inerentes<br />

ao tratamento prolongado. E também para<br />

estimular e dar acesso a dieta equilibrada e<br />

exercícios físicos”, ensina Dirceu Greco.<br />

A polêmica da descoberta<br />

No mundo acadêmico existiu uma<br />

polêmica sobre a descoberta do vírus da<br />

Aids. Uma equipe francesa e outra norte-<br />

-americana lutaram durante anos pelo título<br />

da descoberta. Enquanto os pacientes<br />

viviam com a esperança de que os cientistas<br />

10 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


descobriss<strong>em</strong> a cura da Aids, na década de<br />

1980, a autoria pela descoberta do vírus HIV<br />

e a criação do primeiro exame capaz de detectar<br />

o vírus gerou uma disputa científica<br />

e comercial entre França e EUA. O cientista<br />

estadunidense Robert Gallo, também citado<br />

como descobridor do vírus, chegou a ser<br />

acusado de fraude por uma equipe francesa.<br />

Em 1987, os então presidentes da<br />

França, Jacques Chirac, e dos EUA, Ronald<br />

Reagan, decidiram que os dois países iriam<br />

dividir o crédito pela descoberta. No entanto,<br />

nos anos 1990, os Estados Unidos reconheceram<br />

que os franceses mereciam uma parcela<br />

maior dos royalties dos produtos derivados<br />

da descoberta, solidificando a posição de<br />

Luc Montagnier como principal descobridor.<br />

Em 2008, três cientistas dividiram o Prêmio<br />

Nobel de Medicina daquele ano, sendo os<br />

franceses Françoise Barre-Sinoussi e Luc<br />

Montagnier, pela descoberta do vírus causador<br />

da Aids, o HIV; e o al<strong>em</strong>ão Harald zur<br />

Hausen, pela descoberta de que o papilomavírus<br />

humano (HPV) pode provocar câncer<br />

de colo do útero. Robert Gallo não recebeu<br />

o prêmio, apesar de ter seu nome destacado<br />

na documentação que justifica a pr<strong>em</strong>iação,<br />

divulgada pelo Comitê Nobel.<br />

Os números da Aids<br />

Os números da Aids impressionam,<br />

apesar das campanhas de conscientização<br />

e todos os avanços da medicina no<br />

controle e combate à doença. O Departamento<br />

de DST, Aids e Hepatites Virais do<br />

Ministério da Saúde contabiliza, <strong>em</strong> média,<br />

11.000 óbitos <strong>em</strong> decorrência da doença<br />

no Brasil. Em Minas Gerais, desde 1980,<br />

foram notificados 41.791 casos e 15.154<br />

pessoas perderam a vida vítimas da Aids. A<br />

maior incidência de casos ainda é entre os<br />

homens, mas, a cada ano, essa diferença<br />

v<strong>em</strong> diminuindo. O aumento proporcional<br />

do número de casos entre mulheres pode<br />

ser observado pelo número de casos <strong>em</strong><br />

homens dividido pelo número de casos <strong>em</strong><br />

mulheres. Em 1989, para cada seis casos<br />

de Aids no sexo masculino havia um caso<br />

no sexo f<strong>em</strong>inino. Em 2009, a proporção<br />

diminuiu, passando de 1,6 caso <strong>em</strong> homens<br />

para cada caso <strong>em</strong> mulheres.<br />

A faixa etária <strong>em</strong> que a Aids é mais incidente,<br />

<strong>em</strong> ambos os sexos, é a de 20 a 59<br />

anos de idade. Entre 13 e 19 anos, o número<br />

de casos é maior entre as mulheres. São, <strong>em</strong><br />

média, oito casos <strong>em</strong> meninos para cada dez<br />

<strong>em</strong> meninas. Mas, <strong>em</strong> relação aos jovens,<br />

os dados apontam que, <strong>em</strong>bora eles tenham<br />

elevado conhecimento sobre prevenção<br />

das DSTs, há tendência de crescimento do<br />

HIV. Contudo, a maioria dos casos, no sexo<br />

masculino, se dá entre jovens homossexuais<br />

(26,8%) e bissexuais (10,2%).<br />

Estima-se que 630 mil pessoas vivam<br />

com o vírus no Brasil e, pelo menos,<br />

255 mil não sab<strong>em</strong> que são portadoras ou<br />

nunca fizeram o teste de HIV. Entre 2005<br />

e 2009, com a adoção do Programa Fique<br />

Sabendo, testes de HIV distribuídos e pagos<br />

pelo SUS mais que dobraram: passaram<br />

de 3,3 milhões para 8,9 milhões de<br />

unidades. Os testes realizados para o HIV<br />

no País passaram de 23,9% <strong>em</strong> 1998 para<br />

38,4% <strong>em</strong> 2008.<br />

A epid<strong>em</strong>ia da Aids no Brasil está<br />

estabilizada <strong>em</strong> patamar ainda não satisfatório,<br />

com a taxa de incidência <strong>em</strong> torno<br />

de 20 casos por 100 mil habitantes. Em<br />

2009, foram notificados 38.538 casos da<br />

doença. Os dados do Ministério da Saúde<br />

refer<strong>em</strong>-se apenas aos casos de Aids e não<br />

àqueles infectados pelo HIV.<br />

Apesar de o número total de casos no<br />

sexo masculino ser maior entre heterossexuais,<br />

a epid<strong>em</strong>ia no País é concentrada.<br />

Isso significa que a prevalência da infecção<br />

na população de 15 a 49 anos é menor que<br />

1% (0,61%), mas é maior do que 5% nos<br />

subgrupos de maior vulnerabilidade para a<br />

infecção pelo HIV – como homens que faz<strong>em</strong><br />

sexo com homens (HSH), usuários de<br />

drogas (UD) e profissionais do sexo (PS).<br />

Óbitos e discriminação<br />

“O percentual significativo dos óbitos<br />

ocorre pelo diagnóstico ou acesso tardio<br />

ao tratamento, e o Ministério t<strong>em</strong> buscado<br />

junto com os estados e municípios aumentar<br />

as oportunidades para o diagnóstico e<br />

reforçar com os profissionais de saúde a<br />

necessidade de oferecimento de sorologia,<br />

com os devidos aconselhamentos, não só<br />

para o HIV, mas também para sífilis e hepatites<br />

virais”, anuncia Dirceu Greco.<br />

Segundo o médico, esses números<br />

relativamente baixos <strong>em</strong> todas as avaliações,<br />

seja prevalência, incidência e até mesmo<br />

na mortalidade, mostram o lado positivo<br />

do enfrentamento da epid<strong>em</strong>ia. Por outro<br />

lado, há muitos desafios e dificuldades.<br />

“Por ex<strong>em</strong>plo, o acesso universal aos insumos<br />

de diagnóstico, prevenção e tratamento,<br />

ex<strong>em</strong>plo para muitos outros países, pode<br />

levar a certa complacência, à sensação no<br />

imaginário popular de que a epid<strong>em</strong>ia está<br />

controlada. Isto pode diminuir os cuidados<br />

na prevenção e pode dificultar o necessário<br />

espaço na mídia para esta discussão”, argumenta.<br />

E acrescenta que, apesar do “medo<br />

generalizado” que existia antigamente ter<br />

diminuído, ainda há longo caminho a percorrer<br />

para diminuir o preconceito e impedir<br />

a discriminação que ainda afeta as populações<br />

com maior vulnerabilidade ao HIV.<br />

A cura<br />

Diversas pesquisas estão sendo realizadas<br />

<strong>em</strong> centros de pesquisa do Brasil e<br />

do exterior, e toda a comunidade científica<br />

mundial está <strong>em</strong>penhada na busca da cura<br />

para a doença. No entanto, apesar de todos<br />

os esforços, esta ainda não foi alcançada<br />

e n<strong>em</strong> a perspectiva a curto prazo para a<br />

disponibilização de uma vacina eficaz. O<br />

que explica essa dificuldade é a complexidade<br />

e a grande capacidade de mutação do<br />

vírus. De acordo com Greco, há pesquisas<br />

buscando tecnologias para a cura da AIDS<br />

e, atualmente, exist<strong>em</strong> ensaios clínicos<br />

internacionais buscando novos medicamentos<br />

para ser<strong>em</strong> usados <strong>em</strong> associação<br />

para combater os vírus latentes. “Estes são<br />

responsáveis pela manutenção da infecção<br />

mesmo entre pessoas que receb<strong>em</strong> hoje<br />

tratamento eficaz, pois são incapazes de<br />

eliminá-los”, afirma.<br />

@<br />

Saiba mais:<br />

Acesse o nosso blog e leia mais<br />

sobre os 30 anos da Adis, além<br />

da entrevista completa com a<br />

professora Virgínia Schall.<br />

fap<strong>em</strong>ig.wordpress.com<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 11


ENGENHARIA<br />

Forte<br />

como rocha<br />

Pesquisa apresenta projeto de construção<br />

resistente a terr<strong>em</strong>otos e furacões<br />

Ariadne Lima<br />

Prático trabalhou dias a fio para<br />

construir sua casa de pedra, tão firme e<br />

b<strong>em</strong> acabada que n<strong>em</strong> o sopro forte do<br />

Lobo conseguiu derrubar. Seus irmãos,<br />

Cícero e Heitor, mais preguiçosos e menos<br />

engenhosos, não tiveram a mesma<br />

sorte: viram suas casinhas de palha e<br />

madeira caír<strong>em</strong> por terra, diante do me-<br />

nor sopro do malfeitor. A história dos Três<br />

Porquinhos, tão presente no imaginário<br />

das crianças, poderia ter um final mais<br />

feliz se os irmãos mal sucedidos tivess<strong>em</strong><br />

aplicado engenharia às suas construções.<br />

“Se os porquinhos tivess<strong>em</strong> noções de<br />

equilíbrio, eles estariam protegidos. Bastava<br />

colocar os contrapontos no lugar<br />

certo”, diz o engenheiro civil, mestre e<br />

doutor na área, Ernani de Araújo, recordando<br />

a história infantil. Ele orientou uma<br />

pesquisa de mestrado na Universidade<br />

Federal de Ouro Preto (Ufop) que propõe<br />

uma estrutura mais estável e segura às<br />

edificações, mesmo quando submetidas a<br />

fortes ventos e terr<strong>em</strong>otos.<br />

12 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


A proposta foi t<strong>em</strong>a da dissertação<br />

de Cristina Evangelista Silva e consiste<br />

<strong>em</strong> um modelo arquitetônico e estrutural<br />

específico, voltado para a construção residencial<br />

para famílias de baixa à média<br />

renda, respeitando os conceitos de sustentabilidade.<br />

A pesquisa começou há 10<br />

anos, com a dissertação da aluna Laila<br />

Nuique, que propôs o desenvolvimento<br />

de uma estrutura metálica <strong>em</strong> aço, mais<br />

econômica para construções comerciais.<br />

A ideia foi amadurecida e ganhou nova<br />

forma na dissertação de Evangelista.<br />

A nova pesquisa apresenta um projeto<br />

de construção alternativa industrializada,<br />

viável economicamente e resistente,<br />

principalmente ao vento. Isso se dá por<br />

meio do pórtico desenvolvido, que é<br />

confeccionado <strong>em</strong> aço e é bidirecional,<br />

ou seja, posicionado <strong>em</strong> duas direções,<br />

garantindo a segurança da construção.<br />

Segundo descreve Evangelista, os pórticos<br />

apresentados são modelos espaciais<br />

formados por arcos que se cruzam e proporcionam<br />

a estabilidade de uma construção<br />

<strong>em</strong> duas direções perpendiculares,<br />

quando submetidos a ações externas,<br />

como abalos sísmicos e ventos de até 200<br />

km/h. “Com esse tipo de pórtico, o vento<br />

pode bater <strong>em</strong> qualquer direção e a construção<br />

fica segura”, afirma Ernani Araújo.<br />

O trabalho incluiu uma análise estrutural<br />

por meio da construção de maquetes<br />

físicas e de simulações virtuais, que indicaram<br />

questões como resistência e deformações<br />

provocadas na estrutura <strong>em</strong> razão<br />

do vento. “Também foi feita a análise da<br />

arquitetura, com o estudo da modelag<strong>em</strong><br />

da estrutura, da geometria e do espaço a<br />

ser ganho. Depois, foram feitas as outras<br />

análises, como deslocamento, vinculação<br />

e condições de contorno”, relata Araújo.<br />

Para as análises, foram utilizados os programas<br />

de computador AutoCad (projeto<br />

arquitetônico e estrutural); SketchUp<br />

(modelag<strong>em</strong> <strong>em</strong> 3D) e Ansys (análise estrutural<br />

dos pórticos bidirecionais). Uma<br />

El<strong>em</strong>ento estrutural que dá equilíbrio<br />

e rigidez à construção no ponto <strong>em</strong><br />

que é aplicado, podendo ser retangular,<br />

quadrangular ou circular.<br />

análise comparativa com outros modelos<br />

estruturados <strong>em</strong> aço e com a construção<br />

convencional foi realizada por meio do<br />

programa Cypecad. “Com os resultados<br />

obtidos, concluímos que o perfil de análise<br />

suportou os carregamentos aplicados,<br />

não houve rompimento da estrutura e sua<br />

deformação e deslocamento foram muito<br />

pequenos”, relata Cristina Evangelista.<br />

O modelo proposto também se difere<br />

dos convencionais pelo uso de formas arredondadas.<br />

Pela análise estrutural do formato,<br />

usando conceitos de engenharia civil, foram<br />

investigadas as tipologias estruturais, apontando<br />

que o formato <strong>em</strong> arco é mais fácil de<br />

ser executado e eficiente. Esse principio também<br />

foi aplicado na construção dos pórticos.<br />

“Os romanos já sabiam que modelos circulares<br />

e parabólicos são os melhores. No Coliseu,<br />

por ex<strong>em</strong>plo, muita coisa é feita <strong>em</strong> arco.<br />

O mais eficiente é o modelo parabólico, mas,<br />

por ser mais difícil de executar, o circular é<br />

mais usado”, elucida Ernani Araújo.<br />

Ação e reação<br />

Qu<strong>em</strong> já passou do ensino médio e<br />

não matou as aulas de Física certamente vai<br />

se l<strong>em</strong>brar da 3ª Lei de Newton (Lei da Ação<br />

e Reação), segundo a qual um corpo A, que<br />

exerce força sobre um corpo B, recebe deste<br />

uma força de mesma intensidade, mesma<br />

direção e <strong>em</strong> sentido contrário. É o que acontece<br />

nas construções a todo o momento, <strong>em</strong><br />

razão de ações externas como peso, ventos<br />

e impactos. “Quando um vento bate <strong>em</strong> uma<br />

construção, ele provoca pressão e sucção.<br />

Quando esses dois efeitos se somam, ele<br />

tende a arrancar parte da construção. Assim,<br />

o vento pode arrancar janelas, portas e telhas<br />

de uma edificação”, explica Araújo.<br />

As reações acontec<strong>em</strong> <strong>em</strong> movimentos<br />

internos e, com base nesses esforços, os<br />

pesquisadores chegaram às medidas exatas<br />

e mais adequadas aos tubos que formam os<br />

pórticos. Outra inovação apresentada na pesquisa<br />

é a flexibilidade desses tubos, alcançada<br />

por meio de indução eletromagnética. “Ela<br />

permite a curvatura do material, formando<br />

pórticos <strong>em</strong> arcos que se cruzam no espaço,<br />

<strong>em</strong> direções travadas, deixando a construção<br />

livre de ações horizontais (ventos). Não existe<br />

na história da engenharia, n<strong>em</strong> da arquitetura,<br />

o conceito de pórticos de estabilização bidire-<br />

“Com os resultados obtidos,<br />

concluímos que o perfil<br />

de análise suportou os<br />

carregamentos aplicados,<br />

não houve rompimento da<br />

estrutura e sua deformação<br />

e deslocamento foram muito<br />

pequenos”.<br />

Cristina Evangelista<br />

Pesquisadora<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 13


cionais. Esta é a grande inovação do projeto”,<br />

diz Araújo. “Além disso, nossa construção é<br />

mais leve, mais resistente estruturalmente,<br />

mais barata e dentro do conceito de sustentabilidade,<br />

com poucos resíduos e poucas<br />

perdas”, completa.<br />

De acordo com o engenheiro, para a<br />

próxima etapa, o ideal é fazer a análise numérica<br />

da estrutura, desenvolver um protótipo<br />

e testá-lo <strong>em</strong> um laboratório apropriado<br />

para a simulação de vento <strong>em</strong> estruturas,<br />

o que ainda não existe na Universidade. A<br />

ideia é fazer o pedido da patente do projeto,<br />

que será apresentado no ano que v<strong>em</strong> <strong>em</strong><br />

um congresso na Inglaterra.<br />

Sons e t<strong>em</strong>peraturas<br />

A preocupação com o conforto térmico<br />

e acústico do tipo de construção proposta<br />

também fez parte da pesquisa. Para<br />

isso, Cristina Evangelista teve a orientação<br />

do engenheiro mecânico, mestre e doutor<br />

na área de Engenharia Térmica, Henor Artur<br />

de Souza. De acordo com o orientador,<br />

os resultados da pesquisa apontaram que,<br />

no que se refere aos confortos térmico e<br />

acústico, o projeto apresenta des<strong>em</strong>penho<br />

adequado, considerando as características<br />

do material utilizado. “O projeto t<strong>em</strong> todas<br />

as aberturas propostas e material adequado<br />

de fechamento de alto des<strong>em</strong>penho. Ele<br />

se adequa às varias regiões climáticas do<br />

país. A única alteração que poderia ser proposta<br />

diz respeito à ventilação, que pode<br />

ser alterada de acordo com as condições<br />

locais do clima”, diz.<br />

Segundo Souza, a intenção é continuar<br />

a avaliação do des<strong>em</strong>penho térmico<br />

da construção, <strong>em</strong> uma fase de continuidade<br />

ao trabalho. As avaliações são realizadas<br />

por meio de simulação numérica,<br />

utilizando um programa de computador<br />

chamado Energyplus. São considerados<br />

os dados de dimensão do projeto (volume)<br />

e os materiais utilizados no fechamento,<br />

como piso e cobertura, com simulações de<br />

variados climas, para analisar o comportamento<br />

da estrutura.<br />

No sist<strong>em</strong>a convencial: a estrutura das construções é<br />

composta por pilares e vigas de concreto armado.<br />

Na construção proposta: a estrutura que sustenta a<br />

cobertura é composta por dois módulos de pórticos bidirecionais.<br />

14 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


País Tropical<br />

Popularmente, o Brasil é considerado<br />

alvo das dádivas divinas pelo clima tropical<br />

e por não ser um país propenso à ocorrência<br />

de terr<strong>em</strong>otos e furacões. O que torna<br />

interessante, então, a construção de edifícios<br />

resistentes a desastres naturais desse<br />

tipo? De acordo com o Secretário Executivo<br />

do Fórum Mineiro de Mudanças Climáticas<br />

Globais, Milton Nogueira, <strong>em</strong>bora não sejam<br />

de grande impacto, o Brasil registra tr<strong>em</strong>ores<br />

<strong>em</strong> vários pontos, devido a situações<br />

como o ajuntamento de camadas de terra.<br />

Conforme mostra o site do Observatório<br />

Sismológico da Universidade de<br />

Brasília (UNB), disponível <strong>em</strong> http://www.<br />

obsis.unb.br/, os abalos mais recentes<br />

ocorreram <strong>em</strong> Minas Gerais, nas cidades de<br />

Nova Lima, Montes Claros, Caraíbas e Ijaci.<br />

Os tr<strong>em</strong>ores ocorr<strong>em</strong>, principalmente, <strong>em</strong><br />

regiões de solos calcários, mais propensos<br />

ao ajuntamento de terra, e onde há prática<br />

da mineração, devido aos impactos provocados<br />

pela atividade. Segundo Nogueira, o<br />

aumento de casos conhecidos nos últimos<br />

anos não deve ser atribuído ao aumento de<br />

ocorrências, mas ao desenvolvimento de<br />

sismógrafos mais sensíveis. Apesar das alterações<br />

no clima global, o Brasil permanece<br />

pouco vulnerável a grandes terr<strong>em</strong>otos,<br />

uma vez que não está sob ação de placas<br />

tectônicas <strong>em</strong> seu território.<br />

Já no caso de ventos fortes, o Brasil está<br />

mais propenso, <strong>em</strong>bora nunca tenha registrado<br />

grandes furacões. Nogueira afirma que é<br />

possível que as mudanças climáticas afet<strong>em</strong><br />

a velocidade dos ventos <strong>em</strong> todo o mundo,<br />

mas não é possível prever casos assim nas<br />

microrregiões, como Minas Gerais, por<br />

ex<strong>em</strong>plo. Diante disso, o especialista acredita<br />

na importância da pesquisa para a prevenção<br />

de ações provocadas pelas alterações no<br />

clima. “As mudanças climáticas vão afetar<br />

as construções não só pela velocidade dos<br />

ventos, mas também pelo aumento do volume<br />

de água e as variações de t<strong>em</strong>peratura. A<br />

construção deve ser resistente na estrutura,<br />

mas também não deve estar sujeita a mofo,<br />

excesso de umidade ou trincas na época da<br />

Aparelhos que registram a ocorrência<br />

e a intensidade de tr<strong>em</strong>ores de terra<br />

seca. É preciso que a arquitetura e a engenharia<br />

estejam preparadas para isso”, alerta.<br />

De acordo com Ernani Araújo, uma<br />

construção leve como as mais modernas<br />

está vulnerável à ação de ventos mais fortes.<br />

“Até quando ter<strong>em</strong>os estruturas seguras?”,<br />

indaga. “A ciência não consegue prever<br />

quando pode ocorrer o próximo terr<strong>em</strong>oto<br />

<strong>em</strong> qualquer lugar no mundo. Por isso,<br />

prevenir é importante”, afirma. “No Brasil, já<br />

t<strong>em</strong>os registros de fortes ventos <strong>em</strong> cidades<br />

do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São<br />

Paulo, etc. Os casos de coberturas arrancadas<br />

<strong>em</strong> postos de gasolina são ex<strong>em</strong>plos da<br />

ação de ventanias, que provocam pressão e<br />

sucção sobre as construções.”<br />

Mercado<br />

Ernani Araújo afirma que, ainda que<br />

o Brasil não represente um amplo mercado<br />

para os edifícios resistentes, o produto<br />

poderá ser exportado para países mais propensos<br />

à ocorrência de terr<strong>em</strong>otos e furacões.<br />

“É uma forma de agregar valor à nossa<br />

matéria-prima, que vai para outros países a<br />

preços irrisórios. Precisamos de gente que<br />

invista nisso”, diz.<br />

Para o presidente da regional Minas<br />

Gerais da Associação Brasileira de Engenheiros<br />

Civis (Abenc) e vice-presidente<br />

da Abenc Nacional, Iocanan Moreira, é<br />

importante trabalhar o t<strong>em</strong>a da construção<br />

resistente, especialmente <strong>em</strong> casos como<br />

o da pesquisa da Ufop, que também inclui<br />

a preocupação com a questão ambiental, a<br />

geração de resíduos e a redução de custos.<br />

“Nossa engenharia t<strong>em</strong> sido uma engenharia<br />

de exportação, mas ainda estamos engatinhando<br />

<strong>em</strong> termos de avanços e eles têm<br />

que ser colocados no mercado por meio de<br />

estudos como este”, destaca. O engenheiro<br />

também alerta para a importância da preocupação<br />

com a prevenção de impactos <strong>em</strong><br />

todas as etapas de uma construção. “A falta<br />

de estudo real de questões relacionadas à<br />

urbanização da cidade t<strong>em</strong> causado catástrofes<br />

como as que t<strong>em</strong>os visto na televisão.<br />

É preciso estudar criteriosamente a situação<br />

do terreno e a estrutura do local, e é importante<br />

que órgãos públicos façam um trabalho<br />

de prevenção. Na engenharia não há<br />

obras que não possam existir. Tudo precisa<br />

ser estudado”, alerta.<br />

Vantagens<br />

do modelo<br />

proposto sobre<br />

as construções<br />

convencionais<br />

• Rapidez e facilidade<br />

na execução da obra.<br />

• Possibilidade de desmontag<strong>em</strong> e<br />

reutilização <strong>em</strong> outro local.<br />

• Canteiro de obra limpo e com menos<br />

entulho.<br />

• Racionalização de materiais, diminuindo<br />

o desperdício.<br />

• Sist<strong>em</strong>a estrutural mais eficiente que<br />

o convencional, apresentando maior<br />

resistência estrutural a fortes ventos e<br />

até mesmo a abalos sísmicos.<br />

• Economia e menor<br />

consumo de aço da estrutura.<br />

• Apresenta uma solução de construção<br />

com menor impacto ao meio ambiente.<br />

• Economia e ganhos <strong>em</strong> área apresentando<br />

maior área construída com menor<br />

consumo de aço.<br />

• Apresenta maior eficiência econômica<br />

e estrutural com o uso de pórticos<br />

bidirecionais.<br />

• Apresenta melhor organização espacial<br />

dos ambientes com área íntima mais<br />

reservada da área social.<br />

• Possui área de serviço b<strong>em</strong> planejada<br />

e coberta.<br />

• Possui possibilidade de ampliação<br />

da casa s<strong>em</strong> sofrer alterações na sua<br />

volumetria.<br />

FONTE: SILVA, Cristina Evangelista. Sist<strong>em</strong>a de<br />

Cobertura com pórticos de estabilizações bidirecionais<br />

<strong>em</strong> perfis metálicos de seção circular<br />

com costura para construção residencial industrializada.<br />

2011, 176f. Dissertação (Mestrado<br />

<strong>em</strong> Construções Metálicas) - Programa de Pós-<br />

-Graduação <strong>em</strong> Engenharia Civil, Universidade<br />

Federal de Ouro Preto, Ouro Preto, 2011.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 15


ENERGIA<br />

Pesquisadores estudam aplicações e<br />

aperfeiçoamento de dispositivos da<br />

cadeia de produção de energia solar<br />

Virgínia Fonseca<br />

O Sol possui uma massa 330 mil vezes<br />

maior que a da Terra. No seu interior, a<br />

t<strong>em</strong>peratura média pode chegar a 15 milhões<br />

de graus Celsius. É neste núcleo que<br />

ocorr<strong>em</strong> reações químicas, como a fusão<br />

entre átomos de hidrogênio, produzindo<br />

energia que é transferida para as regiões externas<br />

do astro e alcança o espaço como luz<br />

solar. A luz <strong>em</strong>itida por esta estrela, distante<br />

150 milhões de quilômetros, é a principal<br />

fonte de energia do planeta e el<strong>em</strong>ento indispensável<br />

para a vida no globo terrestre.<br />

Nas últimas décadas, pesquisas <strong>em</strong><br />

todo o mundo têm buscado formas eficientes<br />

de se usar e armazenar esta energia.<br />

Um dos processos mais utilizados é a<br />

captação por meio de painéis ou módulos<br />

com células fotovoltaicas, capazes de converter<br />

a luz solar que nelas incide <strong>em</strong> eletricidade.<br />

Com o objetivo de desenvolver<br />

e aperfeiçoar esses módulos, b<strong>em</strong> como<br />

os processos para fabricá-los, o Centro<br />

Tecnológico de Minas Gerais (Cetec) iniciou,<br />

<strong>em</strong> suas dependências, um conjunto<br />

de aplicações da energia solar fotovoltaica.<br />

O primeiro deles, pela simplicidade e valor<br />

da aplicação, trata da iluminação pública<br />

com “postes solares”. O trabalho está sendo<br />

conduzido pelo Núcleo de Excelência<br />

<strong>em</strong> Materiais Solares (NMS).<br />

A instalação do poste, realizada <strong>em</strong><br />

agosto de 2011, deu início a testes de aplicabilidade,<br />

limitações e confiabilidade da<br />

tecnologia. O modelo, o primeiro de uma<br />

série, foi instalado no jardim da entrada<br />

principal do Cetec – local escolhido devido<br />

à boa incidência de luz solar, à necessidade<br />

de iluminação à noite e à visibilidade na instituição.<br />

“As atividades iniciais são de engenharia.<br />

Ainda serão instalados outros sist<strong>em</strong>as<br />

energizados pela luz solar, agora com<br />

apoio de <strong>em</strong>presas. Estes e outros sist<strong>em</strong>as<br />

<strong>em</strong> operação <strong>em</strong> regiões diversas do Brasil<br />

serão estudados”, explica o coordenador do<br />

NMS, José Roberto Tavares Branco.<br />

A partir da energia captada durante o<br />

dia (armazenada <strong>em</strong> baterias), o sist<strong>em</strong>a escolhido<br />

para d<strong>em</strong>onstração permite manter<br />

a iluminação por um período de seis horas<br />

e possui autonomia de dois dias s<strong>em</strong> incidência<br />

de raios solares. Foram utilizados<br />

recursos facilmente disponíveis na região<br />

metropolitana de BH, como lâmpadas fluorescentes<br />

compactas de 15W, acionadas<br />

automaticamente por um relé fotossensível,<br />

que identifica presença ou ausência de luminosidade.<br />

Alternativas mais modernas<br />

serão impl<strong>em</strong>entadas futuramente.<br />

Um dos principais objetivos do grupo<br />

do NMS é mostrar o potencial da energia<br />

solar para Minas Gerais e para a economia<br />

do Estado. A forma que os pesquisadores<br />

adotaram para fazer isto foi dando visibilidade<br />

a aplicações. Branco explica que a<br />

experiência está sendo utilizada para atrair<br />

a atenção para as oportunidades existentes.<br />

“Quer<strong>em</strong>os facilitar a percepção das pessoas<br />

de que esta energia t<strong>em</strong> um número de<br />

aplicações maior, muitas delas corriqueiras,<br />

e mais, Minas t<strong>em</strong> toda a matéria-prima de<br />

que precisamos”, explicita.<br />

Tudo se transforma<br />

A tecnologia fotovoltaica consiste na<br />

geração de eletricidade a partir da luz solar.<br />

16 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


“Com a tecnologia<br />

estabelecida, cada vez que<br />

se dobra a capacidade<br />

de produção, t<strong>em</strong>-se<br />

uma redução de 20% no<br />

custo. Ou seja, o custo<br />

desta energia v<strong>em</strong> caindo<br />

progressivamente, enquanto<br />

o das outras está subindo”<br />

José Roberto Tavares Branco<br />

Coordenador do NMS<br />

Esta energia é tratada por equipamentos<br />

para que possa ser utilizada e também armazenada<br />

<strong>em</strong> baterias ou de outras formas.<br />

O módulo fotovoltaico é um conjunto de<br />

células que pod<strong>em</strong> ter dimensões variadas,<br />

de cm² a m², compostas por um material capaz<br />

de absorver a luz – atualmente, o mais<br />

utilizado é o silício cristalino. A absorção<br />

dos raios solares provoca a liberação de<br />

elétrons, que deixam uma lacuna com carga<br />

positiva na estrutura eletrônica. A separação<br />

desses dois el<strong>em</strong>entos cria uma diferença<br />

de potencial, que é o chamado efeito fotovoltaico<br />

ou tensão voltaica. Uma outra camada<br />

fina, no fundo da placa, permite criar<br />

uma situação de interface. Ao conectar as<br />

duas superfícies, o elétron pode circular,<br />

gerando a eletricidade.<br />

A maior ou menor eficiência do<br />

dispositivo, segundo Branco, depende<br />

das condições ou especificidades da<br />

aplicação. “Como nós trabalhamos toda<br />

a cadeia de produção, faltava nos envolvermos<br />

com a aplicação, a fim de trazer<br />

resposta para a pergunta: que variáveis<br />

é preciso entender para melhorar os materiais<br />

e processos que produzimos até<br />

aqui?”, analisa. Neste processo, o grupo<br />

elencou algumas prioridades de aplicações<br />

e pretende dar visibilidade a elas.<br />

O sist<strong>em</strong>a utilizado no poste implantado<br />

é classificado como de geração isolada,<br />

pois a energia é produzida e utilizada<br />

no mesmo ponto, s<strong>em</strong> contato com a rede<br />

elétrica convencional. A conexão é do sist<strong>em</strong>a,<br />

diretamente do sol para a aplicação<br />

- é possível utilizá-la para iluminar pontos<br />

específicos e <strong>em</strong> situações mais elaboradas,<br />

como carros e mochilas, uma vez que<br />

já exist<strong>em</strong> tecidos com este dispositivo.<br />

Exist<strong>em</strong>, ainda, sist<strong>em</strong>as conectados à<br />

rede. Neste caso, a utilização <strong>em</strong> residências<br />

é a mais conhecida. Países como a Espanha<br />

e a Al<strong>em</strong>anha tornaram-se ex<strong>em</strong>plos<br />

para o mundo. “Eles criaram um sist<strong>em</strong>a<br />

de incentivo, pagando pela energia elétrica<br />

que a pessoa contribui para distribuir”,<br />

conta Branco. Os consumidores instalam<br />

painéis fotovoltaicos <strong>em</strong> seus telhados e a<br />

eletricidade gerada que não é consumida<br />

naquela residência é disponibilizada para a<br />

rede. “Com a tecnologia estabelecida, cada<br />

vez que se dobra a capacidade de produção,<br />

t<strong>em</strong>-se uma redução de 20% no custo. Ou<br />

seja, o custo desta energia v<strong>em</strong> caindo progressivamente,<br />

enquanto o das outras está<br />

subindo”, contabiliza o pesquisador.<br />

Branco esclarece que, apesar do potencial<br />

do país – o pior lugar do Brasil <strong>em</strong><br />

termos de radiação que poderia ser utilizada<br />

t<strong>em</strong> 40% a mais de incidência do que<br />

o melhor local na Al<strong>em</strong>anha – a energia<br />

fotovoltaica ainda não faz parte da matriz<br />

energética nacional, <strong>em</strong>bora existam algumas<br />

ações específicas implantadas. Daí a<br />

importância, segundo o pesquisador, de<br />

chamar atenção das pessoas para o fato de<br />

que há aplicações muito simples – como<br />

a utilização <strong>em</strong> pontos de iluminação de<br />

casas e sítios ou para bombear água <strong>em</strong><br />

uma pequena irrigação, por ex<strong>em</strong>plo. O<br />

uso para suprir processos de tratamento<br />

de água e o acionamento de equipamentos<br />

que funcionam com eletricidade de forma<br />

r<strong>em</strong>ota (geradores) também são citados.<br />

Outros conjuntos de aplicações a<br />

ser<strong>em</strong> impl<strong>em</strong>entadas inclu<strong>em</strong> bases para<br />

armazenamento de energia, para carregar<br />

baterias <strong>em</strong> geral, como de celular, que<br />

estariam disponíveis para utilização do<br />

público dentro do Cetec. “Por enquanto,<br />

são ações de d<strong>em</strong>onstração e validação<br />

de competências, a partir do conhecimento<br />

existente, tirando aprendizado do uso<br />

desses sist<strong>em</strong>as de geração para melhorarmos<br />

os produtos e processos com que<br />

trabalhamos”, ressalta o coordenador. Ele<br />

acrescenta que já há um projeto <strong>em</strong> parceria<br />

com <strong>em</strong>presa mineira. Nesta ação, o<br />

NMS conta <strong>em</strong> sua equipe com o professor<br />

Luís Guilherme Monteiro e estudantes de<br />

Engenharia de Energia do Instituto Politécnico<br />

da Pontifícia Universidade Católica de<br />

Minas Gerais (PUC-MG).<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 17


Foto: ACS/Cetec<br />

O modelo de “poste solar” instalado na entrada do Cetec é o primeiro de uma série<br />

O Sist<strong>em</strong>a Brasileiro de Tecnologia<br />

(Sibratec), operado pela Financiadora<br />

de Estudos e Projetos (Finep), é um<br />

instrumento de articulação e aproximação<br />

da comunidade científica e tecnológica<br />

com <strong>em</strong>presas. Um dos seus<br />

componentes são as Redes T<strong>em</strong>áticas<br />

de Centros de Inovação, formadas por<br />

grupos de desenvolvimento de institutos<br />

de pesquisa tecnológica com<br />

experiência na interação com <strong>em</strong>presas.<br />

Elas têm como objetivo gerar e<br />

transformar conhecimentos científicos<br />

e tecnológicos <strong>em</strong> produtos, processos<br />

e protótipos com viabilidade<br />

comercial para promover inovações<br />

radicais ou incr<strong>em</strong>entais.<br />

Made in Brazil<br />

A cadeia de produção de energia<br />

solar por meio de módulos fotovoltaicos<br />

passa pela obtenção do silício, fabricação<br />

das lâminas das células e construção do<br />

módulo propriamente dito, integração<br />

com componentes elétricos e eletrônicos.<br />

“Na parte de eletrônica exist<strong>em</strong> alguns<br />

equipamentos com os quais t<strong>em</strong>os pouca<br />

experiência no Cetec, então, estamos<br />

firmando projetos e cooperações com<br />

<strong>em</strong>presas do Vale da Eletrônica, de Santa<br />

Rita da Sapucaí, [a 420 km de Belo Horizonte]<br />

e com o Green Solar da PUC-MG”,<br />

detalha Branco. Ele explica que o grupo<br />

está promovendo a mobilização de atores<br />

<strong>em</strong> toda esta cadeia produtiva, o que deve<br />

contribuir para consolidar uma indústria<br />

fotovoltaica no Brasil, ação que vai ao<br />

encontro dos objetivos do Instituto de<br />

Energias Renováveis (Bioerg) – que busca<br />

dar suporte à implantação de pesquisa<br />

e desenvolvimento de produtos tecnológicos<br />

na área energética.<br />

Branco chama atenção para a necessidade<br />

de economia de energia <strong>em</strong><br />

nível mundial e busca de alternativas,<br />

com a consciência de que algumas fontes<br />

– como o próprio sist<strong>em</strong>a hidrelétrico<br />

brasileiro – encontram-se próximas<br />

do limite de produção. Energias limpas,<br />

como a eólica, que já entrou na matriz<br />

energética do país, e a solar tend<strong>em</strong> a<br />

se expandir. “Exist<strong>em</strong> vários projetos <strong>em</strong><br />

As ações no Cetec começaram a partir<br />

de uma parceria com a C<strong>em</strong>ig. Em um<br />

primeiro momento, foram <strong>em</strong>preendidos<br />

esforços também na formação de<br />

recursos humanos por meio da Red<strong>em</strong>at<br />

(Rede T<strong>em</strong>ática <strong>em</strong> Engenharia de Materiais)<br />

e outros programas <strong>em</strong> Minas.<br />

Atualmente, a iniciativa conta com o<br />

apoio também da FAPEMIG, do Ministério<br />

da Ciência e Tecnologia, da Financiadora<br />

de Estudos e Projetos (Finep),<br />

da Coordenação de Aperfeiçoamento de<br />

Pessoal de Nível Superior (Capes) e do<br />

Conselho Nacional de Desenvolvimento<br />

Científico e Tecnológico (CNPq).<br />

A PUC-MG possui trabalhos relacionados<br />

à parte eletrônica e ao des<strong>em</strong>penho<br />

elétrico do sist<strong>em</strong>a, b<strong>em</strong> como o Centro<br />

Federal de Educação Tecnológica (Cefet-<br />

-MG). As Universidades Federais de<br />

Minas Gerais (UFMG), de Viçosa (UFV)<br />

e de Uberlândia (UFU) também possu<strong>em</strong><br />

projetos a respeito. As atividades não<br />

estão totalmente interligadas, mas existe<br />

interesse, segundo o pesquisador, <strong>em</strong><br />

promover esta organização de esforços.<br />

andamento, acredito que dentro de uns<br />

três anos as <strong>em</strong>presas já vão conhecer<br />

o negócio e o custo desta energia estará<br />

competitivo com a eletricidade conven-<br />

cional”, prevê o pesquisador, que coordena<br />

também a rede t<strong>em</strong>ática de Centros<br />

de Inovação <strong>em</strong> Tecnologias para Energia<br />

Solar Fotovoltaica do Sist<strong>em</strong>a Brasileiro<br />

de Tecnologia (Sibratec).<br />

A preocupação com soluções que<br />

result<strong>em</strong> na redução do custo da energia<br />

fotovoltaica é fator comum entre as pesquisas<br />

nesta área, já que hoje ela custa <strong>em</strong><br />

média o triplo da convencional, devido aos<br />

investimentos <strong>em</strong> equipamentos. O armazenamento<br />

é outro ponto de convergência.<br />

Alguns estudos apontam que, se fosse<br />

possível reter adequadamente a energia<br />

do sol que diariamente é recebida e não é<br />

utilizada, seria possível manter metrópoles<br />

inteiras, com um nível de <strong>em</strong>issão de carbono<br />

que se aproximaria de zero. O grupo<br />

do Cetec t<strong>em</strong> expectativas de, <strong>em</strong> breve,<br />

começar a trabalhar processos também<br />

voltados para armazenag<strong>em</strong>.<br />

PROJETO: Engenharia de Superfícies<br />

para Energias Renováveis - Eficiência<br />

Energética e Biomateriais<br />

COORDENADOR: José Roberto<br />

Tavares Branco<br />

MODALIDADE: Programa<br />

Pesquisador Mineiro<br />

VALOR: 48.000<br />

18 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


O site da FAPEMIG mudou<br />

Ao acessar o endereço fap<strong>em</strong>ig.br, o<br />

internauta vai encontrar o portal com um<br />

visual diferente, dinâmico, moderno e<br />

navegação rápida. O projeto foi desenvolvido<br />

por uma equipe da Universidade<br />

Federal de São João Del Rei (UFSJ), e,<br />

sob coordenação da pesquisadora Elisa<br />

Tuller, foram realizados testes com professores,<br />

alunos e servidores da universidade,<br />

colaboradores da FAPEMIG e usuários<br />

do site. O objetivo era reunir informações<br />

para construção do novo layout do portal.<br />

Outra novidade que pode ser encontrada<br />

na página é o acesso ao Projeto Minas<br />

Faz Ciência, <strong>em</strong> que o internauta poderá<br />

ouvir os podcasts “Ondas da Ciência”,<br />

assistir aos programas “Ciência no Ar” e<br />

ler os textos do blog Minas Faz Ciência.<br />

Além disso, será possível ler as edições<br />

da revista MINAS FAZ CIÊNCIA online. “O<br />

novo portal permitirá ampliarmos nosso<br />

trabalho e fortalecer o papel da FAPEMIG<br />

de divulgação científica”, explica a chefe<br />

da Assessoria de Comunicação Social<br />

(ACS), Ariadne Lima. Para o presidente<br />

da FAPEMIG, Mario Neto Borges, o novo<br />

portal está compatível com as atividades e<br />

a missão da FAPEMIG, que é induzir e fomentar<br />

a pesquisa e a inovação científica<br />

e tecnológica para o desenvolvimento do<br />

Estado. Visite o site, acessando<br />

www.fap<strong>em</strong>ig.br<br />

CURTAS DA CIÊNCIA<br />

Minas é destaque no Prêmio Jov<strong>em</strong> Cientista<br />

A ciência mineira foi cont<strong>em</strong>plada <strong>em</strong> três<br />

categorias da tradicional pr<strong>em</strong>iação: graduado,<br />

estudante de ensino superior e mérito institucional,<br />

sendo que nas duas primeiras os jovens<br />

pesquisadores conquistaram o primeiro lugar. A<br />

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)<br />

recebeu o prêmio de mérito institucional como a<br />

entidade de ensino superior com o maior número<br />

de trabalhos de valor científico. A Universidade<br />

foi pr<strong>em</strong>iada com 35 mil reais. Na categoria<br />

graduado, a vencedora foi Uende Aparecida<br />

Figueiredo Gomes, da UFMG, pr<strong>em</strong>iada com<br />

30 mil reais com a pesquisa Intervenções de<br />

saneamento básico <strong>em</strong> áreas de vilas e favelas:<br />

Um estudo comparativo de duas experiências na<br />

Região Metropolitana de Belo Horizonte.<br />

Já o vencedor da categoria estudante de<br />

ensino superior, Kaiodê Biague, estudante do 2º<br />

período de arquitetura e urbanismo do Centro<br />

Universitário Izabela Hendrix, recebeu a pr<strong>em</strong>iação<br />

no valor de 15 mil reais, com a pesquisa<br />

Mini Usinas solares fotovoltaicas <strong>em</strong> sist<strong>em</strong>as<br />

de transporte rápido por ônibus BRT (BUS RA-<br />

PID TRANSIT). Para o estudante, ser o vencedor<br />

foi uma surpresa e ao mesmo t<strong>em</strong>po uma motivação<br />

para trilhar a carreira científica. “Fiquei<br />

muito orgulhoso e ainda mais motivado a continuar<br />

pensando <strong>em</strong> uma arquitetura comprometida<br />

com o desenvolvimento das cidades e das<br />

pessoas.” No dia 6 de dez<strong>em</strong>bro, os vencedores<br />

vão receber o prêmio da presidente Dilma Roussef<br />

no Palácio do Planalto, <strong>em</strong> Brasília.<br />

Projeto<br />

Imagens<br />

do Conhecimento<br />

O Projeto Imagens do Conhecimento, desenvolvido<br />

pelo Cedecom-UFMG, propõe a divulgação<br />

de imagens vinculadas ao conhecimento.<br />

Imagens pod<strong>em</strong> ilustrar, representar ou condensar<br />

dimensões a ser<strong>em</strong> discutidas e difundidas. O<br />

fascínio da imag<strong>em</strong> soma-se ao do conhecimento.<br />

Maria-Exphotos, de Marcelo Kraiser, integra<br />

o Imagens do Conhecimento. O trabalho<br />

Exphotos inicia-se com pesquisa sobre processos<br />

analógicos de produção de imagens. Kraiser<br />

se interessava mais pelos defeitos do que pelos<br />

acertos fotográficos e, por meio de processos<br />

digitais, passou a simular esses defeitos da produção<br />

analógica. Para ele, a fotografia pode ser<br />

vista de duas formas: sob a ótica de padrões de<br />

como fotografar ou sob a visão de que a imag<strong>em</strong><br />

é s<strong>em</strong>pre uma invenção sobre o mundo.<br />

A pesquisadora Maria do Céu Diel (UFMG),<br />

no texto Onde foi que eu vi essa ex-foto, onde foi<br />

que eu vivi?, escreve: “Para além da representação,<br />

mais que narrativa ou retórica <strong>em</strong>pobrecida,<br />

as fotografias de Marcelo Kraiser são quase<br />

afrescos, reveladas, impressas e desenhadas nas<br />

paredes im<strong>em</strong>oriais do passado nunca vivido”.<br />

Confira a imag<strong>em</strong> na página 50 desta edição.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 19


LEGISLAÇÃO<br />

Código que<br />

rompe amarras<br />

Projeto de lei<br />

que tramita<br />

no Congresso<br />

Nacional permitirá<br />

desburocratização<br />

dos processos<br />

que envolv<strong>em</strong> a<br />

Ciência no Brasil<br />

Fabrício Marques e<br />

Maurício Guilherme Silva Jr.<br />

20 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Se o criador da Apple, Steve Jobs,<br />

e seu colega Steve Wozniak vivess<strong>em</strong> no<br />

Brasil <strong>em</strong> 1976, jamais teriam tido acesso<br />

aos componentes eletrônicos usados na<br />

montag<strong>em</strong> dos primeiros computadores da<br />

<strong>em</strong>presa <strong>em</strong> uma garag<strong>em</strong>. Desde então,<br />

houve alguma melhora, um avanço tímido,<br />

como l<strong>em</strong>brou o jornalista Fernando<br />

Rodrigues, <strong>em</strong> sua coluna na Folha de S.<br />

Paulo, <strong>em</strong> 8 de outubro de 2011. Mas os<br />

entraves legais, muitas vezes, atrasam ou<br />

mesmo imped<strong>em</strong> o avanço da Ciência, da<br />

Tecnologia e da Inovação no País.<br />

Uma proposta pode alterar esse quadro<br />

e atuar como divisor na história da<br />

Ciência no Brasil, animando e estimulando<br />

inovadores, cientistas, pesquisadores<br />

e <strong>em</strong>preendedores. No final de agosto, os<br />

presidentes dos Conselhos Nacionais das<br />

Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa<br />

(Confap), Mario Neto Borges e dos Secretários<br />

para assuntos de C,T&I (Consecti),<br />

Odenildo Sena, entregaram o Código da Ciência,<br />

Tecnologia e Inovação a autoridades<br />

do Executivo e do Legislativo, <strong>em</strong> Brasília.<br />

O documento, que ora chega às<br />

mãos daqueles que criam e gerenciam<br />

as leis numa d<strong>em</strong>ocracia representativa<br />

como o Brasil, simboliza a concretização<br />

de antigas reivindicações dos mais diversos<br />

setores sociais. Conforme ressalta<br />

Catarina Barreto Linhares, procuradora do<br />

Estado de Minas Gerais, procuradora chefe<br />

da FAPEMIG e uma das coordenadoras<br />

do grupo responsável pela elaboração<br />

da proposta do Novo Código, a iniciativa<br />

formal do Consecti e do Confap é fruto<br />

dos reiterados reclamos das comunidades<br />

acadêmica e <strong>em</strong>presarial, assim como do<br />

Poder Público, quanto à morosidade, à<br />

burocracia, aos entraves e prejuízos ocasionados<br />

ao setor de Ciência, Tecnologia<br />

e Inovação, principalmente no que diz respeito<br />

ao engessamento da legislação.<br />

“Daí constituiu-se o Grupo de Trabalho,<br />

a fim de elaborar proposta de novo<br />

marco legal. Houve reuniões presenciais<br />

<strong>em</strong> Belo Horizonte, Goiânia e Brasília,<br />

além de um s<strong>em</strong> número de contatos à distância,<br />

para troca de textos, discussões e<br />

debates”, explica Linhares. Os encontros e<br />

discussões culminaram com a entrega, <strong>em</strong><br />

agosto último, da proposta ao Congresso<br />

Nacional, que, segundo a procuradora,<br />

“a encampou plenamente, assumindo-a”.<br />

Agora, a iniciativa tramita sob a denominação<br />

de Projeto de Lei n 0 . 2177/11.<br />

“A questão legal foi a motivação principal<br />

para iniciarmos o trabalho que resultou<br />

no PL 2177/2011”, afirma o deputado<br />

federal Sibá Machado, m<strong>em</strong>bro titular da<br />

Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação<br />

e Informática (CCTCI) e vice-líder<br />

da bancada do PT na Câmara dos Deputados.<br />

Mas o parlamentar ressalta que o financiamento<br />

para Ciência e Tecnologia no<br />

Brasil é outro grande probl<strong>em</strong>a porque ainda<br />

é muito pequeno. Hoje, todo o dinheiro<br />

para o setor representa 1.197% do PIB.<br />

Desse valor, 70% vêm do setor público.<br />

A iniciativa privada contribui com apenas<br />

30%. “Estamos trabalhando para aumentar<br />

esse percentual de recursos para 2,5% do<br />

PIB”, diz Machado.<br />

A ideia de mudança na legislação brasileira<br />

surgiu <strong>em</strong> Audiência Pública realizada<br />

pela Comissão de Ciência e Tecnologia<br />

da Câmara, <strong>em</strong> final de abril deste ano. Ouvindo<br />

o ministro Aloízio Mercadante, convidado<br />

à época para aquele debate, ficou claro<br />

que o Brasil só recuperará o t<strong>em</strong>po perdido<br />

se investir <strong>em</strong> pesquisa e inovação. “Essa é<br />

a ponte para um futuro de desenvolvimento<br />

com geração de <strong>em</strong>prego, renda e b<strong>em</strong>-estar<br />

social. Para chegarmos lá, é necessário<br />

acabarmos com as amarras legais que hoje<br />

engessam os pesquisadores, intimidam os<br />

profissionais que, t<strong>em</strong>endo a burocracia,<br />

acabam renunciando à pesquisa”, comenta<br />

o deputado federal.<br />

Depois dessa audiência pública,<br />

houve um período de três meses <strong>em</strong> que,<br />

segundo Machado, mais de 1.200 entidades<br />

públicas e privadas de todo o País<br />

colaboraram com ideias e sugestões para<br />

consolidar o projeto. A amplitude dessa<br />

participação é diretamente proporcional à<br />

importância do t<strong>em</strong>a e ao grau de preocupação<br />

existente entre os cientistas brasileiros,<br />

quando o assunto é a legislação<br />

que regula o setor.<br />

Ao longo do processo de criação do<br />

Novo Código, “modelos” internacionais,<br />

a ex<strong>em</strong>plo das experiências de Coreia e<br />

Estados Unidos, serviram de base aos<br />

princípios gerais do documento. Outras<br />

“Daí constituiu-se o Grupo<br />

de Trabalho, a fim de elaborar<br />

proposta de novo marco legal.<br />

Houve reuniões presenciais<br />

<strong>em</strong> Belo Horizonte, Goiânia<br />

e Brasília, além de um<br />

s<strong>em</strong> número de contatos à<br />

distância, para troca de textos,<br />

discussões e debates”.<br />

Catarina Barreto Linhares<br />

Procuradora chefe da FAPEMIG<br />

Além da procuradora Catarina Linhares<br />

(FAPEMIG), o Grupo de Trabalho<br />

Confap/Consecti foi composto pelos<br />

advogados Breno Rosa (SECT/AM),<br />

Clóvis Squio (FAPESC), Cristina Leftel<br />

(FAPESP) Gianne Azevedo (FAPE-<br />

AM) e Valéria Firme (FAPES).<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 21


Trata-se, respectivamente, da Sociedade<br />

Brasileira para o Progresso da<br />

Ciência, do Conselho Nacional de<br />

Desenvolvimento Científico e Tecnológico<br />

e da Associação Nacional dos<br />

Dirigentes das Instituições Federais<br />

de Ensino Superior.<br />

“As maiores dificuldades<br />

que percebi pod<strong>em</strong> ser<br />

resumidas <strong>em</strong> quatro<br />

grandes grupos: Lei de<br />

Licitações, subvenções,<br />

financiamentos e compras<br />

no exterior.”<br />

Sibá Machado<br />

Deputado federal<br />

importantes referências foram o regime de<br />

contratações e aquisições do Banco Interamericano<br />

de Desenvolvimento (BID) e a<br />

Organização Mundial de Comércio (OMC),<br />

que, segundo Catarina Linhares, “possu<strong>em</strong><br />

regras b<strong>em</strong> mais céleres e razoáveis para o<br />

fomento e d<strong>em</strong>ais ações junto ao setor de<br />

C,T & I”. Apesar disso, as entidades nacionais<br />

e suas necessidades revelaram-se os<br />

principais norteadores para elaboração da<br />

proposta final. “Várias delas, entre as quais<br />

SBPC, CNPq e Andifes, contribuíram com<br />

o apontamento de entraves e sugestões de<br />

alteração”, conta.<br />

Mas o que muda, afinal?<br />

Um dos objetivos dos responsáveis<br />

pela elaboração da proposta enviada ao<br />

Congresso Nacional foi, segundo esclarece<br />

a procuradora Catarina Linhares, o<br />

agrupamento da legislação de regência<br />

<strong>em</strong> documento único. Seriam mais fáceis,<br />

afinal, o manuseio e a aplicação<br />

das normas legais, que não aparec<strong>em</strong><br />

esparsas e difusas, por usuários e destinatários.<br />

“Assim, estando as normas<br />

diretamente ligadas à C,T & I num único<br />

diploma, não restará mais qualquer<br />

dúvida acerca de sua aplicabilidade e<br />

pertinência, afastando-se de pronto a<br />

incidência de regramentos divergentes e<br />

diferentes”, ressalta.<br />

Desse modo, a Lei de Inovação<br />

foi aperfeiçoada para estender seus incentivos<br />

e benesses a um maior número<br />

de entidades de Ciência, Tecnologia<br />

e Inovação, além de “facilitar o acesso<br />

e a execução dos projetos de pesquisa<br />

e inovação pelos parceiros Estado-<br />

-Acad<strong>em</strong>ia-Empresa”. Nos capítulos do<br />

documento apresentado ao Congresso<br />

Nacional, há referências a diversas etapas<br />

e nuances do processo da produção<br />

científica. No que se refere, por ex<strong>em</strong>plo,<br />

às aquisições e contratações, prevê<strong>em</strong>-<br />

-se, entre outras melhorias: otimização<br />

da interação entre professores/pesquisadores;<br />

facilitação das importações de<br />

materiais para pesquisa e desburocratização<br />

da prestação de contas, com foco<br />

nos resultados.<br />

“Os princípios constitucionais e a<br />

boa-fé dev<strong>em</strong> ser norteadores de todas<br />

as ações, <strong>em</strong> qualquer setor. A flexibilização<br />

não é, de forma alguma, sinônimo<br />

de informalidade, omissão ou desídia”,<br />

ressalta Linhares. O que se pretende é<br />

destacar a importância aos resultados<br />

alcançados, eliminando-se, segundo a<br />

procuradora, “entraves formais de prestação<br />

de contas que, atualmente, desestimulam<br />

os pesquisadores e instituições,<br />

até mesmo a buscar fomento público.<br />

Por óbvio que deve haver prestação de<br />

contas, clara e objetiva, e a fiscalização,<br />

s<strong>em</strong>pre que se entender necessário, pelos<br />

Órgãos competentes”, completa.<br />

Camaleônicos obstáculos<br />

Os entraves à produção científica revelam<br />

múltipla face: dos pequenos obstáculos<br />

cotidianos à imensa “engrenag<strong>em</strong>”<br />

da burocracia, muitos são os fatores de<br />

morosidade a solapar o desenvolvimento<br />

da pesquisa no Brasil. Em entrevista à<br />

edição especial de Minas faz Ciência, que<br />

tratou do processo de internacionalização<br />

das instituições brasileiras, o Reitor<br />

da Universidade Federal de Minas Gerais<br />

(UFMG), professor Clélio Campolina Diniz,<br />

destacou o que, <strong>em</strong> sua visão, configuraria<br />

a “maior de todas as dificuldades”<br />

para ampliação da ciência no Brasil: “As<br />

normas legais que, nas universidades,<br />

são as mesmas para todo o setor público.<br />

Há, por ex<strong>em</strong>plo, a lei das licitações,<br />

nº 8.666, que diz que tudo precisa ser<br />

licitado, pelo menor preço. A pesquisa,<br />

contudo, precisaria ter certa autonomia<br />

para eleger o que lhe é prioritário. Seriam<br />

necessários critérios científicos de avaliação,<br />

e não mercadológicos”.<br />

O professor Jalver Machado Bethônico,<br />

do departamento de Fotografia, Cin<strong>em</strong>a<br />

e Teatro da Escola de Belas da UFMG, cita<br />

a “dureza” dos processos para aquisição<br />

de equipamentos de pesquisa, mesmo que<br />

facilitados até certa etapa.<br />

Recent<strong>em</strong>ente, Bethônico preparava<br />

listag<strong>em</strong> para aquisição de aparelhos<br />

de áudio, fundamentais a seus estudos<br />

sobre a relação entre som e imag<strong>em</strong> (Leia<br />

reportag<strong>em</strong> à página 28). T<strong>em</strong>pos depois<br />

de descritas e enviadas as especificações<br />

técnicas ao setor responsável pela compra<br />

dos equipamentos, o professor recebe co-<br />

22 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


municado oficial, a relatar que nada havia<br />

sido feito, <strong>em</strong> função de dúvidas relativas às<br />

configurações do pedido: desejava-se, afinal,<br />

o X-mini ou o X-mini Max? Ao invés de<br />

rapidamente resolvido, por meio de simples<br />

esclarecimento com o autor da d<strong>em</strong>anda, o<br />

processo acabou interrompido: “Não pude<br />

seguir com a compra. Fui obrigado a fazer<br />

outro formulário de requisição”, conta.<br />

Com a impl<strong>em</strong>entação da nova<br />

proposta de legislação para C, T & I,<br />

experiências negativas como a de Jalver<br />

Bethônico pod<strong>em</strong> deixar de existir.<br />

Conforme ressalta Catarina Linhares,<br />

os pesquisadores, assim como as instituições<br />

públicas ou privadas que atu<strong>em</strong><br />

no setor, “terão desburocratizadas suas<br />

ações, o que trará celeridade e efetividade<br />

aos projetos de pesquisa e de inovação.<br />

Terão todos maior liberdade para fazer<strong>em</strong><br />

parcerias, <strong>em</strong> prol de que haja circulação<br />

do conhecimento <strong>em</strong> favor do desenvolvimento<br />

econômico e social do País”.<br />

Além disso, ressalta a procuradora,<br />

o Poder Público terá ampliada a possibilidade<br />

de cumprir “sua missão de agente<br />

indutor e fomentador da nova Economia<br />

do Conhecimento. Espera-se consolidar<br />

um ‘círculo virtuoso’ onde a parceria entre<br />

Estado, Acad<strong>em</strong>ia e Empresa seja benéfica<br />

a todos os parceiros, e se realimente de<br />

forma contínua, gerando novos produtos<br />

no mercado, <strong>em</strong>prego, renda, patentes etc.,<br />

<strong>em</strong> favor da população brasileira”.<br />

Propostas<br />

para desburocratizar<br />

Quando confrontado com os principais<br />

probl<strong>em</strong>as do arcabouço legal vigente,<br />

o deputado federal Sibá Machado<br />

entende que trabalhar com Ciência,<br />

Tecnologia e pesquisa no Brasil é um<br />

desafio de diversas ordens. “Mas para<br />

responder a essa pergunta diria que as<br />

maiores dificuldades que percebi nas<br />

conversas com cientistas, pesquisadores,<br />

professores universitários, pod<strong>em</strong><br />

ser resumidas <strong>em</strong> quatro grandes grupos:<br />

a chamada Lei de Licitações; as<br />

subvenções; financiamentos e compras<br />

no exterior”.<br />

O deputado federal enumera seis<br />

das principais propostas para um novo<br />

arcabouço legal, defendendo um novo<br />

olhar da lei sobre t<strong>em</strong>as como, por ex<strong>em</strong>plo,<br />

as licitações. “Não é mais possível,<br />

se quisermos acompanhar os países desenvolvidos,<br />

que o cientista, para adquirir<br />

equipamentos e produtos indispensáveis<br />

à sua pesquisa, tenha que comprar pelo<br />

menor preço ou percorrer todas as etapas<br />

exigidas na Lei de Licitações”, observa.<br />

Para ele, a espera comprometerá o sucesso<br />

de sua pesquisa e o produto de menor<br />

preço, provavelmente, comprometerá<br />

a qualidade e precisão dos resultados.<br />

Se aprovada a nova Lei, as aquisições e<br />

contratações observarão o primado da<br />

qualidade sobre o preço. “Defend<strong>em</strong>os a<br />

aquisição direta, inclusive por importação<br />

para equipamentos de alta tecnologia<br />

voltados para CT&I, mediante justificativa<br />

técnica, sendo desnecessário o exame de<br />

similaridade. Os insumos e serviços de<br />

natureza comum poderão ser adquiridos<br />

e contratados por Seleção Simplificada,<br />

levando <strong>em</strong> consideração qualidade, garantia<br />

e assistência”.<br />

Quanto aos prazos, a proposta que<br />

os instrumentos jurídicos decorrentes<br />

da atividade de CT&I dev<strong>em</strong> ter os seus<br />

prazos vinculados à duração do projeto,<br />

s<strong>em</strong> limitação de aditivos, desde que justificados,<br />

podendo ser acrescidos valores<br />

suficientes para fazer frente às despesas.<br />

“Quer<strong>em</strong>os que a legislação brasileira<br />

estabeleça um regime diferenciado<br />

quando o assunto é Ciência, Tecnologia<br />

e Inovação. Que todo aporte de capital <strong>em</strong><br />

ações de CT&I sejam considerados investimento”,<br />

diz Sibá.<br />

Sobre as pesquisas por <strong>em</strong>presas<br />

privadas, o Projeto de Lei, à ex<strong>em</strong>plo do<br />

que já se pratica nos países desenvolvidos,<br />

abre a possibilidade de incentivo e<br />

fomento público às <strong>em</strong>presas atuantes<br />

<strong>em</strong> pesquisas de CT&I, para constituição<br />

de parcerias e criação de incubadoras de<br />

novas <strong>em</strong>presas. Cria instrumentos de es-<br />

PRÓXIMOS PASSOS<br />

Confira alguns dos trâmites pelos quais passará o documento “Sugestões de<br />

alteração do marco legal para ciência, tecnologia e inovação”, entregue ao<br />

Congresso Nacional <strong>em</strong> 31 de agosto deste ano e que agora responde pelo nome<br />

de Projeto de Lei nº 2177/11.<br />

1. O presidente Marco Maia determinou que a proposta deverá ser<br />

analisada <strong>em</strong> Comissão Especial e depois pelo Plenário da Câmara. No<br />

momento aguarda-se a indicação, pelos líderes dos partidos, dos m<strong>em</strong>bros<br />

da Comissão Especial. Instalada a Comissão, será eleito presidente e relator<br />

para iniciar a apreciação da proposição.<br />

2. No Congresso Nacional, ao invés de passar por diversas sucessivas<br />

comissões, o Projeto será analisado por comissão mista, especialmente<br />

formada para rápido exame do t<strong>em</strong>a.<br />

3. Ou seja, simultaneamente, por entendimento com a Comissão de<br />

Ciência e Tecnologia do Senado, o senador Eduardo Braga apresentou o<br />

mesmo projeto naquela Casa, como forma de agilizar sua tramitação. No<br />

Senado, a proposição é identificada pelo PLS nº 619/2011, que se encontra<br />

na Comissão de Constituição e Justiça e aguarda designação do relator.<br />

4. Até que a proposta entre <strong>em</strong> votação, prevê-se, segundo o deputado<br />

Sibá Machado, a realização de audiências públicas e de recebimento e análise<br />

de <strong>em</strong>endas.<br />

5. Após a votação, o Projeto será enviado à Presidente da República,<br />

para sanção ou veto.<br />

6. Caso sancionado, o Projeto é publicado e, efetivamente, torna-se lei.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 23


24 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011<br />

tímulo à inovação, como as subvenções<br />

econômicas, financiamentos, participação<br />

societárias e o voucher tecnológico, que é<br />

um crédito não re<strong>em</strong>bolsável concedido<br />

pelas agências ou órgãos de fomento,<br />

resgatável exclusivamente pelas <strong>em</strong>presas<br />

de Ciência e Tecnologia credenciadas,<br />

destinado ao pagamento de transferência<br />

de tecnologias, compartilhamento e uso<br />

de laboratórios ou contratação de serviços<br />

especializados.<br />

Para as importações de equipamentos,<br />

o Projeto de Lei considera que<br />

as instituições de pesquisa possam<br />

adotar os procedimentos do Programa<br />

“Importa Fácil”, tendo tratamento aduaneiro<br />

simplificado, com maior agilidade,<br />

equipe especializada da Receita Federal<br />

com treinamento para despacho de cargas<br />

relativas a produtos destinados à<br />

pesquisa, determinação de aeroportos<br />

específicos para internalização dessas<br />

compras realizadas no exterior.<br />

Em relação à prestação de contas,<br />

o Projeto estabelece que a União, Estados,<br />

Distrito Federal e os Municípios<br />

deverão adotar sist<strong>em</strong>as de prestação<br />

de contas flexíveis com obediência aos<br />

seguintes princípios: a) foco na análise<br />

do resultado do projeto, e não na contabilidade;<br />

b) limite para r<strong>em</strong>anejamento<br />

com justificativa posterior, e além deste<br />

limite, mediante prévia manifestação; c)<br />

prestação de contas mediante relatório<br />

eletrônico, com obrigação de guarda dos<br />

documentos comprobatórios do bom uso<br />

dos recursos, a ex<strong>em</strong>plo do que é hoje a<br />

Declaração do Imposto de Renda.<br />

Outro ponto importante que não ficou<br />

esquecido diz respeito à dedicação<br />

exclusiva. Pela proposta, os professores<br />

de dedicação exclusiva poderão realizar<br />

atividades de pesquisa e extensão <strong>em</strong><br />

horário concomitante, s<strong>em</strong> prejuízo das<br />

vantagens do cargo público, fazendo jus<br />

ao recebimento de bolsa de incentivo à<br />

inovação, se for o caso. Além disso, permite<br />

que os pesquisadores estrangeiros,<br />

detentores de visto provisório de permanência<br />

no Brasil, possam atuar <strong>em</strong> projetos<br />

de Ciência, Tecnologia e Inovação,<br />

recebendo bolsas de qualquer natureza.


As novas leis da (ciência) dinâmica<br />

Confira algumas das sugestões de alteração do marco legal para Ciência,<br />

Tecnologia & Inovação, proposta pelo grupo de grupo de trabalho Consecti-Confap:<br />

Construção de ambientes especializados<br />

e cooperativos de inovação<br />

As diversas instâncias governamentais<br />

(União, Estados, Distrito Federal, Municípios)<br />

e suas respectivas agências de<br />

fomento poderão estimular e apoiar alianças<br />

estratégicas para projetos de cooperação<br />

com <strong>em</strong>presas nacionais e internacionais,<br />

Entidades de Ciência, Tecnologia e<br />

Inovação (ECTIs) – públicas e privadas – e<br />

organizações de direito privado voltadas à<br />

formação de Recursos Humanos qualificados,<br />

à pesquisa e ao desenvolvimento de<br />

produtos e processos inovadores.<br />

Unificação de nomenclaturas<br />

Para facilitar processos, contratos e<br />

acordos, o novo código descreve conceitos<br />

diversos, dos significados de “contrato” a<br />

“aquisição”; de “criação” a “criador”; de “financiamento”<br />

a “parque tecnológico”.<br />

Inventor independente<br />

A ele será facultada a possibilidade<br />

de solicitar, desde que comprove depósito<br />

de pedido de patente, a adoção de sua<br />

criação por ECTI, agência ou órgão de<br />

fomento, que decidirá livr<strong>em</strong>ente quanto<br />

à conveniência e à oportunidade da solicitação,<br />

com vistas à elaboração de projeto.<br />

Ações conjuntas<br />

ECTIs públicas e privadas poderão<br />

compartilhar seus laboratórios, equipamentos,<br />

instrumentos, materiais e d<strong>em</strong>ais<br />

instalações <strong>em</strong> atividades voltadas à inovação<br />

tecnológica.<br />

Estímulo à inovação nas<br />

ECTIs privadas com fins lucrativos<br />

As diversas instâncias governamentais<br />

e suas agências de fomento<br />

poderão promover e incentivar o desenvolvimento<br />

de produtos e processos<br />

inovadores <strong>em</strong> ECTIs privadas, com fins<br />

lucrativos e voltadas a atividades de<br />

pesquisa, mediante a concessão de recursos<br />

financeiros, humanos, materiais<br />

ou de infraestrutura, a ser<strong>em</strong> ajustados<br />

<strong>em</strong> instrumentos específicos, destinados<br />

a apoiar atividades de pesquisa, desenvolvimento<br />

e inovação, para atender<br />

às prioridades da política industrial e<br />

tecnológica nacional.<br />

Formação de Recursos Humanos<br />

As diversas instâncias governamentais<br />

e seus órgãos e agências de fomento<br />

concederão bolsas destinadas à formação<br />

e capacitação de Recursos Humanos e à<br />

agregação de especialistas <strong>em</strong> ECTIs, que<br />

contribuam para a execução de projetos de<br />

pesquisa ou de desenvolvimento tecnológico<br />

e atividades de extensão inovadora e<br />

transferência de tecnologia.<br />

Acesso à biodiversidade<br />

Não dependerá de autorização prévia<br />

o acesso a amostra de componente do<br />

patrimônio genético e de conhecimento<br />

tradicional, desde que associado a fins<br />

exclusivos de pesquisa e desenvolvimento<br />

nas áreas biológicas e afins, <strong>em</strong><br />

quantidades razoáveis, nos termos de<br />

regulamentação.<br />

Importação<br />

Serão isentas dos impostos de importação<br />

e sobre produtos industrializados e do<br />

adicional ao frete para renovação da marinha<br />

mercante as importações de máquinas,<br />

equipamentos, aparelhos e instrumentos,<br />

b<strong>em</strong> como suas partes e peças de reposição,<br />

acessórios, matérias-primas e produtos<br />

intermediários destinados à pesquisa<br />

científica, tecnológica e inovação.<br />

Aquisições e contratações<br />

As aquisições de bens e as contratações<br />

de serviços destinados exclusivamente,<br />

à pesquisa, desenvolvimento e<br />

inovação serão regidos pelos princípios<br />

básicos de legalidade, impessoalidade,<br />

moralidade, probidade, publicidade,<br />

sustentabilidade, razoabilidade e busca<br />

permanente e prioritária pela qualidade,<br />

durabilidade e adequação a seus objetivos.<br />

Patrimônio<br />

Os bens ou serviços gerados ou<br />

adquiridos com a aplicação dos recursos<br />

destinados ao estímulo ou inovação de<br />

CT&I serão incorporados, desde sua aquisição<br />

no âmbito dos projetos, ao patrimônio<br />

da ECTI recebedora.<br />

Prestação de contas eletrônica<br />

União, Estados, Municípios, Distrito<br />

Federal e órgãos e agências de fomento<br />

estabelecerão formas simplificadas e uniformizadas<br />

de prestação de contas dos<br />

recursos repassados com base nesta lei, a<br />

ser realizada, preferencialmente, mediante<br />

envio eletrônico de informações.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 25


O Código Nacional da CT&I<br />

Urge “concertar” a legislação da Ciência, Tecnologia<br />

e Inovação no Brasil. Importantes avanços foram feitos na<br />

política da área e também nos investimentos – mas ainda<br />

existe um obstáculo fundamental a ser superado. A legislação<br />

vigente é fragmentada, ultrapassada e inadequada<br />

ao contexto do Século do Conhecimento. Neste sentido e,<br />

como um “concerto de orquestra” surge o Código Nacional<br />

da CT&I que diz respeito à regulamentação legal para a ciência<br />

no Brasil. Moderno, articulado, simplificado, enxuto<br />

e apropriado para colocar o País numa posição de avanços<br />

mais rápidos na ciência e especialmente na inovação.<br />

O documento, subscrito pela maioria das instituições<br />

que atuam na área, está circulando na sociedade, no<br />

Congresso Nacional e no Executivo Federal. É resultado de<br />

muito trabalho - de muitas cabeças - que v<strong>em</strong> atender aos<br />

anseios da comunidade científica nacional, d<strong>em</strong>andas estas<br />

lideradas pelo atual Ministério da Ciência, Tecnologia<br />

e Inovação – MCTI que prepara uma nova etapa da política<br />

científica nacional.<br />

O País precisa falar a mesma língua quando se referir<br />

à ciência, seja quando falam as agências de fomento, as<br />

instituições de pesquisa ou os órgãos de controle. Assim,<br />

o Código proposto, mais do que unificar a nomenclatura,<br />

define conceitos que facilitarão o diálogo entre os atores<br />

mencionados. Será o “livro de cabeceira” de gestores, usuários<br />

e operadores do controle nesta área. Neste sentido,<br />

simplifica procedimentos administrativos e burocráticos<br />

para os processos de importação, priorizando o des<strong>em</strong>baraço<br />

aduaneiro; a isenção de impostos e a fiscalização<br />

da Receita e da Anvisa. Da mesma forma, agiliza o acesso<br />

à biodiversidade, independent<strong>em</strong>ente de autorização do<br />

Ministério do Ambiente, quando se tratar de amostras do<br />

patrimônio genético para fins de pesquisa.<br />

As aquisições e contratações; os convênios e contratos;<br />

o controle do patrimônio e a prestação de contas <strong>em</strong><br />

projetos e programas de ciência, tecnologia e inovação<br />

ganham novo entendimento e modernos mecanismos. No<br />

caso das aquisições, o Código destaca a prevalência da<br />

qualidade, garantia e assistência sobre o mito do “menor<br />

valor” e com processos simplificados, incluindo a possibilidade<br />

de prazos superiores à sessenta meses. Propõe<br />

modelo de prestação de contas eletrônico dispensando a<br />

imediata apresentação da documentação comprobatória,<br />

que só será exigida quando despertar a dúvida do uso inadequado<br />

dos recursos – procedimento similar ao adotado<br />

pela Receita Federal no caso do imposto de renda.<br />

O Código estimula a inovação na medida <strong>em</strong> que<br />

amplia, flexibiliza e substitui, <strong>em</strong> novos artigos legais, os<br />

fundamentos da vigente Lei de Inovação. Neste aspecto,<br />

não só permite amplo compartilhamento de acervos públicos<br />

mediante r<strong>em</strong>uneração de infraestrutura e recursos humanos,<br />

mas também regulamenta o aporte de recursos nas<br />

<strong>em</strong>presas, especialmente micro e pequenas, <strong>em</strong> diversas<br />

modalidades – inclusive a subvenção direta. Garante ainda<br />

o direito do pesquisador-inventor ter participação financeira<br />

nos royalties de sua criação.<br />

Não menos importante é o uso indistinto dos recursos<br />

que passam a ser vistos como investimento <strong>em</strong><br />

pesquisa e inovação, e não mais como apenas rubricas<br />

contábeis (custeio, capital, bolsas) que infernizam a vida<br />

de gestores e usuários destes recursos. Assim, passam<br />

a focar no resultado da aplicação do recurso ao invés do<br />

processo de execução.<br />

Não se pretende esgotar aqui todos os benefícios<br />

contidos no documento, mas pode-se afirmar que as alterações<br />

constantes da proposta do Código constitu<strong>em</strong><br />

avanços que permit<strong>em</strong> vislumbrar um futuro promissor<br />

para CT&I no Brasil. O País já v<strong>em</strong> tendo reconhecimento<br />

científico e tecnológico internacional e não pode perder<br />

essa grande oportunidade!<br />

Mario Neto Borges<br />

Presidente da FAPEMIG e do Conselho<br />

Nacional das Fundações Estaduais de<br />

Amparo à Pesquisa (Confap)<br />

26 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Código da Ciência<br />

Há consenso. Nos anos mais recentes, os investimentos<br />

<strong>em</strong> Ciência, Tecnologia e Inovação no<br />

Brasil tiveram aumento progressivo. O que se t<strong>em</strong><br />

criticado, a partir da administração da presidenta<br />

Dilma, é o contingenciamento de recursos destinados<br />

à CT&I, numa quebra de compromisso assumida<br />

lá atrás pelo então presidente Lula de que,<br />

até final de 2010, recursos para essa área seriam<br />

intocáveis. Sei que está <strong>em</strong> jogo o excesso de zelo<br />

da presidenta para com a crise econômica mundial.<br />

Entretanto, mesmo leigo na seara da economia, trabalho<br />

com a convicção de que manter fortes investimentos<br />

<strong>em</strong> CT&I é poderosa arma para se exorcizar<br />

uma crise. De qualquer modo, alimento a crença de<br />

que, a partir do próximo ano, as coisas retom<strong>em</strong> a<br />

velocidade dos últimos anos e que a presidenta nos<br />

surpreenda, como t<strong>em</strong> feito <strong>em</strong> outras áreas, com<br />

seu estilo de gestão.<br />

Mas, voltando ao consenso aqui l<strong>em</strong>brado,<br />

há notáveis evidências dos desdobramentos do ciclo<br />

virtuoso por que passou o País. O aumento dos<br />

investimentos federais do MCTI, por meio de suas<br />

agências de fomento, aliado à brilhante ideia de um<br />

Plano Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação<br />

(PACTI), com metas a ser<strong>em</strong> cumpridas, contagiou<br />

diversos estados da federação e os desafiou a participar<strong>em</strong><br />

ativamente da <strong>em</strong>preitada. Os sist<strong>em</strong>as<br />

estaduais se organizaram com suas secretarias e<br />

se criaram novas fundações de amparo à pesquisa<br />

(hoje já são 25!), estabelecendo-se a cultura das<br />

parcerias e potencializando-se recursos. Disso<br />

decorrente, formaram-se mais pesquisadores, ampliou-se<br />

a iniciação científica, fortaleceram-se os<br />

programas de pós-graduação, lançaram-se ações<br />

ousadas, como os institutos nacionais de C&T e<br />

tantas outras; deslancharam-se os programas de<br />

subvenção econômica, estimulando-se <strong>em</strong>presas<br />

a comprar os desafios da inovação e os ganhos<br />

da competitividade. E, no meio de tudo isso, um<br />

fenômeno novo que eu reputo da maior relevância:<br />

a descentralização dos investimentos associada à<br />

sua desconcentração, fato que revelou, por meio<br />

dos indicadores, o aumento proporcional de recursos<br />

destinados às regiões Norte, Nordeste e<br />

Centro-Oeste, o que sinaliza para a redução das<br />

desigualdades regionais, ainda que se tenha muita<br />

estrada a percorrer nesse sentido.<br />

Ao lado desse consenso, entretanto, caminha<br />

outro que representa uma força paradoxal, verdadeiro<br />

entrave a tudo que se t<strong>em</strong> conseguido até aqui<br />

para o Brasil ocupar o seu devido lugar entre as<br />

nações que lideram a produção de conhecimento,<br />

tecnologia e inovação. Se, por um lado, t<strong>em</strong>-se o<br />

que com<strong>em</strong>orar com os avanços aqui referidos, por<br />

outro, se t<strong>em</strong> a lamentar que a legislação <strong>em</strong> vigor<br />

(imprópria, ultrapassada e dispersa) tenha sido o<br />

maior obstáculo para maiores saltos quantitativos e<br />

qualitativos. Neste sentido, a proposta para o novo<br />

“Código da Ciência”, capitaneada pelos conselhos<br />

nacionais dos secretários estaduais de CT&I<br />

(Consecti) e presidentes de fundações estaduais<br />

de amparo à pesquisa (Confap), com contribuições<br />

de entidades e instituições representativas da área<br />

(SBPC, ABC, Andifes, Abru<strong>em</strong>, Finep, CNPq, Capes),<br />

significa uma revolução nos marcos regulatórios<br />

que reg<strong>em</strong> a vida de instituições e pessoas<br />

que faz<strong>em</strong> ciência no país. Agora está nas mãos do<br />

Congresso e do Executivo.<br />

Odenildo Sena<br />

Secretário de C&T do Amazonas e presidente do Conselho Nacional<br />

de Secretarias Estaduais para Assuntos de C,T&I (Consecti)<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 27


ARTE E TECNOLOGIA<br />

Projetos da Escola de<br />

Belas Artes da UFMG<br />

dedicam-se à pesquisa<br />

das artes digitais<br />

e computacionais,<br />

estimulando inovadoras<br />

interações poéticas<br />

entre sons e imagens<br />

Maurício Guilherme Silva Jr.<br />

Dente de Leão: por meio do<br />

sopro, público participa da<br />

poética obra<br />

Foto: Divulgação<br />

28 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Na enorme tela branca, a galinha preta<br />

anda de um lado a outro. Diante dela,<br />

o espectador banca o sádico algoz. Com<br />

um afiado tridente nas mãos, diverte-se<br />

por cutucar a pobre ave, que foge <strong>em</strong> frenético<br />

desespero. De beleza estética ímpar<br />

– apesar da aparente crueldade –, a cena<br />

esconde ainda outros atrativos: equipado<br />

com fone nos ouvidos, o “torturador” da<br />

galinácea digital ouve, a cada alfinetada no<br />

animal, uma série de sons e versos da peça<br />

Hamlet, de William Shakespeare, a questionar<br />

os desígnios da existência.<br />

Fruto de pesquisas <strong>em</strong> torno das<br />

possibilidades interativas da arte computacional,<br />

o poético <strong>em</strong>bate entre homens<br />

e galinhas digitais é capaz de,<br />

num átimo, revelar as muitas facetas de<br />

algumas das mais inovadoras iniciativas<br />

estéticas da cont<strong>em</strong>poraneidade. Trata-se,<br />

<strong>em</strong> síntese, de experimentações, práticas<br />

ou conceituais, responsáveis por configurar<br />

complexas redes de interconexão entre<br />

imag<strong>em</strong> e som, assim como de estimular<br />

os indivíduos a inéditos modos de fruição<br />

da obra e/ou performance artística.<br />

“Investimos, assim, <strong>em</strong> interação<br />

multimodal. Por meio da voz, do tato e de<br />

outros movimentos ou ações, o espectador<br />

interage com a obra, que lhe responde imediatamente”,<br />

explica o comunicador visual<br />

Jalver Machado Bethônico, professor do<br />

Departamento de Fotografia, Teatro e Cin<strong>em</strong>a<br />

da Escola de Belas Artes (EBA) da Universidade<br />

Federal de Minas Gerais (UFMG).<br />

Se, até pouco t<strong>em</strong>po, não havia na<br />

EBA a tradição de pesquisas acerca de novas<br />

relações entre sons e imagens – posto<br />

que o ensino de desenho revela-se protagonista<br />

na instituição –, hoje, destacam-se por<br />

lá dois instigantes caminhos de investigação<br />

estética. A primeira vertente reúne pesquisas<br />

sobre a relação entre música e artes<br />

gráficas. Trata-se do estudo da representação<br />

visual da voz, assim como das especificidades<br />

da pintura que busca interpretar os<br />

sons. Já na outra seara de inquirições, investe-se<br />

na exploração da rede de conexões<br />

entre signos visuais e sonoros, como forma<br />

de compreender e promover comparações,<br />

traduções e escrituras audiovisuais.<br />

Como resultado desta segunda “via”<br />

de pesquisas, nasce, <strong>em</strong> 2004, sob coordenação<br />

de Bethônico e do professor<br />

Francisco Marinho, o grupo interSignos,<br />

cujo “S”, maiúsculo e ao centro do vocábulo,<br />

busca, justamente, revelar a força e<br />

as peculiaridades das (inter)mediações.<br />

Desde sua formação oficial, a iniciativa<br />

pretende, entre outros objetivos, “ampliar<br />

o conhecimento do universo dos encontros<br />

entre imag<strong>em</strong> e som; explorar as possibilidades<br />

de articulação da(s) linguag<strong>em</strong>(ns)<br />

audiovisual(is); melhorar a formação dos<br />

alunos, por meio de metodologias capazes<br />

de ampliar o trânsito inters<strong>em</strong>iótico, e produzir<br />

textos e obras individuais e, preferencialmente,<br />

coletivas”.<br />

Com base <strong>em</strong> tais princípios, uma<br />

série de experimentações <strong>em</strong> artes digitais<br />

– todas muito instigantes e desafiadoras<br />

– passou a fazer parte da rotina<br />

dos pesquisadores. Em 2006, durante<br />

o 38º Festival de Inverno da UFMG, por<br />

ex<strong>em</strong>plo, Jalver Bethônico e Francisco<br />

Marinho desenvolveram as ideias para<br />

o engenhoso Palavrador, ambiente interativo,<br />

com estrutura de software, que<br />

funcionava como “gerador de poesia”. A<br />

obra – que, atualmente, é um “livro físico<br />

capaz de interagir com um mundo poético<br />

cibernético construído <strong>em</strong> 3D” – chegou<br />

a ser exposta, nos Estados Unidos, <strong>em</strong><br />

2007, quando integrou o evento ACM Siggraph<br />

Art Gallery – Glogal Eyes.<br />

Arte graduada<br />

Como fruto direto das ininterruptas<br />

ações do grupo de pesquisa, surge <strong>em</strong><br />

2006, com financiamento da FAPEMIG, o<br />

projeto O silêncio, a sombra e o silício: experiência<br />

da arte computacional <strong>em</strong> instalações<br />

interativas e imersivas com fomento,<br />

iniciativa que se revelaria riquíssima<br />

<strong>em</strong> possibilidades, a ponto de estimular,<br />

até mesmo, novas oportunidades de oferta<br />

acadêmica na própria Escola de Belas<br />

Artes da UFMG. Inicialmente, contudo,<br />

os pesquisadores propunham-se, apenas,<br />

a aprimorar a estrutura do chamado Museu<br />

Museu, galeria com acervo de obras<br />

criadas pela professora Mabe Bethônico,<br />

que, apesar de inteiramente virtual, jamais<br />

assume tal condição.<br />

No desenvolvimento inicial do projeto,<br />

portanto, os pesquisadores propunham-<br />

O projeto de Galinha foi realizado por<br />

Daniel Pinheiro Lima, sob orientação<br />

dos professores Jalver Bethônico e<br />

Francisco Marinho, para exposição<br />

na Escola de Belas Artes <strong>em</strong> agosto<br />

de 2008.<br />

A obra ganhou, <strong>em</strong> 2006, o Prêmio de<br />

Poesia Digital da Cidade de Vinarós,<br />

na Catalunha, na categoria de arte-<br />

-software.<br />

Syggraph é o nome de uma associação<br />

norte-americana especializada <strong>em</strong><br />

computação gráfica.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 29


-se a ampliar a complexidade do conteúdo<br />

do Museu Museu, a partir da instauração<br />

de diversos ambientes interativos. “Buscaríamos<br />

um exercício de forma no interior de<br />

um acervo”, explica o professor Jalver Bethônico,<br />

ao ressaltar, porém, que os planos<br />

se diversificaram: “As coisas começaram a<br />

tomar rumos inesperados, como resultado<br />

das pesquisas com arte digital”. Surg<strong>em</strong><br />

daí propostas as mais diversas. Além de<br />

ateliês e oficinas para discussão do t<strong>em</strong>a,<br />

tanto na graduação quanto na pós, são realizadas<br />

diversas exposições com o material<br />

gerado a partir de tais iniciativas. “Perceb<strong>em</strong>os,<br />

então, a necessidade de montar um<br />

outro espaço de investigação”.<br />

Eis o mote para a criação do 1maginari0,<br />

grupo de pesquisa abrigado no<br />

Laboratório Midia@rte da EBA e que, <strong>em</strong><br />

convênio com o interSignos, dedica-se à<br />

pesquisa de interfaces multimodais e ao desenvolvimento<br />

e à produção <strong>em</strong> artes digitais,<br />

computacionais e poéticas. “De repente,<br />

buscávamos consolidar uma nova área<br />

dentro da Escola de Belas Artes. E por meio<br />

de uma nova habilitação”, explica Bethônico.<br />

Iniciava-se, desse modo, o curso de<br />

graduação <strong>em</strong> Cin<strong>em</strong>a de Animação e Artes<br />

de Digitais (CAAD), hoje já na quarta turma.<br />

Confira o blog do projeto:<br />

www.1maginari0.blogspot.com<br />

Fotos: Divulgação<br />

“No curso, que hoje já conta com sete professores,<br />

o estudante recebe formação híbrida<br />

e, ao mesmo t<strong>em</strong>po, t<strong>em</strong> a possibilidade<br />

de se especializar <strong>em</strong> um dos percursos<br />

oferecidos”, esclarece o professor.<br />

Dos sopros à Babel<br />

Criatividade, tecnologia e interação<br />

são palavras verdadeiramente fundamentais<br />

às iniciativas propostas pelos<br />

pesquisadores ligados ao grupo 1maginari0.<br />

Que o diga a instalação Dente de<br />

Leão, experiência estética que costuma<br />

provocar inesperadas sensações nos<br />

espectadores. O funcionamento da obra,<br />

de autoria de Chico Marinho, Francisco<br />

Chaves e Jalver Bethônico, é bastante<br />

simples – apesar dos efeitos surpreendentes:<br />

ao soprar um microfone camuflado<br />

de flor, a pessoa faz aparecer, numa<br />

tela de projeção, imagens de milhares<br />

de s<strong>em</strong>entes esvoaçantes, que, pouco a<br />

pouco, transformam-se <strong>em</strong> po<strong>em</strong>as. “Ao<br />

mesmo t<strong>em</strong>po, no fone de ouvido, perceb<strong>em</strong>-se<br />

construções sonoras e musicais<br />

que variam de acordo com a intensidade<br />

do sopro”, relata Bethônico.<br />

Outra maravilhosa experimentação<br />

<strong>em</strong> arte digital desenvolvida pelo grupo de<br />

pesquisa é a obra Babel, fruto de parceria<br />

de Jalver com Marcelo Bicalho, apresentada<br />

<strong>em</strong> 2008 numa exposição da Escola<br />

de Belas Artes. Na instalação, é preciso<br />

chacoalhar um teclado para a que torre de<br />

versos, belissimamente projetada numa<br />

tela, se sustente ou se movimente. “Nesta<br />

e <strong>em</strong> outras obras, a ludicidade está presente.<br />

Apesar disso, não pod<strong>em</strong>os deixar<br />

de lado as proposições e experimentações<br />

estéticas”, completa Bethônico.<br />

Projeto: O silêncio, a sombra<br />

e o silício: experiência da arte<br />

computacional <strong>em</strong> instalações<br />

interativas e imersivas<br />

Coordenador: Jalver Machado<br />

Bethônico<br />

Modalidade: Grupos Emergentes<br />

de Pesquisa<br />

Valor: R$ 70.000<br />

Pessoas interag<strong>em</strong> com o Palavrador e ajudam a movimentar a tecnológica Babel<br />

30 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Projeto de pesquisadores<br />

da UFJF mapeia e classifica<br />

espécie de moluscos<br />

terrestres na região da<br />

Zona da Mata mineira<br />

BIOLOGIA<br />

Desireé Antônio<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 31


“As espécies de menor porte<br />

não são um probl<strong>em</strong>a tão<br />

grande porque elas já têm<br />

predadores aqui, ao contrário<br />

do caramujo africano, cujo<br />

predador é um gavião que só<br />

existe na África, o que facilita<br />

sua proliferação”<br />

Elisabeth de Almeida Bessa<br />

Coordenadora do projeto<br />

Determinar quais, quantos e como<br />

viv<strong>em</strong> os moluscos terrestres da região da<br />

Zona da Mata mineira: esses foram os objetivos<br />

de um estudo de pesquisadores do<br />

Departamento de Zoologia da Universidade<br />

Federal de Juiz de Fora (UFJF), na região<br />

da Zona da Mata, Sudeste do Estado.<br />

Com o nome “Taxonomia de Moluscos<br />

Terrestres da Microrregião de Juiz de<br />

Fora, Minas Gerais, e Avaliação da Atividade<br />

Moluscicida, Repelente e Ovicida de<br />

Produtos Naturais”, o projeto visou ainda<br />

investigar a eficácia de substâncias naturais<br />

para controle biológicos dos moluscos<br />

gastrópodes terrestres, aqueles que se locomov<strong>em</strong><br />

arrastando-se por meio de uma<br />

espécie de pé na região do ventre.<br />

A área de cobertura da pesquisa incluiu,<br />

além de Juiz de Fora, as cidades de<br />

Chácara, Coronel Pacheco, Bicas, Lima<br />

Duarte, Matias Barbosa, Piau, Rio Preto e<br />

São João Nepomuceno, Ponte Nova, Viçosa,<br />

Carangola e o Parque Estadual Serra<br />

de Ibitipoca, situado nos limites entre Lima<br />

Duarte e Santa Rita do Ibitipoca.<br />

A iniciativa, realizada entre 2007 e<br />

2009, integra um projeto de abrangência<br />

maior chamado “Biologia, Comportamento<br />

e Participação de Moluscos Terrestres no<br />

Ciclo Biológico de Parasitos”, mantido<br />

desde 1998 pelo departamento.<br />

A classe deve seu nome ao termo grego<br />

“gastropoda”, junção das raízes gaster, estômago,<br />

e podos, pé, e inclui, além das lesmas<br />

e dos caramujos, que habitam ambientes<br />

terrestres, espécies aquáticas, tanto de água<br />

doce quanto salgada. Estima-se que haja<br />

hoje 35 mil espécies de moluscos terrestres,<br />

número expressivo que coloca o grupo como<br />

um dos de maior biodiversidade. Em Minas<br />

Gerais, de acordo com levantamentos do começo<br />

dos anos 2000, o rol de espécies varia<br />

entre 56 e 70, das quais 40 estão presentes<br />

na localidade da Zona da Mata.<br />

Elisabeth de Almeida Bessa, da UFJF,<br />

coordenadora do estudo e também do Núcleo<br />

de Malacologia, ramo da biologia que<br />

se dedica ao estudo dos moluscos, explica<br />

que a pesquisa foi motivada pelo interesse<br />

<strong>em</strong> confirmar a quantidade e quais são as<br />

espécies na região de Juiz de Fora e proximidades,<br />

<strong>em</strong>pregando uma metodologia<br />

de identificação que leva <strong>em</strong> conta outras<br />

características dos indivíduos que não<br />

apenas a concha ou as partes moles, como<br />

se costuma fazer tradicionalmente.<br />

Na etapa de revisão taxonômica, à<br />

qual esteve à frente a professora Flávia<br />

Junqueira, as espécies seriam determinadas<br />

conforme a análise morfológica macro<br />

e microscópica dos sist<strong>em</strong>as reprodutor,<br />

digestório, do complexo palial e a morfologia<br />

das conchas.<br />

A taxonomia é a ciência que trata da<br />

classificação das espécies <strong>em</strong> grupos, de<br />

acordo com sua s<strong>em</strong>elhança. Na análise<br />

proposta pelo estudo, os animais foram<br />

examinados quanto à morfologia, que trata<br />

da forma das estruturas do organismo,<br />

tanto de suas conchas, e de seu complexo<br />

palial, que compreende o material no interior<br />

da cavidade da concha.<br />

Esse tipo de análise, mais completa,<br />

considerando também as estruturas do organismo<br />

para determinação das espécies,<br />

se opõe a uma tendência de estudos que<br />

focavam apenas o comportamento dos animais,<br />

muito comum nas últimas décadas,<br />

e t<strong>em</strong> como vantag<strong>em</strong> contribuir para uma<br />

aferição mais precisa.<br />

A necessidade desse tipo de abordag<strong>em</strong>,<br />

conta a coordenadora, se deve à<br />

possibilidade de que espécies de moluscos<br />

sejam ameaçadas de extinção, antes mesmo<br />

de ser<strong>em</strong> identificados, graças à redução das<br />

áreas habitáveis provocada pelo aumento do<br />

desmatamento e intensificação do processo<br />

de urbanização. Uma das implicações dessa<br />

dinâmica é a diminuição da oferta de alimentos:<br />

essencialmente herbívoros, as mudanças<br />

ocasionadas pela expansão das cidades aca-<br />

32 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Foto: sxc.hu<br />

bam por reduzir drasticamente os locais onde<br />

encontram meios para sobreviver<strong>em</strong>.<br />

No caso da população de moluscos<br />

terrestres, que se encontram na Zona da Mata<br />

mineira, o quadro se torna ainda mais grave<br />

pela velocidade com que os focos de Mata<br />

Atlântica, bioma natural da região, vêm se<br />

devastando. De acordo com levantamento<br />

da ONG SOS Mata Atlântica e do Instituto de<br />

Pesquisas Espaciais (Inpe) referente ao período<br />

de 2008 a 2010, <strong>em</strong> terras mineiras, a destruição<br />

das áreas de floresta Atlântica cresceu<br />

15% <strong>em</strong> comparação ao triênio de 2005 a<br />

2008, com a diminuição de aproximadamente<br />

13 mil hectares de cobertura vegetal.<br />

Mas os probl<strong>em</strong>as não param aí: as<br />

espécies do local têm que enfrentar, também,<br />

a concorrência das espécies exóticas<br />

ou invasoras de moluscos, aquelas que não<br />

são endêmicas, ou seja, típicas do local <strong>em</strong><br />

que são encontradas e que disputam com as<br />

nativas a sua alimentação, levando ao desequilíbrio<br />

ecológico daquele ecossist<strong>em</strong>a.<br />

A presença dessa fauna ou flora estranhas<br />

a um dado ecossist<strong>em</strong>a altera as relações<br />

ecológicas que ali havia, principalmente as<br />

da cadeia alimentar, sendo, por isso, considerada<br />

a segunda maior causa de extinção<br />

de espécies, perdendo apenas para a redução<br />

dos biomas por ação humana.<br />

Uma das espécies invasoras mais<br />

conhecidas e que t<strong>em</strong> causado danos consideráveis<br />

é o caramujo gigante africano<br />

(Achatina fulica). Conta-se que a espécie foi<br />

trazida para o País na década de 1980 para<br />

ser exposta <strong>em</strong> feira no Paraná como uma<br />

alternativa ao escargot, espécie comestível de<br />

molusco. Como os brasileiros não tinham o<br />

hábito, tipicamente francês, de consumir esse<br />

prato, os produtores acabaram por liberar os<br />

animais na natureza. Com condições propícias<br />

à sua reprodução, resultante da postura<br />

de mais de 400 ovos por indivíduo, dos quais<br />

99% chegam a filhotes, a espécie hoje se encontra<br />

<strong>em</strong> quase todo o país.<br />

Mais do que ameaçar a fauna nativa, o<br />

invasor africano acarreta prejuízos econômicos,<br />

por destruir plantações, e pode implicar<br />

outros ainda mais graves à saúde humana,<br />

por ser hospedeiros de uma série de parasitos<br />

que provocam doenças, como a angiostrongilíase,<br />

que ataca o sist<strong>em</strong>a nervoso<br />

central, e a angiostrongilíase abdominal,<br />

Típico da Ásia,o caracol de jardim(Bradybaena similaris) adaptou-se com sucesso ao climabrasileiro<br />

que pode levar à morte por perfuração do<br />

músculo e consequente h<strong>em</strong>orragia.<br />

Daí a importância do outro objetivo do<br />

projeto. Paralelamente às análises morfológicas,<br />

a pesquisa se dedica ainda a estudar os<br />

hábitos das espécies de moluscos <strong>em</strong> condições<br />

de laboratório, utilizando como amostra<br />

uma geração criada com esse propósito, para<br />

avaliar os efeitos moluscicidas de algumas<br />

substâncias naturais – que controlaria o<br />

crescimento da população de animais – ou<br />

repelente – que reduz presença de moluscos<br />

no local. “Os dados obtidos por esses estudos<br />

pod<strong>em</strong> nos ajudar a trabalhar com maior<br />

segurança no controle de moluscos e, por<br />

consequência, no controle de parasitoses”,<br />

justifica a coordenadora do projeto.<br />

Dessas amostras, foram coletados dados<br />

como a densidade populacional – a razão<br />

entre o espaço total e o número de indivíduos<br />

que o ocupam -, o t<strong>em</strong>po para atingir<strong>em</strong><br />

a maturidade sexual, o ritmo e a quantidade<br />

de ovos de cada ovipostura, além do t<strong>em</strong>po e<br />

a taxa de eclosão dos filhotes, características<br />

reprodutivas dos animais, especialmente a<br />

ocorrência de autofecundação.<br />

A busca por meios de controlar as espécies<br />

de moluscos data do início do século<br />

XX, com o <strong>em</strong>prego de materiais que não<br />

eram específicos para isso, tais como cal,<br />

fosfato de cálcio, cianeto de cálcio ou sulfato<br />

de cobre, chegando-se, na década de 1970,<br />

à pesquisa de mais de 7 mil produtos para<br />

a finalidade. Dentre eles, um dos de maior<br />

destaque foi o medicamento Bayluscide,<br />

que, apesar de eliminar os animais, prejudicava<br />

a fauna e a flora do local de aplicação,<br />

além de ter altos custos de produção. O<br />

probl<strong>em</strong>a levou a que se pesquisass<strong>em</strong> moluscicidas<br />

naturais, com o intuito principal<br />

de controlar os gastrópodes hospedeiros<br />

do agente causador da esquistossomose, o<br />

Schistosoma mansoni. Foi quando se descobriu<br />

o sucesso de substâncias extraídas<br />

de plantas como a castanha de caju (Anacardium<br />

occidentale) e a piteira ou agave<br />

(Agave americana) para esse fim.<br />

No estudo mineiro, o objetivo foi<br />

investigar a resposta das plantas e outros<br />

materiais naturais para controlar a população<br />

de indivíduos jovens ou adultos, b<strong>em</strong><br />

como os ovos de três espécies exóticas,<br />

encontradas na região de Juiz de Fora: a<br />

Bradybaena similaris, conhecido comumente<br />

como caracol de jardim e típico da<br />

Ásia; Subulina octona, com ocorrência <strong>em</strong><br />

regiões tropicais, especialmente do continente<br />

americano; e Leptinaria unilamellata,<br />

também presentes nos trópicos.<br />

Como as condições climáticas do Brasil<br />

são muito s<strong>em</strong>elhantes às de seus locais<br />

de orig<strong>em</strong>, as espécies tiveram grande sucesso<br />

de adaptação, vivendo de forma s<strong>em</strong>elhante<br />

às nativas, inclusive com integração ao<br />

ciclo biológico da área onde estão. “Essas espécies<br />

de menor porte já não são um proble-<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 33


ma tão grande porque elas já têm predadores<br />

aqui, ao contrário do caramujo africano, cujo<br />

predador é um gavião que só existe na África,<br />

o que facilita sua proliferação”, relata.<br />

Na iniciativa da universidade juiz-forana,<br />

foram averiguadas as propriedades<br />

das seguintes plantas: a erva-de-santa-<br />

-maria (Chenopodium ambrosioides), piteira-azul<br />

agave americana (Agave Americana),<br />

coroa-de-cristo (Euphorbia millii),<br />

dedal-de-dama ou alamanda amarela<br />

(Allamanda cathartica), piteira (Furcraea<br />

foetida), guaco (Mikania glomerata),<br />

picão (Bidens pilosa), além de antibióticos<br />

extraídos de fungos, cafeína e timol,<br />

obtido através dos óleos de plantas como<br />

o tomilho e o orégano. Os experimentos<br />

foram feitos cruzando cada planta isoladamente<br />

ou combinada a outras com cada<br />

espécie de molusco individualmente.<br />

Esses materiais foram escolhidos<br />

por já ter<strong>em</strong> sido mencionados como possíveis<br />

moluscicidas pela literatura especializada<br />

e, no caso de alguns dos vegetais,<br />

por pertencer<strong>em</strong> a famílias de plantas que<br />

já apresentaram essas propriedades. A<br />

novidade do trabalho, explica Elisabeth,<br />

é pesquisar esses efeitos sobre moluscos<br />

terrestres, já que, até então, os textos tratavam<br />

apenas dos moluscos aquáticos, que<br />

têm hábitos completamente diferentes.<br />

Resultados<br />

Quanto à primeira etapa do estudo,<br />

a análise taxonômica de moluscos<br />

coletados <strong>em</strong> doze localidades da microrregião<br />

de Juiz de Fora, foi constatado<br />

um número maior de espécies<br />

no local do que as computadas pelos<br />

levantamentos anteriores. Em vez das<br />

quantidades esperadas de 16 famílias,<br />

24 gêneros e 40 espécies, foram encontrados<br />

21 famílias, 36 gêneros e 51 espécies.<br />

Todos os animais encontrados<br />

são de espécies já conhecidas, mas das<br />

quais não se sabia sobre a presença na<br />

Zona da Mata. Dentre elas, nove ainda<br />

precisam ser confirmadas.<br />

Para chegar a esse número, Flávia<br />

coletou amostras de animais entre 2006<br />

e 2009 e as analisou considerando não<br />

apenas a sua concha e a parte mole – que<br />

inclui os sist<strong>em</strong>as do organismo –, mas<br />

também seu material genético, <strong>em</strong> parceria<br />

com outra professora da casa, Sthefane<br />

D´ávila, especialista <strong>em</strong> biologia molecular<br />

e histologia – estudo dos tecidos dos órgãos<br />

– de moluscos terrestres.<br />

Os dados resultantes da pesquisa foram<br />

t<strong>em</strong>a da tese de doutoramento de Flávia, defendida<br />

<strong>em</strong> abril deste ano, e já foram submetidos<br />

a periódicos para publicação. “Os estudos<br />

continuam para confirmar tais espécies, um<br />

processo d<strong>em</strong>orado e que exige pesquisas<br />

mais aprofundadas”, explica Flávia.<br />

Já quanto à segunda fase, o teste com<br />

as substâncias utilizadas para controle dos<br />

animais apresentou resultados positivos na<br />

avaliação da equipe. “Nossa conclusão é de<br />

essas plantas têm ação ovicida, jovencida e<br />

adultocida. Controlar o número de ovos é<br />

muito bom porque filhotes não nasc<strong>em</strong> e,<br />

logo, não t<strong>em</strong>os adultos. Estamos tentando<br />

controlar s<strong>em</strong> exterminar”, afirma Elisabeth.<br />

Por ora, as informações sobre as proporções<br />

de cada material estão sob sigilo devido<br />

ao processo de obtenção de patente das<br />

fórmulas dos moluscicidas naturais criados.<br />

O estudo t<strong>em</strong> ainda contribuições<br />

acadêmicas importantes para a pesquisa<br />

na área da malacologia. Já foram defendidas<br />

15 trabalhos de pós-graduação strictu<br />

sensu, entre dissertações de mestrado e<br />

teses de doutorado, ligadas ao programa<br />

“Biologia e Comportamento Animal” da<br />

universidade. Mais três dissertações na<br />

área de controle biológico deverão ser<br />

defendidas <strong>em</strong> breve: uma <strong>em</strong> fevereiro<br />

de 2012 sobre o Subulina octona, o caracol<br />

de jardim, e as outras <strong>em</strong> 2013, sobre<br />

Achatina fulica, o caramujo africano.<br />

Houve ainda participações <strong>em</strong> bancas<br />

de avaliação de trabalhos de pós-<br />

-graduação e <strong>em</strong> congressos, publicações<br />

de artigos, orientações <strong>em</strong> monografias e<br />

iniciações científicas. “O bom da pesquisa<br />

é que, a cada resposta que encontramos,<br />

há dezenas de outras perguntas que motivarão<br />

outros estudos. É trabalho para a<br />

vida toda”, brinca Elisabeth.<br />

Museu de Malacologia<br />

Para qu<strong>em</strong> pretende ir a Juiz de Fora<br />

nas férias e se interessa pelo universo dos<br />

moluscos, uma boa dica é visitar o Museu<br />

de Malacologia Professor Maury Pinto de<br />

Oliveira, que integra o Núcleo de Malacologia<br />

da UFJF. O local possui laboratórios,<br />

sala de microscopia, locais de criação de<br />

animais, sala de estudos especiais e biblioteca<br />

especializada no t<strong>em</strong>a, com registros<br />

raros dos séculos XVIII e XIX.<br />

Com visitas guiadas de escolas e grupos<br />

de estudos e aberto também ao público<br />

<strong>em</strong> geral, o museu possui uma das maiores<br />

coleções de conchas do país, de moluscos<br />

terrestres e marinhos. Mais informações<br />

pela página do museu http://www.ufjf.br/<br />

malacologia/ ou pelo tel. (32) 2102-3221 e<br />

e-mail malaco.icb@ufjf.edu.br.<br />

O caramujo gigante africano (foto 1), do gênero<br />

Achatina, e o caramujo branco pequeno, do<br />

gênero Bulimulus (foto 2) tiveram seus hábitos<br />

analisados pelo projeto<br />

PROJETO: Taxonomia de moluscos<br />

terrestres da microrregião de Juiz de<br />

Fora, Minas Gerais e avaliação da<br />

atividade moluscicida, repelente e<br />

ovicida de produtos naturais<br />

COORDENADOR: Elisabeth Cristina<br />

de Almeida Bessa<br />

MODALIDADE: Programa Pesquisador<br />

Mineiro (PPM)<br />

VALOR: R$ 48.000<br />

Foto: Arquivo pessoal<br />

34 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Do laboratório para a<br />

prateleira da farmácia<br />

Propriedades ftoterápicas do repolho são utilizadas na produção<br />

de pomadas e bálsamo que têm a capacidade de cicatrizar feridas<br />

LEMBRA DESSA?<br />

Há muitos e muitos anos, as pessoas<br />

costumavam buscar a cura de gripes,<br />

enjoos, dor de dente e feridas no canteiro<br />

plantado no fundo de casa. Misturavam<br />

folhas ou frutos com água ou álcool, entre<br />

outros ingredientes, e colocavam <strong>em</strong><br />

garrafas para tomar ou passar na pele. Até<br />

2007 a Medicina ainda não reconhecia esses<br />

métodos caseiros, porém, depois que<br />

o Ministério da Saúde aprovou o programa<br />

nacional de plantas medicinais e fitoterápicos,<br />

alguns r<strong>em</strong>édios da “vovó” são estudados<br />

<strong>em</strong> laboratórios e transformados <strong>em</strong><br />

soluções eficazes no combate de doenças.<br />

Na edição nº 28 da MINAS FAZ CI-<br />

ÊNCIA, <strong>em</strong> 2007, foi publicada matéria<br />

sobre pesquisadores que encontraram, nas<br />

folhas do repolho - o mesmo que usamos<br />

para fazer saladas -, substâncias que apresentavam<br />

capacidade de cicatrizar feridas.<br />

A pomada era fabricada e vendida apenas<br />

na cidade de Governador Valadares, entretanto,<br />

a eficácia do produto no tratamento<br />

de ferimentos fez com que fosse necessário<br />

o inicio de estudos laboratoriais para<br />

comprovar cientificamente que a Brasica<br />

oleracea var.captata (nome cientifico do repolho)<br />

é um r<strong>em</strong>édio natural que pode ser<br />

comercializado <strong>em</strong> larga escala.<br />

Em 2008 a pomada e o bálsamo deixaram<br />

de ser produtos de manipulação e<br />

adquiriram o status de produtos para industrialização,<br />

com o nome de Debridan.<br />

O farmacêutico e <strong>em</strong>presário Moacir Lima,<br />

que iniciou os estudos com o poder cura-<br />

tivo do repolho, afirma que os principais<br />

avanços conquistados com os produtos é<br />

a credibilidade alcançada junto aos profissionais<br />

da saúde. “Colocar na prática o que<br />

as pesquisas comprovaram e saber que a<br />

pomada poderá se consolidar como principal<br />

marca no tratamento de feridas é muito<br />

importante”, avalia.<br />

No que diz respeito à parte cientifica,<br />

o engenheiro agrônomo e doutor <strong>em</strong><br />

fitopatologia Marcelo Barreto explica que,<br />

após a comprovação da capacidade da pomada<br />

ativar a produção de colágeno e disposição<br />

das fibras da pele, novos estudos<br />

puderam ser iniciados. “T<strong>em</strong>os novas pesquisas<br />

sendo estruturadas especialmente<br />

na área da nanotecnologia, envolvendo o<br />

extrato da Brassica. Com equipamentos<br />

mais elaborados, como o espectrofotômetro<br />

de massa, estamos trabalhando no<br />

conhecimento mais detalhado da química<br />

da planta”, afirma.<br />

O trabalho, que foi iniciado há mais<br />

de quatro anos, ainda gera desenvolvimento<br />

cientifico e industrial. De acordo<br />

com Lima, foram firmadas parcerias,<br />

para continuidade de estudos com a<br />

Brassica, com a Universidade de Santa<br />

Maria, Rio Grande do Sul e Universidade<br />

Federal do Espírito Santo, onde está<br />

o professor Barreto. Ainda está previsto<br />

o lançamento de novos produtos para<br />

tratamento de fissura labial e mamilar e<br />

assaduras. “A Brassica nos surpreende a<br />

cada momento. T<strong>em</strong>os muito ainda o que<br />

investigar e creio que poder<strong>em</strong>os lançar<br />

produtos inovadores e de grande benefício<br />

para diversos tratamentos”.<br />

Foto: sxc.hu<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 35


AGRICULTURA<br />

Pulverizador desenvolvido por <strong>em</strong>presa fabricante<br />

de eletrônicos utiliza princípios da física eletrostática<br />

para aumentar efciência do equipamento<br />

Desireé Antônio<br />

A eletrostática, ramo da física que se<br />

dedica ao estudo das cargas elétricas, não<br />

t<strong>em</strong> relação direta com a agricultura, mas a<br />

aplicação de seus princípios pode contribuir<br />

para cultivos mais produtivos e sadios. Essa<br />

é a proposta do modelo de pulverizador eletrostático<br />

de defensivos agrícolas Eletrobell’s,<br />

desenvolvido pela <strong>em</strong>presa Bell’s Ind. Eletrônica,<br />

com sedes na cidade de Timbó, Santa<br />

Catarina, e <strong>em</strong> Santa Rita do Sapucaí, <strong>em</strong><br />

Minas Gerais. Nos pulverizadores convencionais,<br />

a calda, ou seja, a mistura de água<br />

e defensivos agrícolas, atinge as plantas<br />

graças à pressão feita por uma bomba, um<br />

dispositivo que funciona como um êmbolo<br />

de seringa, “<strong>em</strong>purrando” o líquido para fora<br />

do recipiente. Já no novo projeto, as gotas de<br />

calda receb<strong>em</strong> uma ajuda a mais para atingir<strong>em</strong><br />

seus alvos: a um campo elétrico, um<br />

campo de forças produzido pela atuação de<br />

cargas elétricas sobre uma área, no interior<br />

da máquina, que faz com que as gotas da calda<br />

fiqu<strong>em</strong> eletricamente carregadas e sejam<br />

atraídas pelos vegetais.<br />

Esse campo de forças é gerado por<br />

uma fonte de alta tensão alimentada por<br />

uma bateria de 12 volts, fazendo com que a<br />

tensão atinja o valor de 40 mil volts, ligada<br />

a um eletrodo, objeto que vai possibilitar<br />

a constituição de um circuito elétrico através<br />

da passag<strong>em</strong> de cargas, instalado no<br />

cabeçote do pulverizador. A colocação do<br />

eletrodo na extr<strong>em</strong>idade do equipamento<br />

t<strong>em</strong> uma justificativa: conforme descrito<br />

pelo “Princípio do Poder das Pontas”,<br />

enunciado pelo inventor e político norte-<br />

-americano Benjamin Franklin, no século<br />

XVIII, as cargas elétricas presentes <strong>em</strong> cer-<br />

to corpo que conduza eletricidade tend<strong>em</strong><br />

a se acumular <strong>em</strong> regiões pontiagudas ou<br />

de menor diâmetro, razão pelas qual as<br />

pontas de objeto terão maior concentração<br />

de cargas <strong>em</strong> comparação ao restante de<br />

sua extensão. Essa teoria foi a base para o<br />

desenvolvimento dos para-raios, também<br />

de autoria de Franklin, <strong>em</strong> 1752.<br />

Graças a essa dinâmica, o cabeçote<br />

do pulverizador se torna um local com um<br />

campo elétrico fort<strong>em</strong>ente carregado, fazendo<br />

com que as gotas que passam por ele adquiram<br />

cargas positivas, perdendo elétrons<br />

(partículas atômicas que possu<strong>em</strong> carga<br />

negativa), e sejam atraídas pelas plantas,<br />

que ficam negativamente carregadas devido<br />

à proximidade da calda com os vegetais. A<br />

aproximação da carga positiva das gotas<br />

provoca uma reorganização das cargas da<br />

superfície das folhas, fazendo com que a<br />

parte mais próxima da calda fique negativa,<br />

e a mais distante, positiva. Como cargas<br />

opostas se atra<strong>em</strong>, a mistura é “puxada”<br />

pelas plantas com mais facilidade, tornando<br />

sua aplicação mais eficiente, já que evita a<br />

dispersão indesejada das gotas.<br />

Até chegar ao cabeçote do pulverizador<br />

e ser expelida, a calda faz o seguinte<br />

trajeto: sai do tanque, o reservatório onde<br />

fica armazenada, segue para o gotejador,<br />

de onde passam por um disco dispersor,<br />

que age dividindo as gotas <strong>em</strong> outras ainda<br />

menores, para facilitar a dispersão do produto.<br />

A redução da massa e da dimensão<br />

das gotas potencializa o efeito da atração<br />

eletrostática, já que, quanto menor o corpo<br />

sobre o qual atuam, maior o efeito da força<br />

exercida pelas cargas.<br />

36 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Aliadas a essa novidade, estão ainda<br />

outras alterações destinadas a tornar o pulverizador<br />

mais facilmente manuseável, e o uso<br />

mais eficiente dos defensivos, por ser um modelo<br />

manual, e não costal, com tanque <strong>em</strong> forma de mochila,<br />

transportado nas costas do operador, facilitando<br />

o controle e manuseio pelo agricultor; além do uso<br />

de menores volumes de calda e gotas com dimensões<br />

cada vez mais próximas das definidas como ideais pela<br />

literatura da área, que seria de 100 micrômetros – um<br />

micrômetro equivale a um milionésimo do metro. O<br />

equipamento é voltado às necessidades dos pequenos<br />

e médios produtores de hortaliças e flores.<br />

“O Eletrobell’s é único. No Brasil, até então nenhuma<br />

<strong>em</strong>presa produz um idêntico a esse”, afirma o<br />

engenheiro agrônomo e supervisor de vendas Adálcio<br />

Alberton, que trabalha na matriz. Ele conta que o modelo<br />

começou a ser concebido <strong>em</strong> 2007, quando os diretores<br />

da Bell’s tiveram contato com o projeto desenvolvido por<br />

um pesquisador da Embrapa Meio Ambiente de Jaguariúna<br />

(SP). Esse projeto ainda estava no papel, aguardando<br />

recursos financeiros e humanos para ser concretizado.<br />

Uma das fontes de captação do investimento necessário<br />

foi a FAPEMIG: <strong>em</strong> 2008, a <strong>em</strong>presa, que possui uma filial <strong>em</strong><br />

Minas Gerais, na cidade de Santa Rita do Sapucaí, submeteu o<br />

projeto ao edital para financiamento de projetos do setor privado e<br />

foi um dos cont<strong>em</strong>plados. A participação mineira, no entanto, não<br />

se limitou à captação de recursos: a equipe da filial desenvolveu,<br />

<strong>em</strong> parceria com a da matriz, a parte eletrônica do pulverizador. “O<br />

trabalho foi feito com os dos grupos trocando experiências, erros<br />

e acertos”, explica Marco Passos, engenheiro mecânico da matriz.<br />

Apostando no apelo da proposta, as ideias passaram à fase<br />

de execução <strong>em</strong> 2009, realizada por uma equipe de profissionais<br />

da Bell’s. Os dois anos de trabalho, diz Adálcio, incluíram grande<br />

volume de testes de laboratório para determinar como seria e<br />

como funcionariam os componentes do pulverizador. A maior<br />

dificuldade foi definir qual o dimensionamento e a otimização da<br />

fonte de que seria usada.<br />

O engenheiro revela que, como as informações sobre o<br />

novo modelo ainda eram essencialmente teóricas, foi necessário<br />

encontrar um similar, que já tivesse sido produzido, para servir<br />

como referência. “Como apenas encontramos dois modelos chineses,<br />

os importamos e realizamos as comparações”, justifica.<br />

A avaliação baseada no contraste com o produto asiático<br />

aconteceu <strong>em</strong> outubro do ano passado e foi fundamental para<br />

acertar as características das peças do pulverizador. Na ocasião,<br />

foram analisadas variáveis como a faixa de aplicação efetiva,<br />

densidade, espectro das gotas e o efeito da eletrostática dos dois<br />

tipos, <strong>em</strong> diferentes situações: ora s<strong>em</strong>, ora com o uso da fonte<br />

de energia, e com duas velocidades de aplicação distintas.<br />

Paralelamente às simulações no laboratório, foram realizados<br />

testes de campo <strong>em</strong> propriedades rurais de cultivos de hortaliças<br />

e flores no Estado, <strong>em</strong> parceria com o Departamento de Fitotecnia<br />

da Udesc, que colaborou com a pesquisa organizando ensaios<br />

e avaliações do produto, de acordo com a metodologia científica.<br />

Os resultados dos testes foram promissores: o<br />

Eletrobell’s apresentou bom des<strong>em</strong>penho quanto à efetividade<br />

da aplicação – a capacidade para atingir o alvo<br />

visado – e quanto à densidade das gotas, o que facilita a<br />

cobertura de uma área maior com o uso de menor volume<br />

de defensivos, <strong>em</strong> comparação ao produto chinês.<br />

Os experimentos, tanto os de laboratório, como os de<br />

campo, deram uma indicação também sobre os pontos <strong>em</strong><br />

que o produto deve melhorar: um deles é a dimensão das<br />

gotas, que estava variando entre 40 e 320 micrômetros, enquanto<br />

a literatura da área define como ideais valores que<br />

vari<strong>em</strong> entre 80 a 120 micrômetros. O tamanho das gotas,<br />

cujo termo técnico é diâmetro médio volumétrico (DMV),<br />

t<strong>em</strong> especial importância porque está ligado ao sucesso da<br />

indução por eletrostática: quanto menores as gotas, maior<br />

é o efeito das cargas sobre elas. O probl<strong>em</strong>a está sendo<br />

sanado com a substituição de discos rotativos, que tinham<br />

a função de reduzir o DMV das gotas, por bicos hidráulicos,<br />

que des<strong>em</strong>penha a mesma função de melhor forma.<br />

Hoje, a <strong>em</strong>presa, que ainda não t<strong>em</strong> data para lançamento<br />

do equipamento, está pesquisando uma nova fonte<br />

de energia para o pulverizador, ao que dev<strong>em</strong> se seguir<br />

testes comparativos com outros modelos nacionais. “Ao<br />

realizar experimento <strong>em</strong> lavoura comercial, durante todo o<br />

ciclo da cultura, fazendo os tratamentos com o Eletrobell’s,<br />

poder<strong>em</strong>os avaliar os índices de eficiência no controle de<br />

pragas e doenças, <strong>em</strong> comparação com pulverizadores<br />

comuns”, projeta Adalcio.<br />

Foto: Bell’s Ind. Eletrônica<br />

Um dos testes <strong>em</strong> plantações de hortaliças feitos pelo projeto<br />

Projeto: Pulverizador EletroBells<br />

Coordenador: Adalcio Alberton<br />

Modalidade: Eletroeletrônico<br />

Valor: R$ 158.293<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 37


Entrevista<br />

A nova<br />

fronteira da vida<br />

Depois de se lançar às estrelas e ao oceano, o ser humano<br />

v<strong>em</strong> avançando na tentativa de controlar a influência da relação<br />

entre gene e ambiente sobre nossa saúde<br />

Marcus Vinicius dos Santos<br />

N<strong>em</strong> Júlio Verne, autor francês que<br />

escreveu alguns dos maiores clássicos<br />

mundiais da ficção científica e que s<strong>em</strong>pre<br />

apostou <strong>em</strong> romper fronteiras, foi capaz de<br />

imaginar. O ser humano fechou o século<br />

XX abrindo a caixa secreta que contém<br />

todas as instruções para o funcionamento<br />

do nosso organismo: o genoma humano,<br />

ou seja, o conjunto de genes de uma espécie<br />

que é transmitido, com pequenas<br />

variações, de pais para filhos. Mapeá-los,<br />

conhecer seu exato posicionamento na hélice<br />

do DNA, as estruturas que compõ<strong>em</strong> o<br />

gene, por meio da genômica, pod<strong>em</strong> permitir<br />

saber a probabilidade de um indivíduo<br />

ou etnia desenvolver<strong>em</strong> uma ou outra<br />

doença, por ex<strong>em</strong>plo. A intenção é poder<br />

preveni-las ou retardá-las ao máximo.<br />

Mas isso é algo como ler uma obra<br />

com cerca de 800 volumes, <strong>em</strong> uma língua<br />

desconhecida. Os genes são apenas 5%<br />

dessa “leitura”, que nos seres humanos<br />

somam cerca de 25 mil. Apesar dos desafios<br />

por vir, com esse novo jeito de olhar o<br />

indivíduo a Ciência ultrapassa a fronteira<br />

da compreensão das células e das moléculas<br />

e avança no sentido de alcançar um de<br />

seus principais objetivos, controlar a relação<br />

saúde-doença. MINAS FAZ CIÊNCIA<br />

foi conversar sobre esse t<strong>em</strong>a com um dos<br />

mais reconhecidos geneticistas do Brasil,<br />

o mineiro Sérgio Danilo Pena. Ele acredita<br />

que os avanços na tecnologia pod<strong>em</strong> agilizar<br />

mudança substancial na medicina a<br />

partir de agora, à medida que a sociedade<br />

e a comunidade médica absorv<strong>em</strong> os avanços<br />

da ciência genômica e os incorporam<br />

às informações preditivas e preventivas na<br />

rotina de manutenção da saúde.<br />

Sérgio Pena é médico, Ph.D. <strong>em</strong><br />

Genética Humana, professor titular do departamento<br />

de Bioquímica e Imunologia do<br />

Instituto de Ciências Biológicas da Universidade<br />

Federal de Minas Gerais (UFMG) e<br />

diretor do Laboratório de Genômica Clínica<br />

da Faculdade de Medicina da UFMG, entre<br />

outras atividades.<br />

Que conhecimentos o Projeto Genoma<br />

trouxe para a saúde?<br />

Em 2003, foi anunciado o fim oficial do Projeto<br />

Genoma Humano. Mais de 99% dos 2,9<br />

bilhões de pares de base de DNA, que constitu<strong>em</strong><br />

a principal porção do genoma humano,<br />

foram sequenciados com uma exatidão<br />

superior a 99,9%. Entretanto, as promessas<br />

feitas durante o Projeto foram muitas e algumas<br />

pessoas têm ficado impacientes com<br />

38 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 39<br />

Foto: Bruna Carvalho


a d<strong>em</strong>ora na translação do conhecimento<br />

genômico para o tratamento e a cura de doenças.<br />

Mas o importante é que os avanços<br />

têm ocorrido inexoravelmente e aos poucos<br />

a Medicina vai se tornando mais científica e<br />

certeira, para o benefício de todos. Já t<strong>em</strong>os<br />

muito a oferecer no presente.<br />

Como o senhor traduziria a importância<br />

desse conhecimento para a<br />

humanidade?<br />

Do ponto de vista médico a importância<br />

do Projeto Genoma Humano só pode ser<br />

comparada à publicação do primeiro tratado<br />

científico completo de anatomia humana,<br />

De Humani Corporis Fabrica, por<br />

Andreas Vesalius, <strong>em</strong> 1543. Este livro representou<br />

o alicerce da medicina moderna.<br />

E o conhecimento anatômico propiciou o<br />

florescimento lento e gradual da fisiologia<br />

humana, da patologia humana e da farmacologia<br />

humana nos séculos subsequentes.<br />

Da mesma maneira, o Projeto permitiu<br />

o conhecimento anatômico completo do<br />

genoma humano. Aos poucos vão florescendo<br />

a fisiologia genômica, a patologia<br />

genômica e a farmacologia genômica.<br />

E são essas as bases da Medicina Genômica?<br />

Conhecer a anatomia do genoma humano<br />

representa apenas o ponto de partida de<br />

construção da Medicina Genômica. As novas<br />

técnicas de sequenciamento genômico, 50<br />

mil vezes mais rápidas do que <strong>em</strong> 2003, têm<br />

acelerado ainda mais esse processo. Tanto<br />

que só <strong>em</strong> 2011 foram sequenciados mais de<br />

30 mil genomas humanos. Esse acúmulo de<br />

informações provocou mudança radical nos<br />

conhecimentos sobre a biologia normal do<br />

ser humano e o desenvolvimento de doenças.<br />

Sobre quais doenças os estudos estão<br />

mais avançados?<br />

Mantendo o foco nas doenças comuns,<br />

certamente o entendimento de todas elas<br />

t<strong>em</strong> avançado <strong>em</strong> conjunto. Para algumas,<br />

que depend<strong>em</strong> mais de variações genômicas,<br />

como o diabete juvenil, a degeneração<br />

macular senil e a doença de Crohn, já<br />

t<strong>em</strong>os excelentes ferramentas diagnósticas<br />

que permit<strong>em</strong> a prevenção ou a detecção<br />

precoce para tratamento. Já com respeito<br />

a outras, como a Doença de Alzheimer, que<br />

t<strong>em</strong> aumentado a sua prevalência extraordinariamente<br />

com o aumento da expectativa<br />

de vida da população, t<strong>em</strong>os um bom<br />

entendimento de como a doença se instala<br />

e evolui, mas ainda não conseguimos traduzir<br />

esse conhecimento <strong>em</strong> medidas médicas<br />

práticas.<br />

E quanto à obesidade?<br />

Este é outro desafio enorme. A obesidade<br />

é uma doença complexa, que depende de<br />

fatores genômicos e ambientais. Milhões<br />

de dólares estão sendo investidos nos<br />

estudos genômicos para entender o desenvolvimento<br />

da obesidade e evitar seu<br />

desenvolvimento no paciente individual.<br />

Já a verdadeira epid<strong>em</strong>ia de obesidade que<br />

afeta os países ocidentais, especialmente<br />

os Estados Unidos, parece ser principalmente<br />

devida a fatores ambientais, ou seja,<br />

um excesso de oferta de comida <strong>em</strong> proporções<br />

nunca antes experimentadas na<br />

história da humanidade, aliada a lobismo e<br />

propaganda pela indústria alimentícia.<br />

É possível identificar os mecanismos<br />

de ação das doenças complexas, cuja<br />

base genética depende de muitos genes<br />

e do ambiente?<br />

Todas as características físicas, intelectuais<br />

e comportamentais de uma pessoa,<br />

<strong>em</strong> um dado momento, são determinadas<br />

tanto pelo seu genoma como pela sua<br />

história de vida. Nasce daí o paradigma<br />

genômico de saúde, como sendo o equilíbrio<br />

harmônico entre genoma e ambiente.<br />

As doenças representam a desarmonia<br />

genoma/ambiente. Tal desequilíbrio pode<br />

ser devido a insultos genômicos (doenças<br />

genéticas, como, por ex<strong>em</strong>plo, a síndrome<br />

de Down) ou ambientais (como, por<br />

ex<strong>em</strong>plo, traumas físicos). Entretanto, na<br />

vasta maioria das vezes, as doenças <strong>em</strong>erg<strong>em</strong><br />

da confluência de ‘gatilhos’ ambientais<br />

agindo sobre genomas predispostos.<br />

As doenças comuns, como o câncer, a<br />

aterosclerose, a hipertensão, as grandes<br />

psicoses etc, são multifatoriais e complexas.<br />

Sua análise é difícil porque são<br />

causadas por múltiplas predisposições<br />

genômicas, agindo <strong>em</strong> interação com<br />

fatores ambientais desencadeantes. É<br />

justamente o envolvimento do ambiente<br />

na etiologia [causas] dessas doenças comuns<br />

que abre perspectivas preventivas<br />

personalizadas, a partir de modificações<br />

do estilo de vida e da dieta, da introdução<br />

ou suspensão de medicamentos e do aumento<br />

da frequência de exames clínicos,<br />

laboratoriais ou imaginológicos.<br />

Em 2002, um ano antes do fim do projeto,<br />

o Sr. já falava <strong>em</strong> medicina “pós-<br />

-genômica” e afirmava que, no futuro,<br />

ela seria principalmente preventiva.<br />

Melhor: que as pessoas morreriam<br />

muito mais velhas, com expectativa<br />

de vida superior aos c<strong>em</strong> anos de<br />

vida. Nós estamos perto de alcançar<br />

esse estágio?<br />

Sim. Hoje <strong>em</strong> dia, um bebê recém-nascido<br />

no Japão ou Canadá t<strong>em</strong> probabilidade de<br />

mais de 50% de viver além dos 100 anos.<br />

Vale a pena ressaltar que esse aumento<br />

extraordinário na esperança de vida talvez<br />

tenha mais a ver com saneamento básico<br />

e nutrição do que propriamente com<br />

avanços médicos. Mas o papel fundamental<br />

da medicina pós-genômica (ou<br />

seja, aquela baseada no conhecimento do<br />

mapa genômico do Homo sapiens) será<br />

o de promover o envelhecimento com<br />

saúde, fazendo a prevenção das doenças<br />

crônicas e debilitantes. Assim, não basta<br />

colocar “mais anos <strong>em</strong> nossas vidas”,<br />

mas compete à medicina pós-genômica<br />

colocar “mais vida <strong>em</strong> nossos anos”.<br />

T<strong>em</strong>os avançado igualmente ética e<br />

cientificamente nessa espécie de ‘globalização<br />

do fazer ciência’?<br />

De fato, eu caracterizaria a comunidade<br />

médica da atualidade como <strong>em</strong>inente-<br />

40 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


mente ética. Pela sua própria complexidade,<br />

a Ciência Genômica de fronteira é<br />

s<strong>em</strong>pre uma atividade de grupo, no qual<br />

existe uma regulação ética mútua entre os<br />

m<strong>em</strong>bros. Ad<strong>em</strong>ais, todos os projetos de<br />

pesquisa <strong>em</strong> humanos passam obrigatoriamente<br />

por Comitês de Ética <strong>em</strong> Pesquisa<br />

locais ou mesmo <strong>em</strong> nível nacional,<br />

para conseguir<strong>em</strong> apoio de entidades<br />

responsáveis, como a FAPEMIG. Assim,<br />

posso dizer com certeza que a população<br />

pode ficar tranquila que não há nenhum<br />

Dr. Frankenstein ou Dr. Moreau operando<br />

na comunidade genômica.<br />

E o tratamento com o uso de técnicas<br />

genômicas já está disponível via SUS?<br />

Um dos nossos grandes sonhos é poder<br />

estender os nossos conhecimentos de<br />

Medicina Genômica de fronteira para a<br />

grande população de pacientes brasileiros<br />

atendidos pelo SUS. Atualmente, um<br />

dos nossos projetos apoiados pelo CNPq,<br />

feito <strong>em</strong> colaboração com o Serviço de<br />

Genética Médica do Hospital das Clínicas<br />

da Universidade Federal de Minas Gerais<br />

(que atende pacientes do SUS), visa exatamente<br />

desenvolver testes de viabilidade<br />

com esse objetivo. A implantação de<br />

novos procedimentos do SUS vai muito<br />

além da pura Ciência, envolvendo aspectos<br />

políticos e econômicos que atrasam<br />

sobr<strong>em</strong>aneira o processo. Mas, sou otimista.<br />

Ter<strong>em</strong>os isso <strong>em</strong> poucos anos.<br />

O senhor t<strong>em</strong> afirmado que é biologicamente<br />

impróprio usar o velho conceito<br />

de raça para designar esse ou<br />

aquele indivíduo. Então, isso significa<br />

dizer que a cor da pele não é evidência<br />

suficient<strong>em</strong>ente relevante para<br />

designar a “composição” biológica de<br />

um indivíduo?<br />

Ao longo dos anos, a crença na existência<br />

de “raças” humanas impregnou-se na<br />

nossa sociedade. “Raças” têm sido usadas<br />

não só para sist<strong>em</strong>atizar as populações<br />

humanas, mas também para criar um<br />

esqu<strong>em</strong>a que mantém o status quo social<br />

e é usado para justificar a dominação de<br />

alguns grupos por outros. Assim, a persistência<br />

da ideia de “raça” está ligada à<br />

visão de que os grupos humanos exist<strong>em</strong><br />

<strong>em</strong> uma escala de valor. Os avanços da<br />

genética molecular e o sequenciamento<br />

do genoma humano permitiram um<br />

exame detalhado da correlação entre a<br />

variação genômica humana, a ancestralidade<br />

biogeográfica e a aparência física<br />

das pessoas, mostrando que os rótulos<br />

previamente usados para distinguir “raças”<br />

não têm significado biológico. Pode<br />

parecer fácil distinguir um europeu de<br />

um africano ou de um asiático, mas tal<br />

facilidade desaparece completamente<br />

quando penetramos por baixo da pele e<br />

procuramos evidências destas diferenças<br />

“raciais” nos genomas das pessoas.<br />

A genética influencia os conceitos de<br />

“raça” e a genealogia, a história das<br />

famílias?<br />

Nos últimos dez anos, realizamos estudos<br />

sist<strong>em</strong>áticos da ancestralidade de brancos,<br />

pardos e pretos no Brasil, usando<br />

marcadores de DNA. Nossos estudos<br />

revelaram que, no Brasil, a cor avaliada<br />

fenotipicamente t<strong>em</strong> uma correlação fraca<br />

com o grau de ancestralidade africana<br />

estimada geneticamente. Em outras palavras,<br />

no Brasil, <strong>em</strong> nível individual, a cor,<br />

como socialmente percebida, t<strong>em</strong> pouca<br />

relevância biológica.<br />

Sobre este ponto, favoreço a ideia de que<br />

o fato científico da inexistência das “raças”<br />

deva ser absorvido pela sociedade e<br />

incorporado às suas convicções e atitudes<br />

morais, sendo usado <strong>em</strong> oposição a<br />

qualquer forma de hierarquia entre povos<br />

ou grupos humanos. Argumento que uma<br />

postura coerente e desejável, especialmente<br />

no Brasil, seria a valorização da<br />

singularidade e da dignidade de cada<br />

indivíduo. Todo brasileiro t<strong>em</strong> o direito<br />

visto como um ser humano único <strong>em</strong> seu<br />

genoma e <strong>em</strong> sua história de vida e não<br />

meramente como pertencente a um sexo,<br />

religião ou grupo de cor.<br />

E o aconselhamento genético: o que<br />

esse termo significa, qu<strong>em</strong> deve fazer<br />

e quando?<br />

“Aconselhamento genético” (tradução de<br />

“genetic counseling”) é um termo usado<br />

para designar coletivamente as interações<br />

médicas dos casais com os geneticistas<br />

clínicos. Ele essencialmente visa ajudar<br />

os casais a entender<strong>em</strong> e resolver<strong>em</strong> seus<br />

probl<strong>em</strong>as reprodutivos e familiares. O<br />

aconselhamento pode ocorrer antes, durante<br />

ou após a reprodução. Ou seja, pode<br />

ser pré-reprodutivo, quando se identificam<br />

fatores de risco (consanguinidade,<br />

idade materna elevada, história de doenças<br />

genéticas <strong>em</strong> um dos m<strong>em</strong>bros do<br />

casal ou na família etc.) para o casal que<br />

ainda pretende engravidar. Reprodutivo,<br />

quando se identificam fatores de risco no<br />

transcorrer da gestação, como malformações<br />

fetais ao ultrassom, interrupção da<br />

gravidez e idade materna elevada, mais<br />

conhecido como “diagnóstico pré-natal”.<br />

E o pós-reprodutivo é quando o casal já<br />

t<strong>em</strong> uma criança com uma doença presumivelmente<br />

genética e, nesse caso, o<br />

geneticista busca um diagnóstico preciso<br />

que permita estabelecer um prognóstico,<br />

propor um tratamento e aconselhar o<br />

casal com respeito a gravidezes futuras.<br />

Outra situação comum é o casal com múltiplas<br />

perdas gestacionais, que t<strong>em</strong> muito<br />

a se beneficiar de uma consulta de aconselhamento<br />

genético.<br />

@<br />

Saiba mais:<br />

Conheça a sequência mapeada do<br />

DNA humano:<br />

http://genome.ucsc.edu/<br />

cgi-bin/hgGateway<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 41


INICIAÇÃO CIENTÍFICA<br />

Mentes<br />

brilhantes<br />

Estudantes vencedores do III S<strong>em</strong>inário de Iniciação Científca<br />

da FAPEMIG se destacam pelo ineditismo dos trabalhos e<br />

também pela garra, foco e superação<br />

Juliana Saragá<br />

Muitas mentes jovens e brilhantes.<br />

Cerca de duzentas autoras de projetos de<br />

iniciação científica das mais variadas áreas<br />

do conhecimento. Vieram de diferentes<br />

regiões e instituições de ensino de Minas<br />

Gerais. Muitos nunca tinham vindo à capital<br />

mineira e as expressões revelavam a<br />

<strong>em</strong>polgação de concorrer ao que poderia<br />

ser o primeiro prêmio de suas vidas acadêmicas.<br />

Em meio às faces dos jovens<br />

estudantes, uma não mais jov<strong>em</strong>, mas<br />

igualmente brilhante e entusiasmada. Luiz<br />

Fernando Bandeira de Melo, graduando de<br />

filosofia da Faculdade Católica de Uberlândia,<br />

de 60 anos, teve um ótimo motivo<br />

para voltar à sua cidade orgulhoso. Ele foi<br />

o vencedor na categoria BIC (alunos de<br />

graduação) do III S<strong>em</strong>inário Estadual de<br />

Iniciação Científica da FAPEMIG, realizado<br />

durante os dias 29 e 30 de set<strong>em</strong>bro no<br />

Hotel Ouro Minas, <strong>em</strong> Belo Horizonte. O<br />

objetivo do evento é incentivar a vocação<br />

científica de estudantes mineiros.<br />

O trabalho de Luiz Fernando recebeu<br />

nota máxima <strong>em</strong> todos os parâmetros avaliados,<br />

como relevância do t<strong>em</strong>a, inovação,<br />

metodologia e coerência. O t<strong>em</strong>a, “A Busca<br />

de Sócrates do Conhecimento da Verdade<br />

42 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Religiosa de Êutifron”, apesar do alto nível<br />

de dificuldade, foi apresentado de forma<br />

clara e objetiva, conquistando a medalha de<br />

ouro. “A ideia surgiu no primeiro período da<br />

faculdade, quando comecei a estudar Sócrates.<br />

Êutifron é um dos primeiros diálogos de<br />

Platão, no qual Sócrates e Eutifron tentam<br />

estabelecer uma definição para “piedade”.<br />

Puxei desse diálogo pontos a respeito da<br />

religião”, explica. Segundo ele, o ineditismo<br />

do trabalho é tratar de um t<strong>em</strong>a muito melindroso<br />

para os filósofos, que é a religiosidade<br />

de Sócrates. Luiz Fernando fala sobre o<br />

assunto com tranquilidade e propriedade de<br />

qu<strong>em</strong> possui uma biblioteca <strong>em</strong> casa com<br />

mais de 300 livros de filosofia.<br />

No último dia do S<strong>em</strong>inário, o estudante<br />

e seu orientador, Gilzane Silva Naves,<br />

professor da Católica de Uberlândia,<br />

iam pegar estrada mais cedo, antes da<br />

pr<strong>em</strong>iação, quando foram advertidos pelo<br />

presidente da FAPEMIG, Mario Neto Borges:<br />

“É melhor vocês ficar<strong>em</strong>, senão vão<br />

perder uma palestra excelente, além da<br />

pr<strong>em</strong>iação, que promete grandes surpresas”,<br />

conta. “Resolv<strong>em</strong>os ficar. Quando<br />

ouvimos nosso nome <strong>em</strong> primeiro lugar,<br />

foi muito <strong>em</strong>ocionante. Para mim foi inusitado<br />

receber o prêmio no meio de tantos<br />

trabalhos de alto nível, o que também<br />

d<strong>em</strong>onstrou que a FAPEMIG valoriza todas<br />

as áreas do conhecimento com a mesma<br />

importância”. O trabalho pr<strong>em</strong>iado se tornou<br />

monografia e também já faz parte de<br />

seu projeto de mestrado, quase finalizado.<br />

“Quando somos jovens, estudamos incentivados<br />

por um futuro promissor para si e<br />

para constituição de uma família. Quando<br />

estamos mais velhos, somos incentivados<br />

por projetos pessoais. A experiência nos<br />

traz menos afobação e mais foco.” A idade,<br />

na opinião de Luiz Fernando, acarreta vantagens<br />

para trilhar o caminho acadêmico<br />

e ainda é motivo para muito bom humor.<br />

“Meu orientador t<strong>em</strong> a mesma idade do<br />

meu filho. Durante o S<strong>em</strong>inário era confundido<br />

como meu orientando”, diverte-se.<br />

ção Costa, de 16 anos, também têm bons<br />

motivos para com<strong>em</strong>orar. Determinadas,<br />

elas já estão certas da carreira que vão seguir:<br />

Medicina. Alunas do 2º ano do Ensino<br />

Médio do Colégio Marista Dom Silvério,<br />

conquistaram a bolsa na instituição através<br />

do mesmo projeto que recebeu a medalha<br />

de ouro no S<strong>em</strong>inário. Antes de entrar para<br />

o Colégio Marista Dom Silvério, Gabriela<br />

e Natália estudavam na Escola Estadual<br />

Professor Pedro Aleixo, quando tiveram os<br />

primeiros contatos com a coordenadora de<br />

Pesquisa e Pós-graduação da Fundação<br />

Mineira de Educação e Cultura (Fumec),<br />

Andréia Laura Prates Rodrigues, <strong>em</strong> agosto<br />

do ano passado. Depois de uma seleção<br />

na escola, além de participar do Projeto de<br />

Iniciação Científica como bolsistas da FA-<br />

PEMIG, as alunas começaram a frequentar<br />

aulas da orientadora e se destacaram entre<br />

os estudantes da Universidade. Foi então<br />

que a coordenadora do projeto e acadêmicas<br />

de Biomedicina, ex-alunas do Marista,<br />

indicaram as meninas ao Colégio.<br />

Natália e Gabriella fizeram provas de<br />

seleção, passaram a estudar no Colégio<br />

e continuaram na pesquisa. O projeto, desenvolvido<br />

pela Fumec, <strong>em</strong> parceria com<br />

a Universidade Estadual de Minas Gerais<br />

(UFMG), investigou a atuação de íons <strong>em</strong><br />

células relacionadas ao câncer de mama. A<br />

participação dos íons, através dos canais iônicos,<br />

é fundamental para a divisão, comunicação<br />

e sinalização celular (processos que<br />

se encontram alterados <strong>em</strong> células tumorais)<br />

Juventude e superação<br />

Com b<strong>em</strong> menos experiência, mas<br />

muita garra, as ganhadoras do primeiro<br />

lugar na categoria BIC Jr (Ensino Médio),<br />

Gabriella Pires de Almeida e Natália Conceie<br />

t<strong>em</strong> sido cada vez mais alvo de estudo no<br />

câncer. Mas a maior parte destes estudos<br />

se dá <strong>em</strong> células cancerosas <strong>em</strong> estágios<br />

avançados. O trabalho pr<strong>em</strong>iado investigou<br />

de forma pioneira a participação destes íons<br />

<strong>em</strong> células cancerígenas no estágio inicial.<br />

“Na primeira etapa, conhec<strong>em</strong>os as células<br />

normais e todas as suas estruturas e eventos.<br />

Estudamos sobre os canais iônicos e<br />

passamos a conhecer as células do câncer,<br />

que são alteradas”, relata Natália.<br />

Na segunda etapa, as estudantes<br />

acompanharam e participaram de todo o<br />

desenvolvimento da pesquisa <strong>em</strong> laboratório.<br />

“O projeto mudou minha vida”,<br />

orgulha-se. Natália mora no Aglomerado<br />

da Serra, região pobre da capital. Trabalha<br />

como caixa <strong>em</strong> um açougue para ajudar<br />

a família, já que o pai, por causa de um<br />

acidente, se aposentou. Ele fica <strong>em</strong> casa<br />

cuidando da esposa, vítima de um Acidente<br />

Vascular Cerebral (AVC) que deixou<br />

graves sequelas. O probl<strong>em</strong>a de saúde da<br />

mãe impulsiona ainda mais a vocação de<br />

Natália para a Medicina. “Eu descobri que<br />

existe um mundo fora do lugar onde vivo<br />

e que posso fazer algo para ajudar as pessoas,<br />

posso saber mais e transmitir meu<br />

conhecimento. Só Deus sabe a alegria<br />

que sinto por passar por todas as dificuldades,<br />

vencer os obstáculos. A sabedoria,<br />

o conhecimento aprendido, a esperança<br />

e a fé são minhas ferramentas para uma<br />

grande conquista. Estou <strong>em</strong> uma lição de<br />

vida”, <strong>em</strong>ociona-se.<br />

Foto: Gáucia Rodrigues<br />

Estudantes apresentaram seus projetos a uma comissão julgadora durante o evento<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 43


O S<strong>em</strong>inário<br />

Ao todo, 71 instituições mineiras<br />

enviaram participantes, entre orientadores<br />

e estudantes, todos bolsistas de Iniciação<br />

Científica da FAPEMIG, para participar da<br />

terceira edição do S<strong>em</strong>inário de Iniciação<br />

Científica da Fundação. “Nós notamos o entusiasmo<br />

dos estudantes e a nossa missão<br />

no s<strong>em</strong>inário foi despertar o interesse desse<br />

público para trabalhar com Ciência, Tecnologia<br />

e Desenvolvimento”, afirmou o presidente<br />

da FAP mineira, Mario Neto Borges.<br />

David Collares Ache, estudante da<br />

Universidade Federal de Uberlândia, foi<br />

um dos participantes do s<strong>em</strong>inário. Recém-formado<br />

<strong>em</strong> Ciências Biológicas, ele<br />

foi bolsista de Iniciação Científica e segue<br />

na área de pesquisa, dessa vez, no mestrado.<br />

Para ele, o evento é uma forma de a<br />

Fundação mostrar como é realizado o seu<br />

trabalho. “Nós receb<strong>em</strong>os a nossa bolsa,<br />

faz<strong>em</strong>os as pesquisas, mas não t<strong>em</strong>os a<br />

dimensão da grandeza do trabalho da FA-<br />

PEMIG”, destacou.<br />

Um dos palestrantes, o diretor de Ciências<br />

Agrárias, Biológicas e da Saúde do<br />

Conselho Nacional de Desenvolvimento<br />

Científico e Tecnológico (CNPq), Paulo Sérgio<br />

Lacerda Beirão, falou sobre a Iniciação<br />

Científica no contexto do “Programa Ciências<br />

s<strong>em</strong> Fronteiras”, lançado recent<strong>em</strong>ente<br />

pelo governo federal. A iniciativa pretende<br />

conceder 100 mil bolsas de intercâmbio<br />

para estudantes e pesquisadores <strong>em</strong> modalidades<br />

que vão do nível médio ao pós-doutorado.<br />

“Nosso objetivo é levar os maiores<br />

talentos para estagiar<strong>em</strong> nos melhores<br />

centros de desenvolvimento e pesquisa do<br />

mundo, para que o Brasil dê um salto nessa<br />

área e se torne um país de frente na sociedade<br />

do conhecimento”, enfatizou. A estudante<br />

Júlia Soares Parreiras, vencedora do Prêmio<br />

Jov<strong>em</strong> Cientista <strong>em</strong> 2008, na categoria Ensino<br />

Médio, falou aos estudantes sobre a<br />

importância do envolvimento com a pesquisa<br />

científica ainda na adolescência. “Foi<br />

muito legal compartilhar a minha experiência<br />

com os participantes porque eu tive um<br />

ganho pessoal e profissional muito grande<br />

com a carreira científica”, disse. Além dos<br />

debates, foi realizada uma mostra com os<br />

trabalhos dos estudantes. Eles apresenta-<br />

ram seus projetos a uma comissão julgadora<br />

e, ao final do s<strong>em</strong>inário, os três melhores<br />

trabalhos foram pr<strong>em</strong>iados.<br />

Apoio a jovens pesquisadores<br />

O 3º S<strong>em</strong>inário Estadual de Iniciação<br />

Científica fez parte da programação com<strong>em</strong>orativa<br />

de 25 anos da FAPEMIG. O apoio à<br />

iniciação Científica integra as atividades da<br />

Fundação. Só <strong>em</strong> 2010, foram destinados<br />

mais de R$ 13 milhões à iniciativa. A modalidade<br />

Iniciação Científica Junior (Bic-Jr) -<br />

destinada aos alunos de Ensino Médio - <strong>em</strong><br />

parceria com o CNPq, concedeu, só no ano<br />

passado, 1.273 cotas de bolsas (450 CNPq<br />

e 823 FAPEMIG). Essa iniciativa é baseada<br />

no sucesso da iniciação científica <strong>em</strong> nível<br />

da graduação (PiBic), que t<strong>em</strong> d<strong>em</strong>onstrado,<br />

ao longo dos anos, ser uma das atividades<br />

responsáveis pela melhoria dos cursos<br />

de graduação e a melhor forma de gerar<br />

quadros para a pós-graduação no País, reduzindo<br />

o t<strong>em</strong>po de formação de pesquisadores.<br />

Na modalidade Iniciação Científica na<br />

Graduação, <strong>em</strong> 2010, a FAPEMIG concedeu<br />

3.064 cotas a 71 instituições mineiras.<br />

PREMIADOS – BIC JÚNIOR<br />

1º - CARACTERIZAÇÃO ELETROFISIOLÓGICA DOS CANAIS IÔ-<br />

NICOS NA LINHAGEM DE CÉLULAS MGSO-3 DERIVADAS DE<br />

TUMOR DE MAMA<br />

Alunas: Gabriella Pires de Almeida e Natália Conceição Costa<br />

Coordenadora: Andréia Laura Prates Rodrigues<br />

Instituições: Fumec e UFMG<br />

2º - DOENÇA FALCIFORME: IMPLICAÇÕES NA SAÚDE PÚBLICA<br />

REVISÃO BIBLIOGRAFIA<br />

Aluno: Rafael Felipe Gonçalves Miranda<br />

Coordenadora: Ione Maria do Socorro<br />

Instituição: Funec Contag<strong>em</strong><br />

3º - CONSTRUÇÃO E OPERAÇÃO DE UM SECADOR CONVECTI-<br />

VO COM AQUECIMENTO ELÉTRICO<br />

Aluna: Paula Alves Costa de Assis Vieira<br />

Coordenador: André Guimarães Ferreira<br />

Instituição: Cefet<br />

QUADRO - LISTA DE PREMIADOS – BIC<br />

1º - A BUSCA DE SÓCRATES DO CONHECIMENTO DA VERDADE<br />

RELIGIOSA DE ÊUTIFRON<br />

Aluno: Luiz Fernando Bandeira de Melo<br />

Coordenadora: Gilzane Silva Naves<br />

Instituições: Católica de Uberlândia<br />

2º - SENSORES INTELIGENTES E DE BAIXO CUSTO PARA CON-<br />

TROLE E MONITORAMENTO DA FOTOTERAPIA NEONATAL<br />

Aluna: Marcella Rocha Franco<br />

Coordenador: Rodrigo Fernando Bianchi<br />

Instituição: Ufop<br />

3º - PRODUTOS NATURAIS DO CERRADO BRASILEIRO COMO<br />

INIBIDORES DE PROTEASES DE LEISHMANIA<br />

Aluno: José Roberto de Sousa Filho<br />

Coordenador: Ivan de Oliveira Pereira<br />

Instituição: Unincor<br />

44 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Movimento<br />

operário:<br />

de A a Z<br />

HISTÓRIA<br />

Dicionário reúne, <strong>em</strong><br />

formato diferenciado,<br />

dados sobre história do<br />

trabalho <strong>em</strong> Minas Gerais<br />

Virgínia Fonseca<br />

Em 1943, o presidente Getúlio Vargas<br />

aprovou a Consolidação das Leis do<br />

Trabalho (CLT), que regula as relações<br />

trabalhistas individuais e coletivas no país.<br />

A CLT já passou por várias adequações e<br />

outras normas surg<strong>em</strong> para dar suporte na<br />

medida <strong>em</strong> que muda o contexto socioeconômico<br />

nacional. Mas até que o Brasil<br />

chegasse ao seu primeiro modelo de legislação<br />

trabalhista, muita história ficou para<br />

trás, na atuação de pessoas e instituições<br />

que militaram no movimento operário brasileiro.<br />

Organizar <strong>em</strong> um único documento<br />

dados sobre aqueles que representaram<br />

esta luta nas primeiras décadas da República<br />

é a proposta dos pesquisadores responsáveis<br />

pelo Dicionário do Movimento<br />

Operário de Minas Gerais.<br />

O trabalho integra um projeto idealizado<br />

pelo professor de História da Univer-<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 45


sidade Estadual de Campinas (Unicamp)<br />

Cláudio Batalha, de articular nacionalmente<br />

vários dicionários do movimento<br />

operário (leia box). A intenção é reunir, no<br />

formato de verbetes, informações e dados<br />

bibliográficos de organizações e militantes<br />

que atuaram <strong>em</strong> todo o país, criando obras<br />

de referência. Em Minas, a coordenação<br />

está a cargo do Centro de M<strong>em</strong>ória e Pesquisa<br />

Histórica da Pontifícia Universidade<br />

Católica (PUC-MG), por meio do professor<br />

adjunto do curso de História Mário Cleber<br />

Lanna. Trata-se de um projeto interinstitucional<br />

que, além da colaboração da Unicamp,<br />

t<strong>em</strong> o envolvimento de docentes<br />

da Universidade Federal de Juiz de Fora<br />

(UFJF) e da Universidade Federal do Rio<br />

de Janeiro (UFRJ).<br />

Lanna explica que o formato adotado<br />

foge à tendência geral da historiografia,<br />

que privilegia a análise da cultura. Entretanto,<br />

ele aponta uma mudança, bastante<br />

visível no campo da história do trabalho,<br />

de os pesquisadores se voltar<strong>em</strong> com mais<br />

frequência para os estudos biográficos,<br />

devido à aproximação com as escolas européia<br />

e norte-americana, que têm se dedicado<br />

à busca do entendimento de ideias<br />

políticas por meio de experiências de vida<br />

dos indivíduos. No âmbito nacional, há o<br />

ineditismo de procurar compilar <strong>em</strong> trabalhos<br />

de referência para cada região dados<br />

que resgatam do mais simples, individual,<br />

ao mais importante dos agentes que participaram<br />

dessa história. “T<strong>em</strong>os muitas<br />

informações dispersas <strong>em</strong> livros, dissertações,<br />

teses, mas não consolidadas <strong>em</strong> uma<br />

única obra”, diz.<br />

Portanto, homens e mulheres, associações<br />

anarquistas, socialistas reformistas, comunistas,<br />

católicas e mesmo mutualistas (ou<br />

seja, aquelas <strong>em</strong> que mediante contribuição<br />

o participante buscava fazer jus a algum<br />

tipo de assistência) são atores dessa<br />

história <strong>em</strong> Minas Gerais.<br />

Houve uma preocupação dos pesquisadores<br />

<strong>em</strong> resgatar e transformar <strong>em</strong><br />

verbetes o máximo de militantes e organizações<br />

identificadas, mesmo que foss<strong>em</strong><br />

escassas as informações disponíveis.<br />

“Procuramos reunir dados e registrar a<br />

passag<strong>em</strong> daquele ator que às vezes só<br />

é mencionado vagamente, formando um<br />

ponto de partida. Fica registrado que essa<br />

pessoa ou instituição existiu e isso pode<br />

auxiliar <strong>em</strong> futuras pesquisas”, detalha o<br />

coordenador. Nos casos <strong>em</strong> que, apesar<br />

dos esforços, a quantidade de dados não<br />

permitiu a constituição de um verbete, o<br />

professor explica que será feita citação<br />

dos nomes no final do dicionário, apontando<br />

sua participação como militantes.<br />

Ao lado destes, figuram também verbetes<br />

mais complexos, considerados consagrados<br />

pela historiografia. Como ex<strong>em</strong>plos,<br />

são apontados o imigrante italiano Donato<br />

Donati e instituições como a Confederação<br />

Católica, tidos como referência.<br />

Um levantamento inicial aponta que<br />

serão abordadas algo <strong>em</strong> torno de 130<br />

instituições, todas específicas de Minas<br />

Gerais, com atuação local ou regional.<br />

Somam-se cerca de 490 verbetes de<br />

pessoas e algumas entradas registradas<br />

como citações apenas, totalizando 700<br />

referências. Lanna ressalta que esse número<br />

é uma estimativa, a partir da primeira<br />

seleção, mas pode haver mudanças.<br />

Grande parte dos verbetes são de Juiz de<br />

Fora, <strong>em</strong> função do papel econômico que<br />

a cidade teve até 1930, como principal<br />

polo industrial de Minas Gerais.<br />

O grupo – que conta com os pesquisadores<br />

Deivison Amaral, da Unicamp;<br />

Andréia Casanova, da UFRJ; Cláudia<br />

Viscardi, da UFJF; e Carlos Veriano,<br />

da PUC-MG – já finalizou a prospecção<br />

de dados e está na fase de redação e<br />

compilação dos verbetes. Até o final de<br />

2011, todo o conteúdo deve estar pronto,<br />

e o próximo passo é o processo de captação<br />

para publicação, que eles esperam<br />

acontecer <strong>em</strong> meados de 2012.<br />

No máximo, o mínimo<br />

O período considerado na pesquisa<br />

de Minas Gerais abrange do final do século<br />

XIX até 1930, a chamada fase liberal<br />

do movimento operário. A referência inicial<br />

é o ano de 1888, que representa o fim da<br />

escravidão e coincide com o começo da<br />

República. E a historiografia já t<strong>em</strong> 1930<br />

como marco da transformação do movimento<br />

operário, pois é quando surg<strong>em</strong> as<br />

leis de regulamentação do trabalho. A partir<br />

desse momento, os sindicatos passam a<br />

Foto: Marcelo Focado<br />

Militantes e instituições<br />

A pesquisa pautou-se <strong>em</strong> uma minuciosa<br />

análise bibliográfica de publicações<br />

da época e produções acadêmicas atuais<br />

sobre o t<strong>em</strong>a. Foram consideradas todas<br />

as culturas militantes, <strong>em</strong> suas diferentes<br />

ideologias, que fizeram parte, cada uma à<br />

sua maneira, da formação do operariado<br />

organizado no Brasil. A expressão “militante”,<br />

por sua vez, não se refere apenas a<br />

operários, mas também a intelectuais, políticos,<br />

médicos, advogados que atuavam<br />

de alguma forma junto aos trabalhadores,<br />

foss<strong>em</strong> conservadores ou revolucionários.<br />

Publicações da época serviram como fonte para as pesquisas da equipe coordenada por Mário Cleber Lanna<br />

46 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


ser oficializados e há uma política de organização<br />

do movimento operário via Estado.<br />

A expressão “liberal” refere-se ao<br />

fato de que o movimento era organizado<br />

por conta própria. Os sindicatos não eram<br />

unificados, <strong>em</strong> sua maioria formavam-se a<br />

partir de <strong>em</strong>presas e não de profissões –<br />

não existia o sindicato dos metalúrgicos,<br />

mas sim de uma indústria ou de outra. As<br />

categorias profissionais também eram diferenciadas,<br />

pois a presença da indústria no<br />

cenário não era preponderante. Inicialmente,<br />

a força vinha dos sindicatos dos ferroviários,<br />

dos serviços como o comércio e dos<br />

pedreiros. Em um segundo momento é que<br />

começam a aparecer instituições ligadas<br />

aos metalúrgicos, operários.<br />

O movimento acompanha o perfil da<br />

economia política do país e a intervenção<br />

do governo. Inicialmente, a concepção do<br />

Estado era de que o <strong>em</strong>bate entre os <strong>em</strong>pregados<br />

e os <strong>em</strong>presários precisava ser<br />

resolvido pelos próprios envolvidos. “Se<br />

existia um conflito mais violento, era questão<br />

de polícia, não de política”, observa<br />

Lanna. A partir de 1930, esta visão se inverte<br />

e o t<strong>em</strong>a passa a ser de interesse público,<br />

regulamentado pelo Estado. “Daí nosso<br />

recorte, pois isso muda o cenário e, das<br />

instituições que existiram até então, poucas<br />

permaneceram, os operários precisaram se<br />

encaixar <strong>em</strong> modelo de organização dos<br />

sindicatos imposto pelas leis, <strong>em</strong>bora, na<br />

verdade, tenha sido um ganho ter<strong>em</strong> sua<br />

luta reconhecida pelo Estado”, comenta o<br />

professor, acrescentando a expectativa de<br />

que futuramente possam ser desenvolvidos<br />

dicionários sobre épocas seguintes.<br />

No período estudado, existe uma<br />

tendência do chamado sindicato dos reformistas.<br />

Em geral, estavam vinculados<br />

a um tipo de ação assistencialista, <strong>em</strong> um<br />

sentido objetivo: almejavam uma pensão<br />

que pudesse cuidar do trabalhador quando<br />

ele ficasse doente ou garantir auxílio<br />

para enterrá-lo quando morresse. Não<br />

estavam ligados a nenhuma ideologia,<br />

mas a questões práticas do seu cotidiano.<br />

Na medida <strong>em</strong> que essas associações se<br />

un<strong>em</strong>, ganham uma força para reivindicar<br />

algo maior: a jornada de 8 horas, já que o<br />

usual era trabalhar<strong>em</strong> entre 12 horas e 15<br />

horas. “Eles não buscavam uma revolução,<br />

não tinham um projeto diante da sociedade,<br />

queriam o mínimo para sua situação de<br />

vida”, observa Lanna.<br />

Luzes sobre o movimento<br />

operário brasileiro<br />

O Dicionário do Movimento Operário Brasileiro é um projeto discutido no Grupo Mundos do<br />

Trabalho da Associação Nacional de História desde 2001. Entretanto, o <strong>em</strong>brião da ideia existe<br />

desde a década de 1980, por ocasião dos estudos de doutorado do professor de História da<br />

Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Cláudio Batalha, e veio tomando forma por<br />

meio de pesquisas e debates <strong>em</strong>preendidos ao longo dos anos. A inspiração partiu de obras<br />

internacionais do gênero, <strong>em</strong> especial, o dicionário do movimento operário francês.<br />

Em sua primeira fase, o projeto visa organizar e publicar volumes por cidade, estado ou região,<br />

contendo verbetes de militantes e instituições operárias, cobrindo o período que vai do século<br />

XIX à Primeira República. Para Batalha, um dos principais aspectos reside no fato de que<br />

o trabalho permite lançar luz sobre aqueles agentes que usualmente não figuram nos livros<br />

de história e permanec<strong>em</strong> quase anônimos. “Possibilita ver mais claramente que movimentos<br />

sociais não são resultantes exclusivamente da ação de líderes, mas depend<strong>em</strong> da atuação,<br />

com diferentes graus de militância e envolvimento, de um número b<strong>em</strong> maior de indivíduos”,<br />

analisa. Segundo ele, os históricos das organizações, também previstos no projeto, por outro<br />

lado, permit<strong>em</strong> mapear o rico e variado mundo associativo dos primeiros anos da República,<br />

colocando <strong>em</strong> xeque a ideia consagrada de que ao longo de toda sua história o Brasil teve uma<br />

sociedade civil fraca.<br />

Cada volume t<strong>em</strong> uma coordenação responsável, que define as características específicas da<br />

pesquisa local, uma vez que alguns fatores, como o recorte cronológico inicial, pod<strong>em</strong> variar.<br />

Além do dicionário da cidade do Rio de Janeiro, já publicado, estão <strong>em</strong> fase final de produção<br />

os dicionários de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. Projetos para o Estado de São Paulo<br />

e para o Rio de Janeiro no período pós-1930 também estão <strong>em</strong> andamento. Ainda <strong>em</strong> fase de<br />

elaboração e discussão, estão os estudos relativos aos Estados da Bahia, de Pernambuco, de<br />

Alagoas e do Amazonas. “A expectativa é que todos os Estados da Federação acab<strong>em</strong> cont<strong>em</strong>plados<br />

nesta primeira etapa”, explica Batalha. Períodos posteriores da história do movimento<br />

operário seriam trabalhados <strong>em</strong> uma segunda fase.<br />

PROJETO: Dicionário do movimento<br />

operário <strong>em</strong> Minas Gerais<br />

COORDENADOR: Mário Cléber<br />

Martins Lanna Jr.<br />

MODALIDADE: Auxílio especial<br />

e endogovernamental<br />

VALOR: R$ 79.136<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 47


A ciência,<br />

do micróbio ao universo<br />

LEITURAS<br />

Ao contar essa história, mostrar<strong>em</strong>os como<br />

se construiu o mundo moderno. A ciência está de<br />

tal modo intricada <strong>em</strong> nossas vidas que mal notamos<br />

sua presença. Nossas redes de comunicações<br />

móveis depend<strong>em</strong> da mecânica orbital, que permite<br />

o posicionamento de satélites no céu; da química do<br />

combustível de foguetes; dos materiais usados <strong>em</strong><br />

plásticos e chips de silício dos computadores, telefones<br />

e baterias.<br />

Milhares são as narrativas acerca do<br />

desenvolvimento dos princípios e produtos<br />

científicos. Pouquíssimas, porém, revelam-se<br />

capazes de oferecer, ao leitor, equilibrada e instigante<br />

junção entre texto e imag<strong>em</strong>, liame s<strong>em</strong><br />

o qual seria impossível compreender as lógicas<br />

e nuances de uma das mais complexas atividades<br />

criadas pelo hom<strong>em</strong>. Bastante conhecida<br />

por suas produções de altíssimo nível, a British<br />

Broadcasting Corporation (BBC), <strong>em</strong>issora<br />

pública do Reino Unido, investiu <strong>em</strong> fascinante<br />

série televisiva sobre os grandes momentos da<br />

Ciência no planeta. Tal iniciativa acabaria por<br />

se transformar <strong>em</strong> bela obra impressa, na qual<br />

relatos, fotografias e ilustrações atra<strong>em</strong> o leitor<br />

a uma irrecusável “viag<strong>em</strong> no t<strong>em</strong>po”.<br />

Escrito por Michael Mosley e John Lynch,<br />

o livro Uma história da ciência: experiência,<br />

poder e paixão, recent<strong>em</strong>ente publicado pela<br />

Zahar, é a saborosa “astronave” que faltava aos<br />

apaixonados por desvendar os mistérios do<br />

progresso científico: dividida <strong>em</strong> seis grandes<br />

áreas – Cosmo, Matéria, Vida, Energia, Corpo<br />

e Mente –, a obra alia textos divertidos (e rigorosos)<br />

a imagens repletas de beleza (e informação).<br />

Som<strong>em</strong>-se a tal dueto as maravilhas<br />

do acurado projeto gráfico, expressas <strong>em</strong> capa<br />

dura e páginas de papel couché.<br />

De modo a facilitar a “viag<strong>em</strong>” de tantos<br />

apaixonados por Ciência, o livro oferece,<br />

ainda, sugestões de leitura e detalhado índice<br />

r<strong>em</strong>issivo sobre t<strong>em</strong>as, cenas e protagonistas.<br />

Garant<strong>em</strong>-se, assim, as mais confortáveis condições<br />

de navegação, para que, aos curiosos<br />

leitores, seja requerida, exclusivamente, a ânsia<br />

por arquitetar – a ex<strong>em</strong>plo dos mais importantes<br />

cientistas da história – um s<strong>em</strong> número de<br />

dúvidas acerca da vida, do t<strong>em</strong>po, da natureza<br />

e do hom<strong>em</strong>.<br />

Livro: Uma história da ciência:<br />

experiência, poder e paixão<br />

Autor: Michael Mosley e John Lynch<br />

Tradução: Ivan Weisz Kuck<br />

Revisão técnica: José Claudio Reis<br />

Editora: Zahar<br />

Título original: The story of the science: power,<br />

proof and passion<br />

Páginas: 288<br />

Ano: 2011<br />

Bases metodológicas<br />

para o design<br />

Na atualidade, existe uma infinidade de métodos,<br />

técnicas e ferramentas dedicadas ao desenvolvimento<br />

do projeto, mas seu <strong>em</strong>prego não pode ser<br />

transferido para qualquer contexto s<strong>em</strong> os necessários<br />

ajustes. Nesse contexto, o design, como lugar de<br />

projeção, necessita de bases metodológicas sólidas<br />

de sist<strong>em</strong>atização de tarefas para organizar seu percurso<br />

criativo, delimitando seu campo de atuação<br />

profissional para seus resultados ser<strong>em</strong> revertidos <strong>em</strong><br />

benefício da coletividade, contribuindo para melhoria<br />

de vida do indivíduo.<br />

Metodologias e experiências de ensino<br />

organizadas <strong>em</strong> Minas Gerais e <strong>em</strong> outros estados<br />

são descritos no recém-lançado Design<br />

e Método, quinto volume dos Cadernos de<br />

Estudos Avançados <strong>em</strong> Design. O objetivo é<br />

chamar atenção para a importância do método<br />

no ensino, na pesquisa e na prática dessa área<br />

do conhecimento. Os artigos que compõ<strong>em</strong> o<br />

livro abordam as relações do design com procedimentos<br />

metodológicos diversos, sejam<br />

eles atualmente utilizados ou ainda <strong>em</strong> estado<br />

de consolidação.<br />

O volume completa a coleção composta<br />

pelos títulos Design e Multiculturalismo, Design<br />

e Transversalidade, Design e Sustentabilidade<br />

I e II, Design e Identidade. Os artigos são<br />

assinados por pesquisadores reconhecidos da<br />

área, do Brasil e do exterior. Juntos, os Cadernos<br />

oferec<strong>em</strong> um panorama atual das discussões<br />

sobre design, promovendo o debate de<br />

alto nível e a produção do conhecimento. Todos<br />

os volumes da coleção possu<strong>em</strong> uma versão<br />

digital, que pode ser acessada, gratuitamente,<br />

pelo endereço www.tcdesign.u<strong>em</strong>g.br.<br />

Uma novidade deste quinto volume, que<br />

contou com o apoio da FAPEMIG, é a inauguração<br />

da versão bilíngue: os artigos vêm acompanhados<br />

de sua versão <strong>em</strong> inglês, ampliando o alcance da<br />

publicação. A iniciativa é do Centro de Estudos,<br />

Teoria, Pesquisa e Cultura <strong>em</strong> Design (Centro<br />

T&C Design) da Universidade Estadual de Minas<br />

Gerais (U<strong>em</strong>g), grupo interdisciplinar que pretende<br />

criar um novo espaço para o debate sobre a<br />

cultura material e a pesquisa teórica <strong>em</strong> design.<br />

Livro: Design e Método<br />

Organização: Dijon de Moraes,<br />

Regina Álvares Dias, Ros<strong>em</strong>ary Bom Conselho<br />

Coleção: Cadernos de Estudos Avançados<br />

<strong>em</strong> Design (volume 5)<br />

Editora: Ed. U<strong>em</strong>g<br />

Páginas: 245<br />

Ano: 2011<br />

48 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011


Foto: Arquivo pessoal<br />

Rodrigo Mendes<br />

Em maio de 2011, o engenheiro agrônomo Rodrigo Mendes, formado pela Universidade do Estado de<br />

São Paulo (USP), publicou artigo na revista Science, no qual aponta um novo mecanismo de defesa para<br />

as plantas, sob a ameaça de 33 mil espécies de fungos residentes no solo situado próximo ao vegetal.<br />

Sua pesquisa de pós-doutorado começou a ser desenvolvida na Universidade de Wageningen, na<br />

Holanda. A expectativa do cientista é dar continuidade ao seu estudo na Empresa Brasileira de Pesquisa<br />

Agropecuária (Embrapa), local onde trabalha desde o começo do ano. O estudo de Mendes pode levar ao<br />

desenvolvimento de plantas com um sist<strong>em</strong>a de defesa efcaz ao ponto de dispensar o uso de agrotóxicos.<br />

5 PERGUNTAS PARA...<br />

Ex<strong>em</strong>plo de um solo naturalmente supressivo ao tombamento causado<br />

pelo patógeno Rhizoctonia. No solo supressivo (esquerda), a incidência<br />

da doença é muito baixa, enquanto que no solo condutivo a maioria das<br />

plantas está infectada. No solo supressivo, as bactérias estão naturalmente<br />

protegendo as plantas de beterraba.<br />

Os solos supressivos são conhecidos<br />

pelos agricultores por “proteger<strong>em</strong>”<br />

suas plantações do ataque<br />

de doenças e pragas, porém ainda<br />

não se sabia como era realizada essa<br />

proteção. Quando o senhor iniciou os<br />

estudos com esse tipo de solo, já se<br />

trabalhava com a possibilidade de a<br />

proteção vir de uma relação ecológica<br />

entre as plantas e outros seres vivos?<br />

1Esse fenômeno, no qual, a despeito<br />

da presença do patógeno de solo, a planta<br />

não é infectada, é conhecido como “solos<br />

supressivos a doenças”. A base microbiológica<br />

do fenômeno já era conhecida:<br />

ex<strong>em</strong>plos clássicos são o trigo nos Estados<br />

Unidos e na Austrália, e tomate e tabaco na<br />

França. Porém, os mecanismos utilizados<br />

pela comunidade microbiana durante a<br />

proteção estavam ainda por ser<strong>em</strong> elucidados.<br />

A abordag<strong>em</strong> metagenômica utilizada<br />

no estudo deu uma nova dimensão a um<br />

tópico b<strong>em</strong> conhecido, e se mostrou como<br />

uma poderosa ferramenta para se estudar a<br />

interação planta/microrganismos.<br />

Foi escolhido o cultivo de beterrabas<br />

para realizar testes das formas<br />

como os vegetais se defendiam de<br />

fungos. Quais foram os métodos de<br />

análise aplicados para compreender a<br />

estrutura de defesa dos vegetais?<br />

2Conhecendo-se previamente a natureza<br />

microbiológica do fenômeno, decidimos<br />

acessar diretamente a comunidade<br />

microbiana associada às raízes da beterraba<br />

<strong>em</strong> solos com diferentes níveis de<br />

supressão ao patógeno Rhizoctonia. Tradicionalmente,<br />

técnicas dependentes de cultivo<br />

de micro-organismos são utilizadas, o<br />

que limita o número de micro-organismos<br />

estudados durante a interação. Neste estudo,<br />

utilizando uma técnica conhecida<br />

como metagenômica, isolamos diretamente<br />

o DNA a partir do solo aderido às raízes<br />

de beterraba e descobrimos mais de 30 mil<br />

espécies bacterianas na interação.<br />

No estudo <strong>em</strong> desenvolvimento,<br />

foram encontradas 33 espécies de<br />

bactérias que barravam o avanço de<br />

doenças. Existe uma atuação especifi-<br />

definida para essas bactérias? Elas 3ca<br />

ag<strong>em</strong> consorciadas?<br />

Os resultados d<strong>em</strong>onstraram que<br />

o principal meio de ação das bactérias é<br />

sua atuação <strong>em</strong> consórcio com diferentes<br />

espécies, no qual grupos bacterianos<br />

dominantes atuam suprimindo a doença.<br />

Embora milhares de bactérias atu<strong>em</strong> simultaneamente,<br />

33 espécies foram as mais<br />

dinâmicas no processo de supressão.<br />

Explique como funciona o processo<br />

de defesa <strong>em</strong> estudo e, especifique,<br />

qual é a participação do solo,<br />

4plantas e bactérias.<br />

A planta, crescendo na presença de<br />

um patógeno, libera nutrientes que são usados<br />

pelas bactérias do solo. Em resposta,<br />

as bactérias se ader<strong>em</strong> às raízes e ajudam a<br />

planta atuando como guarda-costas, produzindo<br />

antibióticos que contra-atacam o fungo<br />

durante a infecção, impedindo, assim, o<br />

desenvolvimento da doença.<br />

A descoberta desse novo mecanismo<br />

de proteção para as plantações<br />

pode gerar quais benefícios para o de-<br />

da agricultura? 5senvolvimento<br />

A aplicação direta desse conhecimento<br />

seria “engenheirar” plantas para que elas<br />

recrut<strong>em</strong> as bactérias benéficas a fim de se<br />

defender<strong>em</strong> naturalmente de patógenos. O<br />

impacto da utilização desta estratégia seria<br />

a redução da aplicação de químicos na agricultura,<br />

contribuindo para o uso sustentável<br />

do solo e, consequent<strong>em</strong>ente, evitando a<br />

contaminação de ambiente.<br />

MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011 49


Crédito: Marcelo Kraiser (professor do Departamento de Desenho da Escola de Belas Artes – UFMG)<br />

Maria-Exphotos, de Marcelo Kraiser; o trabalho iniciou-se com pesquisa sobre processos analógicos<br />

de produção de imagens, e integra o Imagens do Conhecimento (leia mais na página 19)<br />

VARAL<br />

50 MINAS FAZ CIÊNCIA • SET/NOV 2011

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