olhares de "crianças" sobre gênero, sexualidade e infância - UNESP
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Provavelmente, tal circunstância seja provocada pela construção das i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> gênero, em uma socieda<strong>de</strong> que, entre outros elementos, carrega as marcas do<br />
patriarcalismo e apresenta a mulher como um ser inferior ao homem, baseando-se na idéia <strong>de</strong><br />
que isso se fundamenta em diferenças biológicas e sexuais entre ambos. Trata-se <strong>de</strong> valores e<br />
simbologias cujos significados são construídos em uma longa duração histórica, já que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
Aristóteles, é explicado que o macho fornecia a forma e a fêmea a matéria, o útero, sendo este<br />
como uma terra que, a princípio sem vida, precisava ser fertilizada. E, como explica Parker,<br />
em relação à vagina, esta se torna, em suas várias conexões simbólicas, “um ponto <strong>de</strong> foco<br />
para as noções <strong>de</strong> impureza na vida brasileira” (1991, p.68). O autor, assim, prossegue:<br />
Um quadro diferente e muito mais complicado aparece quando se trata do<br />
corpo da mulher e as representações <strong>de</strong> feminilida<strong>de</strong> que ele codifica.<br />
Assim como o falo toma forma como uma arma, um instrumento <strong>de</strong> força e<br />
violência potencial, o corpo da mulher surge, através <strong>de</strong> um processo bem<br />
parecido <strong>de</strong> associação lingüística, tanto como o objeto <strong>de</strong>ssa violência<br />
quanto, paradoxalmente, um local <strong>de</strong> perigo por si só. (PARKER, 1991,<br />
p.67).<br />
ela:<br />
Também é oportuno lembrar o que diz Muraro (1983), em pesquisa realizada por<br />
A primeira coisa que po<strong>de</strong>mos inferir <strong>sobre</strong> a sexualida<strong>de</strong> feminina é o que<br />
já afirmamos antes: ela parece menos centrada <strong>sobre</strong> os órgãos genitais do<br />
que a do homem. Aparece mais difusa <strong>sobre</strong> o corpo (“corpo é coisa <strong>de</strong><br />
mulher”) e a dos homens mais centrada no pênis. (p.326).<br />
A resistência <strong>de</strong>ssas meninas em falar <strong>de</strong> seus corpos, em específico <strong>de</strong> sua<br />
genitália, tem raízes em uma história <strong>de</strong> repressão, violência e <strong>de</strong>scaso para com as<br />
necessida<strong>de</strong>s sexuais e <strong>de</strong> prazer femininos, como apontou Muraro, em investigação realizada<br />
há mais <strong>de</strong> vinte anos, abrangendo homens e mulheres <strong>de</strong> várias classes sociais. Conclue-se<br />
que, na cultura brasileira, como <strong>de</strong>staca Parker (1991), está presente o corpo mais genitalizado<br />
do homem, o que se liga aos princípios da lógica <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> patriarcal, que tem o<br />
homem como produtor e como ser ativo, na relação sexual, em busca do gozo e do prazer.<br />
Essas concepções estão ancoradas nas falas das meninas, que já manifestam uma<br />
<strong>de</strong>svinculação, em ser mulher, do conhecimento do seu próprio corpo e <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>leites.