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ensaio<br />
Um olhar carregado de sentimento, como o do<br />
menino que observa, por trás das flechas, um grupo<br />
que chega cantando na aldeia. A beleza dos Awá-<br />
Guajá através das lentes de Christian Knepper é um<br />
manifesto apaixonado pela proteção desse povo,<br />
cuja cultura é cada vez mais ameaçada pelo avanço<br />
da sociedade envolvente. Paixão que se reflete na<br />
sinceridade de imagens captadas no cotidiano da<br />
aldeia. Como a silhueta de um pequeno caçador que<br />
aponta o arco em direção ao céu para derrubar uma<br />
preguiça, escondida na mira do arqueiro.<br />
Christian, alemão radicado há 15 anos no<br />
Maranhão, esteve por diversas vezes, entre os anos<br />
2002 e 2003, nas aldeias Awá e Juriti, na Terra<br />
Indígena Awá. Desde que teve seu primeiro contato<br />
com o grupo, impressionou-o a harmonia com que<br />
vivem e interagem com a natureza. Confeccionam<br />
habilmente os objetos de que necessitam em seu dia-adia.<br />
Usam a boca para deixar as flechas afiadas. Criam,<br />
com carinho, os filhotes dos animais caçados, que mais<br />
tarde se transformam em amigos e brinquedos das<br />
crianças. “Mas é triste escutar o barulho ensurdecedor<br />
de um trem da Estrada de Ferro Carajás, enquanto<br />
beleza ameaçada<br />
Felipe Milanez<br />
CHRISTIAN KNEPPER<br />
dançam para a Lua”, comenta o fotógrafo, ao lembrar o<br />
momento em que retratou o ritual “viagem para o céu”<br />
(ohó iwa-beh), cerimônia praticada durante o período<br />
da estiagem nas noites de Lua cheia. Nessa cerimônia,<br />
os homens são adornados pelas mulheres com penas<br />
de aves, como na foto desta página.<br />
Os Guajá, que se autodenominam Awá, termo<br />
que significa “homem”, “pessoa” ou “gente”, tiveram<br />
os primeiros contatos na década de 1970. Não muito<br />
longe de onde foram tiradas as fotos deste ensaio, um<br />
subgrupo de Awá vive ainda mais ameaçado: cerca<br />
de 30 indivíduos perambulam pela Terra Indígena<br />
Araribóia, na floresta, ainda sem contato permanente<br />
com a sociedade ao redor. De uma forma geral, os Awá,<br />
um dos últimos povos caçadores e coletores do Brasil,<br />
enfrentam problemas com doenças introduzidas pelos<br />
não-índios, e vivem em áreas em constante perigo de<br />
invasões. Um futuro incerto.<br />
Mirando o céu, 2002, aldeia Awá. “O menino subiu no telhado de sua casa para derrubar um bicho preguiça que havia fugido<br />
para uma árvore, depois de uma caçada”, conta Christian<br />
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