diálogo para a sustentabilidade no litoral norte paulista ... - Simpoi
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ANAIS<br />
DIÁLOGO PARA A SUSTENTABILIDADE NO LITORAL NORTE PAULISTA.<br />
INOVAÇÕES NA NEGOCIAÇÃO DOS CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS DAS<br />
OPERAÇÕES DE PETRÓLEO E GÁS<br />
ICARO ARONOVICH DA CUNHA ( icarocunha@unisantos.br )<br />
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS<br />
ANTONIO CARLOS FREDDO ( acfreddo@terra.com.br , acfreddo@unisantos.br )<br />
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS<br />
FERNANDA GABRIELA BORGER ( ppgn@unisantos.br )<br />
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS<br />
Resumo<br />
Trata-se da conceituação utilizada na análise de fenôme<strong>no</strong>s de conflitos socioambientais,<br />
vistos como disputas entre grupos que fazem distintos usos dos recursos ambientais. A<br />
resolução pacífica dos conflitos se apóia na abordagem dos ganhos mútuos, associada à<br />
perspectiva do Desenvolvimento Sustentável, apoiando <strong>no</strong>vas formas de relacionamento da<br />
empresa com seus stakeholders. A pesquisa foca as atividades da Petrobras <strong>no</strong> <strong>litoral</strong> <strong>no</strong>rte<br />
<strong>paulista</strong>, com especial atenção aos conflitos com o movimento ambientalista que eclodiram na<br />
fase de licenciamento ambiental do projeto Mexilhão de extração de gás da Bacia de Santos.<br />
Palavras-chave<br />
conflito socioambiental, recursos ambientais, ganhos mútuos, Petrobras, Bacia de Santos<br />
Introdução<br />
O artigo apresenta conceituação utilizada na análise de fenôme<strong>no</strong>s de conflitos<br />
socioambientais, vistos como disputas entre grupos huma<strong>no</strong>s que fazem distintos usos dos<br />
recursos ambientais. A resolução pacífica dos conflitos se apóia na abordagem dos ganhos<br />
mútuos, associada à perspectiva do Desenvolvimento Sustentável, apoiando <strong>no</strong>vas formas de<br />
relacionamento da empresa com seus stakeholders.<br />
A pesquisa desenvolvida foca as atividades da Petrobras <strong>no</strong> <strong>litoral</strong> <strong>no</strong>rte <strong>paulista</strong>, com especial<br />
atenção aos conflitos com o movimento ambientalista que eclodiram na fase de licenciamento<br />
ambiental do projeto Mexilhão de extração de gás da Bacia de Santos. O trabalho traz uma<br />
leitura do quadro de conflitos em escala regional, e recupera as tratativas da empresa com o<br />
movimento ambientalista que levaram a estabelecer um Comitê de Diálogo <strong>para</strong> a promoção<br />
da Sustentabilidade, em que a empresa torna-se parceira das ONGs, experimentando <strong>no</strong>vo<br />
posicionamento como ator pró Sustentabilidade.<br />
Conceitos utilizados nesse trabalho<br />
Conflitos ambientais são disputas entre diferentes grupos huma<strong>no</strong>s que utilizam de formas<br />
distintas os recursos ambientais. São fenôme<strong>no</strong>s complexos, envolvendo a esfera dos<br />
fenôme<strong>no</strong>s físicos e biológicos, as relações sociais, e a interação entre estes dois campos. São<br />
mais freqüentes os conflitos decorrentes dos impactos ambientais de uns usos sobre outros, as<br />
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disputas pela utilização de recursos, e os conflitos pelo uso dos conhecimentos ambientais<br />
(Little, 2001).<br />
No Brasil, a dinâmica de conflitos ambientais é um fenôme<strong>no</strong> essencial <strong>para</strong> entender a<br />
evolução da política ambiental. Por parte dos movimentos de opinião ambientalistas, um dado<br />
fundamental é que na fase de fundação (a<strong>no</strong>s 70 -80) houve uma forte influência de uma visão<br />
de mundo preservacionista, dentro do ideal de manutenção de uma natureza intocada, cuja<br />
transformação pelos seres huma<strong>no</strong>s é algo negativo (Viola, 1996) . Pelo lado do gover<strong>no</strong>,<br />
assinale-se uma dificuldade em incorporar a resolução de conflitos como dimensão estratégica<br />
da política ambiental, já que predomina uma cultura burocrática, <strong>no</strong>rmativa, herdada da fase<br />
de controle dos efeitos negativos das práticas econômicas e que não avançou <strong>para</strong> uma visão<br />
gerencial mais ampla, à altura do desafio de construir um desenvolvimento sustentável<br />
(Cunha, I. A. e Junqueira, L., 2007).<br />
Sustentabilidade ou Desenvolvimento Sustentável é um conceito consagrado pelo Relatório<br />
Nosso Futuro Comum, que traz a idéia de superar o cenário que indica um colapso das<br />
possibilidades de desenvolvimento em função da ultrapassagem dos limites da natureza em<br />
sua capacidade de sustentar a eco<strong>no</strong>mia. A Sustentabilidade tem como dimensões<br />
fundamentais o atendimento das necessidades básicas das populações atuais e futuras,<br />
revendo padrões de consumo acima do ecologicamente razoável; o uso prudente dos recursos<br />
naturais, desenvolvendo substitutos <strong>para</strong> os recursos não re<strong>no</strong>váveis antes de seu esgotamento<br />
e respeitando padrões que permitam a perpetuação da oferta dos recursos re<strong>no</strong>váveis; uma<br />
evolução da técnica, evitando a poluição e os riscos; a conservação da diversidade biológica e<br />
a re<strong>no</strong>vação dos processos ecológicos essenciais; a construção e manutenção de uma relação<br />
equilibrada entre volume das populações e as bases de recursos dos ambientes em cada região<br />
(CMMAD, 1988).<br />
Recursos comuns são conjuntos que ofertam serviços ambientais que dependem de sua<br />
indivisibilidade, como mares produtores de pescado, florestas produtoras de água, etc. Nossa<br />
sociedade tem dificuldade cultural e jurídica em administrar estes recursos, quando<br />
deveríamos ser capazes de estabelecer regimes de propriedade compartilhada, gerando<br />
<strong>no</strong>rmas de uso que garantissem o respeito a parâmetros equilibrados de aproveitamento <strong>para</strong><br />
evitar quadros de escassez (Mac Kean e Ostrom,2001) .<br />
A abordagem dos ganhos mútuos <strong>para</strong> resolução de disputas é um conjunto de propostas de<br />
estratégias que facilitam a construção de entendimentos em situações de conflito envolvendo<br />
muitos atores, como são tipicamente os conflitos socioambientais. Esta abordagem é<br />
trabalhada pelo Consensus Building Institute, centro de pesquisa que reúne trabalhos do<br />
Instituto de Tec<strong>no</strong>logia de Massachussets (M.I.T.) e da Escola de Direito de Harvard, e<br />
divulgada por meio do International Programme on the Management of Sustainability,<br />
atividade realizada anualmente na Holanda com apoio do gover<strong>no</strong> daquele País (Susskind &<br />
Field, 1997; Susskind et.al., 2000). De forma geral, a idéia é que a boa estratégia é aquela que<br />
leva em conta as necessidades dos demais atores, em função de cujo entendimento podem ser<br />
construídas propostas em que se combinam ganhos <strong>para</strong> as diversas partes, em jogos de soma<br />
positiva.<br />
Empresa, conflito e construção de reputação ambiental: <strong>para</strong> autores como Fernando<br />
Almeida, a empresa deve negociar os conflitos com os grupos de interesse com os quais se<br />
relaciona – consumidores, fornecedores, gover<strong>no</strong>, comunidades, imprensa, ambientalistas,<br />
etc.- pois hoje <strong>no</strong> Brasil há um processo participativo na política ambiental fazendo com que<br />
as decisões sobre licenças ambientais extrapolem o pessoal técnico dos órgãos de gover<strong>no</strong>. A<br />
reputação ambiental torna-se um ativo intangível da empresa, a ser obtido por meio de uma<br />
combinação de responsabilidade social, ecoeficiência e diálogo com os stakeholders (grupos<br />
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de interesse). É cada vez mais um valor positivo que se pode agregar aos negócios (Almeida,<br />
2002).<br />
Risco, comunicação e percepção do risco, gerenciamento dos riscos, risco ambiental do<br />
negócio, gestão social do risco, são outro campo de questões fundamentais. Os riscos de<br />
acidentes ambientais são elementos centrais <strong>para</strong> a atividade de petróleo e gás, cujo<br />
gerenciamento se apóia na equação básica R = F x C , que estabelece o risco como produto<br />
da multiplicação de freqüência ou probabilidades de eventos, por suas conseqüências. Nas<br />
situações em que as conseqüências podem incluir desdobramentos exter<strong>no</strong>s, afetando<br />
diretamente comunidades, a redução do índice de risco implica na pre<strong>para</strong>ção destes grupos,<br />
dos gover<strong>no</strong>s locais, dos órgãos de emergência, <strong>para</strong> respostas adequadas.<br />
Torna-se necessário comunicar os riscos, desafiando as equipes técnicas a lidar com as<br />
diferentes percepções de risco. Um dos fatores complicadores reside em que a percepção dos<br />
riscos pelo público não coincide com a visão dos especialistas. Enquanto estes aprendem a<br />
quantificar grandezas e lidar com probabilidades, o público reage com a indignação: a<br />
possibilidade do acidente revolta, poluir é errado.<br />
Para a empresa que tem na sua estratégia a construção da boa reputação ambiental, o risco<br />
passa a ter uma equação ampliada, em que todos os fatores acima são multiplicados pela<br />
repercussão do acidente na opinião pública. Surge o risco ambiental do negócio.<br />
De outro lado, na medida em que a segurança ambiental depende em determinadas situações<br />
da cooperação do gover<strong>no</strong> local, dos órgãos de emergência e das lideranças da comunidade<br />
<strong>para</strong> que exista um padrão aceitável, o gerenciamento de riscos torna-se uma tarefa social, que<br />
demanda entre outros fatores capacitação ampliada (Cunha,I. e Junqueira, L., 2007).<br />
Síntese: posicionamento estratégico socioambiental – como a atividade econômica<br />
estreita ou amplia as oportunidades associadas à resiliência ecológica; como proporciona<br />
uma gestão social do risco ambiental<br />
Combinando as ferramentas acima referenciadas, a discussão do posicionamento da empresa<br />
diante de situação de conflito ambiental parte do entendimento de que os vários atores<br />
enxergam a empresa não apenas em função da maneira como consegue fazer a gestão<br />
ambiental dos seus próprios processos produtivos, mas também pelo condicionamento que<br />
impõe sobre os recursos de uso comum, consumindo uma faixa de sua resiliência ecológica e<br />
dessa forma eventualmente estreitando as oportunidades de sobrevivência dos demais setores.<br />
Mais que isso: há um jogo de forças <strong>no</strong> quadro de conflito ambiental em cada região, e a<br />
empresa é avaliada pelos diferentes atores em função da articulação que mantém com os<br />
demais interesses. A empresa freqüentemente é vista como parte da coalizão de poder que<br />
impõe um padrão de uso predatório dos recursos ambientais, na região ou <strong>no</strong> País; e <strong>para</strong><br />
alterar sua reputação deve buscar ser reconhecida como um dos atores pró Sustentabilidade.<br />
Para alterar a relação que mantém com os demais atores, e em especial <strong>para</strong> construir a<br />
colaboração essencial ao gerenciamento social dos riscos, a empresa deve conquistar a<br />
confiança do público. Para tanto, além de assegurar o acesso à informação, é importante<br />
fomentar a capacitação mínima dos demais atores, <strong>para</strong> que estes possam participar<br />
construtivamente do processo. Tais tarefas poderiam ficar, ao me<strong>no</strong>s em parte, a cargo dos<br />
órgãos governamentais de administração ambiental, mas seu desempenho deixa várias lacunas<br />
graves.<br />
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Modelo esquemático: posicionamento da Empresa <strong>no</strong> quadro de conflitos ambientais<br />
Reproduzido de Cunha, I. A. (2006). Os recursos comuns, como a Mata Atlântica ou o mar costeiro, são<br />
percebidos de maneiras distintas, em função dos diversos usos desenvolvidos pelos grupos huma<strong>no</strong>s. As<br />
alternativas de padrão de utilização destes conjuntos dão lugar a alianças entre alguns atores, coalizões que<br />
podem ser mais ou me<strong>no</strong>s favoráveis a alternativas sustentáveis de aproveitamento dos recursos ambientais do<br />
lugar. A opção estratégica pela Sustentabilidade empresarial deve refletir-se na escolha por participar de uma<br />
coalizão com as forças pró-<strong>sustentabilidade</strong>.<br />
Metodologia<br />
A análise aqui apresentada aproveita resultados de pesquisas desenvolvidas em diferentes<br />
momentos sobre os procedimentos de gestão ambiental na região, especialmente aqueles<br />
referentes ao gerenciamento de riscos do terminal de São Sebastião.<br />
O trabalho se apóia ainda em estudo documental complementar, especialmente o Zoneamento<br />
Ecológico Econômico do Litoral Norte, os Relatórios de Impacto Ambiental sobre o Projeto<br />
Mexilhão, o Diagnóstico Participativo de Caraguatatuba desenvolvido pela Petrobras; e<br />
também em levantamento sobre pontos de vista de atores relevantes na região, por meio de<br />
entrevistas e de discussões em grupo com dirigentes de Unidades de Conservação, militantes<br />
ambientalistas, dirigentes municipais de meio ambiente, lideranças da área de serviços<br />
turísticos.<br />
Outra fonte de informações relevante tem sido a participação <strong>no</strong> fórum de discussão Petrobrás<br />
/Rede de Entidades Ambientalistas do Litoral Norte, surgido da reivindicação dos<br />
ambientalistas <strong>no</strong> sentido de ser organizada uma Ouvidoria sobre o Projeto Mexilhão, o que<br />
veio a dar lugar à implantação de um Comitê de Diálogo <strong>para</strong> a Sustentabilidade.<br />
Situação de conflito ambiental <strong>no</strong> Litoral Norte de São Paulo<br />
- geral: matriz energética<br />
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ANAIS<br />
O fenôme<strong>no</strong> de divulgação e discussão da crise climática associada à emissão de gases estufa<br />
faz com que hoje em cada lugar se reproduza o debate sobre a matriz energética, embora falte<br />
repertório à maioria das pessoas.<br />
Há um macro-conflito ambiental, trazido à cena cada vez que se discute um <strong>no</strong>vo projeto<br />
energético, que é o conflito em tor<strong>no</strong> do clima, cujas conseqüências anunciadas <strong>para</strong> as<br />
regiões litorâneas são potencialmente catastróficas, pela elevação do nível do mar, alteração<br />
da pluviosidade, aumento de doenças tropicais, etc.<br />
Diante desse <strong>no</strong>vo fenôme<strong>no</strong> de consciência, um desafio posto aos gestores de operações com<br />
energia é buscar uma linha de atuação e de discurso capaz de demonstrar consciência e<br />
sensibilidade, associando e valorizando os investimentos e operações destinados à busca de<br />
alternativas mais sustentáveis do ponto de vista ambiental <strong>para</strong> o suprimento das demandas<br />
de energia.<br />
- estrutural: Litoral Norte de São Paulo<br />
A construção do terminal de petróleo e derivados em São Sebastião <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 60 foi um dos<br />
grandes fatores de mudança de uma região periférica, política e eco<strong>no</strong>micamente, em relação<br />
ao Vale do Paraíba. A Petrobrás trouxe melhoria de acessos rodoviários; energia elétrica;<br />
serviços bancários; arrecadação e empregos. Inaugurou um fluxo de trabalhadores migrantes,<br />
vindos em caminhão do <strong>no</strong>rte de Minas Gerais <strong>para</strong> as obras do terminal.<br />
O rompimento do isolamento da região onde havia forte presença de núcleos caiçaras se deu<br />
definitivamente com o asfaltamento da Rio-Santos na década de 80. A re-ocupação da costa,<br />
já impulsionada pelo Porto e pelo terminal, passava a ter um forte ingrediente imobiliário,<br />
aproveitando os atrativos turísticos de sol e praia.<br />
Num tempo em que cuidados ambientais eram questões alheias à eco<strong>no</strong>mia, os impactos<br />
foram muitos e volumosos. Aterros feitos indiscriminadamente, lançamentos de esgotos,<br />
desmatamentos, somaram-se a um histórico de derramamentos de petróleo que atingiu a casa<br />
de mais de duas centenas de episódios, incluindo dois casos em que houve pânico na cidade<br />
associado a incêndios, de um navio e de produto vazado <strong>para</strong> um córrego <strong>no</strong> Centro Urba<strong>no</strong>.<br />
Grupos ambientalistas aguerridos e ligados a movimentos fora da região se articularam e<br />
tiveram presença marcante na política local como iniciativas da cidadania, somadas a lutas<br />
pela devolução da eleição de Prefeito em São Sebastião. Isso explica o fato dessa cidade ter<br />
desenvolvido uma política ambiental local: esta era uma resposta ao estágio atingido pelo<br />
conflito ambiental já naquele momento, final dos a<strong>no</strong>s 80 e início dos 90.<br />
O Gerenciamento de Riscos do terminal respondeu às demandas do órgão estadual de<br />
controle, a CETESB, e da política municipal que criou um mecanismo de acompanhamento<br />
do processo pelo Conselho municipal de Meio Ambiente. O Terminal de São Sebastião de<br />
certa forma antecipou-se ao realizado depois pelo PEGASO: foi feito um investimento de 36<br />
milhões de dólares que resultou, na segunda metade dos a<strong>no</strong>s 90, na redução drástica de<br />
número de acidentes e também dos volumes vazados.<br />
O gerenciamento dos riscos com discussão pública mudou o relacionamento da comunidade<br />
com a empresa. No período 97-2000, uma parceria reuniu o Parque Estadual da Serra do Mar,<br />
a Prefeitura de São Sebastião e a Petrobrás num Programa de Ecoturismo, Proteção e<br />
Educação Ambiental. Um peque<strong>no</strong> investimento da empresa propiciou um trabalho integrado<br />
de fiscalização ambiental que tor<strong>no</strong>u-se o mais destacado <strong>no</strong> estado de São Paulo; a educação<br />
ambiental nas escolas públicas municipais; e a fundação de um eco-negócio de ecoturismo,<br />
que criou raízes e persiste até hoje.<br />
Outra parceria importante foi o restauro da Igreja Matriz de São Sebastião, com suporte da<br />
Petrobrás e da Volkswagen por meio de projeto enquadrado na Lei de Incentivo à Cultura.<br />
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A discussão pública dos riscos e seu gerenciamento criou as condições <strong>para</strong> evoluir <strong>para</strong> a<br />
implantação do Alerta e Pre<strong>para</strong>ção da Comunidade Local <strong>para</strong> Emergências, a metodologia<br />
desenvolvida pelo programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (de<strong>no</strong>minada Pla<strong>no</strong><br />
APELL). São Sebastião teve em 2000 seu primeiro Dia do Alerta, com cerca de 8.000 pessoas<br />
participando de uma gincana cujo enredo foi a cartilha de pre<strong>para</strong>ção <strong>para</strong> emergências.<br />
A descontinuidade administrativa da política local afetou esta experiência. No período 2002 a<br />
2004, o APELL foi retomado mas de forma festiva, apoiando-se excessivamente na<br />
distribuição de brindes <strong>para</strong> conquistar participação. Os erros dessa política foram constatados<br />
numa avaliação feita em 2005, quando uma pesquisa com os moradores do entor<strong>no</strong> do<br />
terminal constatou que as pessoas sabiam que havia risco mas não memorizavam as<br />
orientações básicas sobre como agir na emergência.<br />
Dessa forma, o advento do PEGASO – programa de excelência em gestão ambiental e saúde<br />
ocupacional da Petrobras, lançado em 2000 como resposta aos grandes acidentes da<br />
Guanabara e de Araucária- não representou em São Sebastião e na região o mesmo que em<br />
outros lugares, já ali se experimentou precocemente uma evolução substancial da política de<br />
gestão da empresa, inclusive com a criação de mecanismos avançados de comunicação e<br />
gerenciamento social dos riscos; e depois um certo refluxo, com a desorganização dos<br />
procedimentos de gestão governamental local e descontinuidade dos processos de diálogo<br />
sobre riscos. A perda de centralidade do Conselho Municipal de Meio Ambiente de São<br />
Sebastião afetou de forma severa as relações entre a empresa e o público regional.<br />
Gestão Ambiental na região e atitudes dos atores<br />
As diferentes etapas acima rapidamente descritas deram condição <strong>para</strong> uma evolução na visão<br />
de diferentes personagens locais a respeito da postura gerencial da empresa, das<br />
possibilidades de cooperação, da virada na cultura técnica, na concepção de negócios e enfim<br />
dos compromissos com excelência em gestão ambiental por parte da direção e do corpo de<br />
funcionários da Petrobrás. Contudo, da forma como ocorre o processo de administração<br />
ambiental na região, torna-se difícil que tais avanços na compreensão da evolução da empresa<br />
sejam socializados de forma ampla.<br />
Em boa parte, isso se deve aos limites da gestão ambiental praticada pelos órgãos<br />
governamentais. Sem tentar uma caracterização ampla que tomaria um espaço descabido, é<br />
importante lembrar que não há uma fiscalização ambiental adequada, consorciada entre os<br />
níveis federal, estadual e municipal; os trabalhos de planejamento ambiental são tecnicamente<br />
limitados e não têm continuidade; não há articulação horizontal entre a área de meio ambiente<br />
e outras áreas de papel estratégico <strong>para</strong> as soluções dos problemas regionais, tais como<br />
Habitação, Saneamento, Transportes; os gover<strong>no</strong>s municipais freqüentemente descambam<br />
<strong>para</strong> o desmando e desprezam em suas prioridades de ação questões básicas, como a saúde<br />
pública, enquanto desperdiçam recursos – inclusive os originários da arrecadação do petróleo.<br />
Há falhas de origem <strong>no</strong> colegiado encarregado da política de gerenciamento costeiro e de<br />
gestão dos recursos hídricos. Essa instância não consegue agregar os atores fundamentais do<br />
desenvolvimento regional, entre outras razões por falta de objetivos claros <strong>para</strong> um trabalho<br />
de gestão.<br />
Planejamento municipal, atuação básica em temas ambientais, ordenamento do processo de<br />
urbanização, são ações que apenas de forma bissexta integram o horizonte de equipes de<br />
gover<strong>no</strong>s locais que expressam freqüentemente acordos com determinados interesses<br />
econômicos, tais como os ligados às atividades imobiliárias. Carentes de recursos, os órgãos<br />
estaduais esbarram também <strong>no</strong>s acordos políticos que geram orientações vindas do alto <strong>para</strong><br />
não interferir <strong>no</strong>s negócios locais.<br />
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ANAIS<br />
Nesse contexto, as atitudes dos movimentos ambientalistas são por vezes agressivas. A<br />
agressividade, <strong>no</strong> repertório de análise de conflitos, é entendida como uma resposta defensiva<br />
diante da dor ou da ameaça de dor, real ou imaginária. Nesse caso, resposta defensiva diante<br />
da ameaça percebida – corretamente ou não – de que um conjunto de empreendimentos de<br />
vulto na região, caindo sobre um cenário de desordem geral na ocupação do território, seja<br />
desencadeador de um <strong>no</strong>vo e ampliado surto de devastação.<br />
A Petrobras e o gerenciamento de conflitos socioambientais<br />
Nessa parte do trabalho,a idéia é discutir possibilidades de estratégias de ação <strong>para</strong> a<br />
Petrobras, de forma a reestruturar seu relacionamento com os diferentes públicos regionais <strong>no</strong><br />
<strong>litoral</strong> <strong>no</strong>rte de São Paulo - onde se localizam importantes operações, como o Projeto<br />
Mexilhão de Gás e o Terminal de Petróleo e Derivados de São Sebastião - por meio da<br />
construção e consolidação de uma imagem de excelência <strong>no</strong> campo socioambiental.<br />
A resolução de conflitos aqui é utilizada como ferramenta <strong>para</strong> discutir um posicionamento<br />
em curto prazo e também num prazo médio, de alguns a<strong>no</strong>s, considerando a alternativa de<br />
avanço <strong>para</strong> uma estratégia de Sustentabilidade. O tempo deve ser devidamente considerado<br />
numa estratégia de negociação devido a diferentes fatores:<br />
- as atitudes dos atores regionais se ligam a uma história de convivência com as atividades da<br />
empresa;<br />
- a empresa precisa de tempo <strong>para</strong> demonstrar coerência com os compromissos de i<strong>no</strong>vação<br />
em gestão que vem assumindo;<br />
- a natureza das operações com petróleo, gás e outras fontes energéticas implica em<br />
equacionamentos de alternativas mais sustentáveis com um tempo de maturação que não pode<br />
ser atropelado;<br />
- a negociação de conflitos depende de uma boa utilização do tempo futuro <strong>para</strong> a construção<br />
de acordos imediatos.<br />
O desafio da Petrobras <strong>no</strong> Litoral Norte de São Paulo reúne algumas características centrais:<br />
- a região tem diversos condicionantes ambientais peculiares acompanhados da presença de<br />
uma variedade de atores com forte potencial de articulação e repercussão <strong>para</strong> suas visões<br />
críticas, <strong>para</strong> fora da região, sejam estas posições razoáveis tecnicamente ou não;<br />
- a região tem uma história de conflitos ambientais acirrados, associados ao fato de ter<br />
guardado relativo isolamento até os a<strong>no</strong>s 80, quando se deu a melhoria do acesso rodoviário.<br />
Na história da mudança regional, alguns grandes empreendimentos – como o Porto de cargas<br />
gerais ou o Terminal de petróleo e derivados – se somam a um processo de ocupação<br />
desordenada que está ainda em curso, um processo imobiliário incontido que se desdobra <strong>no</strong><br />
dia-a-dia da política local como choque de diferentes concepções de mundo;<br />
- as ações de administração ambiental governamental na região estão muito aquém do padrão<br />
requerido <strong>para</strong> gerir os conflitos e estabelecer um processo ordenado de dinâmica territorial,<br />
uma gestão que inclusive possa canalizar produtivamente o encaminhamento de<br />
reivindicações e propostas oriundas dos diferentes setores organizados;<br />
- a empresa tem uma intervenção de grande porte na região, que historicamente teve sua<br />
parcela de contribuição <strong>para</strong> este processo de ocupação. Suas operações com produtos<br />
perigosos se desenvolvem <strong>no</strong> interior de conjuntos naturais e construídos de alta<br />
vulnerabilidade e importância ecológica e cultural. Há um stress <strong>no</strong> relacionamento cotidia<strong>no</strong><br />
da empresa com diferentes setores locais, ligado entre outros fatores à memória de acidentes e<br />
contaminações, e à falta de uma continuidade / coerência nas manifestações externas da<br />
empresa (atitudes dos seus diferentes setores);<br />
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ANAIS<br />
- a velocidade da mudança de cultura técnica da empresa em gestão ambiental é bem maior do<br />
que o ritmo de mudança da percepção e de aquisição de confiança nessa mudança por parte<br />
dos diferentes públicos exter<strong>no</strong>s. Os mecanismos participativos de gerenciamento ambiental<br />
já construídos na região, que auxiliariam nessa direção, sofrem com a descontinuidade por<br />
parte dos gover<strong>no</strong>s locais;<br />
- o retor<strong>no</strong> econômico da presença da empresa não garante um reconhecimento de seu papel<br />
positivo <strong>para</strong> o desenvolvimento local. A principal razão é o padrão usual de administração<br />
pública, a utilização com prioridades discutíveis e nada transparentes do orçamento<br />
governamental <strong>para</strong> o qual a arrecadação propiciada pela empresa dá uma grande<br />
contribuição. A empresa é vista como um ator de grande poder que participa de um padrão<br />
predatório de uso do território.<br />
Os primeiros movimentos do processo de licenciamento ambiental do Projeto Mexilhão<br />
ocasionaram grande ruído na região e fora dela, por remobilizarem as tensões presentes nesse<br />
quadro regional. O elemento deflagrador foi a discussão inicial em audiência pública<br />
conduzida pelo IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente). Os principais aspectos a<br />
provocarem reação foram:<br />
- compartimentação da análise técnica do empreendimento nas partes de mar e terrestres.<br />
Analisar por partes um mesmo empreendimento é algo percebido <strong>no</strong> meio ambientalista como<br />
uma estratégia já tradicional, <strong>no</strong> País, <strong>para</strong> facilitar aprovações que de outra forma seriam<br />
difíceis, pois impede de equacionar amplamente os impactos ambientais projetados. No caso<br />
de Mexilhão, essa decisão da burocracia da agência ambiental contami<strong>no</strong>u a imagem da<br />
empresa negativamente, gerando predisposição que deve ser contornada;<br />
- má organização e condução, por parte do IBAMA, do processo de debates na audiência<br />
pública, o que é entendido em ambiente de conflito como um boicote à participação pública e<br />
uma tentativa de atropelar a fase de discussão;<br />
- a associação por parte do público interessado entre as transformações regionais que serão<br />
originadas pelo Projeto Mexilhão e aquelas potencialmente ligadas a outros projetos de<br />
grande porte anunciados <strong>para</strong> a região, em especial a expansão do Porto de São Sebastião e a<br />
ampliação da Rodovia dos Tamoios. Aliás, este efeito sinérgico está assinalado como fonte de<br />
preocupação <strong>no</strong> próprio RIMA de Mexilhão, conferindo veracidade a esta impressão difusa.<br />
Dessa forma, uma estratégia de gerenciamento de conflitos deve ter como um de seus<br />
objetivos específicos tirar a Petrobrás da “vala comum” dos grandes empreendedores que<br />
chegam à região sem dar garantias de que levarão em consideração as necessidades dos<br />
grupos huma<strong>no</strong>s locais e a vulnerabilidade dos ambientes.<br />
Fórum de discussão e negociação com a REAL Norte: fundando um Diálogo <strong>para</strong> a<br />
Sustentabilidade<br />
A demanda das entidades ambientalistas reunidas na REAL Norte (Rede de Entidades<br />
Ambientalistas do Litoral Norte), surgida como desafio, é uma importante oportunidade <strong>para</strong><br />
comunicar à região uma <strong>no</strong>va postura. Bem encaminhado, este fórum pode ser o primeiro<br />
passo prático numa estratégia de reposicionamento da empresa <strong>no</strong> quadro de conflitos<br />
ambientais regionais, colocando-se como uma parceira na promoção do Desenvolvimento<br />
Sustentável. Para que isso ocorra, há alguns pontos que podem ser destacados como questões<br />
estratégicas.<br />
De Ouvidoria a Comitê - A idéia original apresentada pelos ambientalistas foi de uma<br />
ouvidoria sobre o Projeto Mexilhão. Essa proposta continha um conjunto de demandas que,<br />
com pequenas adaptações, são não apenas assimiláveis mas de interesse <strong>para</strong> que se construa<br />
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visibilidade <strong>para</strong> linhas de gestão praticadas hoje pela empresa, mas ainda não percebidas<br />
amplamente na sociedade. Estas reivindicações foram as seguintes:<br />
- um processo de participação e acompanhamento das questões socioambientais do Projeto<br />
Mexilhão de Gás, com especial ênfase <strong>no</strong> debate público dos estudos de impacto ambiental,<br />
na construção de ações de mitigação, recuperação e compensação do mesmo, na transparência<br />
em relação aos programas ambientais e sócio-econômicos deste Projeto, e na garantia de<br />
procedimentos adequados de verificação e resposta às demandas da sociedade civil;<br />
- realização de uma Avaliação Ambiental Estratégica sobre o conjunto de projetos de grande<br />
porte anunciados <strong>para</strong> a região.<br />
O trabalho de negociação de conflitos desenvolvido nessa fase construiu um encaminhamento<br />
conjunto <strong>para</strong> a formatação desta idéia, com a redefinição do ambiente de acompanhamento a<br />
ser construído na forma de um Comitê, e não mais de uma instância externa como uma<br />
Ouvidoria. Uma Ouvidoria seria mais típica de uma situação em que se deve atuar como um<br />
tipo de fiscal de um empreendimento que se fecha à participação social. Não é o caso e isso<br />
não oferece ganhos à empresa, porque se<strong>para</strong> o mundo em “nós” ambientalistas e “eles” (a<br />
empresa) os desenvolvimentistas / geradores de impactos e riscos.<br />
Em contrapartida, um Comitê que incorpore claramente este conjunto inicial de demandas,<br />
reconhecendo que há temores e conflitos de opinião mas que o amplo esclarecimento e<br />
discussão de alternativas é objetivo comum, faz das iniciativas ações que encerram<br />
cooperação e resultados que poderão agregar valor <strong>para</strong> ambas as partes.<br />
Reposicionando a empresa: nós, sustentáveis, e os outros<br />
A Petrobras, por meio da Unidade de Negócios da Bacia de Santos e da Gerência Corporativa<br />
de S.M.S. (Saúde, Meio Ambiente e Segurança) de São Paulo e Centro-Oeste, desenvolveu<br />
sua atuação propondo <strong>para</strong> inclusão na pauta do Diálogo <strong>para</strong> a Sustentabilidade a discussão<br />
geral da presença da empresa na região, indo além portanto do acompanhamento apenas do<br />
<strong>no</strong>vo projeto que extrai gás em alto mar, transporta o produto por duto submari<strong>no</strong> <strong>para</strong> uma<br />
planta de tratamento em Caraguatatuba e depois, por um duto em túnel, sobe a Serra do Mar<br />
<strong>para</strong> encontrar o gasoduto já existente, em Taubaté.<br />
A empresa propôs que as discussões tivessem como foco também as atividades do Terminal<br />
de petróleo e derivados de São Sebastião, do qual saem linhas de dutos <strong>para</strong> quatro refinarias,<br />
e cujas instalações deverão ser expandidas em breve.<br />
Outro tema lembrado pelos representantes da empresa e apoiado pelos ambientalistas é o<br />
acompanhamento e a cooperação com as iniciativas de gestão ambiental em escala regional,<br />
em especial os trabalhos de implantação das Unidades de Conservação (parques, estações<br />
ecológicas, áreas de proteção ambiental).<br />
Um posicionamento importante foi a discussão do acesso futuro de outros atores regionais ao<br />
processo de Diálogo com o qual ambas as partes se comprometeram. Para resolver como<br />
organizar o acesso, garantindo que o processo não possa futuramente ser empalmado por<br />
oportunistas sem vínculo com os objetivos firmados, e ao mesmo tempo trabalhando <strong>para</strong><br />
envolver gradativamente gover<strong>no</strong>s locais, setores da administração estadual, outras empresas<br />
e entidades do terceiro setor, estabeleceu-se como um pré-requisito a adesão de cada <strong>no</strong>vo<br />
participante convidado a um compromisso com uma plataforma de Desenvolvimento<br />
Sustentável cuja referência são os conteúdos do relatório Nosso Futuro Comum.<br />
Aqui há um ponto importante: o que diferenciará <strong>no</strong> andamento dos trabalhos os que podem e<br />
os que não podem ser aceitos como parceiros será a adesão a este compromisso. A empresa se<br />
coloca nesse encaminhamento como um dos atores que irão zelar pelo compromisso com a<br />
Sustentabilidade. Evidentemente, dependerá das atitudes da empresa dar veracidade a esta<br />
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ANAIS<br />
posição inicial: mas a empresa está se candidatando – com aval dos ambientalistas - a ser um<br />
parceiro do desenvolvimento sustentável, e o Comitê de Diálogo é o núcleo fundador de uma<br />
coalizão regional <strong>para</strong> a Sustentabilidade, promovida pelo movimento ambientalista e pela<br />
empresa. Uma conquista inicial da maior importância <strong>para</strong> ambos.<br />
Acesso à informação: discutindo o RIMA, e o potencial <strong>para</strong> construção de parcerias<br />
Ambas as partes queriam fazer a discussão do RIMA ( Relatório de Impacto sobre o Meio<br />
Ambiente, que resume e consolida os conteúdos do EIA – Estudo de Impacto Ambiental.<br />
Ambas as peças informam o processo de licenciamento ambiental de grandes projetos). Era<br />
indispensável que esse encaminhamento fosse pactuado, já que o sistema da primeira<br />
audiência pública organizada pelo IBAMA (outubro de 2006) foi falho, gerando medo de<br />
manipulação.<br />
A alternativa construída com apoio da mediação de conflitos foi uma organização conjunta<br />
empresa - ambientalistas <strong>para</strong> este debate, o que deu lugar a várias sessões de discussões, com<br />
apresentação de solicitações de esclarecimentos e de sugestões de alterações de projeto,<br />
apresentadas diretamente aos técnicos da empresa e encaminhadas também ao órgão<br />
licenciador, o IBAMA.<br />
A dimensão central nesse campo de trabalhos é a construção de confiança. Em ambientes de<br />
conflito, o tratamento dado à informação é fundamental <strong>para</strong> haver confiança <strong>no</strong> processo. As<br />
partes podem ter visões diferentes sobre as questões, mas se houver garantia de acesso à<br />
informação, o processo de debate será percebido como legítimo e dará esperança de<br />
construção de <strong>no</strong>vas soluções pelo caminho do diálogo.<br />
Esse último aspecto serve <strong>para</strong> orientar os passos futuros <strong>no</strong> debate do RIMA: como serão<br />
tratados os pontos que surgirem desta avaliação conjunta, como idéias <strong>no</strong>vas ou divergentes<br />
sobre possíveis encaminhamentos das questões ligadas aos impactos ambientais do projeto<br />
Mexilhão, em suas partes terrestre e marítima?<br />
Em relação ao RIMA como peça <strong>para</strong> licenciamento, facilitar esclarecimentos ajuda a reduzir<br />
tensões <strong>no</strong> processo de audiências públicas que ainda ocorram. Os ambientalistas poderão<br />
fazer sugestões de encaminhamentos que o IBAMA incorporará ou não como exigências na<br />
licença. A empresa terá a opção de manifestar-se, apoiando ou questionando as propostas que<br />
venham a surgir nessa ocasião.<br />
A discussão pode propiciar também idéias de encaminhamentos que possam ser pactuados<br />
sem depender de exigências formais do órgão licenciador / fiscalizador. Iniciativas de gestão<br />
ambiental empresarial que vão além dos requisitos legais, <strong>no</strong> espírito do SGA ISO 14000, em<br />
que a conformidade legal é condição necessária mas não exclusiva <strong>para</strong> a definição da política<br />
ambiental da empresa.<br />
O Diálogo <strong>para</strong> a Sustentabilidade e o Centro de Desenvolvimento Sustentável do<br />
Litoral Norte <strong>paulista</strong><br />
A Petrobras e 12 (doze) Organizações Não Governamentais ambientalistas do <strong>litoral</strong> <strong>no</strong>rte<br />
<strong>paulista</strong> firmaram em julho de 2008 um convênio de cooperação pelo qual se põem de acordo<br />
com a estruturação conjunta do Comitê do Diálogo <strong>para</strong> a Sustentabilidade dessa região. A<br />
Universidade Católica de Santos participa na condição de responsável pela mediação dos<br />
conflitos, tendo desenvolvido uma estratégia de suporte ao diálogo, o Centro de<br />
Experimentação em Desenvolvimento Sustentável (CEDS).<br />
As atividades previstas <strong>para</strong> dois a<strong>no</strong>s de trabalho incluem sessões do Comitê de Diálogo, em<br />
que um dos temas de pauta será sempre a discussão das operações da empresa e dos<br />
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ANAIS<br />
correspondentes programas ambientais. Outra estratégia é a realização de Seminários<br />
temáticos <strong>para</strong> incorporar <strong>no</strong>vos atores nas discussões dos problemas socioambientais<br />
regionais.<br />
Está previsto o apoio a experimentos de econegócios, modelos inspirados nas idéias de Ignacy<br />
Sachs sobre ecodesenvolvimento, e a atividades de acompanhamento dos processos regionais<br />
de gestão ambiental.<br />
Pelo lado dos ambientalistas, surge a oportunidade de experimentar um <strong>no</strong>vo repertório ao<br />
lidar com o conflito. Tradicionais ferramentas do jogo de resistência e obstrução a projetos<br />
desenvolvimentistas dão lugar ao diálogo e à construção de entendimentos, em que as ONGs<br />
começam a tatear <strong>no</strong> campo desconhecido que é ser portador de um <strong>no</strong>vo tipo de valor<br />
potencial <strong>para</strong> os negócios: o reconhecimento de integrar uma iniciativa em prol da<br />
Sustentabilidade, numa região com atributos ambientais amplamente reconhecidos.<br />
Pelo lado da empresa, exploram-se caminhos <strong>para</strong> construir uma <strong>no</strong>va visibilidade positiva<br />
inacessível pelos métodos tradicionais da comunicação institucional. A <strong>no</strong>va postura combina<br />
alguns ingredientes básicos:<br />
garantia de acesso democrático à informação sobre riscos e impactos ambientais;<br />
garantia de acesso à informação e discussão sobre os procedimentos de gestão ambiental e<br />
sobre as alternativas decisórias em <strong>no</strong>vas operações;<br />
apoio à discussão sobre as prioridades regionais <strong>para</strong> um desenvolvimento sustentável;<br />
compromisso público com a gradativa adoção de práticas mais sustentáveis e com a<br />
excelência em gestão ambiental.<br />
O processo encerra um importante ganho <strong>para</strong> ambas as partes: equipes técnicas e militantes<br />
se capacitam mais, adquirem conhecimentos sobre <strong>no</strong>vas formas de abordagem <strong>para</strong> os temas<br />
em pauta. De um lado, o gerenciamento das operações com petróleo e gás e suas<br />
peculiaridades técnicas; do outro, o conhecimento das características dos ambientes regionais<br />
e de seus grupos huma<strong>no</strong>s. Em ambos os lados, gente especializada mas até certo ponto leiga<br />
<strong>no</strong>s enfoques adotados pelos demais atores.<br />
Há o compromisso explícito de agir respeitando a livre expressão das diferentes opiniões e<br />
interesses. A experiência é um foco de interesse geral, na medida em que representa um<br />
caminho alternativo <strong>para</strong> as perdas de energia que se podem constatar <strong>no</strong>s episódios<br />
recorrentes de disputas e impasses em tor<strong>no</strong> de licenciamentos ambientais de grandes obras,<br />
em regiões caracterizadas pela fragilidade e importância de seus ecossistemas. Caso se<br />
confirmem as melhores expectativas sobre o potencial de um processo de diálogo <strong>para</strong><br />
resolução pacífica de conflitos socioambientais, empresas, organizações do terceiro setor,<br />
entidades governamentais, terão <strong>no</strong>vas razões <strong>para</strong> trilhar o caminho das iniciativas<br />
voluntárias <strong>para</strong> melhoria do desempenho ambiental e <strong>para</strong> democratizar o acesso às<br />
informações.<br />
O tempo investido <strong>no</strong> debate dos projetos, nessa hipótese, deixa de ser um obstáculo<br />
burocrático e pode ser incorporado de outra forma <strong>no</strong>s pla<strong>no</strong>s de investimentos. Desenha-se<br />
uma alternativa estratégica: ao invés de impasses prolongados com desgaste de imagem,<br />
processos mais resolutivos com agregação de valor ambiental aos investimentos.<br />
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