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Alunos Surdos: Aquisição da Língua Gestual e Ensino da ... - Exedra

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A C T A S D O I E I E L P<strong>Alunos</strong> <strong>Surdos</strong>: <strong>Aquisição</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> <strong>Gestual</strong> e <strong>Ensino</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> Portuguesa<strong>Alunos</strong> <strong>Surdos</strong>: <strong>Aquisição</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> <strong>Gestual</strong> e <strong>Ensino</strong><strong>da</strong> <strong>Língua</strong> PortuguesaMaria Ma<strong>da</strong>lena Belo <strong>da</strong> Silveira BaptistaEscola Superior de Educação de CoimbraPalavras chaveSurdez - Educação Bilingue – <strong>Língua</strong> <strong>Gestual</strong> PortuguesaResumoA comunicação apresenta<strong>da</strong> visa realçar a importância <strong>da</strong> exposição precoce <strong>da</strong>criança sur<strong>da</strong> Portuguesa à <strong>Língua</strong> <strong>Gestual</strong> Portuguesa (sua língua natural), e evidenciarmetodologias específicas para o ensino <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> Portuguesa na sua vertente oral eescrita. Para o efeito, começaremos por explicitar os princípios <strong>da</strong> educação bilingueno que respeita à criança sur<strong>da</strong> e só depois passaremos a fazer referência à <strong>Língua</strong><strong>Gestual</strong> Portuguesa (LGP) e ao ensino <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> Portuguesa. No primeiro ponto destacomunicação, denominado de surdez e bilinguismo, explicitamos os pressupostosde uma educação bilingue. No ponto imediatamente a seguir, falamos do processode aquisição <strong>da</strong> LGP em crianças sur<strong>da</strong>s e tentamos desmistificar alguns mitos queain<strong>da</strong> persistem em relação a esta língua de mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>de visuo-manual. Finalizamos,fazendo referência à aprendizagem <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> Portuguesa por parte <strong>da</strong> criança sur<strong>da</strong>e interligando os aspectos <strong>da</strong> orali<strong>da</strong>de com questões de leitura e escrita. Para oefeito, propomos cinco finali<strong>da</strong>des essenciais e enquadramos objectivos e activi<strong>da</strong>descorrespondentes a ca<strong>da</strong> uma dessas finali<strong>da</strong>des.IntroduçãoA linguagem permite à criança aprender o que não é imediatamente evidente edesempenha um papel central no pensamento e no conhecimento. No caso <strong>da</strong> surdeza consequência imediata para a criança será o comprometimento a nível <strong>da</strong> aquisiçãoespontânea <strong>da</strong> linguagem oral uma vez que não recebe, ou tem dificul<strong>da</strong>de em recebero feed back auditivo.197


exedra • 9 • Março de 2010dos gestos através de relações espaciais, estabeleci<strong>da</strong>s pelo movimento ou outrosrecursos linguísticos2. A estrutura <strong>da</strong>s línguas gestuais não é modela<strong>da</strong> na sintaxe e morfologia <strong>da</strong>slínguas orais, possuiu uma gramática própria, rica e complexa. As línguas gestuais sãoindependentes <strong>da</strong>s línguas fala<strong>da</strong>s;3. A ideia de que as LG’s são uma representação icónica dos seus referentesé erra<strong>da</strong>. Os aspectos icónicos ou pictográficos de gestos individuais não são oaspecto mais significativo <strong>da</strong> sua estrutura e do seu uso. A maior parte dos gestossão arbitrários, ou seja, não representam associações ou semelhanças visuais com oreferente. Forças linguísticas e sóciolinguísticas tendem a inibir a natureza icónica dosgestos, tornando-os mais arbitrários com o passar do tempo. Além disso, processosgramaticais regulares tendem a suprir relações icónicas.4. As LG’s não são universais. Ca<strong>da</strong> país possui a sua própria LG. Uma línguagestual estrangeira não é transparente para um surdo que use outra LG. As mesmasrazões que explicam a diversi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s línguas fala<strong>da</strong>s aplicam-se à diversi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>slínguas de sinais. Ca<strong>da</strong> país apresenta a sua respectiva LG. Factores geográficos eculturais são influentes e determinantes na mu<strong>da</strong>nça histórica do gesto;5. As LG’s não são realiza<strong>da</strong>s através <strong>da</strong> soletração. Existe um gesto para ca<strong>da</strong>conceito. O alfabeto gestual é um sistema manual distinto <strong>da</strong> LG que consiste nasoletração com a mão no ar, e em distintas configurações, do abcedário. Tem porfinali<strong>da</strong>de fazer a ponte com a língua oral em situações específicas, como, por exemplo,a gestualização de palavras para as quais ain<strong>da</strong> não existe um gesto específico. Ca<strong>da</strong>país possui o seu próprio alfabeto.Estando esclarecido o estatuto linguístico <strong>da</strong>s diferentes línguas gestuais, e muitoconcretamente no caso português, o estatuto <strong>da</strong> LGP, reconhecido desde 1997 naconstituição portuguesa, importa agora voltar a referir que as crianças sur<strong>da</strong>s, postasnum ambiente onde o input em língua gestual é fornecido em quanti<strong>da</strong>de suficiente ecom a quali<strong>da</strong>de espera<strong>da</strong>, adquirem esta língua de forma espontânea, natural e similarao modo como as crianças ouvintes adquirem a sua língua materna oral. Assim, sendo<strong>da</strong><strong>da</strong> a oportuni<strong>da</strong>de às crianças de gestualizarem e verem os gestos em movimento,isto é, falarem e “ouvirem” falar em LG elas irão adquirir e desenvolver a linguagem,obedecendo aos mesmos parâmetros linguísticos de evolução de qualquer criança queadquire uma língua oral.3 - O <strong>Ensino</strong> do Português como Segun<strong>da</strong> <strong>Língua</strong>A língua oral ou escrita será trabalha<strong>da</strong> segundo os princípios <strong>da</strong> aprendizagem deuma segun<strong>da</strong> língua. Assim, a LG é o objectivo e o meio facilitador <strong>da</strong> aprendizagemem geral, providenciando ao surdo uma base para a aprendizagem de uma segun<strong>da</strong>língua.Os resultados de alguns estudos, incidindo maioritariamente em crianças sur<strong>da</strong>sfilhas de pais surdos e inseri<strong>da</strong>s em experiências educativas bilingues (língua de200


<strong>Alunos</strong> <strong>Surdos</strong>: <strong>Aquisição</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> <strong>Gestual</strong> e <strong>Ensino</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> PortuguesaFinali<strong>da</strong>de 3: Descoberta <strong>da</strong> existência de letrasObjectivos: Levar a criança a perceber que as letras são representaçõesgráficas de enti<strong>da</strong>des motoras.Ensinar de forma sistematiza<strong>da</strong> a decifrar, isto é, a transformar sequênciasde letras em significadosACTIVIDADES/ESTRATÉGIAS• Utilizar o alfabeto manual associando-o à letra correspondente de formanatural e contextualiza<strong>da</strong>• Fazer exercícios de discriminação visual <strong>da</strong>s características gráficas <strong>da</strong>sletras (semelhanças e diferenças)• Fazer exercícios de consciencialização dos movimentos articulatórios queestão na base de determinado som (leitura labial) 1• Fazer exercícios de decifração visual, isto é, transformar sequências deletras em significados.Nota: O domínio do alfabeto manual e a acesso rápido à correspondênciagesto/letra tem para a criança sur<strong>da</strong> a mesma importância que a automatização <strong>da</strong>correspondência letra/som tem para a criança ouvinte.Enquanto o processo de decifração não estiver automatizado, a compreensãotextual estará fortemente comprometi<strong>da</strong>, pois é a rapidez de acesso ao significado <strong>da</strong>palavra escrita que permite o processamento <strong>da</strong> frase em que a palavra se insere.203


exedra • 9 • Março de 2010Finali<strong>da</strong>de 4: Compreensão de estruturas gramaticais simples e complexasdentro de um textoObjectivo: Tomar consciência que a reali<strong>da</strong>de pode ser representa<strong>da</strong> atravésdo código escrito, nomea<strong>da</strong>mente, através de estruturas frásicas simplese complexas.ACTIVIDADES/ESTRATÉGIAS• Introduzir frases simples afirmativas e negativas (sujeito-verbo eatributo).• Introduzir as regras de concordância género/número.• Explicitar regras gramaticais simples.• Introduzir estruturas gramaticais mais complexas (sujeito-verbo-atributoe complementos (não necessariamente nesta ordem).• Introduzir o significado de pronomes interrogativos mais frequentes:Quem, como, onde, o quê, quando, quantos, porquê?...• Introduzir textos que contenham as estruturas anteriormente trabalha<strong>da</strong>s.Nota: Devem ser utiliza<strong>da</strong>s metodologias do ensino do Português onde setenha em atenção:a contextualização <strong>da</strong>s situações e <strong>da</strong> informação1 - a utilização de frases que respeitem as quali<strong>da</strong>des exigíveis na construção deuma frase correcta: uni<strong>da</strong>de, clareza e concisão2 - a importância do desenvolvimento vocabular numa aprendizagem harmoniosacuja sequência vá do concreto ao abstracto3 - a importância dos materiais de apoio, em particular textos correctamenteconstruídos, que respeitem na íntegra os factores <strong>da</strong> textuali<strong>da</strong>de, nomea<strong>da</strong>mentea adequação a ca<strong>da</strong> nível etário, tendo em vista a aceitabili<strong>da</strong>de que decorre <strong>da</strong>quanti<strong>da</strong>de, quali<strong>da</strong>de, pertinência e modo4 - a importância de se utilizar com rigor, em contexto escolar, o textoexplicativo, objectivo, em que os diversos componentes e as suas ligações lógicasestejam claramente explicitados.Os processos didácticos a utilizar deverão ser semelhantes aos de ensino deuma língua segun<strong>da</strong> (L2) para os alunos ouvintes.A LG e a língua escrita devem ser trabalha<strong>da</strong>s de modo a pôr em evidência assemelhanças e as diferenças estruturais de ambas.204


exedra • 9 • Março de 2010Reflexões finaisAo longo <strong>da</strong> comunicação pretendemos expor a filosofia <strong>da</strong> educação bilingue <strong>da</strong>criança sur<strong>da</strong> e como a mesma poderá e deverá ser implementa<strong>da</strong>. Esta filosofia só seráviável em contextos onde haja pessoas que utilizem a LGP, contextos escolares ondeexistam educadores e professores especializados, professores de LGP e Intérpretes deLGP.A LGP é uma área relativamente recente, tornando-se necessário que se realizemestudos psicolinguísticos e linguísticos ca<strong>da</strong> vez mais diversificado e aprofun<strong>da</strong>dospara que deste modo se possa contribuir para uma didáctica do ensino <strong>da</strong> LGP combases sóli<strong>da</strong>s.Embora advogando a filosofia de educação bilingue, reconhecemos que asocie<strong>da</strong>de é maioritariamente ouvinte e desconhecedora <strong>da</strong> LGP, que nem sempre épossível comunicar em todos os contextos utilizando apenas a escrita e que existemsituações onde o professor de LGP e o intérprete de LGP não estão presentes, pelo queestratégias como a leitura labial 4 e o treino auditivo devem continuar a fazer parte dosplanos de estimulação linguística <strong>da</strong> criança sur<strong>da</strong>. É extremamente importante que oadulto tenha presente a necessi<strong>da</strong>de de falar com a criança ao mesmo nível, de formaa facilitar todo o processo de leitura labial. A leitura labial exige um esforço muitogrande, tanto ao nível de atenção e concentração, como de activi<strong>da</strong>de mental parareconstruir as mensagens. Não é possível pedir a um aluno surdo que siga indicaçõesexpositivas durante muito tempo, sem outros apoios visuais para além <strong>da</strong> cara doeducador/professor. A fim de facilitar o processo de leitura labial, o professor deveráter a preocupação de explicar o significado de novas palavras, escrevendo a palavra etendo o cui<strong>da</strong>do de estar virado para a criança quando está a ler ou a falar sobre o queescreveu no quadro. Deverá recorrer a estratégias visuais (posters, textos, esquemas,desenhos), preocupar-se com as condições de visibili<strong>da</strong>de e colocar a criança perto desi. O professor deve ter sempre presente a ideia que se a criança não estiver a olharpara quem fala não irá ter acesso à informação uma vez que a sua forma de apreensão<strong>da</strong> língua oral se processa essencialmente através do canal visual. O treino auditivopode aju<strong>da</strong>r a criança a discriminar e percepcionar alguns sons do meio ambiente quepodem servir de alerta e constituir uma maior segurança para a criança que, apesar desur<strong>da</strong>, possui alguns resíduos auditivos.4 Activi<strong>da</strong>de que está integra<strong>da</strong> na filosofia de educação bilingue mas que nem sempreé muito valoriza<strong>da</strong>.206


<strong>Alunos</strong> <strong>Surdos</strong>: <strong>Aquisição</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> <strong>Gestual</strong> e <strong>Ensino</strong> <strong>da</strong> <strong>Língua</strong> PortuguesaBibliografiaBaptista, M. (1999). Alguns aspectos lexicais e morfo-sintácticos <strong>da</strong> língua gestualportuguesa. Tese de mestrado em psicolinguística, Facul<strong>da</strong>de de Letras <strong>da</strong>Universi<strong>da</strong>de de Lisboa, Lisboa.Baptista, M. (2005). Desenvolvimento <strong>da</strong> linguagem oral em crianças sur<strong>da</strong>s prélinguísticascom implantes cocleares. Tese de doutoramento em ciências <strong>da</strong>educação, Universi<strong>da</strong>de Católica de Lisboa, Lisboa.Lourenço, L. (2005). A aprendizagem <strong>da</strong> compreensão de leitura. In I. Sim-Sim (Org.),.A criança sur<strong>da</strong>: contributos para a sua educação, Lisboa, Fun<strong>da</strong>ção CalousteGulbenkian.Sim-Sim, I. (2005). O ensino do português escrito aos alunos surdos na escolari<strong>da</strong>debásica. In I. Sim-Sim (Org.), A criança sur<strong>da</strong>: contributos para a sua educação,Lisboa, Fun<strong>da</strong>ção Calouste Gulbenkian.Sim-Sim, I. (2005). A aprendizagem <strong>da</strong> linguagem escrita pela criança sur<strong>da</strong>. In I.Sim-Sim (Org.), A criança sur<strong>da</strong>: contributos para a sua educação, Lisboa,Fun<strong>da</strong>ção Calouste Gulbenkian.207


exedra • 9 • Março de 2010208

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