20REGIÃO ECONÓMICADINHEIRO & NEGÓCIOS> PROGRAMA ESPECIAL <strong>DE</strong> INSPECÇÕES APRESENTADO PELA “TROIKA”Caixas Agrícolascom solidez e saúde Cinco caixas agrícolas do distrito de Bejamanifestaram esta semana notória satisfaçãocom os resultados globais do ProgramaEspecial de Inspecções realizado comoparte das medidas e acções acordadaspelas autoridades portuguesas, relativamenteao sistema financeiro, no âmbito doPrograma de Assistência Económica e Financeiraestabelecido com o FMI, a UniãoEuropeia e o Banco Central Europeu.Segundo um comunicado divulgadopelas caixas do Guadiana Interior; Beja eMértola; Aljustrel e Almodôvar; Ferreirado <strong>Alentejo</strong>; e São Teotónio, as conclusõespara o Crédito Agrícola deste Programa Especialde Inspecções “vieram confirmar asolidez financeira do grupo e a boa saúdeque apresenta para enfrentar as condiçõesparticularmente complexas da actual conjuntura”.Refira-se que este programa de inspecçõesabrangeu os oito maiores gruposbancários portugueses, incluindo o GrupoCrédito Agrícola, e teve como objectivo “validaros dados sobre risco de crédito utilizadosna avaliação da sua solidez financeira”.A mesma fonte adianta que, em todo opaís, a “troika” avaliou créditos no valor de8,6 mil milhões de euros, cobrindo a totalidadeda carteira de crédito do Grupo CréditoAgrícola.“A avaliação concluiu ser adequado ovalor global da imparidade registada nascontas consolidadas do grupo, sendo queo impacto agregado dos resultados do ProgramaEspecial de Inspecções na avaliaçãoda solvabilidade do grupo traduziu senuma ligeira diminuição do rácio de Tier1 de 11,6% para11,5%, mantendo-se acimados mínimode 8% exigidonaquela data”,esclarecem ascaixas agrícolasbaixo-alentejanas.Refira-se que o CréditoAgrícola “mantém um elevado patamarde segurança” em matériade liquidez, o que resulta de um ráciode transformação que se situa“em cerca de 90%”.Caracterizado como banca de relação, oGrupo Crédito Agrícola, que comemorouno ano de 2011 o seu centenário, está, segundaa fonte contactada pelo “CA”, “muitoenraizado nas comunidadeslocais, onde participaactivamente no desenvolvimentosocioeconómico”,nomeadamente no distritode Beja.Esse trabalho está a serdesenvolvido, “não só atravésda comercialização dosseus produtos e serviços,como no apoio a iniciativas deâmbito social e de cooperação económica,abrangendo instituições humanitárias,de solidariedade social, escolares,autarquias e todo o tecido empresarial”.“Esta postura, aliada a carteira menosexposta ao risco, colocou o grupo numaposição bastante confortável no mercadobancário”, conclui o comunicado.pub.APOIO À DIVULGAÇÃO
2012.01.06opinião21>análise> opiniãoMARIANA MAIA <strong>DE</strong> OLIVEIRAestudante do Ensino SuperiorA GAvetAEm todas as casas, creio, existe sempreum compartimento – desde uma modestagaveta até uma divisão completa– que se destina a armazenar indefinidamenteas coisas cuja existência decidimospassar a ignorar. Sótãos arredados dotrânsito quotidiano da vida, caves obscurascheias de uma indiferença húmida,armários bafientos atulhados de coisassem préstimo, gavetas sem fundo queacumulam diligentemente os despojos daexistência. Terras de ninguém, fragmentosdesordenados de passado que vivem prisioneirosde si mesmos. Coisas moribundasque continuam a respirar a respiraçãoque prenuncia uma morte cronicamenteiminente.Todas as casas, creio, ou todos os ajuntamentosfuncionais de pessoas que vivemcomummente as suas vidas, têm essanecessidade quase orgânica de uma sítioonde possam armazenar a sua transpiração.Talvez que essa necessidade venha deum pavor igualmente orgânico de atraiçoara memória, como se ela, no fim de contas,se consubstanciasse nesses objectosvelhos, fúteis e decapitados que o decorrernatural da vida vai deixando para trás. Eles,os objectos, são também vítimas absolutamenteinocentes da nossa incapacidade decometer uma eutanásia atempada – agora,encerrados nos seus cubículos de inutilidade,sabem eles, sabemos nós, que nãopoderão jamais abandonar esse túmulocaseiro. Perderam irreversivelmente o seucontexto. São coisas não resolvidas mas inteiramentepassadas, perderam a validadee chegaram por engano ao presente, e perdemosnós a disponibilidade para lhes daralgum sentido. As coisas que estão verdadeiramentena Gaveta são, por definição,aquelas que não têm nenhuma perspectivade sair dela.A Gaveta acumula inconscientementeas partes mal resolvidas de nós. É nela quedepositamos as coisas incómodas que, assimafastadas para longe da vista, procuramoslevar para longe do coração (ou, pelomenos, da porção dele que se encarrega delidar com estes aborrecimentos colateraisa existir). Nela sepultamos aquilo que nãoqueremos que se intrometa mais nos caminhosandáveis de todos os dias, mas a quetambém não queremos perder o direito deacesso; as coisas absolutamente inúteisque obstinadamente queremos que continuema ser inutilmente nossas. Basta-nosa certeza simples de que esses resquíciosde passado continuam lá, imóveis nessaGaveta eterna para que os acometemos,presos nesse limbo indeciso que não é on-A profundidade da Gaveta, creio, ultrapassa em tanto a nossa capacidadede compreensão que a ideia dela nos aparece com a simplicidadeterna e quase infantil com que sempre vêm embrulhadas as coisas queimportam verdadeiramente.tem, nem hoje, nem amanhã; é um nuncamais mascarado de talvez.A Gaveta, por vezes, extravasa com insolênciaos limites físicos da divisão quelhe estava destinada e, quase sem repararmos,apodera-se do espaço que era o nosso.Como uma infecção temporariamentesem cura, invade-nos perfidamente sob aforma mais frequente de uma desarrumaçãodescuidada, e engole-nos, perversa,dentro do seu próprio caos. É possível que,nem sempre mas muitas vezes, a desarrumaçãoexterna e palpável do espaço ànossa volta traduza a nossa própria desarrumaçãointerior; e o sentido desta relaçãode causalidade duvidosa, caso ela exista,é de igualmente duvidosa determinação.Damos por nós imersos num volume sufocantede coisas por decidir, papéis e objectosque gravitam pacientemente de umlocal para outro à espera que saibamos oque fazer com eles (ou, pelo menos, à esperaque queiramos encarar o facto determos que decidir o que fazer com eles).Enquanto isso a desarrumação cresce,ininterrupta, como um organismo vivo aque vamos tacitamente tolerando a (co)existência. Talvez saibamos intimamenteque a causa de tudo é uma espécie de qualquercoisa entre a cobardia e a dificuldadeem lidar com as noções de transitório edefinitivo, ou uma vontade infinita de nãoquerer entender que existe uma diferençaentre os dois. Bem que podíamos fazerhoje, de facto, o que é para amanhã; maso depois de amanhã alicia-nos sedutoramentecom a certeza de que um perpétuosuceder de amanhãs vai eternamente justificara nossa inércia.Temos, de resto, a consolação reconfortantede suspeitar que certos sítios, certascoisas, certos recantos deliberadamenteignorados, são assim porque é assim quetêm exactamente de ser. Caves, sótãos, escritórios,armários; Gavetas eternamentepor arrumar cujo único propósito é o deestar perpetuamente em arrumação, porqueacaso algum dia estivessem definitivamentearrumados deixariam de ter razãopara existir. Sítios cuja identidade é exactamenteessa: uma enormíssima e indolenteindefinição.A profundidade da Gaveta, creio, ultrapassaem tanto a nossa capacidade decompreensão que a ideia dela nos aparececom a simplicidade terna e quase infan-til com que sempre vêm embrulhadas ascoisas que importam verdadeiramente. Ascoisas que lá estão dentro esperam pacientementepor uma ciclicidade que talveznunca mais venha, pelo menos a tempo dedarmos por ela; a Gaveta é um repositórioque obedece a uma certa estrutura circularque em nós desconhecemos, como umdesígnio oculto que cumprimos sem compreender.É amanhã – é amanhã que abrimos aGaveta e a despojamos dos monstros quelá estão dentro. Amanhã mesmo é que arevolvemos de alto a baixo para escrutinaruma por uma todas as inutilidade guardadasdesde sabe-se lá quando, todas as coisasincómodas que nos ferem só na ideiade termos que encará-las; é amanhã. Edesta inabalável convicção que temos hojesó será capaz de nos demover a convicçãoainda mais inabalável que teremos amanhã,e dessa só a que virá no outro dia, eassim sucessivamente até que esse ímpetorevolucionário acabe, como os demais, poresmorecer molemente nos interstícios dosdias. Ladram os cães de nós – e sempre acaravana acaba por passar. A linha do tempo,que se conheça, permanece impassívele horizontal perante estas contendas infantiscom um passado por concluir.Na Gaveta, de resto, por entre a tralhaescusada e parasitária, há-de haver tambémguardado algum pedaço antigo denós. Estimemo-la ao menos por isso, como respeito devido a essa generosidadecúmplice de quem guarda desinteressadamentebocados do que já fomos, para queassim, libertos, voltemos a poder ser mais.Quem julga não ter Gavetas, creio, certamentenão conhece a sua Casa.