Vol. 08 N. 03 set/<strong>de</strong>z 2010<strong>de</strong>nunciar o frame evocado. A FrameNet traz ex<strong>em</strong>plosanotados para o verbo to blame como evocador apenasdo frame Judgment.(8) And [youCOGNIZER] can’t blame [him EVALUEE ] [forbeing frightened.REASON]O verbo to accuse, segundo a FrameNet, po<strong>de</strong>evocar três frames: Judgment, Judgment_communicatione Notification_<strong>of</strong>_charges. Comono caso do verbo to blame, a diferença entre os framesJudgment e Judgment_communication é apenasuma questão <strong>de</strong> comunicar ou não o <strong>julgamento</strong>. A FrameNet,no entanto, apresenta ex<strong>em</strong>plos anotados apenaspara o frame Judgment_communication:(9) Now [sheCOMMUNICATOR] was accusing [me EVALUEE ]in front <strong>of</strong> a stranger.Outro frame evocado pelo verbo to accuse éNotification_<strong>of</strong>_charges. Po<strong>de</strong>-se perceber quehá uma diferença dos frames Judgment e Judgment_communication para o frame Notification_<strong>of</strong>_charges: a linguag<strong>em</strong> jurídica. Como evocador do frameNotification_<strong>of</strong>_charges, o verbo to accuse é umtermo jurídico.(10) [A witness at the trial <strong>of</strong> two men ACCUSED]accused [<strong>of</strong> the mur<strong>de</strong>r <strong>of</strong> a police informerCHARGES ] [...].<strong>Os</strong> frames s<strong>em</strong>ânticos po<strong>de</strong>m captar a diferença<strong>de</strong> sentido <strong>de</strong> uma mesma palavra. No entanto, a seçãoseguinte analisa, a partir da análise contrastiva dos <strong>verbos</strong><strong>de</strong> <strong>julgamento</strong> <strong>em</strong> inglês e português, questões linguísticasque <strong>de</strong>v<strong>em</strong> ser efetivamente <strong>de</strong>scritas para subsidiar aconstrução <strong>de</strong> léxicos computacionais multilíngues maisrefinados.<strong>Os</strong> <strong>verbos</strong> <strong>de</strong> <strong>julgamento</strong> no portuguêsConforme o quadro 1, dos onze <strong>verbos</strong> inicialmente<strong>de</strong>scritos por Fillmore (1971) como <strong>verbos</strong> <strong>de</strong> <strong>julgamento</strong>,apenas cinco <strong>de</strong>les faz<strong>em</strong> parte do frame Judgment ou <strong>de</strong>frames relacionados, como os frames Judgment_communicatione Judgment_direct_adress. Esses<strong>verbos</strong> são: to accuse, to blame, to criticize, to praise eto scold. Para fins <strong>de</strong> <strong>de</strong>limitação da abrangência <strong>de</strong>stetrabalho, a análise se restringe aos <strong>verbos</strong> evocadores dosframes Judgment e Judgment_communication: toaccuse, to blame, to criticize e to praise.Em primeiro lugar, buscam-se os equivalentes<strong>de</strong> tradução <strong>em</strong> dicionários bilíngues. Essa etapa inicialmostra a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>finir com precisão umequivalente <strong>de</strong> tradução. Em segundo lugar, as entradas<strong>de</strong> dicionários monolíngues são comparadas. O objetivo<strong>de</strong>ssa etapa é <strong>de</strong>monstrar que a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se encontrarum equivalente <strong>de</strong> tradução está diretamente ligada à falta<strong>de</strong> sobreposição entre os significados <strong>de</strong> uma palavra e <strong>de</strong>seu equivalente <strong>de</strong> tradução. Por fim, a análise contrastivabusca encontrar <strong>em</strong> um corpus paralelo os pontos <strong>de</strong>dificulda<strong>de</strong> para a tradução dos <strong>verbos</strong> <strong>de</strong> <strong>julgamento</strong> eexplicá-los com base na S<strong>em</strong>ântica <strong>de</strong> Frames.Este trabalho segue a metodologia aplicada porFillmore e Atkins (2000) no estudo da poliss<strong>em</strong>ia doverbo to crawl. Nesse artigo, Fillmore e Atikins analisamas entradas do verbo to crawl <strong>em</strong> dicionários <strong>de</strong>língua inglesa, comparam a <strong>de</strong>finição apresentada pelosdicionários com contextos extraídos do National BritishCorpus. O passo seguinte à busca por equivalentes<strong>de</strong> tradução <strong>em</strong> dicionários bilíngues inglês-francês éverificar o nível <strong>de</strong> sobreposição entre os significadosentre o inglês e o francês.Este segue a metodologia aplicada por Fillmore eAtikins (2000). Em primeiro lugar, i<strong>de</strong>ntificam-se equivalentes<strong>de</strong> tradução <strong>em</strong> português para os <strong>verbos</strong> to accuse,to blame, to criticize e to praise. Nessa etapa, são usadosdiferentes dicionários bilíngues inglês-português. Emsegundo lugar, i<strong>de</strong>ntificam-se, com o auxilio <strong>de</strong> dois dicionáriosmonolíngues, um <strong>em</strong> inglês e outro <strong>em</strong> português,os diferentes significados dos <strong>verbos</strong> <strong>em</strong> estudo nas duaslínguas. A partir da i<strong>de</strong>ntificação dos diferentes padrões <strong>de</strong>poliss<strong>em</strong>ia nas duas línguas, comparam-se os equivalentes<strong>de</strong> tradução apresentados pelos dicionários com os equivalentes<strong>de</strong> tradução obtidos com o corpus COMPARA.Significado e equivalência <strong>de</strong> tradução<strong>Os</strong> dicionários bilíngues são, há muito t<strong>em</strong>po, utilizadoscomo fonte <strong>de</strong> equivalentes <strong>de</strong> tradução, auxiliandonão somente o trabalho do tradutor, mas sendo utilizadospara ativida<strong>de</strong>s pedagógicas e para <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>recursos computacionais multilíngues. O Quadro 2 mostraum comparativo entre diferentes dicionários bilíngues eos equivalentes <strong>de</strong> tradução apresentados por esses dicionáriospara os <strong>verbos</strong> to accuse, to blame, to criticizee to praise. São utilizados nesse quadro comparativo osdicionários Dicionário Oxford Escolar para EstudantesBrasileiros <strong>de</strong> Inglês (DOE, 1999), Michaelis DicionárioIlustrado (MDI, 2005), Harper Collins Portuguese concisedictionary (CPD) (Whitlam et al., 2001) e o Dicionárioinglês-português (DIP) (Martins, 1977).Estabelecer os significados <strong>de</strong> uma palavra <strong>em</strong> umdicionário monolíngue não é uma tarefa simples. Ao secomparar dicionários bilíngues, como no Quadro 2, po<strong>de</strong>sever que encontrar um equivalente <strong>de</strong> tradução exatopara uma <strong>de</strong>terminada palavra é ainda mais complicado.Alguns dicionários bilíngues são mais sucintos, outroselencam significados por números. Enquanto dicionários<strong>Os</strong> <strong>verbos</strong> <strong>de</strong> <strong>julgamento</strong> <strong>em</strong> inglês e português: o que a análise contrastiva po<strong>de</strong> dizer sobre a S<strong>em</strong>ântica <strong>de</strong> Frames 217
CalidoscópioQuadro 2. Verbos <strong>de</strong> <strong>julgamento</strong>s <strong>em</strong> dicionário bilíngues.Chart 2. Verbs <strong>of</strong> judgment in bilingual dictionaries.AccuseBlamecriticizePraiseDOE MID CPD DIPacusar alguém (<strong>de</strong> algo)culparcriticar1. elogiar2. louvar1. acusar, <strong>de</strong>nunciar2. censurar, repreen<strong>de</strong>r1. acusar, consi<strong>de</strong>rarresponsável, responsabilizar2. censurar, repreen<strong>de</strong>r1. <strong>de</strong>saprovar, criticar,censurar2. Julgar, fazer crítica1. louvar, aplaudir, elogiar2. glorificar, exaltar.Acusarculpar alguém poralgo; ter a culpaCriticarelogiar, louvaracusar, culpar,incriminar; atraiçoar,<strong>de</strong>nunciar.culpar, censurar,repreen<strong>de</strong>r; acusar;vituperar.criticar, censurar,comentar.louvar, elogiar,glorificar, exaltar;preconizar.compactos procuram apresentar um número reduzido<strong>de</strong> equivalentes <strong>de</strong> tradução, dicionários mais extensosapresentam um conjunto <strong>de</strong> sinônimos como equivalentes<strong>de</strong> tradução.Uma explicação possível para essa falta <strong>de</strong> correspondênciaentre os dicionários bilíngues po<strong>de</strong> serencontrada nos dicionários monolíngues. Por meio <strong>de</strong>comparação das entradas do Oxford American Dictionary(OAD, 2003) e do Dicionário Houaiss da LínguaPortuguesa (Houaiss e Villar, 2009), po<strong>de</strong>-se ver queos significados dos equivalentes <strong>de</strong> tradução não sãocorrespon<strong>de</strong>ntes. Embora o verbo acusar seja equivalente<strong>de</strong> tradução <strong>de</strong> to accuse, o Quadro 3 mostra, pormeio <strong>de</strong> comparação entre o OAD e o Houaiss, que ossignificados para ambos os <strong>verbos</strong> nas duas línguas nãosão correspon<strong>de</strong>ntes. <strong>Os</strong> significados 5 e 6 são metafóricos,e não encontram um significado correspon<strong>de</strong>mno verbo <strong>em</strong> inglês.Outro ex<strong>em</strong>plo <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> correspondência entreos significados dos itens lexicais <strong>em</strong> inglês e português éo caso dos <strong>verbos</strong> to praise e elogiar. Enquanto o OADapresenta dois significados para o verbo to praise, oHouaiss apresenta apenas um significado para o verboelogiar, equivalente <strong>de</strong> tradução do verbo to praise.Ou seja, o significado 1 do verbo to praise t<strong>em</strong> comoequivalente <strong>de</strong> tradução elogiar, porém o significado 2t<strong>em</strong> como equivalente <strong>de</strong> tradução o verbo glorifi car,louvar. Ou seja, os significados dos itens lexicais <strong>em</strong>português e inglês não são totalmente correspon<strong>de</strong>ntes.Essa falta <strong>de</strong> correspondência no nível conceitual daslínguas provoca dificulda<strong>de</strong>s para a tradução.Reflexões a partir da análise <strong>de</strong> corpusA presente seção discute os pontos que a S<strong>em</strong>ântica<strong>de</strong> Frames, como teoria s<strong>em</strong>ântica aplicada à criação <strong>de</strong>léxicos computacionais multilíngues, po<strong>de</strong> ser ampliada.Para tanto, parte-se da análise contrastiva dos <strong>verbos</strong> toaccuse, to blame, to criticize e to praise com base no corpusparalelo 4 COMPARA (Frankenberg-Garcia e Santos,2002). O COMPARA é um corpus paralelo bidirecionalportuguês-inglês e português-inglês, contendo textosoriginais nas duas línguas e suas respectivas traduções(http://193.136.2.104/COMPARA/). A atual versão doCOMPARA utilizada neste estudo apresenta 1.435.926palavras do português, 1.542.762 palavras do inglês e97.723 unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> alinhamento 5 .<strong>Os</strong> resultados obtidos através do COMPARA sãoorganizados <strong>em</strong> três partes. Em primeiro lugar, são apresentadosos casos <strong>em</strong> que o equivalente <strong>de</strong> tradução <strong>em</strong>português apresenta uma correspondência exata com overbo <strong>em</strong> inglês. Nessa primeira etapa são consi<strong>de</strong>radosapenas os alinhamentos que o verbo <strong>em</strong> inglês apresentacomo equivalente <strong>de</strong> tradução um verbo no português.Em segundo lugar, são apresentados os casos maiss<strong>of</strong>isticados <strong>de</strong> tradução. Nessa etapa são apresentadostanto casos que inclu<strong>em</strong> apenas a mudança da classegramatical, ou seja, um verbo que apresenta como equivalente<strong>de</strong> tradução um substantivo, como casos maisrefinados <strong>de</strong> tradução, que inclu<strong>em</strong> a tradução <strong>de</strong> umverbo através do uso <strong>de</strong> uma expressão idiomática. Porfim, parte-se dos <strong>verbos</strong> <strong>em</strong> português e i<strong>de</strong>ntificam-seos equivalentes <strong>em</strong> inglês.4Segundo Teubert (1996), um corpus paralelo é um corpus bilíngue ou multilíngue que contém um grupo <strong>de</strong> textos <strong>em</strong> duas ou mais línguas. Esse corpus,para ser paralelo, necessita apresentar textos traduzidos, caso contrário, não haverá paralelismo entre os textos das diferentes línguas que compõ<strong>em</strong> o corpus.5O alinhamento diz respeito às unida<strong>de</strong>s do texto original que são alinhadas à tradução. Essas unida<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>m ser o texto, o parágrafo, a sentençaou a palavra. Para maiores informações sobre o alinhamento no COMPARA ver Frankenberg-Garcia (2003).218An<strong>de</strong>rson Bertoldi, Rove Luiza <strong>de</strong> Oliveira Chishman, Hans C. Boas