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uma dimensão formativa no serviço social - capes

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SULFACULDADE DE SERVIÇO SOCIALPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIALDOUTORADOROSA MARIA CASTILHOS FERNANDESEDUCAÇÃO PERMANENTE: UMA DIMENSÃO FORMATIVA NOSERVIÇO SOCIALPORTO ALEGRESETEMBRO DE 2008.


ROSA MARIA CASTILHOS FERNANDESEDUCAÇÃO PERMANENTE: UMA DIMENSÃO FORMATIVA NOSERVIÇO SOCIALTese de Doutorado apresentada ao Programade Pós-Graduação em Serviço Social, daFaculdade de Serviço Social da PUCRS, paraobtenção do título de DOUTORA EM SERVIÇOSOCIAL.Orientadora: Profª Drª Jussara Maria Rosa MendesPORTO ALEGRESETEMBRO DE 2008.


FICHA CATALOGRÁFICABibliotecária responsável: Cinara Ferreira, CRB-10/1824.F363eFernandes, Rosa Maria CastilhosEducação permanente: <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong> <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> /Rosa Maria Castilhos Fernandes. - 2008.199f.Orientadora: Jussara Maria Rosa Mendes.Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica do RioGrande do Sul, Faculdade de Serviço Social, Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, 2008.1. Serviço <strong>social</strong>. 2. Formação profissional. 3. Saúde pública.I - Rosa Maria Castilhos Fernandes. II - Pontifícia UniversidadeCatólica do Rio Grande do Sul, Faculdade de Serviço Social. III –Título.CDD 361.007


ROSA MARIA CASTILHOS FERNANDESEDUCAÇÃO PERMANENTE:UMA DIMENSÃO FORMATIVA NO SERVIÇO SOCIALTese de Doutorado apresentada ao Programade Pós-Graduação em Serviço Social, daFaculdade de Serviço Social da PUCRS,como requisito parcial para a obtenção dotítulo de DOUTORA EM SERVIÇO SOCIAL.Aprovada em ___ de ________________ de 2008.BANCA EXAMINADORA:__________________________________________Profª Drª Jussara Maria Rosa Mendes(Orientadora - PUCRS)__________________________________________Prof(a). Drª Beatriz Aguinski__________________________________Prof(a). Dr(a). Maria Lúcia Martinelli___________________________________________Prof(a). Drª Naira Franzói


Aos assistentes sociais, os ocultos e os descobertos,em especial: Fátima, Milene, Marla, Márcia B.,Miriam, Liliane, Lúcia, Vera, Lourenço, Cleonice,Karen, Greice, Tatiane, Cristiane e Márcia quetornam possível esta história e que fazem adiferença na consolidação da h<strong>uma</strong>nização dasrelações e da justiça <strong>social</strong>.


AGRADECIMENTOSComo medir palavras para agradecer, se nas trilhas percorridas durante a realizaçãodesta pesquisa cruzamos com pessoas tão especiais, <strong>uma</strong>s que não faziam parte da minhavida, outras razão do meu viver. De qualquer maneira, eis os agradecimentos:À minha mãe, Maria, pela fonte de luz que é, iluminando as trilhas que percorri e quecompreendeu que só me tornei professora, porque sou assistente <strong>social</strong>.Ao meu pai, Gentil (in memoriam) que mesmo sem saber, me ensi<strong>no</strong>u o que é o amor,pois do seu jeito não se cansou de dizer aos filhos o quanto os amava.Ao João que soube compreender meus sonhos e pelo que pude contar com seu apoio ecarinho. A Marina, meu melhor feito. Pelo colo que soube me dar em horas difíceis e o amorque transmite.Aos meus familiares que brindaram comigo momentos e conquistas desse processo.Meus irmãos Ricardo, Valter e Mauro e suas famílias; em especial à minha irmã Rosana,pela cumplicidade e afeto.Aos amigos da Psicose Vermelha pelas horas de lazer, a parceria, pela injeção deânimo e a certeza de tê-los por perto: Siruí e Joca, Zé Flávio e Esther.Aos parceiros de reflexões e de construções de estratégias para o embate cotidia<strong>no</strong>,pela diferença que fazem na minha vida e, fundamentalmente, na condução do trabalhoprofissional a Ana Lúcia Maciel e a Mª Graça Türck. Aos colegas de encontros edesencontros da labuta profissional a Marla Kuhn, a Miriam Dias, a Regina Martins e aoFrancisco Kern .Aos colegas do Curso de Serviço Social da ULBRA espaço privilegiado da prática dadocência, em especial, a Ivone Rheiheimer pela convicção da importância desse momento e oincentivo permanente. Aos tantos alu<strong>no</strong>s, que já passaram por mim, por me colocarem emmovimento na busca do amadurecimento intelectual, da oportunidade de me tornarprofessora, pelos debates e avaliações.À orientadora dessa tese Drª Jussara Maria Rosa Mendes, que tive a honra deconhecer e conviver nessa trajetória, que enxergou potenciais e valorizou cada palavra, cadagesto, cada idéia, cada passo e com sua contribuição intelectual, sonhou comigo a realizaçãodesta pesquisa.


À Drª Naira Franzói, por ter me conduzido com sabedoria ao mundo literário daeducação, me permitindo descobrir, ao me ter como aluna ouvinte, “muito falante”, nasdisciplinas do Programa de Pós- Graduação da Faculdade de Educação da UFRGS.Ao Professor Dr. José Alberto Correia, que aceitou o desafio de conduzir a minhaorientação <strong>no</strong> estágio de doutorado na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação naUniversidade do Porto, pois a cada pergunta feita, me alcançava várias obras para que, aodevorá-las, encontrasse as respostas para tantas indagações e me preparasse para os debatesque tivemos.À CAPES pela oportunidade ao conceder a bolsa de Doutorado para cursar oPrograma de Pós Graduação em Serviço Social na PUCRS e pela bolsa de estágio sanduíchede doutorado <strong>no</strong> exterior, demonstrando que o direito e acesso a educação, pode ser <strong>uma</strong>realidade, possível, nesse país.Ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da PUCRS, referência <strong>no</strong> campoda formação profissional, pela oportunidade de amadurecimento intelectual.E como não poderia deixar de citar um agradecimento especial, aos protagonistasdessa investigação, os assistentes sociais, que ao narrarem suas experiências de educaçãopermanente dão <strong>no</strong>vos sentidos as suas vidas e a profissão, impregnando de sentido essa tesede doutorado.A todos, meus agradecimentos.


“Para mim o utópico não é o irrealizável, autopia não é o idealismo é a dialetização dosatos de denunciar e anunciar, o ato dedenunciar a estrutura des<strong>uma</strong>nizante e deanunciar a estrutura h<strong>uma</strong>nizante. Por essarazão a utopia é também um compromissohistórico.”(Paulo Freire)


RESUMOA pesquisa tem como referencial epistemológico o método dialético críticode investigação e caracteriza-se como <strong>uma</strong> pesquisa do tipo qualitativa. Destaca-seentre as categorias do método, a totalidade, a particularidade, a contradição e ahistoricidade. Como categorias explicativas da realidade privilegia-se: educaçãopermanente, educação e formação, construção de saberes e processo de trabalho,destacando-se a questão <strong>social</strong> como <strong>uma</strong> categoria que emerge dessa última.Propõe-se responder a seguinte questão: Como os Assistentes Sociais do municípiode Porto Alegre, <strong>no</strong> Rio Grande do Sul, que atuam <strong>no</strong> campo da saúde, vêmvivenciando experiências de educação permanente <strong>no</strong>s seus processos de trabalho?As trilhas metodológicas constituem-se: na aproximação do objeto de investigação,na revisão bibliográfica sobre o tema, na aplicação de questionário e na realizaçãodo grupo focal com os Assistentes Sociais sujeitos dessa investigação. Assim,durante a investigação, a cada relato de <strong>uma</strong> situação vivenciada de educaçãopermanente, de reflexão critica sobre o processo de trabalho, os assistentes sociaistraziam suas percepções sobre as possibilidades e as dificuldades existentes, asestratégias, as habilidades e as atitudes necessárias aos profissionais, bem como osespaços compartilhados, o trabalho interdisciplinar, a relação com os usuários, asnecessidades em saúde, as demandas do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> e da saúde pública. Enfim,pode-se apreender o como esses profissionais desenvolvem educação permanente<strong>no</strong>s processos de trabalho na saúde. A tese defendida nesta pesquisa é de que aeducação permanente, sendo a reflexão crítica sobre o processo de trabalho, seconstitui em <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> vivenciada nas situações de trabalho dosassistentes sociais, que se dá através da problematização coletiva das demandasque se apresentam, do desejo político e ético-profissional, portanto, <strong>uma</strong> estratégiade formação profissional e de possibilidade de mudança e superação das práticasorganizacionais, para consolidação de um projeto ético-político comprometido com adefesa intransigente dos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, da justiça, da democracia e daemancipação da cidadania.


ABSTRACTThis survey has the dialectical critical method of investigation asepistemological referential and is characterized as a qualitative research. Amongmethod's categories, it is highlighted aspects as totality, particularity, contradictionand historicity. As explicative categories of reality, it is privileged the following ones:permanent education, education and formation, construction of k<strong>no</strong>wledge and workprocess, which have the <strong>social</strong> question as a category. The intentions of this surveyare to give a response to the following question: How Social Workers from PortoAlegre, Rio Grande do Sul, who work in health sector, have been experiencingpermanent education on their work process? Methodological trails are composed bythe approximation of the researched object, bibliography revision on the theme,application of questionnaire and focus groups with Social Workers. Along theresearch, from each permanent education experience reported, Social Workers havebrought to discussion their perceptions about existing possibilities and difficulties,strategies, skills, and attitudes necessaries to these professionals, as well as sharedspaces, interdisciplinary work, relationship with users , needs in health, <strong>social</strong> serviceand public health demands. This way, there was a possibility to discover how theseprofessionals develop permanent education in their work processes on health. Thedefended idea here is that permanent education, as a critical reflection of workprocess, is formed in a formative dimension experienced in <strong>social</strong> workers situationsfaced at work, which comes from the collective problematization of the demands, theethical, professional and political desires. Therefore, a strategy of professionalformation, possibilities of changes and organizational practices overshoot toconsolidate an ethical and political project committed with the intransigent defense ofh<strong>uma</strong>n rights, justice, democracy and emancipation of citizenship.


LISTA DE ILUSTRAÇÕESTabela 1: Concepção de Educação Permanente da Declaração da ConferênciaGeral de Nairobi, em 1976..................................................................... 047Gráfico 1: Distribuição do número de profissionais ativos da 10ª Região ............. 109Gráfico 2: Localização dos Assistentes Sociais na rede de Serviços de Saúde –Porto Alegre........................................................................................... 110Quadro 1: Indicadores de Educação Permanente <strong>no</strong>s Processos de Trabalhodos Assistentes Sociais......................................................................... 112Gráfico 3: Sobre o espaço sócio-ocupacional na área da saúde........................... 113Gráfico 4: Graduação em Serviço Social - Instituição de Ensi<strong>no</strong>........................... 114Gráfico 5: Possibilidades de educação permanente.............................................. 118Gráfico 6: Espaços compartilhados, pesquisas e <strong>social</strong>ização de conhecimentos 119Gráfico 7: Investimento, indicadores e controle <strong>social</strong>........................................... 120Gráfico 8: Supervisão, construção de conhecimentos, atendimento dasnecessidades......................................................................................... 121Gráfico 9: Dificuldades, Aquisição de conhecimentos e habilidades,Problematização.................................................................................... 122Quadro 2: Roteiro para o Grupo Focal................................................................... 126Quadro 3: Categorias Teóricas e Emergentes....................................................... 131Quadro 4: Concepção de Educação Permanente <strong>no</strong> Serviço Social: <strong>uma</strong>construção coletiva ............................................................................... 172


SUMÁRIO1 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 0112 TRANSFORMAÇÕES SOCIETÁRIAS, EDUCAÇÃO E TRABALHO ............ 0172.1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E A FORMAÇÃO ................................... 0222.2 A INTERLOCUÇÃO ENTRE A EDUCAÇÃO E O TRABALHO....................... 0332.3 (RE) VALORIZAÇÃO DOS IDEAIS DA EDUCAÇÃO PERMANENTE............ 0432.3.12.3.2Aspectos Históricos e Conceituais..................................................................A Educação Permanente na Agenda da Saúde <strong>no</strong> Brasil...............................0440523 REFLEXÕES SOBRE AS DIMENSÕES DO PROCESSO DE TRABALHO.. 0573.1 UMA CATEGORIA EM ANÁLISE: PROCESSO DE TRABALHO ................... 0583.2 A QUESTÃO SOCIAL EM PAUTA ................................................................. 0633.3 A DINÂMICA DO PROCESSO DE TRABALHO PROFISSIONAL .................. 0763.4 ENTRE O TRABALHO PRESCRITO E O TRABALHO REAL: ACONSTRUÇÂO DE SABERES087...........................................................................4 AS TRILHAS METODOLÓGICAS DA PESQUISA ........................................ 0954.1 A CONSTRUÇÃO DO OBJETO DE INVESTIGAÇÃO ................................... 0974.1.1 Objetivos e questões <strong>no</strong>rteadoras .................................................................. 1004.2 EM BUSCA DO ESTADO DA ARTE .............................................................. 1014.3 APROXIMAÇÕES EMPÍRICAS ...................................................................... 1084.4 A INTENÇÃO NA ESCOLHA DO INSTRUMENTO: o grupo focal.................. 1235 NARRATIVAS DOS ASSISTENTES SOCIAIS: AS EXPERIÊNCIAS DEEDUCAÇÃO PERMANENTE.......................................................................... 1305.1 DESEJO: UM PRINCÍPIO PARA MUDANÇA.................................................. 1325.2 A ESCUTA DA DEMANDA: A GERAÇÃO DE NECESSIDADESFORMADORAS............................................................................................... 1345.3 OS DETERMINANTES DA DINÂMICA ORGANIZACIONAL......................... 1415.4 A PARTILHA DOS SABERES: EM RELAÇÃO................................................ 1515.5 APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA: A PROBLEMATIZAÇÃO......................... 1565.6 A PRESENÇA DA DIMENSÃO ÉTICO POLÍTICA DO SERVIÇO SOCIAL:UMA REFERÊNCIA IDENTITÁRIA................................................................. 1625.7 O DESENHO DE UMA CONCEPÇÃO: UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA..... 1686 CONCLUSÃO.................................................................................................. 174REFERÊNCIAS............................................................................................... 184APÊNDICES..................................................................................................... 193


111 INTRODUÇÃOO trem que chega é o mesmo trem da partida, a hora do encontro étambém despedida, na plataforma desta estação é a vida deste meu lugar(Milton Nascimento).Aprendemos com a própria vida, é o que <strong>no</strong>s ensi<strong>no</strong>u Paulo Freire. Vida quese manifesta por meio de quem somos, de <strong>uma</strong> identidade, de <strong>uma</strong> trajetória, de umcurriculum vitae do qual fazem parte família, religião, amor, comunidade, amigos,partido político, sindicato, movimento, trabalho, convívio com a natureza, enfim, osvínculos mais profundos que são pilares de <strong>uma</strong> história de vida (GADOTTII, 2004).Chegamos, nesse momento, carregados de <strong>uma</strong> história impregnada desentidos, de interrogações, de <strong>uma</strong> trajetória profissional e de um conhecimento quetem sido adquirido ao longo de <strong>uma</strong> formação. É nesse mesmo trem de chegada quevamos partir, pois, como <strong>no</strong>s diz a música de Milton Nascimento, citada em epígrafepara introduzir o presente trabalho, “a hora de chegada é também a hora da partida”.Parte-se para a realização de <strong>uma</strong> pesquisa com desejo de refletir, lançando, assim,um <strong>no</strong>vo jeito de refletir sobre o mundo: um modo de pensar que estimule aconsciência critica, que seja indagador, cientifico e que possa, então, por meio deum trabalho de descobertas, desvendar aquilo que está latente, e ao mesmo tempooculto, <strong>no</strong> objeto de investigação escolhido.Se o sentido da educação está naquilo que aprendemos com a própria vida(FREIRE, 2003) e dessa, faz parte o trabalho, então, nesse momento, tem-se comodesafio desvendar o processo educativo que existe na prática profissional daprofissão que um dia se escolheu: a de ser Assistente Social. As oportunidadesexperimentadas de reflexões teórico-práticas <strong>no</strong> exercício da profissão de AssistenteSocial, como as de aprendizagem significativa vivenciadas junto a diferentesespaços sócio-ocupacionais, em especial, a área da saúde, incluindo-se, também, aprática da docência na formação de Assistentes Sociais, têm permitido àpesquisadora a imersão em processos de educação permanente. Tais experiênciasfazem sentido na vida profissional ao indagarmos e problematizarmos a realidade<strong>social</strong> que se manifesta <strong>no</strong> trabalho, o que permite construir um <strong>no</strong>vo conhecimentoa partir de um diálogo com aquilo que já se sabia antes. Nessas situações deaprendizagem <strong>no</strong> trabalho, por via experiencial, que se encontram muitas das


12respostas para as perguntas feitas durante o desenvolvimento de <strong>uma</strong> práticaprofissional.O ato de investigar e de indagar as contradições da realidade <strong>social</strong> édesafiador a cada dia. Não são poucas as situações que <strong>no</strong>s deixam perplexos e, aomesmo tempo, <strong>no</strong>s inserem em um permanente movimento de busca, em que nãoapenas <strong>no</strong>s damos conta das situações dessa complexa realidade, como <strong>no</strong>smobilizamos para nela intervir.As demarcações <strong>no</strong> Brasil, nas últimas décadas do século XX, sobretudo <strong>no</strong>início dos a<strong>no</strong>s 1970 (ANTUNES, 2003), caracterizadas pela combinação dareestruturação produtiva (<strong>no</strong>vo padrão de acumulação flexível, deflagrado pelocapital, como um projeto de dominação societal), com as políticas neoliberais e coma aceleração do processo de globalização e os impactos econômicos, políticos esociais daí decorrentes, acirraram o problema do desemprego e do empregoprecário. Todo esse ritmo de i<strong>no</strong>vações <strong>no</strong> mundo contemporâneo altera as formasde gestão da força de trabalho, requerendo um envolvimento dos trabalhadores nabusca de metas de qualidade e de produtividade em benefício do capital. Alteramse,também, a demanda da mão-de-obra, os padrões de qualificação, as exigênciaspara formação profissional e, fundamentalmente, as requisições para intervençõesna realidade.A reprodução das diversidades e desigualdades sociais, econômicas, políticase culturais, formam “um vasto e complexo caleidoscópio de nações, nacionalidades,etnias, mi<strong>no</strong>rias, grupos e classes sociais” (IANNI, 2005, p.127) que configuram ocenário mundial na atualidade. Cenário este, marcado pelos processos deconcentração e centralização do capital que adquirem maior força e alcance,impactando não somente as formas de trabalhar, mas o modo de pensar e ser dah<strong>uma</strong>nidade (IANNI, 2005).Dessa forma, as dinâmicas das mudanças que se sucederam, mesmo emsociedades de desenvolvimento industrial avançado, podem ser visualizadas sobdiferentes prismas e com efeitos impactantes nas condições de vida de segmentosexpressivos da sociedade, tais como: ampliação do desemprego, redução dosempregos estáveis nas empresas, terceirização, precarização das relações de


13trabalho, a permanência do trabalho informal, elevados níveis de exigência dequalificação técnica, acentuada redução <strong>no</strong>s níveis de sindicalização, violação dosdireitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, desmonte dos sistemas de proteção <strong>social</strong>, naturalização dadesigualdade <strong>social</strong>, e, conseqüentemente, o surgimento de <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va pobreza.Nessas reflexões introdutórias é mister referir que, diante das seqüelasprovocadas pela questão <strong>social</strong> na sociedade contemporânea, não se pode negar aurgência em repensar permanentemente os processos de trabalho em que osassistentes sociais estão inseridos. Se as demarcações da atualidade vêmimprimindo diferentes formas de manifestações e de expressões vivenciadas pelapopulação brasileira, em especial a classe trabalhadora, é exatamente esse cenáriomarcado por mudanças de toda ordem <strong>social</strong>, econômica e política que <strong>no</strong>s convocapara a construção de estratégias de enfrentamento da questão <strong>social</strong>.Uma dessas estratégias está na possibilidade de considerar a EducaçãoPermanente, que é um processo de aprendizagem que se dá por meio da reflexãocrítica sobre o processo de trabalho, como <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong> âmbito doServiço Social, pois as situações de trabalho vivenciadas pelos assistentes sociaispodem se constituir em experiências de aprendizagem significativas que incidem naqualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados, desde que possam atender às necessidadessociais da população usuária. Cabe, assim, aos profissionais, o compromisso deinterrogar a lógica desse processo de exclusão e problematizar os seusrebatimentos na vida cotidiana dos sujeitos, considerando-se cada história de vida ea forma como esta se expressa como demanda <strong>no</strong>s espaços sócio-ocupacionais.A partir desse quadro de transformações, desenhado em parte aqui, e asdemandas que dele advêm, que marcam o início deste século XXI, ganha-se fôlegopara repensar a articulação entre a educação e o trabalho. Ancorando-se nesse focotemático, busca-se trilhar os caminhos dessa investigação, refletindo sobre ossaberes necessários aos assistentes sociais, sobre as experiências educativasvivenciadas pelos mesmos e sobre o quanto os espaços sócio-ocupacionais podemse constituir em um lócus de produção de conhecimentos, que deve ser objeto deestudo <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social.


14Estudar e debruçar-se continuamente sobre os problemas de <strong>no</strong>ssa época éreconhecer a contraditória, complexa e dinâmica realidade com que o assistente<strong>social</strong> interage em seu cotidia<strong>no</strong> profissional. Mesmo que se tenha clareza dosobjetivos profissionais e do lugar ocupado por <strong>uma</strong> prática profissional, produto eprotagonista das transformações necessárias para o enfrentamento da questão<strong>social</strong>, propõe-se investir na educação permanente enquanto <strong>uma</strong> estratégia deformação profissional e de possibilidade real de superação de velhas práticas para aconsolidação do projeto ético-político do Serviço Social.Trazer a <strong>dimensão</strong> ético-política nessa investigação, significa tratá-la comoum “saber ontológico” em que se conserva a perspectiva totalizante e crítica tãonecessária na desmistificação das formas reificadas de ser e pensar (BARROCO,2003, p.56) do agir profissional. Os princípios do código de ética profissional, alémde ser guia, são um instrumento crítico que contribui para a não-reprodução daalienação <strong>no</strong> exercício da profissão de assistente <strong>social</strong>. Entre os princípiosdestacam-se: o reconhecimento da liberdade como valor ético central, a defesaintransigente dos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, a consolidação da cidadania e da democracia, oposicionamento em favor da eqüidade, da justiça <strong>social</strong>, a eliminação de todas asformas de preconceito e o compromisso com a qualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados naarticulação com outros profissionais e trabalhadores.Nessa caminhada investigativa, percorre-se trilhas nunca antes percorridas,buscando a inserção nas brechas abertas pela ciência para o “diálogo doconhecimento com a realidade <strong>social</strong>” (KHOURY, 1995, p.130). Entretanto, para queisso acontecesse, constroem-se as trilhas da investigação, a partir do diálogo comos sujeitos envolvidos: os Assistentes Sociais.Por meio desse diálogo tem-se, como objetivo geral, analisar como osassistentes sociais do município de Porto Alegre, que atuam <strong>no</strong> campo da saúde,vêm vivenciando experiências de educação permanente <strong>no</strong>s processos de trabalhoem que estão inseridos. Para tanto, propõe-se desenvolver a pesquisa buscandoresponder a questão central: como os assistentes sociais do campo da saúde vêmvivenciando experiências de educação permanente <strong>no</strong>s seus processos de trabalho?Ancorados nesse objeto de estudo, um conjunto de questões <strong>no</strong>rteiam ainvestigação, tais como: de que maneira os assistentes sociais vivenciam processos


15de formação profissional para atender as exigências postas pela questão <strong>social</strong>; qualo significado atribuído à necessidade da educação permanente e qual a concepçãoexistente sobre a mesma; que dificuldades, obstáculos e possibilidades existem paradesencadear processos de educação permanente; que tipo de capacitaçãoprofissional possibilita a compreensão da realidade e a construção de <strong>uma</strong> açãoprofissional comprometida com o projeto ético-político do Serviço Social.Além dessa introdução, nesse trabalho de pesquisa constam quatrocapítulos. No Capítulo 2, tem-se como objetivo percorrer sobre as configuraçõescontemporâneas caracterizadas pelas transformações societárias de toda ordem –econômica, <strong>social</strong>, política, cultural –, trazendo alguns elementos que ilustram aforma como estas impactam, não somente a vida dos trabalhadores, mas, também,os sistemas de educação e formação na sociedade. Tarefa nada simples, pois pormais que se tenha a intenção de percorrer sobre as configurações atuais, algo ficade fora e, portanto, não se teve a pretensão de dar conta dessa totalidade complexa.Procura-se tratar de alguns dos aspectos de tais transformações, destacando osprocessos de reestruturação produtiva e a interface com as concepções de formaçãoe de trabalho. Também se faz <strong>uma</strong> reflexão sobre a relação existente entreeducação, formação e trabalho, seguida de <strong>uma</strong> revisão da literatura nas ciências daeducação, que dá conta da discussão histórica e conceitual da educaçãopermanente. Com esses traçados, vai-se desenhando a compreensão e ospressupostos teóricos que fundamentam a investigação.O capítulo 3 inicia com a revisão bibliográfica sobre a categoria processo detrabalho e a concepção da categoria questão <strong>social</strong>, em que se procura evidenciar aarticulação desses conteúdos e a profundidade que os mesmos de<strong>no</strong>tam. Abordase,também, a dinâmica dos elementos constitutivos do processo de trabalho dosassistentes sociais: o objeto, os meios e o produto, trazendo nessa parte, o campoda saúde como um dos espaços privilegiados de atuação. Seguindo a lógicareflexiva sobre as principais categorias que subsidiam essa investigação, discorre-sea respeito do trabalho prescrito e o do trabalho real, fazendo <strong>uma</strong> articulação com otrabalho dos assistentes sociais e a construção de saberes <strong>no</strong>s seus contextoslaborais.


16No capítulo 4 são demonstradas as trilhas metodológicas percorridas nessatrajetória de investigação e dedica-se, também, à análise, ainda que sucintamente,daquilo que pode ser captado a partir das informações do questionário aplicado pormeio de recursos tec<strong>no</strong>lógicos, que fez parte da aproximação dos assistentessociais. Mais do que <strong>uma</strong> descrição formalizada do método, dos instrumentos e doprocesso operacional em si, constam peculiaridades da investigação, sobretudoquanto às escolhas feitas, das aproximações daquilo que é empírico, dos sujeitosimplicados na pesquisa, dos critérios utilizados, das subjetividades da pesquisadora,dos achados iniciais. Enfim, constam as pegadas deixadas nas trilhas percorridas.O capítulo 5 desvela a percepção dos assistentes sociais sobre o objetoestudado: o como os profissionais vêm desenvolvendo processos de educaçãopermanente <strong>no</strong> trabalho. Essas experiências que traduzem o como, são apreendidasa partir de suas narrativas desveladas durante a realização dos grupos focais. Asnarrativas, as experiências profissionais vivenciadas <strong>no</strong>s processos de trabalho, asconcepções construídas coletivamente sobre educação permanente <strong>no</strong> ServiçoSocial, o <strong>no</strong>vo, as categorias que emergem, os desejos, o projeto ético-político, asdescobertas do pesquisador e também dos pesquisados, enriquecem esse momentoda pesquisa.Por último, chega-se na estação da conclusão da tese e, nessa, procura-serefletir sobre as trilhas percorridas e os achados da pesquisa, respondendo, a partirdos saberes adquiridos nesse processo, as questões e objetivos explicitados nessacaminhada investigativa. Contudo, consideramos que a pesquisa aqui apresentada éo início de um <strong>no</strong>vo percurso, não somente para a pesquisadora, como paraaqueles sujeitos que desejarem, a partir das contribuições explicitadas nessetrabalho, percorrerem outras trilhas na busca da formação profissional através dasexperiências de educação permanente.


172 TRANSFORMAÇÕES SOCIETÁRIAS, EDUCAÇÃO E TRABALHOO trabalho é a prova pela qual se torna mel o néctar ainda impurodo conhecimento; é o esforço de assimilação da experiência ao processovital em toda a sua complexidade, e não só material, moral, <strong>social</strong>, mastambém intelectual. É o segundo ato da peça cujo primeiro ato a escolamontou; é como que o acabamento de <strong>uma</strong> construção sutil (FREINET,1998, p.295).Sabe-se que o mundo contemporâneo vem <strong>no</strong>s desafiando a cadamanifestação histórica e o quanto é preciso estar atento aos diferentes movimentosda realidade <strong>social</strong>, captando de que maneira esses acontecimentos vêmimpactando a vida cotidiana dos sujeitos, o que pressupõe, tendo como princípio aconcepção dialética, a análise e a problematização da conjuntura atual. Vivemos,nesse começo do século XXI, em um mundo repleto de situações preocupantes,inundado de mudanças, marcado por grandes conflitos, por tensões, poroportunidades desiguais, pelo desemprego estrutural, pelo empobrecimento dapopulação e, também, pelos desastres do ambiente natural provocados pela açãoh<strong>uma</strong>na <strong>no</strong> último século.As mudanças que vêm ocorrendo <strong>no</strong> mundo do trabalho vêm alterando asformas de produção, as relações de trabalho e as exigências para a formação dostrabalhadores. Já não se pode mais conceber que a prática educativa fique alheiaaos processos educativos que passam pela produção material da existênciah<strong>uma</strong>na. “O trabalho moder<strong>no</strong> vem constituindo trabalhadores <strong>no</strong>vos emconsciência, com <strong>no</strong>vo saber, <strong>no</strong>va capacidade de entender-se e de entender arealidade, as leis e a lógica que governa a natureza e a sociedade.” (ARROYO,1991, p.163).O foco atribuído, neste estudo, ao vínculo entre trabalho e educação, está naperspectiva da formação h<strong>uma</strong>na ocorrer em situações de trabalho. Esseentendimento supera a teoria tradicional da educação que excluía o trabalho comoeducativo e “centrava a educação em processos e tempos de inculcação que refletiaa realidade <strong>social</strong> e o pensamento das elites sobre essa realidade polarizada”(ARROYO, 1991, p.167). Compreende-se que estes vínculos entre trabalhoeducaçãodeixaram de ser preocupação de industrialistas, de educadores deescolas profissionalizantes ou somente de educadores de rua, e passaram a serincorporados na teoria da educação, enquanto teoria da formação h<strong>uma</strong>na


18(ARROYO, 1991), a partir da qual se desenvolverá a reflexão neste estudo sobre ainterlocução entre educação e trabalho.Entretanto, é neste cenário de transformações societárias que se evidencia aexistência de um paradoxo caracterizado pela existência, a um só tempo, desituações de um crescimento contínuo do nível de formação, contrapondo-se a <strong>uma</strong>gravamento do desemprego estrutural, da falta de oportunidades para a população,citando, como exemplo, os jovens, que experimentam oportunidades de formaçãotécnica e apresentam dificuldades de inserirem-se <strong>no</strong> mercado de trabalho.Mesmo com todos esses avanços, desencadeados pela chamada era doconhecimento, que demarca as <strong>no</strong>vas exigências para o trabalhador nacontemporaneidade, cabe a indagação sobre a maneira como vem se dando esseaprendizado, sobretudo quanto aos princípios educativos que sustentam a formaçãoh<strong>uma</strong>na, em especial a da classe que vive do trabalho. “As i<strong>no</strong>vações sociais,institucionais, tec<strong>no</strong>lógicas, organizacionais, econômicas e políticas, a partir dasquais a informação e o conhecimento passaram a desempenhar um <strong>no</strong>vo eestratégico papel” (LASTRES & ALBAGLI, 1999,p.8) são pertinentes a essa era doconhecimento 1 .A questão da educação e a do trabalho, durante muito tempo, estevedesligada do pensamento filosófico. “A questão da educação era central, enquanto ado trabalho era marginal” (CHARLOT, 2004, p.9). Versam, na história da1 Encontra-se <strong>no</strong> livro Informação e Globalização na Era do Conhecimento, artigos que tratam dosdesafios diante essas i<strong>no</strong>vações reconhecidas como da era do conhecimento. “Destacam-se emespecial as dimensões <strong>social</strong>, política, ambiental e ético-valorativa. O desafio maior está em resgatálas. Até porque mostra-se crescentemente óbvio que ,caso não sejam adequadamente incorporadas,estas podem vir a constituir-se em elementos de forte instabilidade e de limitação à expansão e àcontinuidade do próprio padrão ou paradigma financeiro-técnico-produtivo atual.”( LASTRES &ALBAGLI,1999, p.24). Diante tais argumentos aponta-se como visão alternativa contemplar: “apercepção do trabalho, não somente como fator de produção (em que o trabalhador é visto comomero sinônimo de capital h<strong>uma</strong><strong>no</strong>) mas como um atributo a ser valorizado e cultivado ao longo davida; o incentivo ao aprendizado contínuo, não apenas como mero instrumento de competitividade,mas também enquanto aprendizado <strong>social</strong>, capacitando os indivíduos a se valerem das mudançastécnicas em prol do ple<strong>no</strong> exercício da cidadania e em favor de <strong>uma</strong> convivência solidária com osdemais e com a natureza”( LASTRES & ALBAGLI,1999, p.25).


19h<strong>uma</strong>nidade, diferentes formulações de filósofos 2 e de cientistas sociais indagando arelação entre a educação e o trabalho, tanto <strong>no</strong> campo das teorias da educação,como das teorias sociais. A concepção mais antiga sobre a prática educativa associaa atividade de um educador a <strong>uma</strong> arte, ou seja, a <strong>uma</strong> téchne, termo gregoatribuído e traduzido pelas palavras “técnica ou arte”. Platão, ao escrever a respeitoda educação 3 , refere que “a educação é a arte (téchne) que consiste em fazer aalma voltar-se de modo mais expedito a si mesmo” (TARDIF, 2002, p.158).Entretanto, é em Hegel que a questão da educação e do trabalho iniciam sua ligaçãomais profunda, o que posteriormente retoma-se como reflexão neste estudo.Rousseau e Kant inauguram as reflexões da modernidade sobre a educação, comoato deliberado, com vontade específica. Não se trata de buscar em um ponto exter<strong>no</strong>as razões para se educar, pois, seguindo as reflexões de Rousseau, sendo a pessoao centro do processo, deve-se buscar nela mesma aquilo que a faz querer aprender(KOWARZIK, 2003).No inicio do Século XX, Freinet (1998), com seu trabalho de pedagogo emilitante político, contribui, na época, com a afirmação de que “o trabalho érealmente formador” 4(1998, p.10-X). Para o autor, o trabalho propõe fortesmotivações para aprendizagem, sendo essas aquisições do trabalho úteis na vida<strong>social</strong> e profissional. Mesmo citando apenas alguns dos tantos pensadores, que comsuas reflexões contribuíram para a teoria da educação moderna, é possível perceberque a interlocução da educação e o trabalho na formação h<strong>uma</strong>na deixam marcas2 “O ideal educativo, por exemplo, pode ser encontrado na filosofia de Sócrates, Platão e Aristóteles,preocupados com a unidade da Polis e com seu funcionamento racional. Ele apareceu associado àsquestões de liberdade, cidadania, direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s e progresso <strong>social</strong>, na obra de Locke, Durkheim,Hanna Arendt e outros. De Condorcet a Francisco Ferrer, de Montessori a Paulo Freire, de Tolstoi aIllich, a educação foi objeto de experiências originais, de densas análises e de polêmicasproposições”, é o que refere Cattani (1996, p.137).3 “O problema fundamental de toda a educação (Erziehung) e da formação (Bildung) foi trabalhadopor Platão através da sistematização da práxis dialógica de Sócrates e, desde então, permanececomo fundamento de toda pedagogia enquanto ciência da prática” (KOWARZIK, 2003, p.70). Ver IN:Dalbosco, Cláudio(org). Filosofia prática e pedagógica. UPF, 2003.4 Sobre Freinet é importante lembrar que este viveu n<strong>uma</strong> época de grande efervescênciasociopolítica, centrada num período ainda marcadamente industrial, entre duas guerras e comrevoluções organizadoras de <strong>no</strong>vos padrões de sociedade. É neste contexto que Freinet lidera ummovimento, mas não somente de protesto e re<strong>no</strong>vação, mas um movimento que apresentou umconjunto de idéias consistentes que foram capazes de traçar um caminho que se contrapunha aeducação tradicional. Freinet, “coabitou também com o irromper de um fluxo e<strong>no</strong>rme de idéias que,embora de grande complexidade, conseguiram trazer ao pa<strong>no</strong>rama pedagógico mundial um maiorprestígio e <strong>uma</strong> visão mais otimista da educação, lançando as bases de um movimento que seadjetivará de Educação Nova” (NUNES, 2002, p.58). Sobre Educação Nova sugiro ver em: FRENEIT,Para <strong>uma</strong> escola do Povo. Lisboa: Editorial presença, 1973. Também em NUNES, Antônio. Freinet:Actualidade pedagógica de <strong>uma</strong> obra. Porto: Asa Editores, 2002.


20na história que leva-<strong>no</strong>s, ainda <strong>no</strong>s dias de hoje, a questionar a sua relação ecompreender a sua relevância.A articulação dos conteúdos conceituais de educação e de formação éessencial para a construção de um processo educativo, pois educação para vida eformação para o trabalho, são propostas que remetem a densos conteúdos. Todosistema educativo pressupõe o desenvolvimento de um projeto de formaçãoprofissional. Isso requer um conjunto de diferentes iniciativas educacionaisdesenvolvidas, além ou independentemente da escola regular, que visam promovera capacidade de trabalho dos indivíduos, <strong>no</strong> caso, referindo-se à educação deadultos.Se recorrermos à acepção corrente, “educação corresponde ao conjunto dasações <strong>no</strong> âmbito das instituições escolares, que visam transmitir conhecimentosgerais e específicos aos alu<strong>no</strong>s” (CATTANI, 1996, p.150). Pode-se dizer que aformação profissional está imbricada aos sistemas educativos das esferas da escolae do trabalho, constituindo-se, assim, como “processo de aprendizagem susceptívelde permitir a aquisição de saberes e de saberes-fazer necessários para o exercíciode um ofício ou de <strong>uma</strong> atividade profissional” (ALALUF, 2005, p.2). Assim,formação corresponde às diversas iniciativas educacionais, desenvolvidas além ouindependente da escolaridade regular ou formal, que vai distinguir a formação inicialou de base, e a formação profissional contínua, que visa promover a capacidade detrabalho dos indivíduos. (CATTANI, 1996; ALALUF, 2005).É importante sublinhar, nessas reflexões introdutórias, que a compreensãodas concepções de educação e a formação não são tratadas separadamente nesseestudo. Inicialmente, contextualiza-se o cenário atual e os seus rebatimentos <strong>no</strong>campo da formação profissional. Seguindo, então, para os aspectos que aproximama interlocução da educação e do trabalho, emergindo, daí, a valorização possível dopotencial formativo (CANÁRIO, 2003, CORREIA, 1999, 2003) das situações e dasexperiências vivenciadas <strong>no</strong>s processos de trabalho.A problemática das relações entre o de<strong>no</strong>minado mundo do trabalho e omundo da formação <strong>no</strong>s fazem debruçar sobre os possíveis vínculos existentes,tanto <strong>no</strong>s seus aspectos formadores, que é o que <strong>no</strong>s interessa desvendar nesta


21pesquisa, quanto nas reconhecidas situações de alienação e de deformação que otrabalho pode proporcionar ao trabalhador. Portanto, a análise das concepções deformação e das práticas educativas sugerem <strong>uma</strong> aproximação com astransformações <strong>no</strong> mundo do trabalho.Para que se possa avançar na análise das relações entre educação,formação e trabalho é imprescindível, parafraseando Correia (2003), se acrescer dealg<strong>uma</strong>s precauções. A primeira delas diz respeito à abordagem dessa relação, quenão é axiologicamente neutra – embora possa ser instrumentada cientificamente –não resulta de critérios apenas cognitivos, “mas é sempre ética, cívica epoliticamente estruturada” (CORREIA, 2003, p.16).O outro fator refere-se à historicidade dos problemas, aos aspectos sóciohistóricosque determinam mudanças em tempos e espaços específicos. Sobre essa<strong>dimensão</strong>, cabe salientar que é somente pensando historicamente o trabalho e aeducação que torna-se possível encontrar os vínculos existentes em cada momentohistórico (ARROYO, 1991).Deve-se considerar, ainda, a <strong>dimensão</strong> prospectiva, quando se trata dessarelação, ou seja, a idéia de reabilitarmos <strong>no</strong>ssas análises sobre os fenôme<strong>no</strong>s quese modificam como “fatos portadores de provir” (CORREIA, 2003, p.16). Com isso,evidencia-se a necessidade de termos <strong>uma</strong> certa cautela ao tratar sobre o futuro daeducação, pois, mesmo não sendo este o objetivo aqui, não se pode negar quevivemos tempos de “expectativas, de perplexidade e da crise de concepções eparadigmas. É um momento <strong>no</strong>vo e rico de possibilidades” (GADOTTI, 1999, p.1).A atenção com as precauções aqui explicitadas, embasa a discussão que sepretende tecer a seguir. Assim, propõe-se, neste capítulo, um trajeto reflexivo emtor<strong>no</strong> das transformações societárias do final do século XX e do início deste correnteséculo XXI, para que se possa discorrer teoricamente sobre as concepções deeducação, de formação e de trabalho, sendo, então, possível, posteriormente, fazerreferência à educação permanente.


222.1 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E A FORMAÇÃOParte-se da premissa, ao considerarmos o mundo do trabalho, que ossistemas de formação não podem ser encarados somente como instâncias de<strong>social</strong>ização profissional, pois se evidencia, a partir de <strong>uma</strong> leitura histórica dessarelação, o papel dos sistemas de formação como instâncias de regulação <strong>social</strong>(CORREIA, 2003). Tal argumento sugere que a interface do trabalho e da formaçãona história da h<strong>uma</strong>nidade, adquiriram três tipos de configurações distintas, quesustentam <strong>no</strong>ssa discussão nesta parte do estudo.O primeiro tipo tem como marco a institucionalização da escolaridadeobrigatória, que se desenvolveu entre os finais do século XIX e o início XX, sendo apreocupação dominante a de assegurar um conformismo ideológico, “bem como oacesso ao sufrágio universal e o reconhecimento <strong>social</strong> de <strong>no</strong>vas qualificaçõesintimamente relacionadas com as <strong>no</strong>vas modalidades de organização do trabalho”(CORREIA, 2003, p.17). Entretanto, de acordo com alg<strong>uma</strong>s correntes dopensamento educacional, tais modalidades de organização do trabalho da indústriamoderna, do sistema de fábrica da própria Revolução Industrial 5 , não foraminicialmente muito entendidas. As dificuldades encontradas referiam-se em aceitaros vínculos entre produção moderna e formação, não pelas relações sociaiscapitalistas então reconhecidas, mas pelo caráter impessoal e massivo do sistemafabril. O industrialismo exigia um tipo de homem com aptidões que nem a família enem a igreja poderiam por si só proporcionar, o que provocará <strong>uma</strong> revolução naescala de valores, e, fundamentalmente, a disseminação da escola de massas(NUNES, 2002).Essa concepção privilegia os espaços onde são realmente possíveis asrelações primárias de formação, como a família, a comunidade, a igreja, o bairro e a5 Pode-se dizer que o século XVIII foi portador da última geração de <strong>uma</strong> velha civilização e oprimeiro de <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va ordem, cuja enunciação será o termo industrialismo, a chamada RevoluçãoIndustrial iniciará. A h<strong>uma</strong>nidade, bem como, suas estruturas, vivenciavam a transição da vidaagrícola para ascensão industrial - em diferentes territórios - com penetrações de acordo com asestruturas sociais, políticas, econômicas e culturais que o acolheram em cada contexto. Com ochamado fim do Antigo Regime se constituía <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va forma de viver que <strong>no</strong> campo educativo teverepercussões de grande significado. “A industrialização força <strong>uma</strong> outra estrutura educativa, baseadanum tipo de organização e n<strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>social</strong> mais alargada que corresponda ás situações queela própria vai construindo. Assim, o não saber ler, mesmo para operários não especializados,começa a expressar <strong>uma</strong> estagnação significativa na vida individual e coletiva” (NUNES, 2002, p22).


24houvesse <strong>uma</strong> desarticulação entre os processos de qualificação <strong>social</strong>mentedisponíveis e a estruturas dos empregos e exigências das organizações dos postosde trabalho, desarticulação essa, diga-se, articulada (CORREIA, 2003).Trazendo a particularidade do Estado Brasileiro <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1960 e 1970, ao seconsiderar o processo de industrialização da época, a política nacional de educaçãopriorizava a formação de especialistas <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> médio que fossem capazes dedominar a utilização de maquinarias ou dirigir processos de produção, o quecaracterizava a profissionalização compulsória 7 . Essa, então, era <strong>uma</strong> estratégia deregulação que visava diminuir a pressão emergente da demanda sobre o ensi<strong>no</strong>brasileiro. A formação do jovem, nesse contexto, seria um instrumento deconformação do futuro profissional ao mundo do trabalho, pois disciplina,obediência, respeito às regras estabelecidas, são condições de inclusão <strong>social</strong>, viaprofissionalização (Ministério da Educação e do Desporto-Lei de Diretrizes e Base,2007).No terceiro momento, marcado pelo período pós-fordismo, buscou-se <strong>uma</strong><strong>no</strong>va forma de regulação, tendo com base a flexibilização da produção, que causouum impacto direto <strong>no</strong>s processos de trabalho e na vida dos trabalhadores. A partir dadécada de 1980, já num contexto de globalização, de acirramento dacompetitividade e de alterações do mercado, pode-se dizer que as transformaçõesque ocorreram despertaram <strong>uma</strong> série de preocupações <strong>no</strong>s cientistas sociais, <strong>no</strong>sentido de desvelar as características desse processo. 8 É, sobretudo, a respeito dasmudanças que se sucederam a partir dos a<strong>no</strong>s 1980 até os dias de hoje, que <strong>no</strong>sinteressa aprofundar, considerando o processo em curso, de transformaçãotec<strong>no</strong>lógica e organizacional do trabalho, com suas implicações para a de<strong>no</strong>minadaqualificação do trabalhador.Para a compreensão do processo instaurado de reestruturação produtiva, éimportante citar que esse surge como resposta a <strong>uma</strong> crise estrutural do capital, que7 Sugiro ver Lei de diretrizes e Bases de Educação Nacional e a Reforma do Ensi<strong>no</strong> Médio - que tratados fatores que orientaram a reformulação curricular do ensi<strong>no</strong> médio e que são expressadas nesta<strong>no</strong>va Lei nº 9394/96.8 Uma das características deste processo referiu-se à crise da sociedade do trabalho que foi tratadaem diferentes estudos a partir da década de 1980, como em Adeus ao Proletariado, de André Gorz,em Trabalho: categoria sociológica-chave de Clauss Offe. Sugere-se ver em Antunes, Ricardo. Ocaracol e Sua Concha. Ensaios sobre a <strong>no</strong>va morfologia do trabalho. SP: Boitempo. 2005.


25na década de 70 começa a dar sinais de esgotamento de um modelo de produçãoque se estendeu durante todo século XX, de<strong>no</strong>minado de taylorismo e fordismo(parcelamento, especialização, intensificação do trabalho, produção em série). Obinômio taylorismo-fordismo, tor<strong>no</strong>u-se improdutivo ”tanto por sua excessiva rigidez,que lhe impunha limitações, como pelo esgotamento de seu regime de acumulação.As causas dessa crise são encontradas sob diferentes ordens: técnica, política,<strong>social</strong> e econômica” (MENDES, 2003, p.26).Emerge, assim, um <strong>no</strong>vo modelo de acumulação flexível, fundamentado numpadrão de produção organizacional e tec<strong>no</strong>logicamente avançado, com técnicas degestão da força de trabalho, como o trabalho em equipes, em times, das células deprodução, entre outras de<strong>no</strong>minações, todas, de alg<strong>uma</strong> forma, relacionadas àsexigências da fase informacional, com a introdução dos computadores <strong>no</strong>sprocessos produtivos e de <strong>serviço</strong>s (ANTUNES, 2003). Dessa forma, as alterações<strong>no</strong> processo produtivo caminhariam rumo à integração do trabalho e àintelectualização da produção.É, então, <strong>no</strong> âmbito das relações de trabalho que se inscreve <strong>no</strong> discursodeste período, de cunho econômico e tecnicista, a necessidade de estimular osprocessos participativos <strong>no</strong>s espaços ocupacionais, como forma de manipular e deenvolver o trabalhador naquilo que é essencial às estruturas capitalistas, amanutenção e “a intensificação das condições de exploração da força de trabalho”(ANTUNES, 2003, p.53). O eixo <strong>no</strong>rteador é a busca de maior produtividade,imposta pela concorrência internacional, associando-se aos <strong>no</strong>vos métodos deprodução introduzidos pela tec<strong>no</strong>logia, a inteligência e conhecimento necessários aotrabalhador.Esse <strong>no</strong>vo paradigma, caracterizado pela reestruturação produtiva, exigiriaum <strong>no</strong>vo perfil do trabalhador, que superasse a qualificação unidimensional,direcionada para as tarefas atomizadas, rotineiras e repetitivas. A intenção eraproporcionar ao trabalhador <strong>uma</strong> formação mais completa - um trabalhadorpolivalente, multi-habilitado, qualificado, competente, portador de maioresconhecimentos gerais, científicos, tec<strong>no</strong>lógicos, enfim com maior escolaridade – afim de torná-lo apto ao domínio de processos cada vez mais sofisticados ecomplexos. (ANTUNES, 2003; CATTANI, 1996; HARVEY, 1993). Essas formas de


26gestão da força de trabalho requerem um envolvimento dos trabalhadores na buscade metas de qualidade e de produtividade, para disputa <strong>no</strong> sistema global do capitale, para isso, a adequação das qualificações dos trabalhadores ao emprego torna-se<strong>uma</strong> condição para sua manutenção <strong>no</strong> mercado de trabalho e/ou inserção <strong>no</strong>mesmo. “Trazem à cena, ainda, questionamentos acerca do acesso ao trabalho e dodireito de ter trabalho” (MENDES, 2003, p.44).Referenciando Gorz, a “qualificação do trabalhador, sua capacidadeprofissional, não é algo estático e objetivo” (1996, p. 199). Mesmo parecendo óbviotal argumento, há de se reconhecer sua complexidade e sua contradição. Aqualificação profissional é resultado instável e provisório, logo, possível de sertransformado coletivamente, que vai exigir do trabalhador aquisição de <strong>uma</strong> <strong>no</strong>vatécnica em substituição a outra já descartada pelo capital. Entretanto, a qualificaçãoprofissional não deve ser encarada como <strong>uma</strong> capacidade de adaptar-se à rápidaevolução tec<strong>no</strong>lógica, mas, fundamentalmente, deve-se ter como estratégia “atransformação da organização do trabalho que os trabalhadores devem impor e nãoo reconhecimento formal e a retribuição de capacidades ’potenciais’ que nunca serápermitido desenvolver” (GORZ, 1996, p.199), sobretudo na ótica capitalista.Para Gorz (1996), as iniciativas de valorização da personalidade dotrabalhador e das suas capacidades tor<strong>no</strong>u-se um meio de atrair mão-de-obra,envolvê-la, resolver o absenteísmo e prevenir conflitos. É, então, a partir daimplementação de <strong>no</strong>vos modelos de gestão que se introduzem mudanças paraqualificação <strong>no</strong> trabalho num quadro de subordinação, tanto <strong>no</strong> aspecto culturalquanto <strong>no</strong> aspecto político. A lógica que pressupõe essa mudança é <strong>uma</strong> mudançatécnica, e de que a formação vai intervir <strong>no</strong> restabelecimento do equilíbrioorganizacional, assegurando, assim, “<strong>uma</strong> adaptação técnica e psicológica dostrabalhadores ao <strong>no</strong>vo contexto, portanto a formação visa tão somente produzirqualificações ou substituir aquelas que se mostrarem obsoletas” (CORREIA, 2003,p.23).Observa-se que as mudanças de ordem tec<strong>no</strong>lógica e estrutural definem<strong>no</strong>vos perfis para as empresas que desejam se manter competitivas num mercadoinfinitamente mais concorrencial, logicamente, decorrente da globalizaçãoeconômica e da busca de produtividade com qualidade. Presencia-se, <strong>no</strong>s dias de


27hoje, um conjunto de iniciativas <strong>no</strong> campo da qualificação profissional, comotreinamentos, cursos de capacitação, criação de Universidades Corporativas, enfim,modelos de desenvolvimento de pessoas que, necessariamente, não partem dasnecessidades trazidas pelos trabalhadores, mas, ao contrário, dizem respeito àsnecessidades do capital. Há de se reconhecer que muitas dessas iniciativas sãoi<strong>no</strong>vadoras, mas estar atento aos modelos de gestão de capacitação profissional époder perceber até que ponto os trabalhadores estão implicados como sujeitoscríticos de um processo produtivo que não seja alienante, mas, sim, um ato criativo,de auto<strong>no</strong>mia, de emancipação e, porque não dizer, de resistência.Também nesse cenário, é relevante considerar as mudanças que sesucederam <strong>no</strong> campo sindical, com relação às políticas de formação, que seconstituíam como um movimento de resistência dos trabalhadores. Mesmo diante aditadura militar brasileira na década de 70, os sindicatos foram protagonistas deexperiências de educação profissional, n<strong>uma</strong> perspectiva de aprofundamento desaber técnico, mas, fundamentalmente, da consciência política e da capacidade deluta da classe trabalhadora (MANFREDI, 1997).Entretanto, na transição dos a<strong>no</strong>s 1980 para os a<strong>no</strong>s 1990, o movimentosindical combativo <strong>no</strong> Brasil, vai gradativamente abandonando a referência “classistade formação político-sindical, e a substitui pela qualificação profissional n<strong>uma</strong>perspectiva de formação dentro do horizonte me<strong>no</strong>r do exercício da cidadaniaburguesa” (ARAÚJO, 2006, p.141). Ao mesmo tempo em que se assiste afragilização combativa dos sindicatos, a própria luta sindical vai se distanciando daruptura com a ordem vigente e retira, aos poucos, de suas atividades <strong>formativa</strong>s,temáticas fundamentais, como a luta de classes e a crítica radical ao sistemacapitalista (ARAÚJO, 2006, p.142) 9 . Entretanto, os ideários neoliberais, aoinstituírem movimentos que se contrapõem aos coletivos, estimulando oindividualismo e a fragmentação dos interesses, contribuem com a desestabilização9 O movimento sindical contribui para que os trabalhadores possam defender seus direitos maiselementares sem mediações externas e distantes e, nesse sentido ele é possibilidade prática elocalizada de <strong>uma</strong> certa forma de liberdade. O sindicalismo está integrado de maneira complementar,à complexa rede de forças sociais. Sua vocação, ou potencialidade, não é a de ocupar na sociedade,um papel central ou exclusivo. Ele é <strong>uma</strong> instituição intermediária, agenciadora da resistência àsvarais formas de opressão, de exploração e de dependência (CATTANI, 1996, p.104). Estaconcepção é em <strong>no</strong>ta citada, para evidenciar a importância dos movimentos sindicais e suscitar areflexão crítica das formas de organização dos trabalhadores, da reinvenção necessária, das <strong>no</strong>vasformas de luta pela garantia de direitos nesse cenário atual.


28dos coletivos institucionais. “A instituição tradicional representativa, burocrática ehierarquizada, deve desaparecer” (CATTANI, 1996, p. 128) ou, ainda, poderão trocarde <strong>no</strong>me, mas, mesmo assim, não há como negar o papel indispensável dossindicatos ou das organizações dos trabalhadores na luta contra-hegemônica nessasociedade capitalista.Mesmo diante de um quadro de reestruturação produtiva que violou osdireitos dos trabalhadores, estão em pauta, <strong>no</strong> Brasil, as reformas trabalhistas esindicais que requerem o envolvimento da sociedade. Entretanto,independentemente dos resultados a serem alcançados com a reforma, a açãosindical contemporânea limita-se à representação dos trabalhadores do setor formal.“Precarizados e desempregados não contam com formas institucionais de defesa ede articulação da luta de seus interesses” (CATTANI, 2006, p.259).Acirra-se, nesse contexto, o problema do desemprego mundial e do empregoprecário, que passa a não ser mais considerado somente como resultado daausência de crescimento econômico, mas como algo inerente a esse crescimentoeconômico, como na situação do Brasil <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1990. Essa é <strong>uma</strong> constataçãoobservada mundialmente, pois, segundo dados da Organização Internacional doTrabalho (OIT), aproximadamente 180 milhões de pessoas <strong>no</strong> mundo encontram-sen<strong>uma</strong> situação de “desemprego ‘aberto’ (procurando, mas não achando), e cerca deum terço da mão de obra, <strong>no</strong> mundo, está desempregada ou subempregada (OIT).Sobre as produções estatísticas internacionais realizadas pela OIT quanto aodesemprego estrutural, Antunes (2005) refere ser essa <strong>uma</strong> característica do mundocontemporâneo que contribui para o debate atual.Um terço da força h<strong>uma</strong>na mundial disponível para o ato laborativoestá exercendo trabalhos parciais, precários, temporários ou já vivencia asagruras do não-trabalho, do desemprego estrutural. Perambulam pelomundo, como prometeus moder<strong>no</strong>s, à cata de algo para sobreviver. Mais deum bilhão de homens e mulheres padecem as vicissitudes da precarizaçãodo trabalho, dos quais centenas de milhões têm seu cotidia<strong>no</strong> moldado pelodesemprego estrutural (ANTUNES, 2005, p.13).Podemos também citar como contradições deste cenário a concentração docapital através das privatizações e incorporações, que ocorrem ao mesmo tempo,que a intensificação da fragilização da força de trabalho em função da flexibilização


29caracterizado pelos contratos temporários, subcontratos, terceirização, entre outrasmodalidades.O capitalismo contemporâneo busca, dessa forma, preservar-se,através da introdução de um regime de acumulação diferenciado [...]. Omercado de trabalho passa por radical transformação, emergindo um <strong>no</strong>voparadigma de produção industrial, a partir de um modelo de produçãoflexível. (MENDES, 2003, p.29).É essa lógica vigente que tem como princípio a reestruturação produtiva,comandada pelo ideário do capital, que acarreta a crescente redução do trabalhovivo e a sua substituição pelo trabalho morto corporificado <strong>no</strong> maquináriotec<strong>no</strong>científico, gerando, assim, a sociedade dos descartáveis (ANTUNES, 2005).Um dos lados perversos desse ideário está na culpabilização do sujeito pelasua exclusão do mundo do trabalho, pois atribui-se ao mesmo, a falta decapacitação ou de condições técnicas, ou ainda de técnicas obsoletas, <strong>no</strong> casodaqueles expulsos das situações de trabalho. A reflexão crítica sobre essaconjuntura <strong>no</strong>s possibilita reconhecer que são das alterações do mundo do trabalhoque emergem a chamada <strong>no</strong>va pobreza e a violação dos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s,vivenciada cotidianamente por <strong>uma</strong> parte significativa da população, vitimizadas porprocessos sociais, políticos e econômicos excludentes.Observa-se, contudo, que o campo da formação movimenta-se na esteira dosprocessos de reestruturação produtiva de forma contraditória, pois não há dúvidassobre os avanços e as oportunidades de qualificação profissional, mesmo queindividuais. Essas oportunidades de formação, entretanto, tem um papel cada vezmais relevante de regulação <strong>social</strong>, intervindo tanto na gestão organizacional,quanto na manutenção da estrutura da sociedade global e, por isso, osquestionamentos são cada vez mais pertinentes. É nesse quadro de flexibilização daforça de trabalho que se redige o discurso por investimentos <strong>no</strong>s níveis deescolaridade, para que os trabalhadores possam permanecer empregados ou,ainda, possam assumir postos de trabalho almejados na carreira profissional.Interessante de se trazer aqui são as análises realizadas por Correia (2003)sobre a relação infeliz da formação com o trabalho, que se prolonga até os dias dehoje, o que desconstrói o discurso da dicotomia que possa existir. Os apelosfreqüentes para que o campo da formação intervenha na resolutividade dos


30problemas das organizações, contribuíram para o desenvolvimento de metodologiasde intervenção alternativas à formação, como os estágios profissionalizantes,destacando-se a idéia de que a formação não se dirige aos indivíduos, mas àsorganizações (CORREIA, 2003).A formação tem centrado suas ações nas carências dos trabalhadorestendencionalmente desadaptados ou defasados, deixando de focar suas açõesnaqueles trabalhadores implicados <strong>no</strong>s processos de mudanças. Correia faz <strong>uma</strong>reflexão a partir das experiências de formação contínua com professores dePortugal, realidade local na qual está inserido, em que predominam concepções“carencialistas” associadas à lógica do trabalho prescrito, conforme reformacurricular daquele país, afirmando, então, que ”a formação deixou de ser um direitopara, na melhor das hipóteses, se transformar n<strong>uma</strong> maldição, num suplício”(CORREIA, 2003, p. 23).A idéia da formação como suplício está associada à formação como um deverde adaptação às transformações tec<strong>no</strong>lógicas ou às atividades prescritas <strong>no</strong>scontextos de trabalho. Modelos de formação que partem de níveis centrais, queplanejam e prescrevem aquilo que é necessário ao trabalhador, sem a participaçãocoletiva dos mesmos, desqualificam e desvalorizam as situações experienciais,desconsiderando, muitas vezes, as reais demandas de capacitação do trabalhador.Portanto, de “direito reivindicado”, a formação transforma-se num suplício “queimporta suportar para se assegurar as condições mínimas de sobrevivência sem secair na exclusão profissional e na exclusão <strong>social</strong>” (CORREIA, 1999, p.7).Das <strong>no</strong>vas formas de gestão do trabalho, incluindo aquelas pertinentes aocampo da formação, emerge um conjunto de estratégias que atendem a diferentesinteresses. A formação <strong>no</strong> trabalho é mediada por interesses oriundos denecessidades do capital, do trabalhador ou do Estado, ou ainda, pela população quecaracteriza o público alvo de determinado <strong>serviço</strong>, que vão definir as demandas porformação.Esses interesses devem ser reconhecidos e analisados de acordo com asparticularidades de cada situação, tais como: <strong>uma</strong> organização privada promove oajustamento da formação à mudança dos conteúdos do trabalho, com intuito de


31melhorar sua “performance” <strong>no</strong> mercado; o Estado pode promover um conjunto deatividades <strong>formativa</strong>s para implantar um programa cuja relevância atenda ainteresses políticos da gestão de gover<strong>no</strong>, sem haver <strong>uma</strong> preocupação comprocessos participativos e com a implementação de <strong>uma</strong> política <strong>social</strong> que atendaàs necessidades sociais dos cidadãos usuários do seu <strong>serviço</strong>; com relação àpopulação usuária, essa pode avaliar a qualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados e indicarnecessidades de aprimoramento, ou seja, <strong>uma</strong> demanda não atendida deverá serquestionada, pois poderá indicar quais saberes são necessários para que osprofissionais possam atendê-la. Portanto, conhecer e identificar a origem dasnecessidades por formação nas organizações é um ponto de partida para aproblematização das relações existentes e do que está em jogo na elaboração daspolíticas de formação <strong>no</strong> trabalho <strong>no</strong>s dias de hoje.Considerando o exposto até aqui, pode-se afirmar que a educação e aformação profissional são questões centrais na agenda contemporânea, pois a elassão atribuídas funções essencialmente instrumentais e de regulação, <strong>uma</strong> vez quesão “capazes de possibilitar a competitividade e intensificar a concorrência, além deadaptar trabalhadores às mudanças técnicas e minimizar os efeitos do desemprego”(SEGNINI, 2000, p.73), sendo essa, a orientação de alg<strong>uma</strong>s organizaçõesinternacionais reguladoras, como o Banco Mundial 10 . Para o Banco Mundial “se nadamais mudar, quanto mais instruídos forem os trabalhadores de um país, maioresserão suas possibilidades de absorver as tec<strong>no</strong>logias predominantes e assim chegara um crescimento rápido da produção” (Banco Mundial, 1996, p.26).Essa argumentação <strong>no</strong>s parece um tanto contraditória, pois de acordo cominformações da Organização Internacional do Trabalho, entre os desempregados docenário mundial “mais de um terço são jovens de 15 a 24 a<strong>no</strong>s” (OIT), dados essesque não confirmam o argumento do Banco Mundial. Fazendo referência aos estudosde Tanguy (1999) sobre a relação formação-emprego, a autora afirma que essarelação se caracteriza por um paradoxo de <strong>uma</strong> “situação em que o aumento donível de formação convive com o agravamento não me<strong>no</strong>s constante da taxa dedesemprego entre os jovens” (1999, p. 48).10 Sugiro ver em Relatório sobre Desenvolvimento Mundial. O trabalhador e o processo de integraçãomundial. Banco Mundial, Washington, 1995.


32Mesmo não tendo a pretensão de discorrer sobre as tendências <strong>no</strong> campo daformação sustentada pelos avanços da tec<strong>no</strong>logia, a intensificação do ensi<strong>no</strong> àdistância suscita, atualmente, diferentes opiniões <strong>no</strong>s bancos acadêmicos e entre asáreas do saber científico. Falar em educação e trabalho, <strong>no</strong>s dias de hoje, éobservar essas tendências <strong>no</strong> campo da formação, que são contornadas pelosartefatos da tec<strong>no</strong>logia informacional que crescem e se solidificam <strong>no</strong>s espaçosformadores, como nas Universidades, através da implementação dos Cursos àDistância. Existem estudos 11 que indicam que as oportunidades virtuais sãotec<strong>no</strong>logias <strong>no</strong> campo da educação que contribuem para a formação permanente docidadão, mesmo sendo à distância (DEMO, 2006).Retomando a reflexão sobre a era do conhecimento citada anteriormente,cabe citar a existência de um forte papel da informação e do conhecimento naseco<strong>no</strong>mias que vem provocando mudanças substantivas nas relações, forma econteúdo do trabalho. A intensidade <strong>no</strong> uso da informação e conhecimento nessesprocessos, apóiam-se, por sua vez, “em <strong>no</strong>vos saberes e competências, em <strong>no</strong>vosaparatos e instrumentais tec<strong>no</strong>lógicos, tanto como em <strong>no</strong>vas formas de i<strong>no</strong>var e deorganizar o processo produtivo” (LASTRES & ALBAGLI,1999,p.8). Um aspectoimportante a ser destacado, diante o paradigma das tec<strong>no</strong>logias e da informação ecomunicação, é que o investimento <strong>no</strong> acesso a <strong>no</strong>vas tec<strong>no</strong>logias e em sistema deinformação avançados são importantes, mas não bastam. Junto a esse processo éfundamental contar com <strong>uma</strong> base de conhecimentos sustentada por um processode aprendizagem contínuo em que os agentes dessas i<strong>no</strong>vações sejam os própriostrabalhadores, por isso a “importância de focalizar o agente coletivo na análise epromoção de tais processos” (LASTRES & ALBAGLI, 1999, p.18).O cenário até aqui descrito, demonstra o quanto é fundamental nãoabandonar a questão do trabalho, nem os questionamentos sobre os impactos quevêm causando tanto para aqueles que vivenciam a sua falta, como para aqueles quefazem parte desse mundo. Esse período de início do século XXI traz muitasincógnitas sobre o futuro da cidadania dentro e fora dos espaços de trabalho e,11Sobre este assunto sugiro ver em DEMO, Pedro. Formação Permanente e Tec<strong>no</strong>logiasEducacionais. Petrópolis, Vozes: 2006. O autor faz referência a diferentes estudos sobre a educaçãoà distância. Mesmo não sendo intenção aprofundar neste estudo tal temática, não há com deixar decitá-la, devido a importância da <strong>dimensão</strong> que vêm sendo dada pelos ideários neoliberais a este tipode processo de formação.


33também, sobre a capacidade de reação e de resistência do conjunto dostrabalhadores e da sociedade frente a esse cenário. (PAIXÃO, 1996). Salienta-se otraço original da educação desenhada <strong>no</strong> século XX e que torna-se desafio nesteséculo XXI “o deslocamento de enfoque do individual para o <strong>social</strong>, para o político epara o ideológico” sendo também possível dizer, que “não há idade para se educar,de que a educação se estende pela vida e que ela não é neutra” (GADOTTI, 1999,p.2).A aproximação entre os contextos de formação e as mudanças pertinentes aomundo do trabalho não estão pensadas somente a partir do entendimento daadaptabilidade, mas é <strong>uma</strong> aproximação crítica preocupada com o processo deeducação dos coletivos de trabalho capazes de movimentos instituintes que possamincidir nas mudanças da organização e dos processos de trabalho. A partir dessecontexto de transformações e das demandas que dele advêm, ganha-se fôlego pararepensar a articulação entre educação e trabalho, que <strong>no</strong>s remete à temática dosaber do trabalhador, das experiências educativas vivenciadas pelos sujeitos e doquanto os espaços sócio-ocupacionais se constituem num lócus de produção deconhecimentos que devem ser objeto de estudo <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social. “Aoapreender os complexos teóricos e práticos que envolvem os processos deprodução e legitimação de saberes <strong>no</strong> trabalho, a temática do sujeito na suaarticulação com a do trabalho volta a se apresentar” (SANTOS, 2003, p.38). Seráabordada, a seguir, <strong>uma</strong> interlocução necessária: educação e trabalho.2.2 A INTERLOCUÇÃO ENTRE A EDUCAÇÃO E O TRABALHOEducar faz parte da própria vida. Quem não ouviu, em algum momento, essaafirmação? Sua origem está nas palavras de Rousseau, que compreendia que todoser h<strong>uma</strong><strong>no</strong> poderia ter “a possibilidade de ser um agente livre e a meta daeducação seria formar esse agente” (STRECK, 2004, p.26). A partir da crítica àsociedade da época, Rousseau mostra ao mundo burguês de seu tempo, que todohomem poderia ser educado para sua emancipação. Entretanto, ainda <strong>no</strong>s dias dehoje, tem-se como desafio formar pessoas, visando a perspectiva emancipatória eautô<strong>no</strong>ma, para que, ao se inserir <strong>no</strong> trabalho, a pessoa possa, dele, fazer umespaço de concretização de cidadania.


34Inicialmente, para que se possa discorrer sobre a temática educação, épreciso compreendê-la como <strong>uma</strong> prática necessariamente permanente. Alg<strong>uma</strong>sreflexões de Paulo Freire em tor<strong>no</strong> do ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong>, abrem caminho para oentendimento da educação como prática permanente:Ressaltamos, inicialmente a sua condição de ser histórico-<strong>social</strong>,experimentando a tensão de estar sendo para poder ser e de estar sendonão apenas o que herda, mas também o que adquire e não de formamecânica. Isto significa ser o ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong>, enquanto histórico, um ser finito,limitado, inconcluso, mas consciente de sua inconclusão. Por isso, um serininterruptamente em busca, naturalmente em processo. Um ser que, tendopor vocação a h<strong>uma</strong>nização, se confronta, <strong>no</strong> entanto com o incessantedesafio da des<strong>uma</strong>nização, como distorção daquela vocação (FREIRE,2003, p.18).Nesse sentido, somos programados para aprender; inacabados, masconscientes de seu inacabamento e, por isso, em permanente busca; indagador,curioso em tor<strong>no</strong> de si e de si com o mundo e com os outros. Como sujeitoshistóricos preocupados sempre com o amanhã, tem-se, como condiçãonecessária,estar inserido-se, ingênua ou criticamente num incessante processo deformação (FREIRE, 2003).A educação é permanente, não porque certa linha ideológica ou certa posiçãopolítica ou, ainda, algum interesse econômico o exijam. A formação e a educaçãosão permanentes na razão, de um lado, da finitude do ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong>, e, de outro, daconsciência que ele tem da sua finitude. Para Freire, o ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong> incorpora à suanatureza “não apenas saber que vivia, mas saber que sabia e assim, saber quepodia saber mais. A educação e a formação permanente se fundam ai” (2003, p.20).A educação, como formação, como processo de conhecimento, de ensi<strong>no</strong> ede aprendizagem, foi incorporada na vida dos seres h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, à sua natureza. ParaFreire (2003, p.21) “não é possível ser gente sem desta ou daquela forma, sem seachar entranhado n<strong>uma</strong> certa prática educativa”. O ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong> jamais pára deeducar-se.As prementes transformações sociais e tec<strong>no</strong>lógicas criaram <strong>no</strong>vos espaçosde conhecimento. Como <strong>no</strong>s diz Gadoti (1999), além da escola, também a empresa,o espaço domiciliar e o espaço <strong>social</strong> tornaram-se educativos. A interdependênciaentre os diferentes espaços sociais, tais como, o domiciliar, o escolar e o de


35trabalho, <strong>no</strong>s remete a romper com a idéia de tempo próprio para aprendizagem.Como ele está todo o tempo em todo lugar, o espaço de aprendizagem é aqui - emqualquer lugar - e o tempo de aprender é sempre. Assim, o espaço-tempo, escolhidonessas reflexões, é aquele de <strong>uma</strong> prática educativa que não ocorre somente naescola formal, mas de <strong>uma</strong> prática educativa vivenciada pelos trabalhadores, a partirda reflexão critica sobre o seu processo de trabalho, em espaços sócio-ocupacionaisem que se dá o exercício de <strong>uma</strong> profissão.Busca-se, nesse estudo, fundamentos teóricos que possam sustentar areflexão sobre a relação entre educação e trabalho. Nas reflexões de Charlot (2004)sobre a relação da educação e do trabalho, encontram-se argumentosepistemológicos fundamentados em Hegel e em Marx, que ligam profundamenteessas questões 12 . Charlot (2004), ao considerar a filosofia de Hegel, ilustra a ligaçãoexistente entre educação e trabalho, a partir da dialética do senhor e do escravo.Hegel mostra que,o escravo, por confrontar-se com a natureza <strong>no</strong> decorrer de seu trabalhopara o senhor, forma-se, enquanto o senhor, ao contrário, cai n<strong>uma</strong> totaldependência em relação ao escravo, incluindo para sua sobrevivênciamaterial. Há aí <strong>uma</strong> idéia fundamental: o trabalho forma. Há até duas idéiasfundamentais já que, à precedente, é preciso acrescentar esta: o trabalho éum processo de domínio: domínio da natureza, de si próprio e, pelo me<strong>no</strong>sa prazo, dominação daquele que não trabalha por aquele que trabalha(CHARLOT, 2004, p.10-11).É a partir desses enunciados de Hegel que Marx encontra pistas para que,<strong>no</strong>s Manuscritos Filosóficos de 1844, pudesse sustentar a idéia do trabalho comoessência do homem. Para Charlot (2004), é porque o trabalho é a essência dohomem que o filósofo Marx escolhe o campo do proletário. Entretanto, Marx sedetém implicitamente na idéia do trabalho como essência do homem, pois irá focarsemais explicitamente nas relações de dominação entre o senhor e o escravo, aburguesia e o proletariado, o capital e o trabalho. “O pensamento de Marx irá deter-12 Ao referenciar as reflexões de Charlot (2004) sobre os enunciados de Hegel e Marx e as pistasdeixadas por estes pensadores sobre a relação entre educação e trabalho, afirma-se a originalidadede Charlot ao retomar a história do pensamento filosófico sobre esses conceitos e enunciá-los comoproblemáticas contemporâneas emergentes.


36se <strong>no</strong> trabalho como valor de troca, deixando pouco explorada a idéia do trabalhocomo valor de uso” (CHARLOT, 2004, p.11). 13Há, então, de acordo com Charlot (2004), pistas deixadas por Hegel e Marxde <strong>uma</strong> ligação entre educação e trabalho. Se o homem transforma o mundo e poresse trabalho de transformação do mundo ele transforma a si mesmo, existem, aí,fortes ligações entre educação e trabalho, pois ao admitirmos que “educar é fazeradvir um ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong>, é de fato essencial saber qual é o processo que pode assimconstruir o h<strong>uma</strong><strong>no</strong>. É o trabalho, podemos responder n<strong>uma</strong> perspectiva marxista”(CHARLOT, 2004, p.11).As raízes dessa idéia de que o trabalho forma, encontram-se profundamentearraigadas <strong>no</strong> mundo operário, em que os <strong>social</strong>istas do século XIX negavam osprincípios da escola primária e gratuita da época.Para eles tratava-se de <strong>uma</strong> armadilha da burguesia que queriaimpedir que os seus filhos continuassem a ser educados <strong>no</strong> atelier, lá ondeeles aprenderiam a solidariedade de classe. Quanto a Marx, ele consideravaque cabe ao povo educar o Estado, e não ao estado educar o povo”(CHARLOT, 2004,p.12).Historicamente, porém, o modelo da educação somente <strong>no</strong> atelier, ou daeducação para o trabalho e pelo trabalho, é superado pelo modelo da escolaprimária para todos – gratuita e obrigatória –, distinguindo-se dos lugares detrabalho. O trabalho, <strong>no</strong> final do século XIX e início do século XX, era, ainda,pensado como força criativa e propulsora de um <strong>no</strong>vo mundo, aquele em que seacreditava que a sociedade comunista tomaria o lugar do capitalismo. Entretanto,13 Ao tratar sobre o valor de uso e valor de troca, <strong>no</strong> Capital, Marx refere que “é a utilidade de <strong>uma</strong>coisa que faz dela um valor de troca” (MARX, K. O Capital. Edição Popular/Lisboa: edições 70. 5ªEdição. S/a<strong>no</strong>.p.17) “Uma coisa pode ser útil e produto do trabalho h<strong>uma</strong><strong>no</strong> sem ser <strong>uma</strong> mercadoria.O homem que, com sua produção, satisfaz as necessidades pessoais, produz efetivamente um valorde uso, mas não <strong>uma</strong> mercadoria. Para produzir mercadorias, é preciso que não produza apenassimples valores de uso, mas valores de uso para outrem, valores de uso sociais. Finalmente, nadapode ser valor sem ser objeto de uso. Se for inútil, não conta como trabalho e portanto, não criavalor.” (p.20). E sobre isto muito há o que adensar, por isto nesta <strong>no</strong>ta chama-se atenção para areflexão sobre o valor de uso enunciado na teoria de Marx, e da possibilidade de explorar estacategoria ( mesmo esta não sendo referencia reflexiva inicial desta pesquisa) trazendo-a paracompreensão da relação entre educação e trabalho. Pois o trabalhador <strong>no</strong> seu processo de trabalhoao atribuir sentido ao mesmo, poderá produzir saberes como resultado de sua interação nas relaçõesde trabalho e mais do que isto, ao usar estes saberes poderá atender necessidades sociais deoutrem e estrategicamente vivenciar experiências sociais que possam resistir aos ditames neoliberaise traçar redesenhos coletivos que contribuam com a concretização de <strong>uma</strong> sociedade com justiça<strong>social</strong>.


37após a primeira e a segunda guerras mundiais, o trabalho passa ser pensado comoforça trocável e a educação como forma de acesso ao mercado de trabalho.Percorrer essa trajetória histórica requer análises longas que não pretende-sefazer aqui, mas não se pode deixar de citar tais fragmentos históricos, pois essescontribuem para compreender o lugar que ocupam a educação e o trabalho <strong>no</strong>s diasde hoje, e os interesses que sustentam essa ligação <strong>no</strong> cenário atual. Pois, comorefere Charlot (2004, p.14), paradoxalmente, “é em termos de acesso ao mundo dotrabalho que a educação é pensada hoje, e, cada vez mais, é este acesso que elaestá reduzida hoje.”Seguindo o entendimento da existência de <strong>uma</strong> ligação da educação e dotrabalho, considera-se que assim “como a educação, o trabalho é <strong>uma</strong> experiência<strong>social</strong>” (CATTANI, 1996, p.140), que se constitui em um fator essencial da<strong>social</strong>ização e da dinâmica das relações sociais. Mesmo com suas característicascontraditórias, trabalhar é fonte de prazer e de satisfação, pois através da execuçãode tarefas úteis, o trabalhador pode, de alg<strong>uma</strong> forma, contribuir com a sociedadeem geral. Trabalhar significa, também, ato de criação, de desvendamento de <strong>no</strong>ssaspotencialidades, de desejos, de auto<strong>no</strong>mia, de confrontação com a realidade e deprocesso de aprendizagem.Uma outra perspectiva importante para compreensão do trabalho nacontemporaneidade, diz respeito à <strong>dimensão</strong> da contradição e da dialética presentenessa categoria, fundamentada <strong>no</strong> materialismo histórico de Marx (1980). Ao mesmotempo em que dignifica, possibilita a criação e tem sido vital para a h<strong>uma</strong>nidade, otrabalho, esse ato laborativo, degrada, aliena, explora e desvaloriza o potencialh<strong>uma</strong><strong>no</strong>.Quando a vida h<strong>uma</strong>na se resume exclusivamente ao trabalho, elafreqüentemente se converte num esforço pe<strong>no</strong>so, alienante, aprisionandoos indivíduos de modo unilateral. Se por um lado, necessitamos do trabalhoh<strong>uma</strong><strong>no</strong> e reconhecemos seu potencial emancipador devemos tambémrecusar o trabalho que explora, aliena e infelicita o ser <strong>social</strong> (ANTUNES,2005, p. 14).Por outro lado, em determinadas situações de trabalho, há um processo derealização que desencadeia <strong>uma</strong> transformação real <strong>no</strong> trabalhador. “O trabalhocomo atividade proposital, orientado pela inteligência, é produto especial da espécieh<strong>uma</strong>na” (BRAVERMAN, 1987, p.52). Portanto, trabalhar não é exclusivamente


38transformar um objeto ou <strong>uma</strong> situação n<strong>uma</strong> outra coisa; é, também, transformar asi mesmo <strong>no</strong> e pelo trabalho, e, com o passar do tempo, o homem modifica tambémo seu “saber trabalhar”. “Em termos sociológicos, pode-se dizer que o trabalhomodifica a identidade do trabalhador, pois trabalhar não é somente fazer alg<strong>uma</strong>coisa, mas fazer alg<strong>uma</strong> coisa de si mesmo, consigo mesmo” (TARDIF, 2002, p.56).É neste fazer alg<strong>uma</strong> coisa consigo mesmo que encontramos as brechas paraa aprendizagem <strong>no</strong> trabalho, para a mudança <strong>no</strong> jeito de fazer, <strong>no</strong> jeito de pensar e,por isso, a oportunidade de evoluir, de crescer, de adquirir conhecimento. É esse oprocesso de formação que é defendido aqui. “Sendo formação processo, duraporque não dura, ou dura porque se transforma” é o que <strong>no</strong>s diz Demo (2006, p.37).Encontram-se ainda, na literatura sobre a temática, diferentes estudos queabordam a importância da relação da formação com o mundo do trabalho, enfocadacomo <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> fundamental na perspectiva de <strong>uma</strong> educação para a cidadania(CANÁRIO, 2003). Tal enfoque busca superar o histórico conflito existente em tor<strong>no</strong>do papel da própria escola, de formar para a cidadania ou para o trabalho produtivo(RAMOS, 2005) 14 .Pensar, então, a formação em articulação com as situações de trabalho,constitui-se como um tema cuja atualidade, oportunidade e relevância, podem serjustificados por três razões. De acordo com as pesquisas que vêm sendo realizadaspor Canário (2003), assiste-se nas últimas décadas a <strong>uma</strong>expansão quantitativa e a <strong>uma</strong> difusão das práticas de formação que sãolargamente tributárias da crescente importância estratégica da formaçãoprofissional contínua que tem vindo a constituir-se como um domíniofundamental para a investigação, a reflexão teórica e a intervenção <strong>no</strong>campo educacional (CANÁRIO, 1997, p.7).Essas expansões das práticas de formação representam <strong>uma</strong> extensão domundo profissional da população adulta, que vão além das modalidadesescolarizadas e que defendem a idéia de reciclagem, considerando as aquisiçõesfeitas <strong>no</strong> processo de formação inicial. Entretanto, reconhece-se hoje a importância14 Atualmente <strong>no</strong> Brasil existem estudos que apontam as possibilidades e desafios na elaboração de<strong>uma</strong> proposta curricular na perspectiva da formação integrada voltada para os jovens e adultostrabalhadores que garanta o direito a <strong>uma</strong> formação que lhe permita a leitura do mundo e paraatuação neste e integrado de forma digna e com consciência crítica e política. Sobre este assuntosugiro ver em RAMOS, Marise. Possibilidades e desafios na organização do currículo integrado. SP,2005.


39de revalorizar o potencial formativo das situações de trabalho, pois ao propiciarem aprodução de estratégias, de dispositivos e de práticas de formação “valorizamfortemente a aprendizagem por via experiencial e o papel central de cada sujeitonum processo de autoconstrução como pessoa e como profissional” (CANÁRIO,2003, p.7).A construção de <strong>no</strong>vas maneiras de pensar e de agir <strong>no</strong> campo da formaçãocontínua é <strong>uma</strong> segunda razão, que aparece associada às formas de organizar osprocessos de trabalho. Nessa lógica, tem-se a centralidade do sujeito que se forma,que se dá através da maneira como utiliza um saber na própria experiência detrabalho. O ponto de referência aqui é o próprio sujeito, capaz de dar continuidadeaos processos de formação através de sua prática profissional.São os sujeitos (ao contrário do que acontece <strong>no</strong> quadro deprocessos de formação transmissivos e <strong>no</strong>rmativos) que estão emcondições de mobilizar para as situações de formação os saberesadquiridos nas situações de trabalho e, por outro lado, reinvestir nassituações de trabalho o que anteriormente se formalizou. Cria-se, assim,condições para <strong>uma</strong> interação fecunda entre <strong>uma</strong> via simbólica e <strong>uma</strong> viaexperiencial de aprendizagem, e emergem de forma concomitante, osconceitos de trajetória profissional e de percurso de formação (CANÁRIO,2003, p.8).A terceira razão diz respeito ao papel determinante e decisivo que se atribuiao fator h<strong>uma</strong><strong>no</strong> na vida das organizações de trabalho, cujas capacidadesindividuais associam-se às capacidades coletivas de mudanças organizacionais.Essa razão enfatiza a tendência evolutiva de <strong>uma</strong> concepção (instrumental eadaptativa) de formação para a mudança, para <strong>uma</strong> concepção de formação namudança, “devolve à ação interativa dos atores, em contexto, o principalprotagonismo” (CANÁRIO, 2003, p 8).Sobre o protagonismo do trabalhador, muito ainda há que se refletir e tratar,principalmente sobre as estratégias que os assistentes sociais constróem <strong>no</strong>sprocessos de trabalho. Entretanto, para que esse protagonismo ocorra, será precisoencarar as situações de formação como reconstruções das situações de trabalho,sobretudo de <strong>social</strong>ização dessas práticas profissionais. Atualmente se reconhece<strong>uma</strong> forte <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> das situações e contextos de trabalho como <strong>uma</strong>possibilidade fecunda, “para orientar quer a produção de <strong>no</strong>vas práticas <strong>formativa</strong>s


40quer a sua elucidação a partir da produção de <strong>no</strong>vos conhecimentos” (CANÁRIO,2003, p.8).Ao trazer para esta pesquisa o entendimento de que o trabalho possui <strong>uma</strong><strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> relevante, considera-se que “os sistemas de trabalho devem sertambém encarados como sistemas cognitivos” (CORREIA, 2003, 32) em que osmodos de pensar e os instrumentos estejam disponíveis à <strong>uma</strong> intervençãopotencialmente transformante. Entretanto, as aquisições das cognições transcendemas individuais, pois essas emergem de <strong>uma</strong> rede de relações <strong>no</strong> espaçoorganizacional.Encarar as situações de formação dos assistentes sociais comoreconstruções das situações de trabalho e <strong>social</strong>ização destas práticas profissionaisé <strong>uma</strong> das maneiras de preencher o “fosso entre a academia e os profissionais deponta”, questão apontada por Netto (1996, p.110), que poderá contribuir com asi<strong>no</strong>vações tão necessárias para a construção de conhecimentos frente à realidade<strong>social</strong> contemporânea. Compactua-se com o entendimento de Netto (1996) de que acategoria profissional necessita problematizar sua formação profissional, incluindonesse debate todos os assistentes sociais, não apenas as <strong>no</strong>vas gerações, mas,fundamentalmente, aqueles oprimidos <strong>no</strong> mercado de trabalho diante das <strong>no</strong>vasexigências.Canário (2003) salienta em suas reflexões sobre a temática em foco, aimportância do exercício profissional como pólo decisivo do processo deprofissionalidade. A escolha pela profissão de Assistente Social é <strong>uma</strong> procura por<strong>uma</strong> formação e, até mesmo, <strong>uma</strong> procura identitária. Essa escolha profissionaldireciona o sujeito para <strong>uma</strong> prática <strong>social</strong> comprometida com as mudançassocietárias e não para <strong>uma</strong> prática que reproduz valores desiguais e que se submeteaos ditames do mercado neoliberal, por isso a importância de problematizarmos aformação profissional <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social. Tal reflexão coloca em evidênciaa necessidade, mesmo não sendo foco desse estudo, de abordar o significadoatribuído ao termo profissão. A princípio, tem-se que a profissão de um indivíduo “é oreconhecimento <strong>social</strong> dos saberes que ele adquiriu na esfera da formação, bemcomo dos <strong>serviço</strong>s ou produtos que ele é capaz de oferecer, reconhecimento esseconferido por meio de sua inserção <strong>no</strong> mercado de trabalho” (FRANZOI, 2006, p.50).


41Entretanto, para além dessa concepção, Franzoi (2006, p. 51) entende que aprofissionalização de um indivíduo “não se realiza apenas na formação: só secompleta com a inserção <strong>no</strong> trabalho, por um lado, porque o conhecimento necessitada prática para se efetivar; por outro, porque é com a inserção <strong>no</strong> trabalho que seconcretizam as relações de trabalho”. É <strong>no</strong> trabalho que a profissão se materializa. É<strong>no</strong> trabalho cotidia<strong>no</strong> que os assistentes sociais experimentam as contradições darealidade, acionam um conjunto de conhecimentos e de habilidades profissionais,disputam espaços e projetos políticos, organizam-se coletivamente para asmudanças e, principalmente, se deparam com as demandas sociaiscontemporâneas.É preciso repensar a formação profissional dos assistentes sociais levandoem conta seus saberes e as realidades específicas de seu trabalho cotidia<strong>no</strong>. Existe,então, <strong>uma</strong> necessidade de associar a formação a <strong>uma</strong> ação que poderá promover arequalificação dos coletivos de trabalho.A desejável, aproximação entre os contextos de formação e oscontextos de trabalhos pode, por isso, ser pensada segundo o registro daadaptabilidade. Ela é <strong>uma</strong> aproximação crítica, funcionalmente“desadaptada” às relações instituídas de trabalho preocupada com arequalificação dos colectivos de trabalho; a formação é em s<strong>uma</strong>, <strong>uma</strong>gente catalisador das trocas entre as diferentes “linguagens do trabalho”um catalisador das potencialidades formantes do exercício do trabalho,exercendo simultaneamente <strong>uma</strong> permanente vigilância crítica sobre aorganização, sobre as tendências que tendem a desqualificá-la (CORREIA,2003, 32).É pertinente pensar que os resultados obtidos através de um processo deformação não se configuram como resultados definitivos, pois estão sujeitos aosquestionamentos impostos pelas exigências do momento sócio-histórico <strong>no</strong> qualestá implicado o trabalhador. Sobre esse argumento, Demo (2006) refere o fortequestionamento sobre a pedagogia de resultados definitivos.Primeiro, não <strong>no</strong>s formamos por completo, porque na natureza nadaé completo, tudo evolui. Embora não possamos ser perfeitos, somosperfectíveis, podemos aprender sempre. Segundo nenhum diploma é strictosensu ponto de chegada, porque nele nada se fecha propriamente, a nãoser um reconhecimento formalizado (DEMO, 2006, p.37).Dito de outro modo, não há <strong>uma</strong> formação definitiva, assim, a formatura deum profissional deve ser compreendida como <strong>uma</strong> passagem para um <strong>no</strong>vo desafio,o de considerar que a formação é permanente. Entretanto, parece fundamental a


42análise crítica e a compreensão dos fundamentos ideológicos que sustentam oparadigma da aprendizagem ao longo da vida, principalmente a partir dos a<strong>no</strong>s1990, quando a discussão sobre a educação se desloca do “terre<strong>no</strong> político efilosófico para o terre<strong>no</strong> da eficácia e da subordinação funcional da educação àracionalidade econômica” (CANÁRIO, 2003, p. 198).Nesse sentido, o debate sobre a formação e a educação <strong>no</strong>s remetem a <strong>uma</strong>reflexão crítica sobre os significados atribuídos aos modos de aprendizagens, quepara responderem aos desafios da mundialização, priorizam o debate sobre osmeios que acabam sobrepondo-se ao debate sobre os fins (CANÁRIO, 2003). Emque pese a importância dos meios e do modo como desencadeiam-se os processosde aprendizagem, há de se ter a clareza do onde se quer chegar, a que princípios einteresses se vai atender e sobretudo, compreender que os saberes que estãosendo adquiridos estarão a <strong>serviço</strong> de diferentes interesses. Por isso o debate sobreos fins torna-se fundamental e, neste estudo, o ambiente de trabalho é o espaço quepermite esta reflexão <strong>uma</strong> vez que o saber está sendo colocado em uso paraatender necessidades sociais postas como requisições para os trabalhadores.Assim, compreende-se que o entranhamento em <strong>uma</strong> prática educativa nãoocorre somente na escola formal, e esta pesquisa refere-se à necessidade de <strong>uma</strong>prática educativa dos Assistentes Sociais a partir da reflexão critica sobre o seuprocesso de trabalho, para que se possa comprender que os meios não sesobreponhem aos fins e vice-versa.Percorrer por estas concepções teóricas que fundamentam as categoriasreflexivas desta investigação, marcadas pela tríade formação, educação e trabalho,demarca a revisão bibliográfica sobre as mesmas e a escolha dos pressupostos quesustentam a caminhada investigativa <strong>no</strong> campo do Serviço Social. Entretanto, aeducação permanente, como categoria central dessa investigação, será tratada sobseus aspectos históricos e conceituais, devido a relevância de compreendê-la, paraque se possa comprometer-se com a efetivação da mesma, a partir da reflexãocrítica sobre os processos de trabalho dos assistentes sociais.


432.3 (RE)VALORIZAÇÃO DOS IDEAIS DA EDUCAÇÃO PERMANENTEA educação, na verdade, necessita tanto de formações técnicas ecientíficas como de sonhos e utopias.Paulo Freire.O titulo aqui atribuído, (Re) Valorização dos Ideais da Educação Permanente,é resultado de questionamentos sobre a real compreensão da concepção atribuída àEducação Permanente <strong>no</strong>s dias de hoje, em tempos, ainda, de valorização de algoque não foi suficientemente valorizado na história da educação e da formação dah<strong>uma</strong>nidade, ou, quem sabe, de revalorização do movimento da EducaçãoPermanente dos a<strong>no</strong>s 1970, com <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va roupagem tecida pelos ideáriosneoliberais.Cabe sinalizar que o discurso da educação permanente é, em muitassituações, reconhecido com o da aprendizagem ao longo da vida e, portanto, épertinente <strong>uma</strong> análise sobre o uso dessas termi<strong>no</strong>logias, considerando o percursohistórico de ambas concepções. A idéia de que a educação e a formação nãopodem se restringir a <strong>uma</strong> determinada etapa da vida e de que se constitui umprocesso contínuo ao longo da existência, parece ser consensual (Canário,1994) e,por isso, requer <strong>uma</strong> compreensão e um conhecimento da origem e dos princípiosda educação permanente.Observa-se, também, a existência da referência educação permanente com omesmo sentido atribuído à educação ou à formação continuada. A reflexão teórica,aqui explicitada, pretende contribuir com a elucidação dessas concepções, atravésde <strong>uma</strong> revisão crítica do conceito de Educação Permanente e do discursoideológico da aprendizagem ao longo da vida.Além disso, na realidade brasileira, mais especificamente, a política decapacitação dos profissionais que atuam <strong>no</strong> Sistema Único de Saúde –SUS –considera a educação permanente como estratégia educacional e dedesenvolvimento dos trabalhadores da saúde e, conseqüentemente, do própriosistema. Assim, a concepção de educação permanente é instituída na gestãopública da saúde brasileira. Essa aproximação com a política de saúde <strong>no</strong> Brasil dásepor ser esse o território empírico que vai determinar os espaços sócio-


44ocupacionais dos sujeitos dessa investigação, pois acredita-se que as experiênciasde educação permanente podem se dar em diferentes tempos, espaços e contextos,incluindo os de trabalho.2.3.1 Aspectos Históricos e ConceituaisAo revisarmos a literatura nas ciências da educação, que dá conta dadiscussão histórica da educação permanente, encontram-se relatos de experiênciasde educação popular que estão relacionadas com a educação de adultos, de formaminimamente estruturada e <strong>no</strong> exterior do sistema formal de ensi<strong>no</strong> (MELO, 1986).Durante a década de 1970, um grupo de<strong>no</strong>minado Grupo Diretor sobreEducação Permanente, com patrocínio do Conselho da Europa, visitou e observou25 experiências piloto de educação popular, o que culmi<strong>no</strong>u em um relatório finalapresentado <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1978. O Grupo classificou as experiências descritas emfunção do posicionamento de maior ou me<strong>no</strong>r intensidade em dois vetores: “aparticipação dos adultos na sua própria formação e a intenção globalizante doprojeto” (MELO, 1986, p.50). O segundo vetor expressa o sentido atribuído aopopular 15 como um futuro desejado. É, então, esse futuro desejado que acabará porcriar meios de agir sobre o ambiente natural e <strong>social</strong>. “Para lá dosaber/conhecimento passa a desenvolver-se o saber/poderes para agir” (MELO,1986, p.50).Nesse entendimento, centra-se a crítica de que esse saber/poder para agirnão poderia ser objeto de receitas pré-estabelecidas que um professor passaria atransmitir aos alu<strong>no</strong>s e, sim, teria de ser produção do próprio grupo. “Neste caso oprocesso central da educação popular deixa de ser um saber possuído por um - oprofessor, para se tornar n<strong>uma</strong> criação coletiva de cultura por um grupo de iguais”(MELO, 1986, p.51). Essa perspectiva de educação popular apontada pelo relatórioem questão, revela <strong>uma</strong> tendência: a autogestão pedagógica. Tal tendência torna-seirresistível e influencia aspectos essenciais do fenôme<strong>no</strong> da aprendizagem.Em primeiro lugar, modifica a relação entre quem aprende e o saberexistente (relação já de dominador-dominado ou, melhor, de criador-criado e15 Para isto também, foi preciso demonstrar o entendimento vigente sobre a concepção do popularque é entendido como um presente vivido e popular como um futuro desejado.


45não mais de reverência humilhante para com a “cultura objeto de culto,osaber idealizado); em segundo lugar, altera a maneira como se elabora edesenvolve o próprio saber, outorgando um papel cada vê mais ativo aquem aprende, que se torna genuinamente o sujeito da aprendizagem(MELO, 1986, p.51).Esse entendimento classificaria, então, as experiências de educação popularde acordo com o grau de participação dos adultos na sua própria formação, critérioesse apresentado pelo Relatório Final do Conselho da Europa. Outro aspecto refereseaos autores dessas experiências, grupos sociais pertencentes às classesdominadas,que se organizam para obter <strong>uma</strong> solução (ou fazer <strong>uma</strong> discussão) coletivados problemas provocados por um cotidia<strong>no</strong> que lhes é alheio e do qualpretendem apropriar-se( quanto mais não seja, pela conquista de <strong>uma</strong>melhor compreensão do porquê desse cotidia<strong>no</strong>s) (MELO, 1986, p.50).As reflexões introdutórias sobre educação popular <strong>no</strong>s levam às origens domovimento da educação permanente, que emergiu <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1970, num contexto deruptura e de crítica, de lutas operárias e estudantis em oposição ao modelo escolar,que <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 50 e 60 expandiu-se de forma acelerada, culminando na crise mundialda educação (CANÁRIO, 1994). As idéias e as práticas de educação e de formaçãoque se sucederam <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1970, influenciadas pelas experiências de educaçãopopular, traduziram-se <strong>no</strong> movimento da educação permanente, movimento esseque tinha como princípios a <strong>dimensão</strong> política e filosófica, indicado em publicação deum relatório da UNESCO 16 , o aprender a ser, sendo essa concepção “um ponto deviragem <strong>no</strong> modo de encarar e conceber os processos educativos” (CANÁRIO, 2003,p.192).Nesse contexto, a “perspectiva da educação permanente aparece como umprincípio reorganizador de todo o processo educativo” (CANÁRIO, 1994, p.2), cujasorientações propõem-se a superar as concepções dominantes e as práticasescolarizadas. Considerado como o manifesto da educação permanente, o relatórioda UNESCO enfatizava <strong>uma</strong> oposição à lógica cumulativa e escolar daaprendizagem, e privilegiava um processo educativo coincidente com o ciclo vital e aconstrução da pessoa.16 No a<strong>no</strong> de 1976 o Instituto UNESCO da Educação publica um dos livros básicos para entender oprocesso da educação permanente: DAVE, R.H.(dir). Fundamentos de la educación permanente.Santillana: Instituto de la UNESCO.Madrid. 1979. Esta trajetória histórica também é tratada por Osório(2003). Sugiro ver em OSÓRIO, Agustín. Educación Permanente Y Educación de adultos. EdItoraAriel: Barcelona, 2003.


46Esta emergência da pessoa como sujeito da formação apareceassociada a três pressupostos sobre a educação: o da diversidade, o dasua continuidade e o da sua globalidade. Esta concepção de educaçãopermanente aparecia na época, como <strong>uma</strong> possibilidade de pensar ereorganizar todo o processo educativo, subordinando-o à construção de<strong>uma</strong> cidade educativa (CANÁRIO, 2003, p.192).A idéia da pessoa como sujeito da formação e os pressupostos dacontinuidade, diversidade e globalidade, materializam-se em processos deaprendizagem, que são resultados de <strong>uma</strong> combinação de diferentes situações emodalidades de formação, que depende da relação que esse sujeito estabelece comos outros e com o mundo (CANÁRIO, 1994). Essa concepção de educaçãopermanente também esteve fortemente ligada a correntes de pensamento crítico,que se contrapõem ao sistema escolar. 17Entretanto, ainda <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1968, o próprio diretor da UNESCO da época,René Maheu, refere que a educação permanente não pretende criar um sistemaparalelo ao sistema escolar e universitário e sim “englobar todas as formas daeducação, a totalidade da população e as idades da vida” (OSÒRIO, 2003, p.17).Não se trata, portanto, de <strong>uma</strong> atividade específica, como a educação deadultos. É mais do que isso. Há <strong>uma</strong> ampla revisão literária, realizada por Osório(2003) sobre as publicações que permitiram elucidar a concepção de educaçãopermanente, superando a sua relação direta com a educação de adultos. Um dostextos chaves que elucidam essas concepções a partir de <strong>uma</strong> revisão sobre aeducação na época, refere-se à obra Aprender a Ser, de Edgar Faure, publicada em1972. O autor procurou elaborar um conceito de educação permanente em que emum só expressasse todos os momentos do ato educativo.Atualmente a educação já não se define em relação a um conteúdodeterminado, trata-se de entendê-la como um processo do ser h<strong>uma</strong><strong>no</strong> que,17 Entre os autores pode-se citar Ivan Ilich (1971) com <strong>uma</strong> idéia radical que se contrapõe ao sistemaescolar e em um outro contexto, Paulo Freire que sistematizou <strong>uma</strong> crítica ao sistema de educaçãobancária defendendo a idéia de <strong>uma</strong> escola libertadora que seja capaz de ajudar a ler e transformar omundo. Ver em Pedagogia do Oprimido.... Vejamos um comentário de Nóvoa (2002) sobre Ivan Illich:“publicou um livro simbólico, Deschooling society, que em português recebeu o título Sociedade semescolas, inseria-se n<strong>uma</strong> crítica ao “projeto escolar” que vinha sendo formulada a partir de sedes tãodiferentes como as sociologias da reprodução, as pedagogias não diretivas, as trorias da libertação,as perspectivas institucionalistas ou os movimentos da educação permanente. A história correu aocontrário das expectativas de Illich. Nos últimos trinta a<strong>no</strong>s assistiu-se a um crescimento dos sistemasescolares, que forma invadindo todos os espaços e tempos de vida. O apelo recente à educação eformação ao longo da vida é o episódio mais recente de um longo processo de escolarização dasociedade” (NÓVOA, 2002, p.13).


47através da diversidade de suas experiências, aprende a expressar-se, acomunicar-se, a interrogar o mundo e cada vez mais a si mesmo (FAURE,1972, p.220).Essa idéia de processo, em todas as idades da vida e, também, oentendimento que transcende os muros das instituições, dos programas e dosmétodos, confere a essa concepção um sentido mais amplo das discussões atéentão, mantidas e relacionadas com a educação de adultos (OSÓRIO, 2003).Partindo dessas reflexões e de <strong>uma</strong> síntese conclusiva sobre educação permanente,citada por Osório (2003), não se trata de um sistema, tampouco de um setoreducativo, mas de um princípio <strong>no</strong> qual se funda a organização de um sistemaglobal, em diferentes momentos da vida, em tempos e espaços determinados.Osório (2003), na tentativa de agrupar a discussão do próprio conceito deEducação Permanente, reportou-se às considerações da Conferência Geral deNairobi, em 1976, o que se apresenta de forma sintetizada na tabela a seguir,Tabela 1: Concepção de Educação Permanente da Declaração da Conferência Geral deNairobi, em 1976 18Educação PermanenteAlg<strong>uma</strong>s de suas conseqüências1. Designa um projeto 1. Não é um sistema fechado.2. Global 2. Não está setorizado.3. Encaminhado a reestruturar o sistemaeducativo como o desenvolvimentotodas as possibilidades de formaçãofora do sistema educativo.4. Nesse projeto, o homem é o sujeito desua própria educação, por meio dainteração permanente com suas açõese reflexões.3. Vai mais além do sistema educativo e,em conseqüência, mais além de umMinistério de Educação.4. É participativo, descentralizado eimbricado nas demandas sociais.18 Mesmo não tendo sido possível revisar na fonte do documento original da Conferência de Nairobi(1976) faz-se referência da síntese enunciada por Osório (2003) sobre a concepção de EducaçãoPermanente tratada em Nairobi em 1976.


485. A Educação Permanente deixa delimitar-se ao período da escolaridade.6. Deve abarcar todas as dimensões dasvidas, todos os ramos do saber e todosos conhecimentos práticos que possamadquirir-se por todos os meios.7. E deve contribuir a todas as formas dedesenvolvimento da personalidade.8. Os processos educativos que seguemao largo da vida das crianças, dosjovens e dos adultos, qualquer que sejasua forma, devem ser consideradoscomo um todo.5. É transescolar.6. É integral. Abarca todos os campos deformação, por lo que seresponsabilizará a todas as instituiçõesimplicadas e grupos sociais.7. Vinculação dos projetos de formaçãocom os projetos de desenvolvimentoem todos os âmbitos.8. Vinculação de todos os processoseducativos entre si.Fonte: OSÓRIO (2003, p.25).As pontuações referentes à concepção de educação permanente destacadasna tabela, estabelecem pautas <strong>no</strong>rteadoras para sua operacionalidade, tais como:projeto global, formação fora da escola, que supera o período escolar, compreensãoda diferentes dimensões da vida h<strong>uma</strong>na e de desenvolvimento integral. Entende-seque a compreensão do sentido atribuído ao significado da educação permanentedeverá se dar em diferentes contextos históricos, considerando as transformaçõessocietárias e os interesses vigentes das classes sociais em relação. Portanto, naeducação permanente, não se trata somente de resolver problemas ou de <strong>uma</strong>forma técnica que usa determinadas estratégias, e, tampouco, de um processoeducativo pontual, “e sim decifrar também o sentido de tais ações que não terminamnum ato isolado, mas que resultam um processo contínuo” (OSÓRIO, 2003, p.14).Entretanto, são limitados os avanços e os registros do movimento daeducação permanente nas práticas educativas. Sucintamente, pode-se dizer que:houve <strong>uma</strong> redução da concepção da educação permanente, relacionando-a com operíodo pós-escolar voltado ao público adulto não-escolarizado, <strong>uma</strong> espécie dereciclagem, de <strong>uma</strong> segunda oportunidade, ou, ainda, como sinônimo de educação


49de adultos. Também as políticas de educação permanente passaram a assumir <strong>uma</strong>tendência, a extensão da formação escolar, pois, em vez de educação permanente,tem-se a permanência da educação e, <strong>no</strong> caso, a escolarizada. Canário (2003),refere-se à crítica atribuída a essa importância escolar, pois “assistiu-se,paradoxalmente, à transformação do planeta em <strong>uma</strong> gigantesca sala de aula”(p.193). Tão importante quanto as limitações já citadas e contraditoriamente àconcepção de aprender a ser, está a desvalorização atribuída às aprendizagensh<strong>uma</strong>nas não-escolarizadas, ou seja, a partir das vivências experienciais (CANÁRIO,1994, 2003).No último quartil do século XX, assistiu-se, em <strong>no</strong>me do desenvolvimento daeducação, “a <strong>uma</strong> erosão progressiva e continuada das referências da educaçãopermanente que conduziu a sua perversão” (CANÁRIO, 2003, p.193). Pode-se dizerque em diferentes experiências educativas, mesmo embrionárias e em um contextode iniciativa popular, esse movimento se fez presente, e sua matriz eraessencialmente política e filosófica.Hoje, pode-se dizer que o discurso oficial da aprendizagem ao longo da vida,marcado a partir da década de 1990, que tem como pretensão a retomada da apostado movimento da educação permanente dos a<strong>no</strong>s 70, é bem diferente. Se <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s70 havia <strong>uma</strong> controvérsia, hoje prevalece o consenso, ou seja, a ausência dedebate e a negação do pensamento crítico.A partir de agora só se admite a discussão sobre os meios,negando-se qualquer pertinência à discussão dos fins, ou seja, àquilo queestá <strong>no</strong> cerne da política e da cidadania. A determinação pelos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s doseu devir individual e coletivo. De facto, se a justificação da educaçãopermanente era de ordem eminentemente política e filosófica, aargumentação que fundamenta a “aprendizagem ao longo da vida” é denatureza inteiramente diversa (CANÁRIO, 2003, p.193).A natureza diversa que Canário (2003) refere, tem origem nas transformaçõesque se sucederam a partir das últimas décadas do século XX e rebatem na forma devida dos trabalhadores, determinando suas condições de vida, de resistências e deacesso às políticas sociais vigentes. Anteriormente, foram destacadas nessecapítulo, alg<strong>uma</strong>s dessas transformações de toda ordem, que vêm influenciando otrabalho, a educação e a formação profissional <strong>no</strong> século XXI.


50O memorando sobre Aprendizagem ao longo da Vida, elaborado pelaComissão Européia em março de 2000, refere que a aprendizagem ao longo da vidaconstitui-se em <strong>uma</strong> estratégia que tem o intuito fornecer as condições para aadaptação às <strong>no</strong>vas exigências dos empregadores e ou dos mercados laborais.Supostamente, há <strong>uma</strong> preocupação com o desemprego ou com a empregabilidade,com a mão-de-obra qualificada ou adaptada e com a aquisição de <strong>no</strong>vascompetências. Essa preocupação afasta-se da raiz h<strong>uma</strong>nística e crítica,fundamentos da educação permanente, tendendo a ser diluída nas dimensõeseducativas para se afirmar como formação e aprendizagem a <strong>serviço</strong> dos ideáriosneoliberais.Assiste-se, então, a um chamamento da aprendizagem ao longo da vida, ouainda, da “educação ao longo de toda a vida” (DELORS, 2003,p.21), num contextode retração do Estado, ou melhor, de retração das políticas sociais, incluindo ocampo da educação, a assistência <strong>social</strong> e a saúde. Esse contexto reforça a idéiadas responsabilidades individuais pela aquisição de saberes e das chamadascompetências tão necessárias de quadro <strong>social</strong> competitivo de inserção <strong>no</strong> mercadode trabalho.Observa-se que <strong>no</strong> Relatório para a UNESCO, da Comissão Internacionalsobre Educação para o século XXI, Delors chama a atenção para a definição de que“o conceito de educação ao longo de toda vida aparece, pois, como <strong>uma</strong> das chavesde acesso ao século XXI” (2003, p.19). A co<strong>no</strong>tação atribuída tem a pretensão dedar resposta aos desafios postos, por um mundo em rápida transformação, atravésde <strong>uma</strong> necessária compreensão melhor do outro e do mundo. Entretanto, para isso,a Comissão desse relatório enfatiza a necessária reflexão sobre as diferentescategorias de ensi<strong>no</strong> (educação básica, ensi<strong>no</strong> secundário e ensi<strong>no</strong> superior) e nãose detém na discussão da educação permanente como um processo educativo forados espaços escolares, dando evidência à aprendizagem ao longo da vida.Contudo, o que vimos até aqui indica a subordinação existente das políticaseducativas e de formação aos ditames da racionalidade econômica dominante. Alógica é de que a empregabilidade é resultado de <strong>uma</strong> aprendizagem bem sucedidae do empenho individual dos sujeitos.


51O que está em jogo nessa seara conceitual sobre educação permanente e atémesmo sobre aprendizagem ao longo da vida, é <strong>uma</strong> forte concepção ideológica.Assiste-se, hoje, a <strong>uma</strong> despolitização e <strong>uma</strong> desideologização da educaçãopermanente. Sobre isso, Paulo Freire (1974) faz <strong>uma</strong> crítica de que não hánecessidade do uso da termi<strong>no</strong>logia permanente, pois as sociedades necessitam de<strong>uma</strong> educação em permanência, colocando em evidência, então, a necessáriadiscussão sobre a educação como prática de domesticação e a educação comoprática de liberdade.Toma-se como referência, para essa investigação, a educação permanente,por compreender que sua origem está fincada em princípios éticos e políticos, o quepode direcionar a construção de <strong>uma</strong> sociedade em que prevaleça a justiça <strong>social</strong> ea emancipação h<strong>uma</strong>na, em que a razão técnica não predomine e não subestime aconsciência crítica de sujeitos dotados de desejo e de conhecimentos, capazes derefletirem sobre seus atos.Partindo desse entendimento, a educação permanente pressupõe acombinação de <strong>uma</strong> diversidade de situações <strong>formativa</strong>s, e, portanto, não se podedesprezar as experiências vivenciadas de educação continuada que fazem parte dacontinuidade da formação inicial da história de vida de um profissional. A educaçãocontinuada poderá visar o aperfeiçoamento profissional <strong>no</strong> contexto de trabalho ouem outros espaços que ocorrem fora da escola. Entretanto, a forma como éorganizada depende da relação que esse sujeito estabelece com os outros e com omundo diante das situações experienciadas.É essa concepção que se está defendendo aqui. Sua concretização,entretanto, está diretamente relacionada a um conjunto de fatores já citados. Entreesses fatores, está a capacidade de problematização do próprio significado daeducação permanente. Em especial, nessa pesquisa, o espaço em que esta sedesenvolve é o do trabalho e, portanto, a aproximação com a política de saúde <strong>no</strong>Brasil se faz necessária, não somente porque esta se orienta pelo princípio dareflexão crítica do processo de trabalho nesta área, mas, também, porque contribuicom a elucidação de aspectos conceituais e históricos na particularidade do campoda saúde.


522.3.2 A Educação Permanente na Agenda da Saúde <strong>no</strong> BrasilFoi <strong>no</strong> âmbito da saúde, a partir de 1984, impulsionado e sob coordenação doPrograma de Desenvolvimento de Recursos H<strong>uma</strong><strong>no</strong>s da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que ocorreu <strong>uma</strong> grande mobilização em diferentespaíses das Américas, <strong>no</strong> sentido de reunir <strong>uma</strong> série de experiências educativas emsaúde. 19 O objetivo, na ocasião, foi o de identificar experiências que pudessemcontribuir para o desenvolvimento de <strong>no</strong>vas formas de abordar os problemaslevantados, com o intuito de capacitar as pessoas da área. Nessa direção foram sesomando esforços sob o estímulo criado por um interesse comum, o de modificar aspráticas educativas para transformar a prática de saúde <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s. Desseprocesso de construção coletiva, surge <strong>uma</strong> proposta pedagógica baseada na <strong>no</strong>çãode que o trabalho é o eixo fundamental para a aprendizagem (HADDAD, 1990).Destaca-se, como essência desta proposta, que o manejo de problemascomuns do processo de trabalho é o insumo fundamental para organizar edesenvolver experiências de aprendizagem. A OPAS, então, aponta, a partir dosa<strong>no</strong>s 1990, <strong>uma</strong> perspectiva teórica e metodológica para a constituição deprogramas de educação permanente em saúde.Dentre as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Saúde <strong>no</strong> Brasil em2003, destaca-se, como idéia central da Política de Gestão do Trabalho e daEducação na Saúde, a educação permanente como estratégia educacional e dedesenvolvimento para o SUS (MINISTÉRIO DA SAÙDE, 18 de setembro de 2003) 20 .Um conjunto de ações foram, então, desenvolvidas pelo Ministério da Saúde juntoaos gestores municipais e estaduais, envolvendo os trabalhadores da saúde nessedebate, como forma de implantar <strong>no</strong> Brasil essa proposta, culminando na publicaçãoda Portaria 198, de 13 de fevereiro de 2004, que institui a Política Nacional deEducação Permanente em Saúde para adequação às diretrizes operacionais e19 As primeiras experiências identificadas foram as do Ministério da saúde, <strong>no</strong> Brasil, do departamentodo Valle Del Cauca, na Colômbia e em países da América Central. A partir do exame destasexperiências iniciou-se um processo de fundamentação conceitual e desenvolvimento metodológicoque facilitou a elaboração coletiva de <strong>uma</strong> proposta pedagógica (HADDAD, 1990).20 Ver em pactuação da proposta do Ministério da Saúde “Política de Educação e Desenvolvimentopara o SUS: Caminhos para a Educação Permanente em Saúde - Pólos de Educação Permanenteem Saúde” pela Comissão Intergestores Tripartite, em 18 de setembro de 2003.


53regulamento do Pacto pela Saúde. Atualmente, a portaria 198 está sob revisão, deacordo com “Minuta” do Ministério da Saúde. 21A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde, que vêm sendodiscutida, explicita a relação da proposta com os princípios e diretrizes do SUS, daAtenção Integral à Saúde e a construção da Cadeia do Cuidado Progressivo àSaúde. Uma cadeia de cuidados progressivos à saúde supõe a ruptura com oconceito de sistema verticalizado, para trabalhar com a idéia de rede, de umconjunto articulado de <strong>serviço</strong>s básicos, ambulatórios de especialidades e hospitaisgerais e especializados, em que todas as ações e <strong>serviço</strong>s de saúde sejamprestados, reconhecendo-se contextos e histórias de vida, e assegurando adequadoacolhimento e responsabilização pelos problemas de saúde das pessoas e daspopulações (MINUTA PORTARIA DE REVISÃO 198).É importante destacar que a relevância dada à discussão da educaçãopermanente não se sobrepõe e nem inviabiliza a educação continuada, mas tem-se,como desafio, a primeira, pois permite considerar os problemas da organização dotrabalho, a especificidade de cada realidade local e as características do processode trabalho concreto do espaço sócio-ocupacional ou do <strong>serviço</strong> em questão.Mesmo reconhecendo que ambas conferem <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> temporal decontinuidade da aprendizagem por toda a vida, fincam-se em princípiosmetodológicos diferentes. A educação continuada diz respeito à continuidade daformação inicial visando o aperfeiçoamento profissional, mas nem sempre esseaperfeiçoamento atende às necessidades oriundas da organização do trabalho, e,tampouco, modifica as estruturas e os processos <strong>no</strong> sentido de qualificá-los <strong>no</strong> quediz respeito ao atendimento das demandas.21 Conforme art.1- Definir estratégias para implementação da Política Nacional de EducaçãoPermanente em Saúde, reafirmando as atribuições das três esferas de gover<strong>no</strong>, para adequação à<strong>no</strong>rmatização vigente e às deliberações do Conselho Nacional de Saúde. Parágrafo Único: A PolíticaNacional de Educação Permanente em Saúde deve considerar as especificidades regionais, asuperação das desigualdades regionais, as necessidades de formação e desenvolvimento para otrabalho em saúde e a capacidade já instalada de oferta institucional de ações formais de educaçãona saúde (p.2). Sugiro ver em Minuta Portaria Revisão 198, Ministério da Saúde.


54Os estudos <strong>no</strong> âmbito da saúde sobre a temática, 22 referem que a educaçãocontinuada, geralmente, aponta para um caminho planejado centralmente e apoiadoem processos racionais. “Neste caso, espera-se que a educação atualize, melhore acompetência técnica e articule-se com a carreira individual dos sujeitos”(ROSCHKEL, 1993, p, 6) e, dessa forma, acaba-se não se questionando o próprioprocesso de trabalho e, tampouco, esse se constitui em <strong>uma</strong> categoria de análisecentral capaz de orientar propostas educativas e de mudanças. As experiências queseguem a formação inicial são compreendidas como aquelas que permitem aotrabalhador atualizar, manter ou melhorar sua competência, para que desenvolvasuas responsabilidades <strong>no</strong> trabalho (DAVINI, 1994).Entretanto, essa compreensão sobre educação continuada suscita umconjunto de questionamentos, pois o que garante que a aquisição de conhecimentospode contribuir com a efetivação de mudanças nas práticas organizacionais? O fatode um profissional manter o seu conhecimento atualizado lhe dá condições decontribuir com a melhoria do seu processo de trabalho e com as relações de trabalhoque estabelece entre os profissionais da equipe da qual faz parte? Até que ponto ascapacitações são desenvolvidas a partir de conteúdos oriundos de <strong>uma</strong> situação detrabalho ou de <strong>uma</strong> demanda materializada a partir da necessidade de um usuáriodo <strong>serviço</strong> em questão? Para que se possa responder a essas questões, deve-selevar em conta a necessidade de <strong>uma</strong> “revisão das concepções pedagógicaspredominantes que, ao entenderem a prática como mera aplicação doconhecimento, esvaziam-se de sentido e estabelecem <strong>uma</strong> relação linear e simplistaentre o fazer e o saber” (RIBEIRO, 2007, p. 4).O enfoque da educação permanente, ao contrário, tem como desafio detectarnecessidades <strong>no</strong> próprio processo de trabalho, à luz de contextos específicos. Aeducação permanente é aprendizagem <strong>no</strong> trabalho, em que o aprender e o ensinarse incorporam ao cotidia<strong>no</strong> das organizações e ao trabalho. A educação permanentese baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de transformar aspráticas profissionais.22 A área da saúde (promovida pela Organização Pan-Americana da Saúde - OPAS) <strong>no</strong> final dos a<strong>no</strong>s1980 designa a Educação Permanente como vertente pedagógica para o desenvolvimento depessoas e de mudanças <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> do sistema. Sobre este assunto sugere-se ver em Mª AliceRoschke, Mª Cristina Davini e Jorge Haddad (HADDAD et al. 1993).


55Portanto, a educação permanente pode ser entendida como aprendizagemtrabalho,ou seja, a que acontece <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> das pessoas e das organizações.Desenvolve-se a partir dos problemas enfrentados na realidade e leva emconsideração os conhecimentos e as experiências que os profissionais já têm.Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a partirda problematização do processo de trabalho, e considera que as necessidades deformação e de desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelasnecessidades de saúde das pessoas e das populações. Os processos de educaçãopermanente em saúde têm como objetivos a transformação das práticasprofissionais e da própria organização do trabalho (MINISTÉRIO DA SAÙDE,Portaria 198).Partindo-se dessa orientação, alcançar a mudança pressupõe partir de umprocesso crítico do próprio trabalho, integrando as demandas objetivas com asexperiências da prática profissional. Seguindo essa linha de pensamento, oprocesso de aprendizagem pode caracterizar-se como reconstrutivo, pois vai alémda simples atualização e, em essência, apela para um profundo enfrentamento entrevelhos padrões e o desenvolvimento de outros radicalmente distintos. “Conduz-semais para a construção de <strong>no</strong>vas metas, políticas, <strong>no</strong>rmas e formas de organizaçãoe comunicação <strong>no</strong> trabalho, do que para a simples modificação do velho”(ROSCHKEL, 1993, p.6).Ainda que o gestor federal seja proponente da educação permanente emsaúde <strong>no</strong> Brasil como um processo de gestão colegiada e verticalizada, que propõea superação das formas tradicionais de capacitação e de qualificação dosprofissionais, de democratização institucional, de aprendizagem significativa a partirda problematização das situações de trabalho (CECCIM e FEURWERKER, 2004),há que se reconhecer a necessária compreensão dessa concepção <strong>no</strong>s diferentesníveis hierárquicos, pois sendo a gestão do SUS municipalizada, essa política ficavulnerável a interesses e a critérios políticos locais. Por isso, a importância daproblematização da concepção da educação permanente torna-se fundamental, emparticular quando é tomada como referência de <strong>uma</strong> política de formação detrabalhadores, pois há <strong>uma</strong> tendência em atribuir significado à mesma que nãoaqueles calcados nas dimensões éticas e políticas, nas necessidades dos


56trabalhadores e nas necessidades dos usuários, entre outros aspectos que devemser considerados.Portanto, sabe-se que a formação dos profissionais que atuam na saúde éfundamental, e é exatamente <strong>no</strong> espaço-tempo da universidade que se tem comodesafio formar profissionais comprometidos ética e politicamente com <strong>uma</strong>sociedade justa e h<strong>uma</strong>nitária. Tal direção <strong>social</strong> pressupõe a universalização dosdireitos, e, por isso, na busca intransigente da consolidação do SUS através daatuação responsável e com capacidade de reflexão crítica sobre o seu modo defazer saúde. Assim, a concepção de educação permanente referida na política desaúde brasileira, ao evidenciar a importância da reflexão crítica do processo detrabalho, valoriza as experiências dos trabalhadores vivenciadas <strong>no</strong> campo dasaúde.Finalmente, os pressupostos teóricos tratados até aqui são explorados <strong>no</strong>sseus aspectos conceituais e históricos, mas para que se possa refletir sobre suaexperiência profissional, o trabalhador deve possuir um conhecimento dasdimensões do seu processo de trabalho, o que será tratado <strong>no</strong> capítulo a seguir.


573 REFLEXÕES SOBRE AS DIMENSÕES DO PROCESSO DE TRABALHOO trabalho não é algo que se explique e se compreenda, mas <strong>uma</strong>realidade que se insere na vida dos homens. Devemos inseri-lo nela com aação eficiente de <strong>no</strong>ssa educação; é trabalhando que se estimula a funçãodo trabalho até adquirir todo o seu sentido e todo o seu valor h<strong>uma</strong><strong>no</strong>(FREINET, 1998, p.310).Em que pese os avanços das discussões e das análises teóricas produzidas<strong>no</strong> âmbito do Serviço Social sobre a categoria processo de trabalho, não há comodeixar de tratá-la nesse estudo e, tampouco, se teve essa intenção. Nessainvestigação sobre a educação permanente dos assistentes sociais, que pressupõe<strong>uma</strong> reflexão crítica sobre o processo de trabalho, o trato sobre a categoria tor<strong>no</strong>usecondição sine qua <strong>no</strong>n.Ao completarmos mais de <strong>uma</strong> década de consolidação da proposta nacionaldas diretrizes curriculares para os Cursos em Serviço Social, é pertinente refletiracerca das categorias que orientam o atual projeto de formação profissional,sobretudo a Questão Social e o Processo de Trabalho. Reconhecer o Serviço Socialcomo <strong>uma</strong> profissão eminentemente interventiva <strong>no</strong> âmbito da questão <strong>social</strong>, émotivo suficiente para reflexão permanente sobre o seu processo de trabalho. Nocapítulo anterior discorremos sobre alguns fragmentos desta realidade quedemarcam a forma como vive a população brasileira.Entretanto, a leitura dessa realidade deve ser feita coletivamente pelosassistentes sociais para que estes possam construir estratégias <strong>no</strong> âmbito dotrabalho, a partir das peculiaridades e das especificidades locais, para romper com ociclos de exclusão, de pobreza, de desigualdade, de violência, de discriminação, deinjustiça e de exploração, entre outros, além da violação dos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s,principalmente, quando se trata de um segmento da sociedade brasileira que aindapadece de um sistema de proteção <strong>social</strong> justo e que considere o cidadão como umsujeito de direito e, por conseqüência, dig<strong>no</strong> de acesso aos <strong>serviço</strong>s que possamatender suas necessidades sociais. É esse cenário, marcado por mudanças de todaordem <strong>social</strong>, econômica e política, que <strong>no</strong>s convoca para a construção deestratégias de enfrentamento da questão <strong>social</strong>. Uma dessas estratégias está napossibilidade de considerarmos a educação permanente, que é a reflexão críticasobre o processo de trabalho, como <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong> âmbito do Serviço


58Social, pois as situações de trabalho vivenciadas pelos assistentes sociais podem seconstituir em experiências de aprendizagens significativas que incidem na qualidadedos <strong>serviço</strong>s prestados, <strong>uma</strong> vez que atendam as necessidades sociais dapopulação usuária.Com base <strong>no</strong> que foi exposto, procura-se desenvolver as reflexões dessecapítulo, focando três aspectos que se articulam simultaneamente. Inicialmente, fazse<strong>uma</strong> breve análise sobre Processo de Trabalho, categoria fundamentada pelaTeoria Social Crítica de Marx, que, <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980, tor<strong>no</strong>u-se a base teórica dereorientação da profissão dos Assistentes Sociais. Num segundo momento,privilegia-se a reflexão sobre a Questão Social, “base de fundação sócio-histórica doServiço Social” que, de acordo com os estudos de Iamamoto (2000), é consideradaobjeto de trabalho dos profissionais, pois “é ela em suas múltiplas expressões queprovoca a necessidade da ação profissional” (2000, p. 57). Para tanto, realiza-se<strong>uma</strong> revisão bibliográfica que percorre a leitura sociológica sobre a questão <strong>social</strong>,bem como as discussões mais recentes <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social.O último aspecto volta-se para a dinâmica concernente aos elementos queconstituem o processo de trabalho, pois entende-se que a reflexão não é somenteda prática, mas de todo um contexto sócio-histórico que determina não somente oobjeto de intervenção, mas também as escolhas dos meios e dos instrumentos detrabalho, propulsores de resultados e de resolutividades <strong>no</strong> atendimento àsnecessidades sociais postas e de consolidação de um projeto ético políticoprofissional.3.1 UMA CATEGORIA EM ANÁLISE: PROCESSO DE TRABALHOInicialmente, é pertinente lembrar que as diferentes escolas clássicas dateoria <strong>social</strong> compartilham do ponto de vista de que a categoria trabalho é oelemento central para a compreensão do sentido <strong>social</strong> e econômico dastransformações que ocorrem nas sociedades modernas e contemporâneas.Podemos citar, entre alguns clássicos da teoria <strong>social</strong>, Marx, Durkheim e Weber, que“concebem a sociedade moderna e sua dinâmica central como <strong>uma</strong> sociedade dotrabalho” (OFFE, 1985, p. 166). O modelo de <strong>uma</strong> sociedade burguesa consumista,


59preocupada com o trabalho, movida por sua racionalidade e abalada pelos conflitostrabalhistas, apesar de suas abordagens metodológicas e de construções teóricasdiferentes, é o foco da produção teórica, assumida por essas distintas correntesteóricas (OFFE, 1995).Trazer a categoria trabalho para o centro da explicação das regularidadessociais não significa aderir a <strong>uma</strong> única perspectiva de análise. Enquanto, porexemplo, “para Marx, o trabalho gera conflito, para Durkheim, ele é fonte desolidariedade e de coesão sociais” (COHN, 1993, p. 56). Entretanto, neste estudo,destaca-se o caso especifico de Marx, pois mais do que qualquer outro autor, esseanalisa detalhadamente a evolução das condições e dos princípios organizativos etécnicos que viabilizam o capitalismo e evidenciam que a lógica de valorização docapital passa, obrigatoriamente, pelo controle capitalista do processo de trabalho. 23É Marx (1988) quem afirma em O Capital, que é especifico do trabalhoh<strong>uma</strong><strong>no</strong> a sua característica de ser pensado, e, portanto, consciente e proposital.Para Marx, o processo de trabalho aparece como resultado daquilo que já estavaprojetado na mente do homem, idealizado na imaginação do trabalhador. Assim, ohomem não transforma somente o material sobre o qual incide sua ação, masimprime a esse o projeto que tinha conscientemente em foco, determinando,portanto, o modo de operacionalizar o seu processo de trabalho,e ao qual tem de subordinar sua vontade. E esta subordinação não é um atofortuito. Além do esforço dos órgãos que trabalham, é mister a vontadeadequada que se manifesta através da atenção durante todo o curso dotrabalho (MARX, 1988, p.202).Tratar a concepção de processo de trabalho associando-a ao sistemacapitalista vigente remete-<strong>no</strong>s “à unidade dialética entre o processo de trabalho,(entendido como trabalho h<strong>uma</strong><strong>no</strong> genérico executado para a criação de valores deuso) e o processo de criação de valor (entendido como a forma capitalista deorganização da produção da execução da mais-valia)” (CATTANI, 2006, p.207),conceito esse que, para ser compreendido, implica em um sistema articulado de23 Nas seções III e IV do Livro I de O Capital, encontramos um dos mais completos estudos teóricosde Marx sobre a estrutura do Processo de Trabalho (os capítulos “Divisão do Trabalho e Manufatura”e “ Maquinismo e Grande Indústria’) o que torna-se leitura fundamental para entender o capitalismocomo forma <strong>social</strong> e como organização técnica. Sugiro ver em Marx- O Capital (1988).


60<strong>no</strong>ções e de pressupostos que questionam, definem e qualificam os fenôme<strong>no</strong>sobservados (CATTANI, 2006).De acordo com os estudos de Marx(1988), considera-se processo de trabalhoa todo processo de transformação de um determinado objeto em um determinadoproduto, a partir de <strong>uma</strong> atividade h<strong>uma</strong>na que utiliza-se de meios e de instrumentosde trabalho para sua execução. Essa atividade h<strong>uma</strong>na é o próprio trabalho, talcomo referido por Marx (1988, p.25) “a utilização da força de trabalho é o trabalho”.Portanto, é durante o processo de consumo desta força de trabalho pelo capitalistaque o trabalhador mobiliza capacidades e competências físicas e intelectuaish<strong>uma</strong>nas, considerando-se objetivos preestabelecidos. Dessa forma, todo processode trabalho deverá ser analisado a partir de um contexto sócio-histórico, poiso processo de trabalho é expressão de processos sociais e políticos,articulados a um padrão tec<strong>no</strong>lógico, cuja modelagem é variável e vinculaseàs transformações que ocorrem <strong>no</strong>s componentes do próprio processo.Isso quer dizer que mudanças introduzidas em cada um dessescomponentes influenciam-se mutuamente e incidem na formatação do todo(HOLZMANN, 2006, p.209-210).Braverman (1987), um dos pioneiros nas investigações e nas reflexõesanalíticas sobre processo de trabalho a partir do desenvolvimento da tec<strong>no</strong>logia e damaquinaria e de seu emprego na sociedade capitalista, enfatiza a degradação dotrabalho <strong>no</strong> século XX, situação essa cada vez mais constatada pelos estudoscontemporâneos. De acordo com essa perspectiva, se o processo históricodetermina as formas concretas que assumem a sociedade, a determinação históricanão tem o caráter de <strong>uma</strong> imposição, nem a rigidez de <strong>uma</strong> reação química. O modode produção, a maneira pela qual os processos de trabalho são organizados eexercitados, não depende apenas da tec<strong>no</strong>logia empregada, mas é basicamente oproduto histórico das relações sociais dominantes na sociedade (BRAVERMAN,1987).A partir do inicio dos a<strong>no</strong>s 1970 os estudos sobre o processo de trabalhocomeçaram a se multiplicar quando, então, a “sociologia passou a redirecionar suasatenções para o modo como o capital organiza o consumo produtivo de sua força detrabalho” (LEITE, 1994, p. 48). Tais estudos realizados, com ênfases variadas,buscavam elucidar as formas concretas que assumiu, historicamente, a organização


61do processo produtivo, bem como a evolução das condições de trabalho e o impactodas <strong>no</strong>vas tec<strong>no</strong>logias, entre outras situações.Braverman (1987), através de seu minucioso estudo da organização dotrabalho na fase do capital mo<strong>no</strong>polista, faz um levantamento sobre os diversos tiposde processos de trabalho e concluiu que, em todos esses processos, a acumulaçãode capital implica na permanente degradação da força de trabalho.A partir daí, sucederam-se inúmeras pesquisas e análises que tinham, comoobjetivo, recuperar as formas de dominação que o capital desenvolvia nasempresas, a partir da organização do processo de trabalho. Começa a ser escrita<strong>uma</strong> <strong>no</strong>va história da classe operária, “na qual a ação dos trabalhadores passou aser analisada em função do seu significado para as relações de poder, cristalizadasna relação entre capital e trabalho e expressas na disputa pelo controle deprodução.” (LEITE, 1994, p 49). Surge <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va postura teórica que prioriza aquestão das classes enquanto atores sociais <strong>no</strong> centro da discussão.Os estudos referentes às décadas de 1980 e 1990 apresentaram aspectosimportantes sobre as transformações <strong>no</strong> mundo do trabalho, demonstrando asinquietações que envolvem, principalmente, a introdução de <strong>no</strong>vas tec<strong>no</strong>logias e as<strong>no</strong>vas formas de organização do trabalho. As modificações foram tão intensas nadécada de 1980 que a classe trabalhadora sofreu “a mais aguda crise deste século,que atingiu não só a sua materialidade, mas teve profundas repercussões na suasubjetividade e, <strong>no</strong> inter-relacionamento destes níveis, afetou a sua forma de ser”(ANTUNES, 1995, p.15).de:Considerando as mudanças na produção, Harvey (1993, p.140) as qualificouacumulação flexível, apoiada na flexibilidade dos processos de trabalho, domercado de trabalho dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-sepelo surgimento de setores de produção inteiramente <strong>no</strong>vos, <strong>no</strong>vasmaneiras de fornecimento de <strong>serviço</strong>s financeiros, <strong>no</strong>vos mercados e,sobretudo, taxas altamente intensificadas de i<strong>no</strong>vação comercial,tec<strong>no</strong>lógica e organizacional.Evidencia-se, assim, que as alterações nas formas de gestão do trabalho,iniciadas nas últimas décadas do milênio passado, têm em vista atender aos


62padrões de qualidade, produtividade e lucratividade, estabelecidos pelacompetitividade internacional, <strong>no</strong>s marcos da globalização, da produção e dosmercados. Pode-se dizer que as mudanças na demanda de mão-de-obra e em seuspadrões de qualificação têm implicado n<strong>uma</strong> racionalidade de emprego, dentreoutras questões. Os <strong>no</strong>vos processos de trabalho e a implantação crescente de<strong>no</strong>vas tec<strong>no</strong>logias implicam em cortes, cada vez maiores, de postos de trabalho, ena violação dos direitos sociais dos trabalhadores. Também, é nessa época que severificam os efeitos brutais das transformações econômicas e sociais sobre o desti<strong>no</strong>de inumeráveis assalariados “que vêem seu emprego ameaçado e com freqüênciasuprimido, que vêem a sua qualificação tornar-se obsoleta e inadequada para fazerface às evoluções das profissões” (MALGLAIVE, 1996, p.34).Sendo assim, toda <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va maneira de produzir e, portanto, de trabalhar,vem marcar esse cenário contemporâneo, assinalado pela precarização do trabalhoe o desemprego estrutural (ANTUNES, 2005 ; MENDES, 2003, TUNGUY, 1999). Odesemprego não é mais um fenôme<strong>no</strong> temporário, é algo que veio para ficar, é oque caracteriza <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va categoria <strong>social</strong>, a categoria dos “desempregados delonga duração 24 ” (GUIMARÃES, 2002, p.107).Além disso, a violação dos direitos sociais, a falta de regulação e de proteçãoao trabalho é experienciada pela maioria da população que vive do trabalhoprecário. Considerando-se esse cenário, legitima-se a idéia de que o trabalhopermanece como referência central na sociedade atual, não só em sua <strong>dimensão</strong>econômica, mas também quando se concebe o trabalho em seu universopsicológico, cultural e simbólico, fato perceptível quando se analisam as reaçõesdaqueles que vivenciam cotidianamente o flagelo do desemprego, do não - trabalho,do não-labor (CASTEL, 2004).Outro aspecto importante e determinante na reflexão sobre processo detrabalho diz respeito à forma como se dão as relações de trabalho que emergem doconflito de interesses entre o capital e o trabalho. O modo como está organizado umsistema produtivo específico vai definir os padrões das relações de trabalho entre os24 No artigo “Por <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va sociologia do desemprego”, a autora rastreia o movimento de resignificaçãoque se opera em tor<strong>no</strong> da <strong>no</strong>ção da constituição da <strong>no</strong>va figura do “desempregado delonga duração”. Sugiro ver em Guimarães (2002).


63agentes sociais que ocupam diferentes papéis em um processo de produção.Portanto, as relações de trabalho, independentemente da complexidade de cadasituação ou da peculiaridade assumida, “ são determinadas pelas características dasrelações sociais, econômicas e políticas da sociedade abrangente” (FISCHER, 1987,p.19). Assim sendo, a discussão das relações de trabalho devem ser compreendidase apreendidas, como formas de relacionamento <strong>social</strong> (FISCHER, 1987) e, portanto,expressam características de um cenário histórico, conjuntural e setorial numespaço-tempo <strong>social</strong> e político determinado. A análise das relações de trabalho e asdiferentes formas de impactar a vida dos trabalhadores pressupõem considerar oespaço <strong>social</strong> e político em que se realizam: “a organização do processo de trabalho,a elaboração das políticas administrativo-organizacionais e a prática cotidiana dosagentes sociais em relação” (FISCHER, 1987, p.20).Esse conjunto de observações pertinentes à análise da categoria processo detrabalho leva ao segundo ponto deste texto em que se procura aprofundar acompreensão da questão <strong>social</strong>, <strong>uma</strong> vez que esta e suas múltiplas expressões,constituem-se <strong>no</strong> objeto de trabalho dos assistentes sociais. Assim, a questão <strong>social</strong>é tratada, aqui, como <strong>uma</strong> subcategoria intrínseca à discussão do processo detrabalho dos Assistentes Sociais.3.2 A QUESTÃO SOCIAL EM PAUTASeria um equívoco referir que há somente <strong>uma</strong> compreensão e um sentidoatribuído à expressão questão <strong>social</strong>, pois, mesmo <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social,essa é <strong>uma</strong> discussão presente. Tal fato <strong>no</strong>s instiga a retomar essa reflexão e trazeraqui pressupostos teóricos que permitam apreender o sentido da questão <strong>social</strong>,principalmente como objeto de trabalho do Serviço Social, <strong>uma</strong> vez que esseconstitui-se “ponto saliente, incontornável e praticamente consensual” na agendacontemporânea do Serviço Social brasileiro (NETTO, 2001, p.41).Tratar a questão <strong>social</strong> como um tema em pauta é considerá-la não comoalgo estático, isolado ou como um problema natural de <strong>uma</strong> determinada sociedade,mas, sim, como resultado de um processo histórico de conflito na relação capital etrabalho, que vem adquirindo <strong>no</strong>vas modalidades <strong>no</strong>s últimos tempos, por força de


64mudanças profundas na reestruturação produtiva, na forma de gestão do Estado,nas políticas sociais, e pelo “chamado ‘princípio de exclusão’, que se concretizatanto da parte dos excluídos do processo produtivo do trabalho salariado, quanto daparte dos excluídos pela origem étnica, pela identidade cultural e pelas relações degênero” (WANDERLEY, 2004, p.59). Entretanto, mais do que trazer um conceito dequestão <strong>social</strong>, é preciso compreender os fundamentos da conceituação que estásendo atribuída, através de <strong>uma</strong> releitura histórica, principalmente, ao se consideraressa reflexão <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social.Nos estudos do sociólogo Robert Castel, encontram-se reflexões instigantes efundamentos para a discussão da questão <strong>social</strong>, referenciados na obra AsMetamorfoses da Questão Social, lançado em 1995, na França. Mesmo sendo <strong>uma</strong>obra que encontra sua referência central na realidade histórica da sociedadeeuropéia, em particular na França, o que, certamente, se diferencia do contextobrasileiro, principalmente em função de falta de um Estado Social provedor depolíticas de proteção e que tem como marca a desigualdade <strong>social</strong>, 25 entre outrassituações, o texto é um dispositivo para a reflexão daquilo que é similar ou diferente<strong>no</strong> que se refere à trajetória da questão <strong>social</strong> <strong>no</strong> Brasil.Para início dos argumentos aqui abordados, é pertinente citar a forma comoCastel (2005) refere-se ao termo utilizado – metamorfoses –, pois este não seconstitui n<strong>uma</strong> metáfora que sugere que “a perenidade da substância permanecesob a mudança de seus atributos”, pois, ao contrário, diz que “<strong>uma</strong> metamorfose fazas certezas tremerem e recompõe toda paisagem <strong>social</strong>” (2005, p. 28).Entretanto, ainda que fundamentais, as grandes mudanças nãorepresentam i<strong>no</strong>vações absolutas quando se inscrevem <strong>no</strong> quadro de <strong>uma</strong>mesma problematização. Entendo por problematização a existência de umfeixe unificado de questões (cujas características comuns devem serdefinidas) que emergiram num dado momento (que é preciso datar), que sereformularam várias vezes através das crises, integrando dados <strong>no</strong>vos (énecessário periodizar essas transformações) e que hoje ainda estão vivas(CASTEL, 2005, p.28-29).25 A sociedade brasileira tem como marca a desigualdade <strong>social</strong>, pois há três décadas encontra-se <strong>no</strong>podium do índice de Gini, que mede a desigualdade <strong>social</strong> de todos os países. O índice GINI é oparâmetro internacionalmente usado para medir a concentração de renda. O coeficiente GINI varia dezero a 1,00. Zero significa, que todos os indivíduos teriam a mesma renda e 1,00 mostraria queapenas um indivíduo teria toda a renda de <strong>uma</strong> sociedade (www.folha.uol.com.br. Acessado em10/6/2006). Sobre este assunto sugiro ver: POCHMANN, Marcio. Nova Política de inclusãosocioeconômica. UNESCO, 2005.


65É sob esse argumento de releitura da história, tendo como referência o járelatado pelos historiadores, que Castel faz <strong>uma</strong> leitura sociológica, situando-sesobre os registros epistemológicos existentes, introduzindo, assim, sua análise sobrea categoria questão <strong>social</strong>. 26O amplo percurso histórico traçado por Castel (2005) sobre a constituição dasociedade salarial moderna - tipo de seguridade ligada ao trabalho e não somente àpropriedade, ao patrimônio - até a centrar-se na discussão da questão <strong>social</strong> emtempos de ideários neoliberais que desnudam as precarizações das relações detrabalho e o desmonte de políticas sociais públicas, são, sem dúvida, temasambiciosos que fogem, em profundidade, daquilo que se propõe tratar aqui.Entretanto, busca-se, nessa referência, o sentido atribuído à questão <strong>social</strong>,que é caracterizada como <strong>uma</strong> aporia fundamental, <strong>uma</strong> dificuldade central, “sobre aqual <strong>uma</strong> sociedade experimenta o enigma de sua coesão e tenta conjurar o risco desua fratura” (CASTEL, 2005, p.30). É um desafio que questiona a capacidade de<strong>uma</strong> sociedade existir como um todo, como um conjunto ligado por relações deinterdependência. Tal definição, apesar de parecer um pouco abstrata, ilustra asituação do início do século XIX, <strong>no</strong>s primórdios da industrialização, quando, então,a questão <strong>social</strong> foi explicitamente <strong>no</strong>meada pela primeira vez através da ameaça defratura representada pelos proletários da época, mais especificamente na Europa,<strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1830, quando se tomou consciência da existência de populações queforam, “ao mesmo tempo, agentes e vítimas da Revolução Industrial” (CASTEL,2005, p.30).Foi ao longo do século XIX, com o amadurecimento da organização domovimento operário, que os trabalhadores europeus muniram-se de estratégias delutas, colocando o Estado burguês n<strong>uma</strong> posição mais vigilante às reivindicaçõesdos trabalhadores, e em “estado de permanente ansiedade” (MARTINELLI, 2007,p.93). Esta tomada de consciência operária não se refere somente aoreconhecimento das condições des<strong>uma</strong>nas de vida e de trabalho da população da26 Este entendimento é fundamental para que se compreenda o ponto de partida de Castel (2005)quando apresenta seus argumentos sobre as metamorfoses da questão <strong>social</strong>, o que o diferencia deoutros autores (ainda a serem tratados aqui neste artigo) que discutem a temática, <strong>uma</strong> vez que,mesmo sendo a questão <strong>social</strong> <strong>no</strong>meada pela primeira vez em 1830, suas análises apontam equestionam a existência de <strong>uma</strong> “questão <strong>social</strong>” nas sociedades pré-industriais da Europa ocidental.Sugiro ver em Castel (2005).


66época, nem ao pauperismo que ameaçava a ordem <strong>social</strong> e política, que emergedesse processo de industrialização, ”mas, também, pela tomada de consciência ereação dessa classe contra essas condições” (PEREIRA, 2003, p.112). Esse,portanto, foi um momento em que difundiu-se a convicção da existência de um hiato,pois há, de fato, “<strong>uma</strong> ameaça à ordem política e moral” (CASTEL, 2005, p.30), e,para a burguesia, era preciso encontrar um remédio que fosse eficaz para combatero pauperismo e prevenir-se para a desordem do mundo. A industrializaçãoselvagem, oriunda de <strong>uma</strong> ordem econômica, acarretava <strong>uma</strong> miséria e <strong>uma</strong>desmoralização de massa, e as tensões sociais vigentes colocavam em risco asociedade liberal (CASTEL, 2005).Sob esse aspecto, comportam aqui as reflexões da Pereira (2003) quanto àsperspectivas teóricas sobre a questão <strong>social</strong>, ao salientar a articulação, ao mesmotempo, entre estrutura e sujeitos históricos pois,de um lado a questão <strong>social</strong> é constituída de fatores estruturais, queindependem da ação política de sujeitos em dadas circunstâncias; e, deoutro, contém ações deliberadas e conscientes de sujeitos que queremmudar a sua história. Donde se concluí que, isoladamente, nenhum dessesdois elementos é capaz de suscitar a questão <strong>social</strong>. A questão <strong>social</strong> éproduto e expressão da relação contraditória entre esses dois elementos, ousucintamente, é produto e expressão da contradição fundamental entrecapital e trabalho historicamente problematizada (PEREIRA, 2003, p.112).Para Castel (2005), a questão <strong>social</strong>, na primeira metade do século XIX,descrita pela maior parte dos observadores sociais da época sob a forma depauperismo, não é mais a questão de hoje. Esse proletariado miserável e subversivoque marcava a condição operária <strong>no</strong> início da industrialização, foi se transformandoem <strong>uma</strong> classe operária relativamente integrada, em função da tomada deconsciência coletiva de classe 27 , processo esse que se afirma, sobretudo, a partir dasegunda metade do século XIX e se prolonga até o início do século XX.Com o desenvolvimento da industrialização e da urbanização, o salariado seinstala, passa a ser um estado permanente e para a burguesia “é preferível aceitar27 Castel discorre sobre a condição operária na França e a <strong>no</strong>va relação salarial que deixa de ser aretribuição pontual de <strong>uma</strong> tarefa e assegura direitos, dá acesso a subvenções extra trabalho(doenças, acidentes, aposentadoria) permitindo <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1930 <strong>uma</strong> participação ampliada dooperário na vida <strong>social</strong>. Porém esboça-se <strong>uma</strong> estratificação mais complexa entre os dominantesdominados,pois ao mesmo tempo a classe operária vive a participação na subordinação. Sugiro verem Metamorfoses da questão <strong>social</strong>, <strong>no</strong> capítulo VII, sobre a Sociedade Salarial (2005).


67sua consolidação do que ver se desenvolver <strong>no</strong> coração da sociedade industrialmassas atingidas pelo pauperismo generalizado” (CASTEL, 2004, p. 242).É, então, nesse palco histórico em que está posta a questão <strong>social</strong>determinada pelo conflito entre o capital e o trabalho, que emerge <strong>uma</strong> necessidadeburguesa de controlar a ordem <strong>social</strong> (MARTINELLI, 2007) e o próprio espírito deluta dos trabalhadores da época. Antes mesmo de finalizar a primeira metade doséculo XIX, a classe trabalhadora deixa evidente a “sua força política e a suapresença de classe” (MARTINELLI, 2007, p.99). Desse modo, com a intenção decontrolar a ordem <strong>social</strong> é que surge <strong>uma</strong>aliança da alta burguesia inglesa com a Igreja e com o Estado nascera, soba iniciativa da primeira, a Sociedade de Organização da Caridade. Em seusesforços de racionalizar a assistência, ela criara a primeira proposta práticapara o Serviço Social <strong>no</strong> terço final do século XIX (MARTINELLI, 2007,p.99).Tal sociedade tinha o entendimento claro de que somente coibindo aspráticas de classe dos trabalhadores, como forma de impedir suas manifestaçõescoletivas, poderia se manter um controle sobre a questão <strong>social</strong>, assegurando,assim, o “funcionamento <strong>social</strong> adequado” (MARTINELLI, 2007, p.99). As aliançasque se sucederam nas primeiras décadas do século XX, entre a própria classedominante, como mecanismo de manutenção e de fortalecimento do mo<strong>no</strong>pólio docapital, e com o Estado, “resultou n<strong>uma</strong> grande pressão sobre os trabalhadores paraimpedir sua marcha organizativa” (MARTINELLI, 2007, p.95).Diante de tais circunstâncias, a classe dominante recorre aos agentes quecriará para cuidar do enfrentamento da questão <strong>social</strong>, e, na entrada da quartadécada do século XX, o número de assistentes sociais crescerá “e sua prática jáganhara foro profissional propriamente dito” (MARTINELLI, 2007, p.95). Assim, osassistentes sociais tinham como demanda atuar <strong>no</strong> contexto da estrutura e dasrelações sociais que peculiarizavam a sociedade do pós-guerra, sendo, então, essaa tarefa que a classe dominante reservava para os assistentes sociais naquelemomento. “Não se tratava de empreendimento de fácil execução, poishistoricamente a realização da prática assistencial esteve bastante distanciada dasrelações sociais, associando-se mais a caridade” (MARTINELLI, 2007, p.96).


68Nessa sucinta transcrição histórica, de um recorte que relaciona o surgimentodo Serviço Social com a reflexão sobre a compreensão da concepção da questão<strong>social</strong>, não se pode deixar de citar a marcante identidade atribuída à profissão pelaclasse dominante, diante do contexto sócio-histórico.Tal identidade era, portanto, especialmente útil para a burguesia,pois além de lhe atribuir os canais necessários para a realização de suaação de controle sobre a classe trabalhadora, fornecia-lhe o indispensávelsuporte para que se criasse a ilusão necessária de que a hegemonia docapital era um ideal a ser buscado por toda a sociedade (MARTINELLI,1991, p.124).No Brasil, n<strong>uma</strong> aliança entre a burguesia e setores da igreja católica, haviasido criado o Centro de Estudos e Ação Social de São Paulo - CEAS, <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s de1932, que desempenhou um importante papel para qualificar as chamadas agentespara realização da prática <strong>social</strong>, através de um Curso Intensivo de Formação Socialpara Moças, marcando, assim, a caminhada do Serviço Social brasileiro, que iniciará“sobre o sig<strong>no</strong> da aliança com a burguesia” (MARTINELLI, 2007, p.123).Contudo, na época, a ausência de um projeto profissional específico, de <strong>uma</strong>identidade profissional, produzia <strong>uma</strong> grande fragilidade em termos de consciênciapolítica e <strong>social</strong>. A insustentabilidade de <strong>uma</strong> prática esvaziada de realidade políticae <strong>social</strong>, distante das demandas da classe trabalhadora, atendendo mecanicamentee “inquestionadamente aos interesses de seus contratantes, compradores de suaforça de trabalho”, (MARTINELLI, 2007, p.143), gerava, <strong>no</strong> âmbito da própriacategoria, alienação e crítica, “não como dois blocos mo<strong>no</strong>líticos, mas como termosopostos pela indeterminação da identidade atribuída e abafada pelo pensamentoconservador” (2007, p.145).Os tópicos sobre as raízes do Serviço Social, aqui em parte citados, masamplamente tratados na bibliografia específica do Serviço Social 28 , tratam dosaspectos históricos de <strong>uma</strong> profissão que institui-se a partir do pensamentoconservador e dominante. Entretanto, destaca-se a importância dessa releitura paracompreender os movimentos da profissão e as rupturas que se sucederam, desuperação da alienação e das próprias origens burguesas, assumidas coletivamente28 Encontra-se na produção de conhecimento <strong>no</strong> âmbito do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> estudos pioneiros sobre osaspectos e fundamentos históricos da gênese da profissão de Assistente Social. Sugiro ver emIamamoto e Carvalho (1982), Martinelli (2007).


69ao longo do século XX, de onde emerge o reconhecimento e a construção de umprocesso de trabalho fincado em princípios críticos, desde as últimas décadas doséculo XX, o Serviço Social brasileiroredimensio<strong>no</strong>u-se e re<strong>no</strong>vou-se <strong>no</strong> âmbito da sua interpretação teóricometodológicae política, num forte embate como o tradicionalismoprofissional e seu lastro conservador, adequando criticamente a profissão àsexigências do seu tempo, qualificando-a academicamente (IAMAMOTO,2002, p.20).É então, iluminados por <strong>uma</strong> perspectiva teórico-crítica, que os AssistentesSociais têm como desafio <strong>no</strong> seu desempenho profissional cotidia<strong>no</strong>, “apreender erevelar os <strong>no</strong>vos meandros da questão <strong>social</strong>” (IAMAMOTO, 2002, p.31). Talnecessidade posta ao profissional, de atender as exigências das múltiplasexpressões da questão <strong>social</strong>, evidenciam o quanto a problematização e acompreensão das configurações atuais fazem parte dos objetivos do processo detrabalho profissional.Dessas configurações emerge a discussão sobre a sociedade salarial,apontada não somente como <strong>uma</strong> sociedade na qual a maioria da população éassalariada, mesmo sendo essa <strong>uma</strong> afirmativa a ser considerada. Trata-setambém, de compreendê-la, sobretudo como <strong>uma</strong> sociedade na qual “a maioria dossujeitos sociais têm sua inserção <strong>social</strong> relacionada ao lugar que ocupam <strong>no</strong>salariado, ou seja, não somente sua renda, mas, também, seu status, sua proteção,sua identidade” (CASTEL, 2004, p.243).Para exemplificar esse entendimento, Castel (2004), cita, então, a situação daFrança, onde, <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1970, havia 82% da população ativa assalariada, o quecaracteriza a trajetória na Europa, que, nessa época, então, vivencia o declíniodesse processo. Se essa sociedade salarial inventou um <strong>no</strong>vo tipo de seguridadeligada ao trabalho, e não somente ligada à propriedade e ao patrimônio, éjustamente das mudanças que ocorreram <strong>no</strong> mundo do trabalho que emergem<strong>no</strong>vas situações de trabalho, caracterizadas pela falta dessa proteção <strong>social</strong>.Ao analisar essas configurações, deve-se levar em conta a particularidadesociohistórica de cada conjuntura, pois o cenário, na França, diferencia-se doprocesso vivenciado <strong>no</strong> Brasil. A proteção <strong>social</strong>, em países como o <strong>no</strong>sso, sempre


esteve relacionada aos mínimos sociais 29 e com os ideários neoliberais seinstalando <strong>no</strong> cenário brasileiro, a situação da precarização das relações de trabalhoteve um efeito bombástico afetando a classe que vive do trabalho (ANTUNES,1995).70É partindo dessa <strong>no</strong>va configuração da sociedade salarial que Castel referesea <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va questão <strong>social</strong> <strong>no</strong>s dias de hoje e questiona a função integradora dotrabalho na sociedade. A desmontagem do sistema de proteções e garantias quesão vinculadas ao emprego, e <strong>uma</strong> desestabilização, ou seja, a falta do trabalho,repercute como <strong>uma</strong> espécie de choque para diferentes setores da vida <strong>social</strong>, queextrapolam o mundo do trabalho, colocando os indivíduos em situação de risco,podendo oscilar da condição de vulneráveis <strong>social</strong>mente, para a desfiliação <strong>social</strong>(CASTEL, 2004).Essa oscilação dos sujeitos em diferentes “zonas” da vida <strong>social</strong> se dá namedida em que a relação do trabalho for mais ou me<strong>no</strong>s assegurada e a inscriçãoem redes de sociabilidade mais ou me<strong>no</strong>s sólida. Observam-se sujeitos que vivemdo trabalho precário, por isso encontram-se em <strong>uma</strong> situação vulnerável, e aquelesque perderam o trabalho, ou, ainda, encontram-se isolados <strong>social</strong>mente,de<strong>no</strong>minados “os excluídos.” Entretanto, essa condição imposta pela conjuntura<strong>social</strong> é mutante, ou seja, a questão <strong>social</strong> se transforma ao longo dos a<strong>no</strong>s e, porisso, deve ser analisada a partir de contextos sociohistóricos específicos.Mesmo tendo sido citados em parte alguns pontos tratados por Castel(2004;2005), pode-se dizer que é bastante polêmica a discussão e reflexão que oautor provoca com seus argumentos fundamentados n<strong>uma</strong> história vivida pelah<strong>uma</strong>nidade. Entretanto, ao afirmar que “o trabalho permanece como referênciadominante não somente eco<strong>no</strong>micamente como também psicologicamente,29 Sobre a problematização acerca do entendimento dos mínimos sociais e necessidades h<strong>uma</strong>nas,sugiro ver em: PEREIRA, Potyara. Necessidades H<strong>uma</strong>nas: subsídios à crítica dos mínimossociais.São Paulo: Cortez, 2002. “Esse compromisso <strong>social</strong> mínimo do Estado afigura-se muito maiscomo um dever moral do que cívico, pois Hayek é veemente na sua rejeição às políticas sociais comoinstrumento de concretização de direitos de cidadania sob a responsabilidade do Welfare State. Paraele, o Estado deve prover um mínimo de safety net( rede de segurança) para prevenir ou enfrentar apobreza extrema (nunca a relativa), mas sem elevar os destinatários deste mínimo de provisão àcondição de titulares de direitos, que implicam deveres dos poderes públicos, para não contrariarespontânea e justa do mercado. È esta a concepção de provisão de mínimos sociais que estáatualmente em alta <strong>no</strong> mundo e <strong>no</strong> Brasil, sob influenciada ideologia neoliberal da qual Hayek éconsiderado o mentor intelectual” ( PEREIRA, 2002, p.53).


71culturalmente e simbolicamente, fato que se comprova pelas reações daqueles quenão o tem” (2005, p.19), não descarta a função <strong>social</strong> do trabalho, como formação<strong>social</strong> e de natureza histórica, mas a questiona, interroga e põe <strong>no</strong> centro a reflexãosobre a centralidade do mesmo. Essa centralidade não pode ser apenas objeto deconstatação, mas deve, sim, ser problematizada, pois se assiste a <strong>uma</strong> precarizaçãodas relações de trabalho através do desmonte das garantias e dos direitos dostrabalhadores.Ao revisar-se alg<strong>uma</strong>s das reflexões existentes sobre a questão <strong>social</strong> nasproduções do Serviço Social, busca-se, ainda que de forma sintetizada, traçar asconcepções discutidas e referenciadas por Iamamoto (2001), Pereira (2003) e Netto(2001). O processo de re<strong>no</strong>vação profissional do Serviço Social exigiu <strong>uma</strong>atualização na formação acadêmica, que vêm ancorando o projeto formativo quepreconiza a intervenção sobre a questão <strong>social</strong> (NETTO, 2001). Afinal, o cenário quese impõe <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1970 e 1980, já descritos nesse texto, requisitam um repensarcoletivo do exercício e da formação profissional, como forma de construir respostasacadêmicas, técnicas e ético-políticas, baseadas <strong>no</strong>s processos sociais em curso(IAMAMOTO, 2001).A vertente temática sobre o trabalho, ao ser incorporada como um veioanalítico da profissão, <strong>no</strong> início da década de 1980, a partir dos estudos deIamamoto e Carvalho 30 sobre as relações sociais e <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, indica a inscriçãodo Serviço Social como <strong>uma</strong> especialização do trabalho, inserida, portanto, nadivisão sociotécnica do trabalho. Tal entendimento revela o “caráter contraditório doexercício profissional, porquanto realizado <strong>no</strong> âmbito de interesses e denecessidades de classes sociais distintas e antagônicas” (IAMAMOTO, 2001, p. 10).A contribuição fundamentada pela teoria <strong>social</strong> crítica, na época, possibilitou atransição para outro foco na interpretação da prática profissional do Serviço Social.Essa passa a ser considerada como um dos elementos que constituem o processode trabalho profissional, assim como o objeto, os meios de trabalho, o produto e aprópria atividade do sujeito, que é o trabalho, ou, ainda, a prática profissional.30 Como referência sugere-se ver em IAMAMOTO, Marilda V. Re<strong>no</strong>vação e conservadorismo <strong>no</strong>Serviço Social. Ensaios críticos. São Paulo: Cortez, 1992.


72Cabe salientar o pioneirismo nas contribuições teóricas de Iamamoto sobre adiscussão do processo de trabalho profissional e a questão <strong>social</strong> que, sendodesigualdade, “é também rebeldia, por envolver sujeitos que vivenciam asdesigualdades e a ela resistem e se opõem” (IAMAMOTO, 2001, p.28). Ou, ainda, aconcepção comumente tratada na formação profissional refere-se à questão <strong>social</strong>,sendo apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades dasociedade capitalista madura, que tem <strong>uma</strong> raiz comum; A produção <strong>social</strong>é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente <strong>social</strong>,enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, mo<strong>no</strong>polizadapor <strong>uma</strong> parte da sociedade ( IAMAMOTO, 2001, p. 27).Posteriormente, <strong>no</strong> processo de implantação das diretrizes curriculares <strong>no</strong>sa<strong>no</strong>s de 1996, pesquisadores da área são convocados a subsidiar, através de suasproduções intelectuais, estudos aprofundados sobre a questão <strong>social</strong>, contribuindo,assim, para o debate e o rigor <strong>no</strong> trato da categoria em análise. A articulação doServiço Social e a questão <strong>social</strong> se dá em função dessa última ser considerada oeixo que articula “a gênese das seqüelas inerentes ao modo deprodução/reprodução do capitalismo, das mudanças <strong>no</strong> mundo do trabalho, dassuas manifestações e expressões concretas na realidade <strong>social</strong>, as estratégias deseu enfrentamento articuladas pelas classes sociais e o Estado” (MACIEL, 2006,p.13).Iamamoto considera que, nesse momento histórico de profundastransformações societárias, que “o método legado por Marx é um recurso analíticofecundo para análise das inéditas realidades do presente” (2001, p.30). Ao fazeressa referência verifica-se que a gênese da questão <strong>social</strong> está <strong>no</strong> processo deacumulação ou da reprodução do capital, que produz, ao mesmo tempo, <strong>uma</strong>acumulação de miséria, de disparidades econômicas, políticas e culturais dasclasses sociais.Netto (2001) traz <strong>uma</strong> contribuição também sustentada na análise marxiana,fundamentada <strong>no</strong> caráter explorador do regime do capital, o que permite situar aradicalidade histórica da questão <strong>social</strong>. Distingue a questão <strong>social</strong> das expressõessociais derivadas da escassez nas sociedades que precederam a ordem burguesa<strong>no</strong> período pré-industrial. A escassez, hoje manifestada, decorre de <strong>uma</strong> situação


73produzida <strong>social</strong>mente, resultado da contradição das forças produtivas e dasrelações de produção.Seguindo a linha argumentativa de Netto (2001), a tese sustentada pelo autoré de que inexiste qualquer <strong>no</strong>va questão <strong>social</strong>. Considera que, sem a supressão daprópria ordem do capital, é inevitável a emergência de <strong>no</strong>vas expressões da questão<strong>social</strong>. As transformações societárias, que emergem dessa ordem de forma dinâmica“põe e repõe os corolários da exploração, como a cada estágio de seudesenvolvimento ela instaura expressões sócio-h<strong>uma</strong>nas diferenciadas e maiscomplexas, correspondentes a exploração que é a sua razão de ser” (NETTO, 2001,p.48).Como se pode observar, a discussão de <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va questão <strong>social</strong> ou <strong>no</strong>vasexpressões da questão <strong>social</strong> está presente <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social, bem comoa necessidade de enfrentá-la <strong>no</strong> marco das transformações econômicas e políticascontemporâneas. Além da discussão de ser a questão <strong>social</strong> <strong>no</strong>va ou não, Pereira(2001) contribui, trazendo para sua reflexão, questionamento do próprio termoquestão paradesignar problemas e necessidades atuais, que apesar de dramáticos eglobais, e de produzirem efeitos nefastos sobre a h<strong>uma</strong>nidade, se impõemsem problematização de peso e, portanto, sem enfrentamentos à altura porparte de forças sociais estratégicas ( PEREIRA, 2001, p.51).O pressuposto para compreensão do conceito de questão <strong>social</strong>, que embasaa reflexão de Pereira (2001), parte do princípio de que esta sempre expressou arelação dialética entre a estrutura e a ação, na qual os sujeitos estrategicamentesituados, assumiram papéis políticos fundamentais na transformação dasnecessidades sociais. Sob esse argumento, a autora afirma que, mesmo diante daexistência de problemas que vêm impactando negativamente a h<strong>uma</strong>nidade e quesão evidentes, “eles ainda não foram decisivamente problematizados etransformados em questões explícitas; isto é, ainda não foram alvo de correlaçõesestratégicas, a ponto de abalarem a hegemonia da ordem dominante e permitirem aimposição de um projeto contra-hegemônico” (PEREIRA, 2001, p. 53).A contribuição da autora se dá ao introduzir-se na discussão sobre aconcepção da questão <strong>social</strong>, o aspecto político, referente ao embate travado pelos


74sujeitos sociais diante das opressões do sistema capitalista <strong>no</strong> marco da revoluçãoindustrial, como na Europa <strong>no</strong> século XIX. As situações atuais, os problemasprovocados pelos ideários neoliberais, são produtos de <strong>uma</strong> mesma contradição quegerou essa questão, mas, para Pereira, esses não foram suficientemente politizados,pois a questão <strong>social</strong> assim entendida, é, também, embate político determinadopelas contradições da sociedade capitalista (PEREIRA, 2001).A <strong>dimensão</strong> política, enquanto estratégia de ação, é, então, tratada na suarelação com a questão <strong>social</strong>. Sem <strong>uma</strong> opção política, fica difícil resolver ou darresolução a <strong>uma</strong> expressão da questão <strong>social</strong> desvendada <strong>no</strong> exercício da profissão.A condição prévia para o aparecimento de <strong>uma</strong> questão é um problema que podeser identificado ou não como <strong>uma</strong> demanda que requer <strong>uma</strong> intervençãoprofissional. Entretanto, é fundamental a problematização das necessidades e dasdemandas identificadas, para que se possa efetivar sua resolução, através da“mobilização de forças políticas para o seu enfrentamento” (PEREIRA, 2001, p.120).Portanto, essa análise contribui para compreensão de que a <strong>dimensão</strong> políticaimprimida na efetivação das políticas sociais públicas é um dispositivo que interferena resolução das expressões da questão <strong>social</strong>. Dimensão dotada de intenções, demobilização ou não, mas que de<strong>no</strong>ta a tomada de posição de um profissional frenteàs necessidades postas <strong>no</strong> seu cotidia<strong>no</strong> profissional.As concepções traçadas até aqui subsidiam a reflexão em tor<strong>no</strong> da questão<strong>social</strong> e, conseqüentemente, contribuem com os aportes teórico metodológicosnecessários para formação profissional. Não se propões decidir sobre <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va ouvelha questão <strong>social</strong>, até porque, em alg<strong>uma</strong>s situações, identificou-se o uso doadjetivo <strong>no</strong>va como indicativo de <strong>uma</strong> metamorfose, pois, como bem refere Castel(2005), trata-se da dialética do mesmo e do diferente.Contudo, deve-se considerar a maneira como se problematizam astransformações societárias que impactam a vida dos trabalhadores em cadarealidade sócio-histórica. Diante das revisões expostas sobre a temática, constata-sea existência de <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> dilemática <strong>no</strong> trato da questão <strong>social</strong>, principalmente<strong>no</strong> âmbito do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, <strong>uma</strong> vez que essa e suas múltiplas expressões


75vivenciadas pelos sujeitos, se constituem <strong>no</strong> objeto sobre qual incide a açãoprofissional.Com a reestruturação produtiva advinda das mudanças na gestão e naregulação do trabalho, pode-se dizer que vive-se, na atualidade, <strong>uma</strong> reativação dossentidos, das inquietações, das contradições, das tensões e dos conflitos queestiveram nas origens da história, desafiando, principalmente, a universalização dosdireitos sociais. Longe vão as manifestações de resistências do movimento operáriodo final do século XIX e inicio do XX <strong>no</strong> período industrial, ou as mobilizações dosmovimentos sociais, estudantis e a mobilização dos sindicatos nas décadas daditadura militar em solo brasileiro, ou ainda, as marchas pela democracia, pelasdiretas já, pelas conquistas instituídas na Carta Magna, <strong>no</strong> final dos a<strong>no</strong>s 1980,ainda que sejam políticas de regulação <strong>social</strong> tardia (SPOSATI, 2002), cujoreconhecimento legal não significa que estejam sendo efetivadas, foram temposhistóricos que deixaram marcas e que culminaram em transformações sociais <strong>no</strong>seio de <strong>uma</strong> sociedade capitalista. Em <strong>uma</strong> versão histórica diferente, assiste-se,hoje, o desmonte dos ideais dos sindicatos, a fragmentação dos movimentos sociais,o espraiamento dos estilhaços da violência, a falta de oportunidades, de garantia dedireitos e, ainda, o adormecimento da <strong>dimensão</strong> política e ética entre os cidadãos eos trabalhadores brasileiros.Resta-<strong>no</strong>s cada vez mais, apreender a forma como a questão <strong>social</strong> semanifesta através de suas diversas expressões, para que se possa problematizá-lae, nesse cenário, construir coletivamente estratégias de defesa intransigente dejustiça <strong>social</strong> e dos princípios éticos e h<strong>uma</strong>nitários. Assim, pode-se na históriavivida <strong>no</strong> presente, desocultar os movimentos de resistências existentes, planejar o<strong>no</strong>vo, superar conflitos, questionar idéias e ideais e, como dizia Paulo Freire,reinventar o poder.Difícil torna-se aqui, propor alg<strong>uma</strong> conclusão a respeito da questão <strong>social</strong>que não sejam inquietações. Como se pode observar, a partir dos pressupostos que<strong>no</strong>rtearam a reflexão sobre a questão <strong>social</strong>, mesmo não sendo reconhecida <strong>no</strong>âmbito do Serviço Social, a leitura sociológica pré-industrial realizada por Castel(2005, 2004) e sua relação com a questão <strong>social</strong>, trata-se de considerá-la comosubsídio compreensivo e reflexivo sobre a problemática que se instaura <strong>no</strong>s dias de


76hoje. Fica a compreensão de que a questão <strong>social</strong>, atualmente, se expressa,basicamente, a partir da produção e da distribuição de riquezas conjugadas pelaerosão dos sistemas de proteção <strong>social</strong>, pela vulnerabilidade das relações sociais epelo questionamento da intervenção estatal.Assim sendo, é nesse espaço de tensionamento, entre o capital e o trabalhona realidade atual, que o Assistente Social vai desenvolver seu processo de trabalhoe, por isso, a importância de verificar como os profissionais vêm investindo na suaformação profissional <strong>no</strong> sentido de superar os obstáculos para consolidar seuprojeto ético-político. Se entendemos, então, que a Questão Social se expressa dediferentes formas e se metamorfoseia de acordo com os processos sócio-históricosdeterminados pela sociedade capitalista, é fundamental considerarmos a dinâmica, omovimento e a interlocução das dimensões que constituem o processo de trabalhoprofissional.3.3 A DINÂMICA DO PROCESSO DE TRABALHO PROFISSIONALNesta parte do texto, a intenção é chamar atenção para o quanto o processode trabalho do Serviço Social e os elementos que o constituem - o objeto, os meios,o produto e o próprio trabalho, que é a atividade do sujeito –, tornam-se dispositivospara reflexão permanente dos profissionais. Elementos esses que devem serinterrogados, assim como é a questão <strong>social</strong> um desafio que interroga (CASTEL,2004), a instrumentalidade adotada e o resultado de <strong>no</strong>sso processo de trabalhorespaldado por um projeto profissional, devem ser questionados a partir domovimento sócio-histórico da realidade contemporânea. A <strong>no</strong>rmatização impressa <strong>no</strong>código de ética de 1993, ao estabelecer direitos e deveres do assistente <strong>social</strong> 31 ,deixa registrada a relevância da <strong>dimensão</strong> política <strong>no</strong> exercício da profissão.31 Em que pese a importância do conhecimento e publicização destes direitos e deveres, <strong>no</strong> decorrerdeste estudo os mesmos serão evidenciados articulados com a análise empírica em questão,portanto destacam-se em <strong>no</strong>ta: o reconhecimento da liberdade como valor ético central, que requer oreconhecimento da auto<strong>no</strong>mia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais e de seusdireitos; a defesa intransigente dos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s contra todo tipo de arbítrio e autoritarismo; adefesa, aprofundamento e consolidação da cidadania e da democracia da <strong>social</strong>ização daparticipação política e da riqueza produzida; o posicionamento a favor da equidade e da justiça <strong>social</strong>,que implica a universalidade <strong>no</strong> acesso a bens e <strong>serviço</strong>s e a gestão democrática; o empenho naeliminação de todas as formas de preconceito, e a garantia do pluralismo; o compromisso com aqualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados na articulação com outros profissionais e trabalhadores (CFESS nº273/93 de 13 de março de 1993). Sugiro ver em: CRESS/Coletânea de Leis, 2000.


77Respaldado em princípios e valores h<strong>uma</strong>nistas, o código é mais do que um guia<strong>no</strong>rteador da profissão; é um dispositivo de luta por <strong>uma</strong> sociedade mais justa, o quepressupõe <strong>uma</strong> reflexão crítica permanente sobre a maneira como se desenvolve oprocesso de trabalho do assistente <strong>social</strong>.O projeto profissional, aqui citado, expressa a perspectiva hegemônicaimpressa ao Serviço Social brasileiro e, conseqüentemente, sua operacionalizaçãosupõe “o reconhecimento das condições sócio-históricas que circunscrevem otrabalho do assistente <strong>social</strong> na atualidade, estabelecendo limites e possibilidades àplena realização daquele projeto” (Iamamoto, 2002, p.23). Partindo-se desseentendimento, é possível evidenciar as mediações que incidem nas funções,competências e atribuições do assistente <strong>social</strong>, pois o profissional, ao inserir-se emum espaço organizacional determinado, torna-se “parte de <strong>uma</strong> organização coletivado trabalho, empreendida pelos empregadores, o que interfere <strong>no</strong> conteúdo, nasformas assumidas pelo seu trabalho e <strong>no</strong>s seus resultados” (IAMAMOTO, 2002,p.24).Nesse contexto estão, também, as necessidades dos usuários que vivenciamas múltiplas expressões da questão <strong>social</strong> e que se constituem em demandas“reelaboradas na ótica dos empregadores, <strong>no</strong> embate com os interesses dosusuários dos <strong>serviço</strong>s profissionais. É nesse terre<strong>no</strong> denso de tensões econtradições sociais, que se situa o protagonismo profissional” (IAMAMOTO, 2002,p.25).Portanto, <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social, tratar sobre o projeto profissionalsignifica referir-se àquele construído coletivamente pela categoria dos assistentessociais, incluindo-se aí, o conjunto dos membros que dão efetividade à profissão,envolvendo, assim, profissionais que atuam em diferentes espaços sócioocupacionais,bem como as instituições formadoras, os pesquisadores, os docentese os estudantes de Serviço Social, os organismos corporativos, acadêmicos esindicais, entre outros (NETTO, 2006). Ressalta-se, ainda, que a forma como ostrabalhadores se organizam para efetivação e legitimação de um projeto profissionalé fundamental.Por outra parte, a experiência socioprofissional comprovou que,para que um projeto profissional se afirme na sociedade, ganhe solidez e


78respeito frente às outras profissões, às instituições privadas e públicas efrente aos usuários dos <strong>serviço</strong>s oferecidos pela profissão, é necessário queele tenha em sua base um corpo profissional fortemente organizado(NETTO, 2006, p.144).Os projetos profissionais são compreendidos como estruturas dinâmicas queprocuram responder as alterações das necessidades sociais, das <strong>no</strong>vas requisiçõestécnico-operativas, as transformações societárias de toda ordem – econômicas,históricas e culturais –, “ao desenvolvimento teórico e prático da própria profissão e,ademais, às mudanças na composição do corpo profissional” (NETTO, 2006, p.144).Assim, os projetos profissionais não podem ser considerados algo estático, pois, aocontrário, se re<strong>no</strong>vam, se reinventam na forma de sua consolidação, diante àdinâmica e às contradições da realidade <strong>social</strong>.A afirmação de um projeto profissional hegemônico se dá a partir de tensõese de lutas, de confrontos de idéias, de discussões, de divergências e decontradições <strong>no</strong> âmbito da própria categoria, ou, ainda, <strong>no</strong> espaço sócio-ocupacionalem que se desenvolve a prática profissional. A construção do projeto, aquiconsiderado hegemônico, é inseparável das relações sociais que se dão nesteprocesso, assim como é a construção da identidade profissional (DUBAR, 2006).Ao partir do entendimento de que existem formas de identidade como modosde identificação dos indivíduos na sociedade, há um forte componente relacional naformação das identidades (DUBAR, 2006). 32 A forma “relacional para outrem” definesepelas interações de um sistema instituído e hierarquizado. “Ela constrói-se sobpressões de integração às instituições: a família, a escola, os grupos profissionais, oEstado”. Essa identifica os indivíduos a partir de seus papéis, implica um “Eu<strong>social</strong>izado” (DUBAR, 2006, p.51). Há, também, a forma que provém de <strong>uma</strong>consciência reflexiva de<strong>no</strong>minada por Dubar (2006, p.51)) como a forma “relacionalpara si”. “Põe em marcha de forma ativa o compromisso num projeto que tem umsignificado subjetivo e que implica a identificação a <strong>uma</strong> associação de pares,partilhando o mesmo projeto” (2006, p.51).32 Dubar apresenta um resumo das formas de identidade como modos de identificação dosindivíduos: a forma de identidade biográfica, a forma relacionada para outrem, a forma relacional parasi, a forma biográfica para si. Sugiro ver em DUBAR (2006).


79Portanto, o resultado de um trabalho realizado deverá estar em sintonia comum projeto profissional e, fundamentalmente, com a sua consolidação como umdever ser e não como <strong>uma</strong> proposta ideal (IAMAMOTO, 2002). É nesse sentido quea educação permanente pode tornar-se um dispositivo, <strong>uma</strong> possibilidade decontribuir não só com a formação profissional, como, também, para a consolidaçãodo projeto ético-político do Serviço Social. Na formação dos profissionais, omomento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática (FREIRE, 1997), sobrea atividade dos sujeitos.Entretanto, para um profissional refletir sobre a prática significa encontrar oserros, os acertos, os medos, a subjetividade, as verdadeiras intenções, os valores,enfim, sobre o sentido que atribui ao trabalho e à experiência que vivencia. Mas,então, como fazer esta reflexão? Será que o projeto de formação profissional dosassistentes sociais prepara-os para esse desafio ou são as situações de trabalhoque possibilitam a experiência reflexiva? Essas questões remetem à concepção deprática, ou, ainda, do trabalho,categorias que <strong>no</strong>rteiam essa discussão.Para Iamamoto (2000), pensar o Serviço Social como trabalho tor<strong>no</strong>u-se <strong>uma</strong>provocação para análise da prática profissional, pois essa “prática” é um doselementos que constituem o processo de trabalho do assistente <strong>social</strong>. É a atividadedo profissional, é o trabalho em si.Esse ato de acionar consciente, que é o trabalho, é <strong>uma</strong> atividadeque tem <strong>uma</strong> necessária <strong>dimensão</strong> ética, como atividade direcionada a fins,que tem a ver com valores, com o dever ser, envolvendo <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> deconhecimento e ético-moral (IAMAMOTO, 2001, p.61).O trabalho do Assistente Social acontece a partir de <strong>uma</strong> demanda quemanifesta diferentes expressões da Questão Social, conforme tratada anteriormente,e requer <strong>uma</strong> intervenção profissional dotada de intenções e de valores quedirecionam para um determinado fim. A prática diz, então, respeito à ação h<strong>uma</strong>na,isto é, “a transformação intencional da realidade pelos homens. Implica, portanto, umdesígnio, um fim: o estado que assume a realidade em resultado da transformação.Implica igualmente <strong>uma</strong> origem: o estado do real, ao qual se aplica a ação”(MALGLAVIE, 1995, p.40). Observa-se que o estado inicial e final da açãoprofissional constituem elementos da prática. É esse estado final do trabalho que dávisibilidade à concretização ou não de um projeto profissional e, como tal, está


80investido de desejos, de necessidades e de valores que constituem os motoresdessa prática (MALGLAVIE, 1995).Partindo desse entendimento, a prática, aqui, deixa de ser compreendidasomente como um fenôme<strong>no</strong> que modifica algo ou a ordem das coisas e entra naesfera da moral ou da ideologia, em s<strong>uma</strong>, da ordem <strong>social</strong>, pois o objetotransformado, assim como os meios da sua transformação, não dependemclaramente de resultados materiais (MALGLAVIE, 1995). No âmbito do ServiçoSocial, têm-se como finalidades a defesa intransigente dos direitos sociais, aampliação da cidadania emancipatória e a consolidação da democracia, princípioscitados anteriormente e que constam <strong>no</strong> Código de Ética. Sendo assim, aconcretização desses objetivos, o resultado do trabalho do assistente <strong>social</strong>, se dá<strong>no</strong> campo objetivo e subjetivo, sendo essa última através da esfera ideológico -política. “O assistente <strong>social</strong> lida com demandas diversificadas que abrangem desdequestões materiais ligadas à própria sobrevivência, quanto a questões ligadas àesfera dos valores e comportamentos” (SIMIONATO, 1998, p.14).Associa-se, também, a essa compreensão, a discussão realizada <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s1980 sobre a idéia de que a prática profissional do Serviço Social, o fazer dessaprofissão, não está desvinculado dos processos históricos em contínua construçãode <strong>uma</strong> realidade dinâmica, contraditória e conflituosa. Portanto, a práticaprofissional,não é algo que se coloca à parte dos processos macroscópicos queatravessam a sociedade contemporânea, seja em relação ao mundo dotrabalho, à alteração nas relações Estado/sociedade/mercado, às <strong>no</strong>vasexpressões <strong>no</strong> campo da cultura e nas relações de poder. Essas mediaçõespermitem compreender a prática profissional inserida num processo detrabalho, bem como sua interconexão com a prática da sociedade(SIMIONATO, 1998, p.10).Mesmo sendo essa <strong>uma</strong> discussão iniciada <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980, faz-se necessário,ainda nessa primeira década do século XXI, destacar a relevância do entendimentoda prática dos assistentes sociais estar inserida em processos de trabalho, que sãodeterminados pelo jogo das forças sociais presentes em <strong>uma</strong> realidade <strong>social</strong>concreta. Assim, em cada situação peculiar, as condições e relações de trabalho sãodeterminadas pelas características das relações sociais, econômicas, políticas eculturais de <strong>uma</strong> sociedade.


81Sem a clareza da interlocução desses elementos, dessas condições detrabalho, da sinergia entre os mesmos, que vão se definindo em tempo e espaçoespecífico, e que são determinantes de <strong>no</strong>ssa ação profissional, corre-se o risco dedesenvolver um trabalho cujo resultado não contribui com aquilo que se prega comoprojeto profissional hegemônico.No campo da saúde, referência para reflexão nesse estudo, pode-se dizerque o processo de trabalho dos assistentes sociais está articulado com as diretrizesdo Sistema Único de Saúde - SUS 33 . Esse <strong>no</strong>vo ordenamento ao setor saúde,promulgado a partir da constituição de 1988, como resultado da mobilização e daparticipação popular e de trabalhadores que lutaram em defesa dos direitos sociais,<strong>no</strong> caso o direito à saúde, através de acesso universal, está fincado em aspectoséticos-políticos que possuem <strong>uma</strong> estreita relação com o projeto profissional daprofissão de assistentes sociais. Essa compreensão é fundamental para que sepossa desenvolver um processo de trabalho que tenha como intenção contribuir,através de <strong>uma</strong> ação profissional comprometida, com a consolidação desta política.Esse sistema de saúde se institui <strong>no</strong> cenário brasileiro sob fortes resistênciasdos ideários neoliberais, e a sua regulamentação “foi permeada por confrontos enegociações intensas, refletindo a posição antagônica dos grupos de interessesligados ao setor” (MIOTTO, 2006, p.221). Apesar dos grandes avanços do sistema,como a adoção de práticas efetivas de controle <strong>social</strong> como a criação de conselhoslocais de saúde com poder deliberativo e fiscalizatório, estar atento a todas asformas de desmonte dessa política pública e resistir, é tarefa dos profissionais queatuam nesse setor. Para reflexão crítica sobre o SUS, deve-se considerar a suaamplitude, a sua complexidade e os diferentes resultados obtidos, que dependem domodo de gestão e dos interesses em sua efetivação.O processo de conhecimento dos fatores que determinam a forma comoestão organizados os diferentes espaços sócio-ocupacionais <strong>no</strong> âmbito da saúde, éfundamental para definição das estratégias de intervenção. Da mesma forma,também, está a compreensão dos significados das demandas que requerem <strong>no</strong>ssa33 Lei 8080 de 19 de setembro de 1990. dispõe sobre as condições para a promoção, proteção erecuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos <strong>serviço</strong> correspondentes e dá outrasprovidências. Ver em coletânea de Leis - CRESS, 2000.


82intervenção profissional, pois essas sofrem alterações assim com a realidade <strong>social</strong>e se manifestam através das diferentes expressões da questão <strong>social</strong>, que sãovivenciadas pelos usuários da área da saúde.Outro aspecto a ser considerado é que, entre os usuários dos <strong>serviço</strong>s desaúde e o profissional assistente <strong>social</strong>, “há <strong>uma</strong> disjunção, <strong>uma</strong> separação entrequem demanda e quem recebe diretamente os <strong>serviço</strong>s; isto é, são as instituiçõesestatais e privadas que contratam os profissionais” (SERRA, 2000, p. 161). Essa“figura do atravessador” entre o profissional e o público-alvo, que <strong>no</strong> caso são os<strong>serviço</strong>s de saúde, estatais ou privados, que se constituem em espaços sócioocupacionais,de<strong>no</strong>tam <strong>uma</strong> demanda específica ao profissional. Esse entendimentoatribui ao assistente <strong>social</strong> o desafio de desvendar e de identificar as necessidadesdos gestores do sistema de saúde ou das instituições que os contratam e dosusuários de seus <strong>serviço</strong>s, através da problematização dos interesses que estão portrás dessas demandas.Tal característica confere ao Serviço Social <strong>uma</strong> condição peculiar,o que implica <strong>uma</strong> análise particular da questão das demandas. Significaafirmar, em decorrência deste fato, que há que se ter um duplo movimentode análise em relação ao conhecimento das demandas.Primeiramente, éimprescindível identificar as necessidades do capital e do Estado, emespecial, em fase das alterações estruturais de hoje, para que se possa, emdecorrência, identificar as imposições e demandas que um e outro estãocolocando à profissão, em particular (SERRA, 2000, p.162).Nesse sentido, o processo de trabalho do assistente <strong>social</strong> pressupõe essemomento de desvendamento do real, das necessidades e da identificação dasdemandas. Para compreender as necessidades de saúde, deve-se levar em contaque “elas são produto das relações sociais e destas com o meio físico, <strong>social</strong> ecultural” (MIOTTO, 2006, p. 229).As transformações societárias impactam a vida da população, condicionandoe determinando a sua condição de saúde, o que faz com que o atendimento aosusuários não se limite muitas vezes ao setor saúde, sendo necessário <strong>uma</strong>articulação da rede de proteção <strong>social</strong> que possa atender as necessidades postaspelos usuários do SUS.Como se vê, a definição de necessidades de saúde ultrapassa onível de acesso a <strong>serviço</strong>s e tratamentos médicos, levando em conta astransformações societárias vividas ao longo do século XX e já <strong>no</strong> século


83XXI, com a emergência do consumismo exacerbado, a ampliação da misériae da degradação <strong>social</strong> e das perversas formas de inserção de parcelas dapopulação <strong>no</strong> mundo do trabalho. Mais que isso, envolve aspectos éticosrelacionados ao direito à vida e á saúde, direitos e deveres ( MIOTTO,2006,p.229).Esta apreensão sobre saúde como um processo, como produto e parte de<strong>uma</strong> condição de vida, <strong>no</strong>s remetem a conteúdos densos principalmente aorelacionarmos com a ação profissional dos assistentes sociais, mas, sobretudo o quese quer aqui, é destacar a importância das dimensões política, teórico -metodológica e técnico-operativa <strong>no</strong>s processos de trabalho dos assistentes sociaisda saúde. A intencionalidade das ações e os pressupostos ideopolíticos <strong>no</strong>sconduzem a diferentes resultados, pois dependendo da leitura que se faça darealidade <strong>social</strong> e do SUS, podemos estar consolidando tanto o sistema como oprojeto ético-politico, ou ao contrário, reproduziremos processos de trabalhoalienantes e conservadores.A apropriação de <strong>uma</strong> perspectiva teórico-metodológica defendida aquipressupõe referências que possibilitem a reconstrução permanente do movimento darealidade <strong>social</strong>, objeto da ação profissional “enquanto expressão da totalidade<strong>social</strong>, gerando condições para um exercício profissional consciente, critico epolitizante, que só pode ser empreendido na relação de unidade entre teoria eprática” (VASCONCELOS, 2006, p.253).Da mesma forma está a importância da <strong>dimensão</strong> técnico-operativa, poisessa não se constitui somente na escolha dos instrumentos que deverão seracionados para a intervenção, mas dependem de <strong>uma</strong> análise crítica e estratégicaque se faça da realidade já referida anteriormente, e das oportunidades e brechasque podemos ocupar <strong>no</strong>s espaços sócio-ocupacionais, que não devem serdesperdiçadas, a fim de encaminharmos <strong>no</strong>ssas ações na direção dos interessesdos usuários. Portanto, um conjunto de conhecimentos e de habilidades que sãoacionados, fazem parte da instrumentalidade dos assistentes sociais e não somentede um arsenal de técnicas utilizadas <strong>no</strong> exercício da profissão (IAMAMOTO, 2001).O desenvolvimento de projetos e de programas sociais, as visitasdomiciliares, as entrevistas, os atendimentos individuais e coletivos, os plantões, oplanejamento de ações, a participação <strong>no</strong>s espaços de controle <strong>social</strong>, as


84assessorias e consultorias, o acolhimento, as orientações e encaminhamentos, aarticulação da rede de <strong>serviço</strong>s <strong>no</strong> âmbito local, a participação em equipesinterdisciplinares, entre outros, fazem parte dos meios de trabalho dos assistentessociais na saúde. Entretanto, muito mais do que listar essas possibilidades deinstrumentos e de meios de trabalhar, está a forma como os utilizamos, a intenção,os propósitos, a viabilização dos direitos, do acesso, a informação, a participação,que correspondem ao resultado da ação profissional, conforme citado anteriormente.Existem situações observadas por Vasconcelos (2006) <strong>no</strong> campo da saúde,de que a realização do plantão, como exemplo, é <strong>uma</strong> atividade comum entre osassistentes sociais; entretanto, é preciso estar atento para que isso não se reduza a<strong>uma</strong> prática burocrática.Uma prática profissional burocrática que segue mecanicamente<strong>no</strong>rmas impostas pelo regulamento da administração, autoridade ou seurepresentante, e que ao priorizar um atendimento de escuta, acolhimento,encaminhamento e ou preenchimento moroso e mecânico de formulários,questionários, cadastros que viabilizam acesso a benefícios ou inscrição emprogramas da instituição ( VASCONCELOS, 2006, p.251).Esses procedimentos comprometem a objetivação do projeto profissional,<strong>uma</strong> vez que pode-se inviabilizar o acesso dos usuários a <strong>serviço</strong>s e recursosenquanto um direito <strong>social</strong>. De maneira alg<strong>uma</strong>, o acolhimento, o encaminhamento eo apoio, devem ser deixados de lado; ao contrário, devem contribuir para o início deum processo reflexivo entre o usuário e o assistente <strong>social</strong>. A <strong>dimensão</strong> técnicooperativadeverá priorizar a busca de <strong>uma</strong> participação consciente e efetiva dosusuários <strong>no</strong>s espaços instituídos ou a serem construídos como forma demobilização, organização e acesso a informações necessárias, para preservar,ampliar e realizar seus direitos (VASCONCELOS, 2006).Em estudo realizado junto a assistentes sociais da saúde, 34 foi constatadoque a “prática da maioria dos assistentes sociais, não se remete ao projetohegemônico, mas está hipotecada aos condicionantes político-institucionais quelimitam suas escolhas” (VASCONCELOS, 2006, p. 253). Pois então, ao tomarmos34 A partir de um estudo realizado sobre a realidade do Serviço Social <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s de saúde domunicípio do Rio de Janeiro, Vasconcelos faz referência sobre a prática profissional dos assistentessociais e aponta estratégias e ações que possam fomentar <strong>uma</strong> prática na saúde que implicandoassistentes sociais e demais trabalhadores da saúde <strong>no</strong> sentido de contribuir, facilitar e realizar oacesso aos direitos, sugiro ver em Vasconcelos (2006, 2003).


85como referência o projeto ético-político para o desenvolvimento da práticaprofissional, tal constatação deve ser um dispositivo de mudanças, a partir dareflexão crítica sobre o processo de trabalho profissional, e não motivo para <strong>no</strong>srendermos as exigências institucionais limitadoras.Como se vê “as condições e relações de trabalho em que se inscreve oassistente <strong>social</strong> articulam um conjunto de mediações que interferem <strong>no</strong>processamento da ação e <strong>no</strong>s resultados individual e coletivamente projetados”(IAMAMOTO, 2002, p.25).Nesse sentido, retoma-se a reflexão sobre valor de troca e valor de uso paraevidenciar, aqui, a idéia de que o trabalho, como experiência <strong>social</strong>, não é somentevalor de troca mas é também valor de uso, que ele não é somente momento deexploração e de dominação, mas é também momento de formação e de partilha de<strong>uma</strong> atividade. Ao fazer esta referência não se pretende substituir <strong>uma</strong> abordagempor outra, mas, como refere Charlot (2004), pensá-las juntas. E como pensar oproduto do processo de trabalho do assistente <strong>social</strong> da saúde, por exemplo, sempensar <strong>no</strong> valor de uso que dele advém e não tratar-se somente de <strong>uma</strong> mercadoriade algum proprietário, mas de direitos de acesso, de equidade da saúde coletiva?Então o trabalho <strong>no</strong> SUS produz um valor de uso <strong>social</strong> n<strong>uma</strong> dinâmica de umprocesso de trabalho que é operacionalizada por micro criações, ”onde se constroemsaberes específicos, ligações coletivas, onde se colocam à prova valores sociais epolíticos na confrontação da atividade de trabalho com as <strong>no</strong>rmas antecedentes”(CHARLOT, 200, p.18).É nesse contexto sócio-histórico, em que a hegemonia neoliberal marca suapresença, que se desvela a dinâmica do processo de trabalho dos assistentessociais. Para o desenvolvimento de <strong>uma</strong> prática mediada pelo SUS e pelo projetoético-político-profissional, é fundamental pensar em estratégias que possibilitem aformação profissional <strong>no</strong> próprio espaço de trabalho, à luz de contextos específicos,considerando as particularidades e as necessidades postas pelos usuários e pelospróprios trabalhadores da saúde.É <strong>no</strong> planejamento e na execução de determinadas estratégias eações que o assistente <strong>social</strong> vai se formando e se transformando em umrecurso vivo, cada vez mais qualificado. Vai formando e consolidando a


86sistematização a análise, a crítica, e a avaliação das ações; vai fortalecendosuas referências, seus valores, seus compromissos, seus objetivos... Aomesmo tempo, vai assegurando o acesso e a ampliação dos direitos e docontrole <strong>social</strong> (VASCONCELOS, 2006, p.257).Diante o exposto até aqui, há de se considerar que a própria compreensãocrítica do movimento da realidade <strong>social</strong>, que é peculiar ao processo de trabalho doassistente <strong>social</strong>, impõe a esses profissionais a necessidade de desencadear umprocesso de formação que possa garantir a capacitação dos profissionais que seencontram em atuação profissional. Para que isso aconteça, os assistentes sociaisnecessitam reconhecer o movimento e a dinâmica dos elementos do seu processode trabalho e compreender que a reflexão crítica sobre o mesmo é condiçãodeterminante da qualidade do trabalho profissional e, conseqüentemente, <strong>uma</strong>estratégia para a formação profissional permanente. Formação essa que se inicia <strong>no</strong>âmbito acadêmico, na medida em que forma o sujeito para o exercício da profissão,mas que também se dá <strong>no</strong> exercício profissional, <strong>no</strong> desenvolvimento do seuprocesso de trabalho, em contextos específicos, enfim, <strong>no</strong> próprio trabalho.Apreender o sentido dos conteúdos que fundamentam a formação dosassistentes sociais implica em reconhecê-los como conhecimentos construídoshistoricamente e que se constituem, para o profissional, em pressupostos, a partirdos quais se podem construir <strong>no</strong>vos conhecimentos, num processo de investigaçãoe de compreensão da realidade em que se está inserido.Assim, compreendendo o trabalho como um princípio educativo, acredita-seque o mesmo permite concretamente a compreensão do significado das múltiplasexpressões da questão <strong>social</strong>, da dinâmica do processo de trabalho e daconsolidação do projeto ético político. Portanto, a forma de organização de um corpoprofissional, como os dos assistentes sociais, pressupõe estratégias para superaçãodas dificuldades de afirmação de um projeto profissional, comprometido nãosomente com a viabilização de políticas públicas, mas, fundamentalmente, com aviabilização de direitos e de emancipação de <strong>uma</strong> cidadania política.É importante destacar, também, que a produção de saberes emerge, aqui,como <strong>uma</strong> categoria reflexiva dessa investigação. Portanto, a possibilidade daeducação permanente dos assistentes sociais se constituir n<strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong><strong>formativa</strong>, pressupõe privilegiar <strong>uma</strong> reflexão constante do trabalho real realizado,


87ultrapassando os limites do que é prescrito para o profissional. Na tentativa dearticular as concepções de trabalho prescrito com o trabalho real e a possibilidadede produção de saberes <strong>no</strong>s espaços sócio-ocupacionais, é que se acrescenta oitem a seguir.3.4 ENTRE O TRABALHO PRESCRITO E O TRABALHO REAL: A CONSTRUÇÃODE SABERESParece que o conceito de conhecimentos não é suficiente paraposicionar um indivíduo: há o que ele sabe, há também (e sobretudo) omodo como o sabe e como se pode apoiar <strong>no</strong> que sabe para evoluir(SOREL, 1987, p.11).Os fundamentos teóricos, que respaldam as reflexões sobre a interlocuçãoentre a educação e o trabalho e as possíveis trajetórias <strong>formativa</strong>s que emergem davia experiencial, pressupõem a produção de saberes <strong>no</strong>s processos de trabalho emque os assistentes sociais se inserem. Para tratar sobre a categoria produção desaberes, parte-se do entendimento de que existe <strong>uma</strong> diferença entre aquilo queestá prescrito, como um pla<strong>no</strong> a ser desenvolvido pelo sujeito através de suaatividade, e a realização dessa prescrição. Isto quer dizer que “há sempre umespaço entre aquilo que é da ordem da prescrição - um pla<strong>no</strong> que é elaborado pelopróprio sujeito ou por outrem - e a realização deste pla<strong>no</strong>” (SANTOS, 2000, p.66).Diante de tal compreensão, pode-se crer que nenh<strong>uma</strong> realidade é idênticaà prescrição, pois trata-se da execução de tarefas realizadas por pessoas, o querevela a existência de um espaço que pode ser preenchido por algo que não estavaprevisto, que pode, então, agregar aquela prescrição apontando <strong>no</strong>vas realizações,o <strong>no</strong>vo, o criativo. “Entre o prescrito e o real, existe um espaço de criação”(SANTOS, 2000, p.66).Dar evidência a esse “espaço” é fundamental, pois é dele que se origina osaber; é nessa brecha que podem emergir as estratégias metodológicas para que<strong>uma</strong> intervenção profissional seja crítica e propositiva. Esse é, também, um espaçocoletivo, de interdisciplinaridade, de mobilização em prol da mudança para tecer arede de relações experienciadas <strong>no</strong> trabalho. É, ainda, o espaço de aplicação de umsaber científico adquirido e que passa a ter um sentido para o sujeito a partir domomento em que este lhe permite enfrentar situações postas na prática profissional.


88Torna-se relevante destacar aqui que as condições de trabalho são tambémdeterminantes daquilo que se tem para fazer, como algo prescrito ao profissional,isto quer dizer que as condições necessárias para o desenvolvimento de <strong>uma</strong> tarefainfluenciam diretamente <strong>no</strong> processo de trabalho. Tais condições são definidas, namaioria das vezes pelo próprio capital, construídas pelas empresas, a partir decritérios que não onerem a lógica de acumulação, de interesses em jogo, decomprometimento ou não, com a gestão do trabalho marcada por princípiosparticipativos e democráticos. Contudo, as condições necessárias não estão todaspresentes num mesmo espaço e tempo, sendo tarefa do trabalhador com seupróprio corpo e com sua mente, com seu modo de pensar e de agir, preencher estesvazios, construindo estratégias para que o trabalho possa ser realizado. Assimsendo, pode-se também dizer que quanto maior a diferença daquilo que estáprescrito do que aquilo que é real, maior o desgaste do trabalhador.Em que pese a importância dessa reflexão sobre as condições de trabalho atônica, aqui, é dessa possibilidade de criação que se associa a possibilidade deaquisição de um <strong>no</strong>vo saber. Esse saber, que é construído <strong>no</strong> mundo do trabalho,em espaço-tempo específico, <strong>no</strong> exercício de <strong>uma</strong> ocupação profissional, com opassar do tempo vai se revelando como um <strong>no</strong>vo saber, podendo modificar,inclusive, o “saber trabalhar”.De fato, em toda a ocupação, o tempo surge como um fatorimportante para compreender os saberes dos trabalhadores, <strong>uma</strong> vez quetrabalhar remete a aprender a trabalhar, ou seja, a dominarprogressivamente os saberes necessários à realização do trabalho(TARDIF, 2002, p.57).Cabe esclarecer do quanto se está ciente da condição de que em váriasocupações é necessário a passagem por um processo de formação profissionalinicial - como é o caso dos assistentes sociais -, cuja função é fornecerconhecimentos teóricos, técnicos e políticos que preparam para o trabalhoprofissional. Contudo, essa preparação deve estar articulada com a formação práticae, ainda assim, a experiência direta do trabalho é que vai proporcionar aotrabalhador a assimilação progressiva de saberes necessários a serem postos emuso <strong>no</strong> exercício profissional. Para Tardif (2000, p.58)os saberes ligados ao trabalho são temporais, pois são construídos edominados progressivamente durante um período de aprendizagem


89variável, de acordo com cada ocupação. Essa <strong>dimensão</strong> temporal decorredo fato de que as situações de trabalho exigem dos trabalhadoresconhecimentos, competências, aptidões, e atitudes específicas que sópodem ser adquiridas e dominadas em contato com essas mesmassituações.Pode-se concluir que as situações de trabalho possibilitam aos trabalhadoresdesenvolverem, progressivamente, saberes gerados e baseados <strong>no</strong> próprioprocesso de trabalho, compreendendo-se, então, que são esses os saberes queexigem tempo, prática, experiência e hábito. O que mobiliza justamente aqui é refletirsobre as possibilidades de construção de saberes dos assistentes sociais <strong>no</strong>desenvolvimento dos processos de trabalho.Para isto, inicialmente, é preciso admitir que o saber dos assistentes sociaisnão provém de <strong>uma</strong> fonte única, mas de várias fontes e de diferentes momentos dahistória de vida e da carreira profissional ”essa própria diversidade levanta oproblema da unificação e da recomposição dos saberes <strong>no</strong> e pelo trabalho”(TARDIF, 2002, p.21). Também a forma como os profissionais acionam ou produzemsaberes é diferenciada, <strong>uma</strong> vez que não colocam todos os seus saberes em pé deigualdade em <strong>uma</strong> situação de trabalho. Pode-se dizer que quanto me<strong>no</strong>s utilizável<strong>no</strong> trabalho é um saber, me<strong>no</strong>s valor profissional parece ter. Nessa ótica, “ossaberes oriundos da experiência de trabalho cotidiana parecem constituir o alicerceda prática e da competência profissionais” (TARDIF, 2002, p. 21).Então, o que é um saber? A concepção de saber que orienta este estudo estáembasada em <strong>uma</strong> perspectiva mais ampla, que convoca a palavra “saber” <strong>no</strong> lugardo “conhecimento”. Sobre isso, Santos (2003, p.143) refere que “a forma substantiva‘saber’ é mais ampla do que a forma substantiva ‘conhecimento’, entendido como jáformalizado e legitimado, saber objetivante que circula <strong>no</strong> nível da consciência”.Encontra-se na literatura, <strong>uma</strong> distinção tridimensional com relação ao termo saber:entendido como conhecimento formalizado, construído <strong>social</strong> e historicamente,portanto científico; em outra perspectiva, é compreendido como saber tácito,resultante de experiências individuais ou coletivas; e, por último, a <strong>dimensão</strong>inconsciente do saber, a do desejo de saber (SANTOS, 2003). Contudo “sabersupõe a forma verbal que implica tomá-lo não só como produto, e não só comoproduto <strong>social</strong> e historicamente formalizado segundo câ<strong>no</strong>nes instituídos, mastambém e ao mesmo tempo, saber como ato, processo. (SANTOS, 2003, p7).


90A atividade de trabalho é atravessado de história, de processos, deexperiências, que re-questionam e re-combinam os saberes (SCHWARTZ, 2003).Para o autor, toda vida h<strong>uma</strong>na, porque ela é em parte <strong>uma</strong> experiência, éatravessada de história e, fundamentalmente, quando se trata do trabalho, pois todaatividade de trabalho encontra saberes acumulados <strong>no</strong>s instrumentos, nas técnicas,<strong>no</strong>s dispositivos coletivos, nas condições de trabalho.Quando se trata de trabalho, não se trata de <strong>uma</strong> pequena história:(...) nenh<strong>uma</strong> situação h<strong>uma</strong>na concentra, “carrega”, com ela tantossedimentos, condensações, marcas de debates da história das sociedadesh<strong>uma</strong>nas com elas mesmas quanto às situações de trabalho: os sistemasacionados, os sistemas produtivos, as tec<strong>no</strong>logias utilizadas, as formas deorganização, os procedimentos escolhidos, os valores de uso selecionadose, por detrás, as relações sociais que se entrelaçam e opõem os homensentre si, tudo isso cristaliza produtos da história anterior da h<strong>uma</strong>nidade edos povos. (SCHWARTZ, 2003, p. 23).Assim, muito mais do que tratar de <strong>uma</strong> definição do saber em sua acepçãogeral, interessa-<strong>no</strong>s evidenciar a idéia de que “não há saber senão para um sujeito‘engajado’ em <strong>uma</strong> certa relação com o saber” (CHARLOT, 2000, p.61). É na relaçãohistórica que os sujeitos estabelecem que está a possibilidade da produção dossaberes. “O saber é <strong>uma</strong> relação, um produto e um resultado, relação do sujeito queconhece, com seu mundo, resultado dessa interação” (CHARLOT, 2000, p.61-62).Para Charlot, não se trata de encerrar o saber <strong>no</strong>s livros, pois é “atividade erelação” (2000, p.62). Essa idéia de saber como relação defendida pelo autor,diferencia-se daqueles que a tratam como tipos de saber ou a classificam emvariedades. Pois, na verdade, são “formas específicas de relação com o mundo”.Somente nessa relação é que se pode considerar o saber como prático, “não é opróprio saber que é prático, mas sim, o uso que é feito dele, em <strong>uma</strong> relação práticacom o mundo” (2000, p.62) e, portanto, o mundo do trabalho. O saber aquicompreendido é produzido pelo sujeito confrontado a outros sujeitos e construído em“quadros metodológicos” (CHARLOT, 2000, p.61) que contornam o como, o modo deproduzir os saberes necessários <strong>no</strong> exercício de <strong>uma</strong> profissão, por exemplo, o deassistente <strong>social</strong>.Não há saber senão para um sujeito, não há saber senãoorganizado de acordo com relações internas, não há saber senão produzidoem <strong>uma</strong> confrontação interpessoal. Em outras palavras, a idéia de saberimplica a de sujeito, de atividade do sujeito, de relação do sujeito com elemesmo (deve desfazer-se do dogmatismo subjetivo), de relação desse


91sujeito com os outros (que co-constroem, controlam, validam, partilhamesse saber) (CHARLOT, 2000, p.61).Na história do mundo do trabalho, o trabalho prescrito e o real 35 tomam <strong>uma</strong>proporção significativa. Há <strong>uma</strong> diferença entre aquilo que está prescrito para otrabalho profissional, enquanto um pla<strong>no</strong> a ser desenvolvido pelo sujeito através de<strong>uma</strong> determinada atividade, e a real efetivação dessa prescrição (SANTOS, 2000).Tal compreensão remete aos saberes produzidos na vida cotidiana dostrabalhadores, <strong>no</strong> caso a dos assistentes sociais, há muito que ser estudado pelacategoria profissional, principalmente sobre as condições de trabalho e a relaçãocom a efetivação daquilo que está prescrito <strong>no</strong> código de ética profissional, comoprincípios, que devem guiar a intervenção desses profissionais.A profissão de Assistente Social por ser eminentemente interventiva, requer<strong>uma</strong> reflexão sobre à relação entre teoria e prática. Essa é <strong>uma</strong> relação dialética quetrata da unidade de contrários, “na qual teoria é feita para desconstruir e reconstruira prática, e prática para desconstruir e reconstruir a teoria” (DEMO, 2006, p. 39). Épreciso ter a compreensão da inexistência da dicotomia teórica e prática <strong>no</strong> trabalhodos assistentes sociais, para não se correr o risco de desenvolver a açãoprofissional sem um embasamento teórico que ilumine sua intervenção. Entretanto, énecessário compreender, também, que se tratam de conceitos diferentes em sualógica e em sua dinâmica, pois é certo que um não vive sem o outro.Podemos aprender da teoria, à medida que formos capazes desistematizar idéias, definir conceitos e categorias, ordenar o pensamento,exercitar método. Podemos aprender da prática, à medida que formoscapazes de <strong>no</strong>s confrontar com desafios concretos e procurar soluções.Mesmo que sempre parciais (DEMO, 2006, p.41-42).35 Sobre a origem da teorização das diferenças entre o trabalho prescrito e o trabalho real, sabe-seque vêm de um inquérito de 1969-1972 n<strong>uma</strong> fábrica de montagem de televisões na França, onde aanálise ergonômica do trabalho permitiu pôr em evidência as formas inéditas de atividade, resoluçãode problemas, de inventividade por parte dos trabalhadores considerados como” não qualificados”mas somente “executantes” “Aliás, é preciso homenagear os ergó<strong>no</strong>mos franceses que foram semdúvida dos primeiros a distinguir, <strong>no</strong>s operários especializados em cadeia, o ‘ trabalho teórico’(astarefas a cumprir a ‘gabinete dos métodos’) do ‘trabalho real’ (a actividade do trabalho, o que fazaquela ou aquele que executa a sua tarefa). O operador não é passivo, totalmente subjugado, ele‘elabora modos operatórios que mobilizam os seus próprios recursos‘ ele gera constantemente umconjunto de acontecimentos que lhe permitem decidir acções a conduzir’, ele ‘readapta os objectivosprescritos e desenrasca-se com os meios que se propõe’. Sugiro ver em Claude Dubar, (2006, p.95-96).


92A teoria e a prática são movimentos interligados e provisórios. Não se podeficar só na teoria, porque nada acontece, e nem, ao contrário, ficar só na prática,pois só aconteceria a rotina, a mesmice, e nada mudaria (DEMO, 2006).Pode-se constatar que um saber enunciado adquire pertinência quando nasua adequação a <strong>uma</strong> relação com o real e/ou na sua coerência interna, tornam-sevaliosos servindo como instrumento para atingir um fim perseguido. (MALGLAIVE,1995). Assim, percebe-se o quanto o saber teórico é fundamento indispensável naeficácia dos saberes que vão regular a ação, sugerindo, inclusive, os possíveisprocedimentos para a realização dos seus fins. A relação que o saber teóricoestabelece com a prática é muito mais do que <strong>uma</strong> relação de aplicação, como secost<strong>uma</strong> comumente dizer, é, sobretudo, <strong>uma</strong> relação de intervenção. Portanto, <strong>uma</strong>teoria não se aplica:ela investe-se aí, tornando o objecto (de conhecimento) que permite agirmais eficazmente sobre o real, actuando sobre a representação pensada.Esta operação de intervenção confere ao saber teórico um estatutocontraditório em relação à prática. Por um lado, é-lhe exterior e existeindependentemente dela; dando a conhecer o real, obedece às suas leispróprias que são as do conhecimento. Mas, por outro lado, o saber teóricotem de intervir, de se empenhar na prática, sob pena de se ver condenadoao raciocínio escolástico, ao formalismo do pensamento acadêmico,caminhando para a esterilidade. (MALGLAIVE, 1995, p.71-72).É sob esses argumentos que se justifica a necessidade depermanentemente questionar o saber teórico, as suas insuficiências, permitindo queseus limites sejam revelados e interpelados. Essa teoria, quando posta emmovimento na prática, por si só se retira de um isolamento, sendo consumida pelaprática, que é, ao mesmo tempo, consumidora da teoria. “É na sua relação com aprática que o conhecimento teórico é um movimento permanente para oconhecimento científico do real” (MALGLAIVE, 1995, p.72).Essa é <strong>uma</strong> compreensão fundamental para que os assistentes sociaispossam estar comprometidos com a i<strong>no</strong>vação, a reinvenção, com a resolutividade,enfim, com a consolidação de um projeto profissional. “Quem sabe desconstruir ereconstruir teorias e práticas, mantém-se atualizado em duplo sentido: acompanha oque se faz na teoria e realimenta-se com as mudanças que a prática impõe” (DEMO,2006, p.40).


93É importante observar que de nada adianta somente a denúncia de que otrabalho real é mais complexo do que o trabalho prescrito, o que, por vezes,cost<strong>uma</strong>-se ouvir de diferentes profissionais. É preciso que se problematizem assituações de trabalho para que dele surjam alternativas para “<strong>uma</strong> transformação deestruturas de modalidades de pensar o trabalho e a sua organização” (CORREIA,2003, p.30). A denúncia, por si só, não responde à questão central de saber se osentido <strong>social</strong> a atribuir ao trabalho se deve construir em tor<strong>no</strong> do que é visível, ou,ao contrário, se o trabalho oculto é que irá estruturar o sentido do trabalho visível(CORREIA, 2003). Esse entendimento do autor parece bastante pertinente, poisverifica-se que, em muitas situações, os profissionais ficam amarrados nas queixas enas dificuldades, <strong>no</strong>s entraves políticos da gestão, o que os impede de seorganizarem coletivamente, para que a partir de <strong>uma</strong> reflexão crítica do seuprocesso de trabalho, busquem alternativas de solução e o alcance de resultadosatravés do enfrentamento das situações postas.O exercício profissional dos assistentes sociais se dá junto às diferentesexpressões da questão <strong>social</strong> que emergem da contradição e do conflito entre ocapital e o trabalho. Nesse mesmo movimento dialético, o capital pode apropriar-sede um saber produzido <strong>no</strong> trabalho, mas, por outro lado, também o trabalhador podese apropriar dele. A criação do profissional está relacionada com o <strong>no</strong>vo, com algodiferente que esse produz e que vai além da prescrição. Para que se possa fazer jusao compromisso firmado <strong>no</strong> código de ética profissional, com a qualidade dos<strong>serviço</strong>s prestados à população e com o aprimoramento intelectual na perspectivada competência profissional, tem-se como estratégia para tal o desenvolvimento daeducação permanente.A discussão de educação permanente pressupõe a transformação dosespaços sócio-ocupacionais em locais de desenvolvimento, através da interlocuçãode saberes, em que o processo de trabalho possa ser objeto de análise e deproblematização. Deve-se considerar, ainda, que é o processo de trabalho que podeindicar quais saberes são necessários para qualificação dos atendimentos e dos<strong>serviço</strong>s prestados aos usuários (FERNANDES, 2007).O trabalhador <strong>social</strong> que produz um saber manifesta <strong>uma</strong> determinadarelação com o saber e com o trabalho que tem a ver com a sua própria história, seus


94interesses, seus projetos (SANTOS, 2000). A história do trabalho dos assistentessociais, conforme visto anteriormente, tem sido sustentada pelo projeto ético-políticoda profissão. Entretanto, a construção e a desconstrução de saberes profissionaissão condição para o enfrentamento da questão <strong>social</strong>, para o atendimento dasnecessidades sociais postas e para a valorização daquilo que é produzido <strong>no</strong> mundodo trabalho e que não pode deixar de ser reconhecido pela comunidade científica daárea.Contudo, a aprendizagem <strong>no</strong> trabalho é um processo de ação reflexão açãoque, ao ser vivenciado pelos assistentes sociais, pode privilegiar a aquisição deconhecimento, a produção de saberes, a realização profissional, o questionamento ea descoberta de <strong>no</strong>vas formas de trabalho, o que instrumentaliza os profissionaispara a qualificação de sua atuação. Ademais, é pertinente esclarecer que a intençãodo estudo empírico que se propõe, não é a de superestimar a prática profissionaldos Assistentes Sociais, mas, sim, evidenciar as possibilidades de produção desaberes durante o exercício profissional, através da reflexão crítica do seu processode trabalho, o que torna-se ponto de partida da educação permanente.


954 AS TRILHAS METODOLÓGICAS DA PESQUISATendo em vista a necessidade de explicitar a direção metodológica adotadana pesquisa, este capítulo propõe-se a sistematizar as trilhas metodológicaspercorridas pela pesquisadora, bem como o pressuposto epistemológico <strong>no</strong>rteadorda investigação. A pesquisa tem como referencial epistemológico o método dialéticode investigação e caracteriza-se como <strong>uma</strong> pesquisa do tipo qualitativa. Trata-se deum método que permite buscar “a ligação, a unidade e o movimento que engendraos contraditórios, que os opõe, que faz com que se choquem, que os quebra ou queos supera” (LEFEBVRE, 1991, p.238).Destaca-se, entre as categorias do método, a totalidade, a particularidade, acontradição e a historicidade que enrijecem o fio condutor dessa investigação,contribuindo para apreensão da interlocução entre a educação e o trabalho. Taiscategorias são dotadas de significados, pois são construções históricas emmovimento que atravessam o desenvolvimento do conhecimento e, portanto,permitem penetrar <strong>no</strong> objeto de pesquisa e na realidade <strong>social</strong>. Então, se o real estáem movimento, “que <strong>no</strong>sso pensamento também se ponha em movimento e sejapensamento desse movimento. Se o real é contraditório, então que o pensamentoseja pensamento consciente da contradição” (LEFEBVRE, 1991, p.174).É nessa realidade em movimento que se busca construir e conhecer o objetodessa pesquisa, não o investigando como algo isolado, mas tomado na totalidadedas interações complexas que ligam-se através das relações reais. (LEFEBVRE,1991). O recorte realizado na investigação aqui proposta, constitui-se em <strong>uma</strong>particularidade de determinada totalidade, que é apreendida <strong>no</strong> conjunto de suasrelações, expressando, portanto, suas especificidades, através das manifestaçõessócio-históricas da realidade da qual faz parte. Assim, o método dialético valoriza acontradição dinâmica dos fatos e das ações dos sujeitos, o que permite aopesquisador observar as relações entre o todo e a parte, para explicar a vida <strong>social</strong> eh<strong>uma</strong>na (LEFEBVRE, 1991).As trilhas metodológicas percorridas nessa investigação não são trilhadas porum pesquisador sozinho e, sim, pelos sujeitos pesquisados que vão se envolvendo econtribuindo com a sua percepção sobre o problema pesquisado. O pesquisador, <strong>no</strong>


96processo investigativo, ao fazer a apreensão do real, vai definindo estratégias epercorrendo <strong>no</strong>vas trilhas, que vão lhe permitir materializar o processo empírico.Parte-se de um entendimento epistemológico de que o trabalho científico éum trabalho desenvolvido por um investigador com o objetivo de desvendar <strong>uma</strong>verdade oculta, que pré-existe, isto é, que está latente <strong>no</strong> objeto. Assim, o diálogoexperimental será, nessa perspectiva, encarado como <strong>uma</strong> interrogação que osujeito dirige ao objeto de forma a que este desvende a verdade oculta. O trabalhocientífico é, portanto, um trabalho persistente, em que a invenção está ausente(CORREIA, 2007).É necessário ressaltar que mesmo sendo essa <strong>uma</strong> pesquisa do tipoqualitativa, faz-se o uso de instrumentos que acessam dados quantitativos, quetrazem um acréscimo compreensivo à investigação. Referenciando Minayo, o usodas abordagens qualitativas e quantitativas revela que as mesmas “não sãoincompatíveis e podem ser integradas, num mesmo projeto de pesquisa” (2006,p.76). Entretanto, tem-se o entendimento de “que o arcabouço qualitativo é o quemelhor se coaduna a estudos e situações particulares, grupos específicos euniversos simbólicos” (MINAYO, 2006, p.76).Entre os pressupostos que fundamentam a escolha da metodologia qualitativapara essa pesquisa, considera-se aqueles tratados por Martinelli (1994), quaissejam: o reconhecimento da singularidade do sujeito, o que significa conhecê-lo,escutá-lo e permitir a ele que se revele; o reconhecimento da importância em seconhecer a experiência <strong>social</strong> do sujeito, o que significa compreender a sua trajetóriahistórica <strong>no</strong> contexto <strong>social</strong> e ainda, por último, que o conhecimento do modo de vidado sujeito pressupõe o conhecimento de sua experiência <strong>social</strong> (MARTINELLI,1994).O trabalho de campo que embasa a pesquisa, inicia-se com a aproximaçãodo objeto de investigação, a revisão bibliográfica existente sobre o tema, maisespecificamente sobre a discussão da educação e a sua relação com o trabalho <strong>no</strong>contexto sócio-histórico. Partimos do entendimento que “o trabalho de campo érealizado a partir de referenciais teóricos e também de aspectos operacionais”(MINAYO, 2006, p.203). Como categorias explicativas da realidade, privilegia-se:


97formação, educação permanente e processo de trabalho, trazidos <strong>no</strong>s primeiroscapítulos desse estudo, como pressupostos teóricos que fundamentam a caminhadametodológica desse processo investigativo.Para tanto, foi necessário aprofundar a revisão bibliográfica <strong>no</strong> que se refereaos estudos existentes sobre educação permanente <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social e,mais precisamente, <strong>no</strong> campo da saúde, referência dessa investigação. Estecapítulo trata das trilhas percorridas até aqui, revelando, em parte, aquilo que foivivenciado e apreendido empiricamente pelo pesquisador.4.1 A CONSTRUÇÃO DO OBJETO DE INVESTIGAÇÃOJá faz algum tempo que a questão da educação e do trabalho é <strong>uma</strong> temáticaque <strong>no</strong>s desperta <strong>uma</strong> necessidade de aprofundamento teórico e, além disto,provoca <strong>uma</strong> curiosidade científica que leva à construção do objeto para essapesquisa. Portanto, a delimitação da temática como um dos elementos constitutivosda realização de <strong>uma</strong> pesquisa é o que direciona para a definição do objeto a serinvestigado. Iniciar a aproximação, o namoro com a questão a ser investigada,requer um olhar, <strong>uma</strong> escuta, sobre e da realidade na qual se está inserido, pois nãohá dúvida de que a escolha do tema aqui proposto emergiu de <strong>uma</strong> trajetóriahistórica, o que permitiu, aos poucos, definir o que exatamente se pretende tratarsobre a educação e o trabalho <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social. Foi nessa aproximaçãocom a temática que teve início a construção e a problematização do objeto.Tratar sobre a temática deste estudo pressupõe a necessidade da reflexãocritica acerca do processo de trabalho dos assistentes sociais, que requer umprocesso de educação permanente <strong>no</strong> seu cotidia<strong>no</strong> profissional. Diante do cenáriosocietário contemporâneo, entende-se ser essa <strong>uma</strong> estratégia para a intervençãomais comprometida com resultados que possam inverter essa lógica política eeconômica excludente, reconhecida como neoliberal, imposta pela questão <strong>social</strong> narealidade atual.Para o encaminhamento dessa reflexão, é importante perceber que o espaçoprivilegiado da intervenção profissional é o cotidia<strong>no</strong>, o dia-a-dia do trabalho, a lida,como cost<strong>uma</strong>-se referir, que se revela como um ambiente propício para apreensão


98de conhecimentos e aquisição de habilidades que, segundo Iamamoto (2000), fazemparte da instrumentalidade do Serviço Social. A superação de velhas práticas requer,dos profissionais, um debate sobre o significado de suas intervenções e osresultados alcançados, diante das mutações da questão <strong>social</strong>, já que essa e suasdiferentes expressões se constituem <strong>no</strong> objeto de intervenção do profissional.Citando Iamamoto (2000), ao colocar-se como objeto de sua própriapesquisa, o Serviço Social volta-se sobre si mesmo e descortina ângulos inusitadospara o desdobramento de diferentes estudos sobre a profissão. Além disso,pesquisar <strong>no</strong> e o Serviço Social é conhecer as respostas que a profissão vemformulando para enfrentamento e superação das diferentes expressões da QuestãoSocial, sobretudo a contribuição dos mesmos para a efetividade e a consolidaçãodos princípios do projeto ético-político profissional. É então, pelo ângulo daeducação permanente, que se pretende descortinar as possibilidades da reflexãocrítica sobre o processo de trabalho desses profissionais. A educação permanentepressupõe a aprendizagem, a troca de saberes, o trabalho coletivo, o respeito pelasdiferenças, <strong>no</strong> próprio local de trabalho, nas situações de trabalho.Neste estudo, privilegia-se o trabalho dos assistentes sociais na área dasaúde, pois se observa quanto, nesse campo, são muitos os desafios postos para aprofissão, sobretudo o da promoção e da proteção da saúde da população brasileira,um direito conquistado pela sociedade <strong>no</strong> final dos a<strong>no</strong>s 1980 e que vem sendoconsolidado com a implementação de <strong>uma</strong> política pública instituída como o SistemaÚnico de Saúde - SUS. 36Sendo o assistente <strong>social</strong> reconhecido como trabalhador da saúde, e, por serum profissional que se caracteriza como “um dos principais articuladores de equipesmultiprofissionais” (VASCONCELOS, 2003, p.26), é que torna-se necessárioinvestigar, junto a essa categoria, as experiências de educação permanentevivenciadas a partir do trabalho vivenciado nas equipes de saúde, portanto, deconstrução coletiva. Tor<strong>no</strong>u-se profícuo eleger para este estudo o campo da saúde,<strong>uma</strong> vez que a educação permanente é instituída como vertente pedagógica <strong>no</strong>36 Lei 8080 de 19 de setembro de 1990. Dispõem sobre as condições para a promoção, proteção erecuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos <strong>serviço</strong>s correspondentes e dá outrasprovidências. Ver Coletânea de Leis - CRESS, 2000.


99estatuto de política pública na área da saúde. O reconhecimento e a identificação daeducação permanente em saúde está atrelado a um processo educativo que colocao cotidia<strong>no</strong> do trabalho - ou da formação -, na saúde, em análise (CECCIM, 2005).Em que pese a relevância da pesquisa junto aos assistentes sociais dasaúde, sabe-se que diferentes profissões necessitam construir estratégias para acompreensão e o comprometimento com esses <strong>no</strong>vos tempos de profundasmudanças de toda ordem societária. A idéia de que compreensão ecomprometimento associam–se através do sentido atribuído ao prefixo comum com,rompe com a idéia do pensamento burguês, que é o do individualismo, e considera“à idéia de associação, de coletividade” (RIOS, 2003, p.63). Para estarcomprometido com a construção de <strong>uma</strong> sociedade com justiça <strong>social</strong>, democráticae com a garantia de direitos, é fundamental a compreensão <strong>no</strong> sentido ético deenvolvimento com aquilo que se tem por objetivos profissionais. “Compreensão é,portanto, saber aprofundado, e envolvimento ético-político do saber” (RIOS, 2003,p.64). Abordam-se as reflexões de Rios (2003) pelo entendimento que não é de hojeque tais exigências fazem parte da agenda dos assistentes sociais. Entretanto, ai<strong>no</strong>vação e a reorientação <strong>no</strong> processo de trabalho desses profissionais, sinalizam acompreensão do e o compromisso com o projeto ético-político diante das mudançasda realidade <strong>social</strong>.Não se pode negar que vivenciamos um processo de construção de <strong>no</strong>vaspráticas e temos clareza de que essas devem vir acompanhadas por um conjunto deações estratégicas e articuladas, incluindo os sujeitos que demandam a intervençãotécnico-operativa. Dentre as estratégias, escolheu-se, nesta investigação, aeducação permanente, pois, a partir do processo de trabalho, pode-se identificarquais exigências e saberes são necessários ao assistente <strong>social</strong> para a qualificaçãoe provisão das necessidades sociais demandadas pelos usuários dos <strong>serviço</strong>s, emespecial os da saúde, por se tratar do recorte empírico desta investigação.Quando o profissional se permite refletir criticamente sobre o processo detrabalho em que está inserido, identificando a natureza dos fenôme<strong>no</strong>s existentes eas suas conseqüências, cria-se um mecanismo para identificar com mais clareza assituações a serem superadas mediante <strong>uma</strong> ação educativa sistemática. É aí que a


100educação está presente. Ela está inserida <strong>no</strong> espaço de trabalho e deve serconsiderada como parte dele: formar e formar-se é trabalhar.Portanto, nesta investigação tem-se a intenção de anunciar as experiências<strong>formativa</strong>s de educação permanente vivenciadas pelos Assistentes Sociais e,sobretudo, dar visibilidade ao como vivenciam essas experiências. Experiências quesó podem ser apreendidas na sua singularidade, <strong>no</strong>s elementos particulares que oconstituem, enfim, “na experiência desenvolvida pelos sujeitos” (VENDRAMINI,2006, p.128), sem perder de vista o contexto histórico e ampliado em que “asexperiências são desenvolvidas, para podermos compreender suas potencialidadese seus limites que são históricos” (2006, p.128) ao tomar-se a acepção de que“experiência é o vivido, são acontecimentos, as ações e ao mesmo tempo, o sentidoa ela atribuído” (VENDRAMINI, 2006, p.126), interessa, nesta investigação, nãosomente conhecer, mas, também, apreender o como vivenciam, ou melhor, de quemodo se desenvolvem as experiências de educação permanente vivenciadas pelosassistentes sociais, compondo assim a questão central desta investigação.Partindo das considerações colocadas, propõe-se desenvolver <strong>uma</strong> pesquisaque responda a seguinte questão: Como os Assistentes Sociais do município dePorto Alegre, <strong>no</strong> Rio Grande do Sul, que atuam <strong>no</strong> campo da saúde, vêmvivenciando experiências de educação permanente <strong>no</strong>s seus processos de trabalho?4.1.1 Objetivos e Questões NorteadorasDiante da formulação do problema de pesquisa, foram estabelecidos osobjetivos deste estudo. Objetivo geral: Analisar como os Assistentes Sociais que atuam <strong>no</strong> campoda saúde <strong>no</strong> município de Porto Alegre/ RS vêm vivenciando experiênciasde educação permanente <strong>no</strong>s seus processos de trabalho. Objetivos específicos:1. analisar as experiências de educação permanente vivenciada pelosassistentes sociais, a fim de contribuir com o processo de formação da


101categoria, para que a educação permanente possa ser considerada <strong>uma</strong><strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> dos Assistentes Sociais;2. conhecer o significado atribuído pelos Assistentes Sociais à necessidadede formação profissional, através da educação permanente, paradesvendar e analisar as possibilidades, os obstáculos e as resistênciasexistentes;3. instaurar processos de reflexão crítica acerca do processo de trabalho dosAssistentes Sociais, a fim de desencadear processos de aprendizagemsignificativa nas situações de trabalho.Os objetivos traçados e a serem alcançados ao térmi<strong>no</strong> dessa investigaçãosuscitam um conjunto de questões <strong>no</strong>rteadoras a serem verificadas durante ainvestigação, que são as seguintes:1. De que maneira os assistentes sociais vivenciam processos de formaçãoprofissional para atender as exigências postas pela questão <strong>social</strong>?2. Que dificuldades, obstáculos e possibilidades existem para desencadearprocessos de educação permanente e que se constituem emexperiências de aprendizagem significativa?3. Qual o significado atribuído pelos Assistentes Sociais à necessidade daeducação permanente e qual a concepção existente sobre a mesma?4.2 EM BUSCA DO ESTADO DA ARTEA definição do objeto de pesquisa direciona-se para <strong>uma</strong> revisão bibliográficaaprofundada sobre o tema, procedimento fundamental na etapa inicial dainvestigação, pois “<strong>uma</strong> vez definido o objeto, é proceder a <strong>uma</strong> ampla pesquisabibliográfica, capaz de projetar luz e permitir melhor ordenação e compreensão darealidade empírica” (MINAYO, 2006, p.183).Inicialmente, foi preciso recorrer a diferentes referenciais <strong>no</strong> campo daeducação que pudessem inserir a pesquisadora num contexto da discussão daeducação permanente, da interlocução da educação e do trabalho, de <strong>uma</strong> formaampla e que possibilitasse a reflexão tanto dos estudos clássicos sobre o objeto em


102questão, bem como dos estudos mais contemporâneos. Foi nesse processo que sedeu o fichamento das obras lidas. Destacou-se, em cada <strong>uma</strong>, aquilo que tinharelação com o objeto de estudo em questão, traçando-se, então, o contor<strong>no</strong> teóricodas categorias explicitadas anteriormente, na primeira parte desta sistematização,quanto aos conceitos e às concepções atribuídos pelos autores. Entre as revisõesrealizadas e autores estudados <strong>no</strong> âmbito da educação, destacamos Freire (2003),Gadotti (1999), Arroyo (2003), Canário (2003; 1994), Correia (2003; 1996), Charlot(2000; 2004) Cattani (2006), Santos (2003), Schwartz (2003), Dubar (2006), entreoutros.Entretanto, para além da explicitação dos pressupostos teóricos dascategorias reflexivas desta pesquisa, foi preciso <strong>uma</strong> imersão em diferentes leiturassobre a temática educação permanente <strong>no</strong> campo da saúde, sobretudo <strong>no</strong> âmbito doServiço Social. Ao iniciar-se a revisão bibliográfica junto às produções do ServiçoSocial, foi inevitável percorrer sobre a temática formação, até pela proximidade ecompreensão das categorias educação e formação.Assim, pode-se constatar que a análise da formação profissional doAssistente Social adquire relevância na década de 80, fundamentalmente, emfunção da implementação do <strong>no</strong>vo currículo para os Cursos de Serviço Social(KAMEYAMA, 1998). Ao traçar a trajetória da produção de conhecimentos <strong>no</strong>Serviço Social, Kameyama (1998) destaca que, <strong>no</strong> período de 1980 a 1995,ampliam-se as investigações sobre a formação profissional, principalmente <strong>no</strong>scursos de Pós-Graduação da PUC/RJ, PUC/SP e PUC/RS. Entre as investigações,há <strong>uma</strong> preocupação com relação à dicotomia teoria e prática, com as técnicas deensi<strong>no</strong> e aprendizagem, com o estágio supervisionado, com as disciplinas deTrabalho de Conclusão de Curso (TCCs) e planejamento, entre outros. Já <strong>no</strong> finaldos a<strong>no</strong>s 1990, há <strong>uma</strong> preocupação dos pesquisadores em analisar o papel doServiço Social nas equipes multidisciplinares, pois, diante das <strong>no</strong>vas requisições,competências e condições de trabalho profissional, o assistente <strong>social</strong> tende ainserir-se, e, ao mesmo tempo, dissolver-se em diversas áreas (KAMEYAMA, 1998,p. 49).


103A capacitação 37 dos profissionais Assistentes Sociais vem sendo discutidanas entidades organizativas da categoria, como o Conselho Federal de ServiçoSocial e a Associação Brasileira de Ensi<strong>no</strong> e Pesquisa em Serviço Social(ABPESS) 38 . Entretanto, <strong>no</strong>s últimos tempos, conforme se evidenciou <strong>no</strong> XICongresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAS), essa é <strong>uma</strong> requisição que temmerecido atenção especial, fundamentalmente ao considerar-se a conjuntura atual.Dentre as indicações destacam-se:ressaltar a <strong>dimensão</strong> técnico-operativa da profissão na formação e nacapacitação continuada, em conexão com a <strong>dimensão</strong> ético-política eteórica-metodológica; aprofundar e atualizar a discussão sobre asatribuições e competências profissionais, tanto na <strong>dimensão</strong> da formaçãoquanto na do exercício profissional, através de pesquisas e reflexões;investir na qualificação permanente dos assistentes sociais, através decursos de especialização, aperfeiçoamento, extensão, atualização,presenciais e a distância, tal como o curso à distância ABEPSS/CFESS(NOGUEIRA, 2005, p.190).Em que pese a importância da formação profissional e a vigilância contínua ecrítica junto à mesma, é necessário ter o cuidado de não crer que a legitimação daprofissão está somente <strong>no</strong> equacionamento de políticas de educação continuada.Mais do que isso, suscita-se a necessidade de repensar as condições de trabalhodos Assistentes Sociais, pois políticas de formação de trabalhadores adquiremsentido quando acompanhadas de políticas de qualificação dos espaços sócioocupacionaise suas condições. “É o trabalho que forma ou deforma, qualifica oudesqualifica o trabalhador”, portanto reconhece-se aqui “o trabalho como <strong>uma</strong> matrizfundante e formadora dos seres h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s” (ARROYO, 2003, p.72).A escolha pela temática educação permanente neste momento sócio-históricoda profissão, como <strong>uma</strong> estratégia de consolidação do projeto ético-político doServiço Social, parece ser pertinente, pois indaga a forma como os profissionais vêmcaptando a realidade <strong>social</strong> a partir do desenvolvimento do seu processo detrabalho. Pretende, ainda, colocar em discussão a real preocupação dosprofissionais com o movimento permanente de aquisição de habilidades e deconhecimentos para que, através da sua intervenção técnico-operativa, possam37 Capacitação termo este utilizado nas produções existentes <strong>no</strong> âmbito do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> para tratarda formação continuada destes profissionais.38 A ABEPSS vem assumindo historicamente, desde a década de 70, “um papel de vanguarda natarefa de pensar a formação profissional, <strong>no</strong> que diz respeito à elaboração/ reformulação de currículodos Cursos de Serviço Social, à capacitação docente, á implementação da pós-graduação e áprodução científica” (KAMEYAMA, 1998, p.47).


104defender os direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, a justiça, a eqüidade, além de viabilizar aemancipação da cidadania dos sujeitos e contribuir com a consolidação do SistemaÚnico de Saúde – SUS, já que o campo empírico, aqui considerado, é o da saúde.Outra questão importante refere-se à mobilização dos trabalhadores queparticipam de experiências, tais como, congressos, cursos, oficinas, eventos, entreoutros, pois ainda que essas ocorram na lógica de educação continuada, éfundamental que os profissionais possam <strong>social</strong>izar o conhecimento adquirido juntoà sua equipe de trabalho e aplicá-lo à sua prática, desde que exista <strong>uma</strong> correlaçãodo conteúdo com a necessidade vigente. Cabe, assim, aos assistentes sociais,garantir e estimular que esses espaços coletivos de troca e de aprendizagem <strong>no</strong>trabalho se constituam em situações reais de aprendizagem.Dada a relevância da revisão bibliográfica, parte-se para a área do ServiçoSocial com o intuito de reconhecer a produção de conhecimento sobre o objeto emquestão, mais precisamente sobre os estudos da educação permanente junto aosAssistentes Sociais. Como esta é <strong>uma</strong> discussão que vêm ocorrendo na área dasaúde, foram feitas leituras de diferentes textos que pudessem dispor sobre essadiscussão <strong>no</strong> Serviço Social na Saúde. A discussão sobre a implementação doSistema Único de Saúde – SUS é discussão presente <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social,dada a importância dessa política pública, que tem como princípios a universalidade,a eqüidade, a integralidade e a participação popular. Esses princípios articulam-secom o projeto ético-político da profissão, com a garantia de direitos, sendo, então,um tema presente nas produções bibliográficas <strong>no</strong> Serviço Social, tanto <strong>no</strong> que serefere à discussão da garantia de direitos, quanto às produções que discutem asações profissionais, dentre os quais destacam-se Bravo (2006), Nogueira (2002 e2006), Vasconcelos (2003), Matos (2003), Mioto (2006) e Mota (2006), entre outrosestudos empíricos não tratados aqui.No estudo de Matos (2003), intitulado de “O debate do Serviço Social nasaúde <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 90”, produto de sua dissertação de mestrado apresentada em 2000na UFRJ, verifica-se o quanto a reforma sanitária e o projeto ético-político do ServiçoSocial influenciam <strong>no</strong> trabalho dos Assistentes Sociais na saúde. O autor discorresobre a evolução do debate do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> na saúde, fundamentalmente nadécada de 90, a partir da análise das produções de comunicações e de artigos


105publicados <strong>no</strong>s Congressos Brasileiros de Serviço Social - CBAS de 1992, 1995 e1998. Também refere estudos realizados por Silva 39 sobre as contribuições darevista Serviço Social e Sociedade para o Serviço Social, e que a temática saúde foidestaque entre as publicações das décadas de 80 e 90 (MATOS, 2003). Observa-seque entre os trabalhos citados por Matos (2003), nenhum trata sobre a educação <strong>no</strong>trabalho da saúde ou, ainda, sobre a educação permanente e, tampouco, sobre aformação profissional na saúde.Dentre os estudos referidos anteriormente, na pesquisa realizada porVasconcelos (2003) intitulada “A prática do Serviço Social: cotidia<strong>no</strong>, formação ealternativas na área da saúde”, encontra-se <strong>uma</strong> brecha que conduz à reflexãosobre a capacitação profissional dos Assistentes Sociais. A formação de graduaçãoe a capacitação continuada não foram foco de investigação da pesquisadora, mas ésabido que elas determinam a qualidade do trabalho profissional. Desse modo,Vasconcelos aponta queou o Serviço Social atravessa todo o período da formação graduada ecapacitação continuada, n<strong>uma</strong> constante relação com a realidade,superando os espaços <strong>no</strong> currículo destinados ao ensi<strong>no</strong> da prática(...) ouestaremos fadados a cristalizar a separação entre teoria e prática <strong>no</strong>Serviço Social(..) Formar um assistente <strong>social</strong> capacitado para um trabalhoprofissional mediado pela teoria requer o exercício da relação teoria-práticapelos docentes na formação profissional e a capacitação continuada, o quesó se pode resultar de um trabalho coletivo articulado ( 2003, p. 28).É na esteira da discussão da formação dos Assistentes Sociais que traz-se aeducação permanente como foco da investigação que ora é apresentada. Essacategoria carrega concepções que se diferenciam da proposta da educaçãocontinuada, que nem sempre são estruturadas a partir da problematização de <strong>uma</strong>situação concreta de trabalho. Nesse sentido, a educação permanente, que requer areflexão crítica sobre o processo de trabalho, pode ser considerada <strong>uma</strong> estratégiapara qualificação dos profissionais Assistentes Sociais e dos <strong>serviço</strong>s prestados poresse trabalhador.Esse indicativo não elimina ou, tampouco, se sobrepõe às ações construídas<strong>no</strong> âmbito da profissão, de superação das fragilidades da relação teórico–prática,através de capacitações e de processos de educação continuada desenvolvidos por39 Sobre a pesquisa realizada por Silva sugiro ver em: SILVA, M. S. Contribuições da revista para aconstrução do Serviço Social brasileiro. In: Serviço Social Sociedade. Nº61. São Paulo: Cortez, 1991.


106diferentes segmentos que se voltam para a formação profissional. 40 O exercício darelação teórico-prática, oportunizado na formação inicial, é parte desse processo deaprendizagem, pois a experiência, o vivido <strong>no</strong> mundo do trabalho, ou, ainda, naintervenção profissional, se constituí em um exercício profissional.Outra obra que merece destaque pela sua importância e pela sua contribuiçãonesse momento sócio-histórico, refere-se à iniciativa pioneira da gestão daAssociação Brasileira de Ensi<strong>no</strong> e Pesquisa em Serviço Social - ABEPSS2003/2004, materializada na gestão 2005/2006, a partir da publicação Serviço Sociale Saúde: Formação e Trabalho Profissional. A obra reúne textos de profissionaiscom “<strong>uma</strong> sólida trajetória acadêmica, intelectual e profissional na área de ServiçoSocial” (MOTA, 2006, p.9). Além disso, a coletânea de textos organizados nessaobra oferece não apenas aos Assistentes Sociais, mas a todos que trabalham naárea da saúde, um texto didático e competente, que coloca a saúde como parte datotalidade historicamente construída, negando as abordagens instrumentais quedefendem o mero conhecimento técnico aplicado. “Há a certeza de se estarcontribuindo com a produção do conhecimento crítico e com proposições quereiteram <strong>uma</strong> política de saúde pública universal e integral” (MOTA, 2006, p.9).Foi nesta coletânea que <strong>no</strong>s aproximamos das reflexões recentes de Mioto eNogueira (2006) sobre os desafios do SUS e as exigências para os AssistentesSociais. Dos textos revisados, até o presente momento, encontrou-se nesse <strong>uma</strong>discussão que se aproxima da educação permanente, ou pelo me<strong>no</strong>s, tal temática éreconhecida como discussão <strong>no</strong> campo da saúde. As autoras referem-se aomovimento de reorganização e de atualização das práticas em saúde, conforme jácitado anteriormente, através dos Pólos de Capacitação Permanente e dosProgramas de Capacitação e Atualização Profissional em vários níveis,preconizados pelo Ministério da Saúde.Tal movimento, vinculado à Política Nacional de EducaçãoPermanente do MS tem buscado qualificar recursos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s para atuação<strong>no</strong>s moldes preconizados pelos princípios e diretrizes do SUS. Por essarazoa amplia-se a preocupação com a especificidade do Serviço Social à40 Embora saibamos que a categoria profissional vem se debruçando sobre a temática formação emdiferentes estudos empíricos e em debates nas entidades organizativas, como o Conselho Federal deServiço Social e a Associação Brasileira de Ensi<strong>no</strong> e Pesquisa em Serviço Social (ABPESS) 40 esta é<strong>uma</strong> requisição que tem merecido atenção especial, fundamentalmente ao considerar-se a conjunturasócio-histórica na atualidade Sugiro ver em : NOGUEIRA, 2005.


107medida que se observam outras profissões a largando suas ações emdireção ao <strong>social</strong> (MIOTO & NOGUEIRA, 2006, p. 219).Como se pode observar, a existência da preocupação com a formação dostrabalhadores da saúde é, de fato, algo em evidência e, portanto, merece ser foco deestudo entre os assistentes sociais, que tem o campo da saúde como um dosespaços-ocupacionais.Outra contribuição relevante <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social refere-se à produçãode Nicolau (2004), sobre a formação e o fazer profissional do assistente <strong>social</strong>. Adiscussão da autora em tor<strong>no</strong> da temática considera os aspectos históricos quepermeiam a dicotomia entre o saber e o fazer. Ao apontar as conexões e aspossibilidades de dicotomias e de conflitos entre a formação e o fazer profissional,contribui com as reflexões que se vem fazendo sobre a temática desta pesquisa, quetem como foco a discussão da educação permanente, aquela que acontece naexperiência concreta do trabalho. “A experiência concreta do trabalho é, portanto,complexa, pois mobiliza a totalidade do indivíduo com sua história, experiências e oque foi apropriado na formação, bem como a dinâmica do espaço <strong>no</strong> qual aexperiência se efetiva e o movimento da totalidade <strong>social</strong> lhes dá concretude”(NICOLAU, 2004, p.85).Seguindo essa mesma linha de reflexão sobre saberes, cotidia<strong>no</strong> do trabalhoprofissional, relações, teoria e prática, identifica-se a contribuição de Batista (1995),<strong>no</strong> texto A ação profissional <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong>. “O profissional se faz fazendo” (1995,p.113), assim refere-se a autora, entre tantas reflexões que expõe <strong>no</strong> texto. Oespaço de trabalho é referência nas argumentações de Batista (1995), da mesmaforma que o consideramos nesta pesquisa, espaço privilegiado, que se revela comoo “ambiente <strong>no</strong> qual emergem exigências imediatas e são desenvolvidos esforçospara satisfazê-las, lançando mão de diferentes meios e instrumentos” (1995, p.111).É nesse quadro de revisão bibliográfica que buscam-se fundamentos quecontribuam com as reflexões da investigação.Outra revisão fundamental, já sistematizada na primeira parte deste estudo,refere-se à concepção de educação permanente tratada <strong>no</strong> campo da saúde, emparticular <strong>no</strong> SUS, <strong>no</strong> Brasil. Como se pode observar, encontram-se, na área dasaúde, diferentes estudos sobre esse objeto, entre eles, Haddad (1990), Davini


108(1990), Roschke (1994), Ceccim (2005), Feuerwerker (2003) e Motta (2005), entreoutros. Há <strong>uma</strong> produção textual brasileira, oriunda das discussões preconizadaspelo Ministério da Saúde, a partir de 2003, quando toma a educação permanentecomo idéia central da política de gestão da educação <strong>no</strong> trabalho em saúde e passaa desenvolver ações indutoras significativas <strong>no</strong> interior do Sistema Único de Saúde(MOTTA, 2005).Para que a bibliografia fosse suficientemente ampla e para que se pudessetraçar a moldura dentro da qual o objeto dessa investigação se situa “se faznecessário a busca de diferentes pontos de vista, dos diferentes ângulos doproblema que permitam estabelecer definições, conexões e mediações,demonstrando o estado da arte” (MINAYO, 2006, p.184). Assim, entende-se que arevisão bibliográfica é um processo fundamental que pode ser caracterizado por“vários níveis de aprofundamento” (MINAYO, 2006, p. 183), que, gradativamente, vaisendo desenhado pelo pesquisador.Ao percorrermos essas trilhas que permitiram fazer referências às idéiascentrais sobre o objeto de pesquisa em questão, parte-se para explicitação dacaminhada empírica deste processo.4.3 APROXIMAÇÕES EMPÍRICASChegado o momento de percorrer outras trilhas do trabalho de campo partiusepara a escolha do universo a ser pesquisado. Para isso, faz-se um “recorteespacial que diz respeito à abrangência, em termos empíricos, do recorte teóricocorrespondente ao objeto de investigação” (MINAYO, 2006, p.201). Nesse recorteinserem-se os sujeitos com os quais se interagiu, que são os Assistentes Sociaisque atuam <strong>no</strong> campo da saúde do município de Porto Alegre.Para definir que profissionais seriam escolhidos para vivenciar esse processode investigação e para que se pudesse praticar a diversificação do universo dossujeitos, colhemos informações junto ao Conselho Regional de Serviço Social/CRESS – 10ª região. A intenção foi identificar o número de profissionais ativos <strong>no</strong>município e verificar a possibilidade de contatar com os Assistentes Sociais da áreada saúde vinculados à Delegacia Seccional de Porto Alegre. Através de encontro


109realizado 41 com representante da comissão de formação do CRESS, obteve-se ainformação que de um universo de 3.601 profissionais, 1.405 atuam em PortoAlegre, perfazendo um percentual de 39% dos Assistentes Sociais.número de profissionais160014001200100080060040020001.4051.444416336Porto Alegre Pelotas Caxias do Sul OutrosGráfico 1: Distribuição do número de profissionais ativos da 10ª RegiãoFonte: CRESS, em outubro de 2006.Com base nessa informação deu-se continuidade ao processo investigatório,que compreendeu <strong>uma</strong> identificação e <strong>uma</strong> delimitação dos diferentes <strong>serviço</strong>s dasaúde que são conveniados com o SUS e que se constituem como campos deatuação profissional. Entretanto, das organizações identificadas, elegeram-seaquelas em que foi possível definir o número de assistentes sociais que atuavamnestes espaços, quais sejam: Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre,Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Grupo Hospitalar Conceição e ComplexoHospitalar Santa Casa.Por meio de contatos com os próprios Assistentes Sociais das organizaçõesreferidas ou com profissionais da área de recursos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, durante os meses demarço a maio de 2007, foram listados os endereços eletrônicos dos sujeitos quefariam parte do estudo exploratório.41 Esta informação foi obtida <strong>no</strong> mês de outubro de 2006, de acordo com dados contabilizados peloCRESS 10ª Região.


110número de profissionais8070605040302010072531511SMS/PMPA GHC HCPA SCCHInstituiçõesGráfico 2: Localização dos Assistentes Sociais na rede de Serviços de saúde - Porto AlegreDe posse dessas informações, partiu-se para elaboração de um questionáriocom perguntas abertas e fechadas, (apêndice A) com o intuito de identificar, atravésdas questões formuladas, se o profissional estaria ou não desenvolvendo processosde educação permanente. Assim o questionário foi encaminhado aos assistentessociais (conforme universo definido a partir do quadro de localização) por endereçoeletrônico disponibilizado na ocasião em um site na Internet(www.quetionariodepesquisa.rg3.net) atendendo aos critérios de regulamento pararealização de pesquisa, conforme o explicitado através do termo de compromissoque constou na introdução do questionário.É importante ressaltar que, quando o meio eletrônico foi o escolhido para oencaminhamento do questionário, tinha-se <strong>uma</strong> expectativa de 50% de retor<strong>no</strong>, oque não ocorreu. Isso não pode ser ocultado pela pesquisadora, principalmenteporque a escolha do instrumento foi feita pela facilidade e pela rapidez dacomunicação, afinal a tec<strong>no</strong>logia está em evidência <strong>no</strong> cenário da formação,incluindo o da pesquisa científica. Na tentativa de compreender esse processo,alguns motivos foram identificados e outros não. Por exemplo: alguns endereçoseletrônicos que foram repassados por colegas e pelas áreas de Recursos H<strong>uma</strong><strong>no</strong>s,não estavam corretos ou os profissionais não cost<strong>uma</strong>m acessá-los; em outroscasos, o provedor escolhido não tinha compatibilidade com o provedor do


111profissional, como <strong>no</strong> caso do GHC; outros não teriam se manifestado por motivosempiricamente desconhecidos pela investigadora.A página na internet com o questionário de pesquisa, ficou disponível durantetodo o mês de julho de 2007. Como alguns e-mails não retornavam, foram feitoscontatos telefônicos para averiguação e aquisição de <strong>no</strong>vos endereços. No caso doGHC, optou-se por mandar <strong>no</strong>vamente os e-mail somente para 15 profissionais quehaviam sido contatados e confirmaram seus endereços e disponibilidade emresponder ao questionário. Assim, totalizando, foram encaminhados 113questionários, sendo que 29 foram respondidos (25,66%).Durante o processo, pode-se compreender que nessas trilhas percorridas opesquisador iniciava sua aproximação com os sujeitos e os sujeitos pesquisadosaproximavam-se do pesquisador. Revelavam-se aí, indícios para a escolha daquelesque seriam protagonistas da próxima trilha empírica a ser percorrida, até porqueesses sujeitos também se escolhiam.Ao receberem os questionários e respondê-los, alguns assistentes sociaisenviavam mensagens que encorajavam a pesquisadora a proceder, indicando aimportância desta para a categoria profissional e, mais do que isto, se revelavamcomo sujeitos pertencentes ao processo de investigação deflagrado. As mensagensreferiam : ”Rosa, fiquei feliz de receber tua mensagem e saber que estáspesquisando sobre a <strong>no</strong>ssa profissão, espero contribuir”(Jane); Parabéns pelapesquisa, acho que estamos precisando mostrar o que existe de bom por aí! Contecomigo!” (E.).Por tudo, este foi um processo de aproximação junto aos Assistentes Sociaise que também permitiu obter respostas para questões <strong>no</strong>rteadoras, como porexemplo, a referente à maneira como os profissionais vivenciam processos deformação profissional, que a princípio não foi delimitada, como somente as ocorridasa partir da educação permanente e que, de alg<strong>uma</strong> forma, enunciaram asexperiências de educação continuada dos profissionais.Cabe esclarecer que este instrumento também possibilitou identificar osassistentes sociais que foram convidados para o grupo focal, principalmente em


112função das respostas advindas da parte do questionário que tratou do processo detrabalho desse profissional. Para isto, foram elaboradas alg<strong>uma</strong>s questões que setraduziram em indicadores de desenvolvimento de educação permanente.Elabora pla<strong>no</strong>s, programas e projetos.Viabiliza a participação dos usuários na instituição.Participa de reuniões interdisciplinares (de equipe técnica) sistematicamente.Oportuniza a criação de espaços compartilhados de discussão sobre situações de trabalho entreprofissionais de diferentes áreas.Realiza pesquisas que subsidiem as ações profissionaisSocializa conhecimentos adquiridos junto aos seus colegas.Investe <strong>no</strong> aprimoramento profissional <strong>no</strong> espaço de trabalho, a partir dos problemas referentes àqualidade e à eqüidade dos <strong>serviço</strong>s.Elabora indicadores de avaliação de seu trabalho.Participa de reuniões de conselhos e ou atividades.Realiza supervisão de estágio profissional em Serviço Social.Encontra dificuldades para criação de espaços para a discussão da organização e do processo detrabalho.Considera que durante a prática profissional ocorre aquisição de conhecimentos e habilidades paraalém daquelas apreendidas na formação acadêmica.Os cursos e/ou capacitações promovidas pela instituição (local de trabalho) atendem asnecessidades demandadas pelo <strong>serviço</strong>.Considera que <strong>no</strong> seu cotidia<strong>no</strong> profissional existe a oportunidade de fortalecer seus conhecimentose construir <strong>no</strong>vos.Quadro 1: Indicadores de Educação Permanente <strong>no</strong>s Processos de Trabalho dos Assistentes SociaisConsidera-se relevante expor nessa parte do estudo as informações obtidasjunto aos 29 assistentes sociais, por meio dos questionários respondidos. Comoforma de reconhecer os diferentes espaços ou <strong>serviço</strong>s de atuação dos assistentessociais na saúde, verifica-se, <strong>no</strong> gráfico 3, que sobre o espaço sócio-ocupacional apredominância se dá na área hospitalar, incluindo os <strong>serviço</strong>s de saúde comunitáriadesenvolvido pelo GHC. Percebe-se a inserção dos profissionais junto à atençãoprimária em saúde nas Unidades Básicas na rede pública municipal. A área dasaúde do trabalhador, a Gestão e a Vigilância se constituem como espaços


113potencializadores da prática profissional que se destacam nesse universo depesquisados.45%45%40%35%29%30%25%20%15%10%11%4% 4%7%5%0%Unidade Básicade SaúdeHospitalSaúde doTrabalhadorVigilância Gestão OutroGráfico 3: Sobre o espaço sócio-ocupacional na área da saúdeSobre a trajetória de Formação Profissional e a Educação Continuada osdados sobre a instituição de Ensi<strong>no</strong> de formação estão condicionados à realidadedos Cursos de Serviço Social existentes na seccional da 10ª região do CRESS, poisa maioria das escolas formadoras são particulares. Como a pesquisa direcio<strong>no</strong>u-separa os profissionais que atuam na cidade de Porto Alegre, destacam-se aquelesformados na Região Metropolitana do Rio Grande do Sul (PUCRS, ULBRA eUNISINOS). Entre as Universidades do Estado foi citada a UCPEL.


11460%53%50%40%32%30%20%10%11%4%0%PUCRS UNISINOS UCPEL ULBRAGráfico 4: Graduação em Serviço Social - Instituição de Ensi<strong>no</strong>Sobre o a<strong>no</strong> de formatura dos assistentes sociais foi possível observar aexistência de profissionais formados há mais de três décadas e outros formadosrecentemente, há alguns a<strong>no</strong>s, como <strong>no</strong> caso dos formados em 2004 e que já estãoatuando profissionalmente <strong>no</strong> campo da saúde pública. Ao considerar um tempo detrabalho em tor<strong>no</strong> de 30 a<strong>no</strong>s (tempo de <strong>serviço</strong>), observa-se que mais de 50% dosassistentes sociais ainda irão trabalhar em média de 15 a 30 a<strong>no</strong>s, indicando odesafio que tem pela frente na trajetória profissional.Também pode-se verificar que a educação continuada tem sido objetivo dosassistentes sociais. Nessa parte do questionário houve a intenção de conhecer osinvestimentos e as iniciativas de educação continuada que se constituem <strong>no</strong>conjunto de experiências que seguem a formação inicial e que permitem aotrabalhador manter ou aumentar suas competências para o desenvolvimento desuas responsabilidades <strong>no</strong> trabalho (DAVINI, 1994).Mesmo não sendo foco empírico central desta pesquisa, não se pode negarque a educação continuada faz parte do percurso formativo dos assistentes sociais.Em muitas situações, os profissionais procuram se inserir em <strong>uma</strong> capacitação emfunção de <strong>uma</strong> necessidade não individual, mas coletiva, ou seja, oriunda dasnecessidades identificadas em seu processo de trabalho. Sendo assim, <strong>no</strong>


115compromisso de atender a essas necessidades, investem de diferentes formas <strong>no</strong>seu aprimoramento profissional.Entre os cursos de Pós-graduação, pode-se destacar, do universo de 29assistentes sociais, que 5 realizaram mestrado em Serviço Social na PUCRS e <strong>uma</strong>encontra-se realizando-o em outra área na Universidade Federal do Rio Grande doSul (UFRGS). Entre os cursos de especialização citados, destacam-se aqueles queos profissionais relacionaram com a sua área de trabalho, quais sejam: Direitos daCriança pela Escola Superior do Ministério Público; MBA em Gestão Empresarial(Pelo IBEGEN); Coordenadores de Dinâmica de grupos; Prevenção a ViolênciaDoméstica PUCRS; Saúde do Trabalhador /UFRGS; Arte Terapia <strong>no</strong> Contextoorganizacional; Curso de Terapia de Família; Especialização em Planejamento eGestão de Sistemas de Saúde – UFRGS; Informação Científica e Tec<strong>no</strong>lógica emSaúde;; Pós Graduação em Intervenção Sócio-Familiar pela ULBRA/ Ca<strong>no</strong>as-RS;Especialização em Serviço Social pela PUCRS e participação como aluna PEC <strong>no</strong>Pós Graduação da Educação/ UFRGS.Foi assinalado que, do período referente ao a<strong>no</strong> 2000 até a data dopreenchimento do questionário, os assistentes sociais estiveram participando emdiferentes atividades, tais como cursos, palestras, seminários, oficinas, conferênciasde saúde; fóruns estaduais, simpósios, grupos de estudos de saúde mental, entreoutros. Nessa parte do questionário foi possível captar a opinião e o significado queos Assistentes Sociais atribuem à participação nessas atividades, pois é possívelperceber o quanto essas contribuem para o aprimoramento profissional e para oatendimento das exigências postas pelo trabalho. Os comentários a seguir, referidoscomo exemplo, ilustram a opinião de parte do grupo:- Sim. Entendo como necessário a constante busca de conhecimentopara possibilitar <strong>uma</strong> prática reflexiva que responda as demandas daatualidade. (Secretaria Municipal de Saúde/ Gestão. 42 )- Com certeza. Principalmente porque o SS é <strong>uma</strong> profissão emconstante movimento. Acredito que as atividades que desenvolvemos éde s<strong>uma</strong> importância para aprimoramento, conhecimento, e trocas deexperiências profissionais. Participo sempre dos eventosproporcionados dentro e fora da instituição; (Hospital.).42 Para cada resposta indica-se o <strong>serviço</strong> de saúde a qual está vinculado o Assistente Social, nãosendo aqui evidenciado a autoria do comentário e sim o espaço sócio-ocupacional.


116- A busca por estas <strong>no</strong>vas atividades teve o objetivo principal de adquirir<strong>no</strong>vos conhecimentos e troca de experiência com diferentesprofissionais. De <strong>uma</strong> forma geral posso afirmar que os eventoscientíficos serviram para o meu aprimoramento profissional, entretantonem todos atenderam por completo as exigências postas pelo meucotidia<strong>no</strong> profissional.( Unidade Básica de Saúde- SMS).- Sim. O investimento permanente na busca da informação, de <strong>no</strong>vosaportes, <strong>no</strong>s permite vislumbrar <strong>no</strong>vos horizontes, fortalecerdeterminadas ações e ser propositivos para outras. Contribui,sobretudo, para a práxis, ao realizar-se <strong>uma</strong> reflexão permanente ecientífica sobre a realidade tanto intelectual (conhecimento produzido,quanto à realidade <strong>social</strong> que <strong>no</strong>s desafia a cada dia com suas múltiplasexpressões interferindo na vida dos usuários dos <strong>serviço</strong>s públicos e asíntese, que somos capazes de realizar e elaborar <strong>no</strong>vas alternativas deação (produção do conhecimento). Exemplo: Participei do SimpósioInternacional sobre O futuro da auto<strong>no</strong>mia. Uma sociedade deindivíduos? Ocorrido na UNISINOS em maio /2007. Onde, entre váriosestudos (área da filosofia, psicanálise, sociologia, artes, comunicaçãoda França, Itália e Brasil - explanaram sobre o tema central). Destaco osaportes do sociólogo Robert Castel, os quais contribuem e muito para<strong>uma</strong> leitura sobre a auto<strong>no</strong>mia. Auto<strong>no</strong>mia esta que faz parte do ideáriodo Projeto Ético-Político da Profissão de Assistente Social e de quetanto, cada vez mais a população esta impossibilitada de exercer emface da política neoliberal implantada em <strong>no</strong>sso país e a ausênciagritante e acelerada de suporte <strong>social</strong>, decorrente entre outros aspectosda cerceação de direitos e de políticas públicas ineficazes, (Saúde doTrabalhador/ SMS)- Sim. Consistiram n<strong>uma</strong> estratégia de atualização profissional.Aprimoramento de técnicas e qualificação acerca de Programa eProjetos Institucionais. ( Unidade Básica de Saúde/ SMS).- Certamente! As possibilidades de capacitação <strong>no</strong> dia-a-dia do trabalhome permitiram reflexões importantes para redirecionamento e namaioria das vezes alteração dos métodos de trabalho. As atividades deintercâmbio teórico prático acrescentam <strong>no</strong>vos olhares possibilitandoatividades interdisciplinares. (Vigilância/ SMS)- Sim. Participei de atividades dando visibilidade à ação profissional doassistente <strong>social</strong> na área de transplantes de órgãos, área onde atuo <strong>no</strong>Hospital. O curso que me acrescentou profissionalmente, o qual merefiro, é o de pós-graduação realizado em 2003 e 2004. Esse, comcerteza, contribuiu com minha prática profissional, pois adquiri maisconhecimento a respeito do tema família. (Hospital.).- Sim, <strong>no</strong>vos aportes teóricos do Curso de Terapia de Família e Casal, oque <strong>no</strong>s ajuda a entender, principalmente a dinâmica das famílias, emdiversas situações de vida, doença, luto, já que trabalho na emergência.(Hospital Pronto Socorro).- Sim, <strong>uma</strong> vez que as questões abordadas referem-se ao cotidia<strong>no</strong> detrabalho. Ligadas diretamente a prática profissional. Um espaçoimportante de troca, construção de conhecimento é o Núcleo de ServiçoSocial de Saúde Comunitária. Sobre as Capacitações: cursos sobreviolência, planejamento familiar. (Saúde Comunitária/ GHC)Observa-se nas respostas formuladas a importância atribuída aos processosformativos por meio da educação continuada, sendo a grande maioria destasexperiências assinaladas como contributos para o exercício profissional. Mesmo


117havendo limites, <strong>no</strong> que diz respeito ao atendimento “por completo” das exigênciaspostas às atividades <strong>formativa</strong>s, conforme o que discorreu <strong>uma</strong> profissional que atuan<strong>uma</strong> unidade de saúde, de <strong>uma</strong> maneira geral, as expectativas de aprendizagemdesses profissionais são atendidas.Também observa-se que os assistentes sociais não ig<strong>no</strong>ram a relaçãoexistente desses eventos educativos com as situações concretas de trabalho.Portanto, há <strong>uma</strong> coerência da capacitação profissional que o assistente <strong>social</strong>procura, com <strong>uma</strong> visão estratégica para atender melhor as demandas da saúde.Verifica-se, ainda, que as atividades ocorrem dentro ou fora das instituições, sendoassinalado que a todo investimento é válido buscar, desde que possibilite a práticareflexiva, o redirecionamento e as alterações dos métodos de trabalho e apossibilidade da interdisciplinaridade.As últimas questões do questionário referem-se aos indicadores dedesenvolvimento de educação permanente <strong>no</strong>s processos de trabalho dosassistentes sociais. Parte-se do entendimento de que os profissionais que vivenciamexperiências de educação permanente fazem do seu espaço de trabalho um lócusde aprendizagem, questionando não somente sua maneira de agir, mas tambémcontribuindo com as mudanças na organização do seu trabalho, refletindo sobredeterminadas situações, problematizando situações de trabalho, articulando-se nasequipes de trabalho, trocando experiências e saberes, investindo <strong>no</strong> aprimoramentoprofissional a partir de problemas referentes à qualidade e à eqüidade dos <strong>serviço</strong>s,entre outros indicadores.As respostas afirmativas do gráfico 5 até o gráfico 9, ilustradas a seguir,possibilitaram reconhecer aqueles profissionais que poderiam contribuirdesvendando suas experiências de educação permanente, justificando, assim, aescolha desse instrumento – o questionário – como forma de aproximação dosassistentes sociais e de definição do universo da pesquisa.


11890%80%70%60%50%40%30%20%10%0%Viabiliza a participação dosusuários na instituiçãoElabora pla<strong>no</strong>s, programas eprojetosSim Não Às vezesParticipa de reuniõesinterdisciplinaresGráfico 5: Possibilidades de educação permanenteNo gráfico 5, importantes afirmativas indicam as possibilidades que osassistentes sociais possuem de, <strong>no</strong>s seus espaços de trabalho, acionarem umconjunto de conhecimentos e habilidades que fazem parte da instrumentalidade dotrabalho profissional, como a elaboração do planejamento das ações através deprojetos e programas; também um importante indicador refere-se a participação emreuniões interdisciplinares e a viabilização da participação dos usuários nainstituição. Assim, como há um significativo percentual de assistentes sociais queviabilizam e fomentam os espaços de participação dos usuários, observa-se, como odestacado <strong>no</strong> gráfico 6, que os profissionais que responderam ao questionáriooportunizam a criação de espaços compartilhados de discussão sobre as situaçõese demandas da saúde com diferentes áreas do saber. Também a <strong>social</strong>ização deconhecimentos faz parte do cotidia<strong>no</strong> desses profissionais.


11990%80%70%60%50%40%30%20%10%0%Oportuniza a criação deespaços compartilhados dediscussão sobre situações detrabalho entre profissionais dediferentes áreasRealiza pesquisas quesubsidiem as açõesprofissionaisSocializa conhecimentosadquiridos junto aos seuscolegasSim Não Às vezesGráfico 6: Espaços compartilhados, pesquisas e <strong>social</strong>ização de conhecimentosAinda, <strong>no</strong> gráfico 6, observa-se que a pesquisa enquanto um instrumento dosprocessos de trabalho dos assistentes sociais que subsidia as ações <strong>no</strong> campo dasaúde é algo acionado eventualmente, ou melhor, às vezes por 50% dosparticipantes. De qualquer forma não foi possível desvendar aqui a <strong>dimensão</strong> desteàs vezes, até porque <strong>uma</strong> pesquisa pode dar conta de apreender <strong>uma</strong> determinadarealidade e a partir de então, desencadeiam-se diferentes proposições eintervenções por um período a médio e longo prazo. Contudo, verifica-se que esteinstrumento tem sido utilizado por 32% dos assistentes sociais de<strong>no</strong>tando o seu usopara atendimento da resolutividade dos <strong>serviço</strong>s na saúde


12090%80%70%60%50%40%30%20%10%0%Investe <strong>no</strong> aprimoramento profissional <strong>no</strong>espaço de trabalhoElabora indicadores de avaliação de seutrabalhoParticipa de reuniões de conselho e/oude controle <strong>social</strong>Sim Não Às vezesGráfico 7: Investimento, indicadores e controle <strong>social</strong>O gráfico 7, aponta o investimento quanto ao aprimoramento profissional <strong>no</strong>próprio espaço de trabalho, o que demonstra ser <strong>uma</strong> prática do cotidia<strong>no</strong> de 82%desses assistentes sociais, preocupados com a qualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados.Com relação aos indicadores de avaliação do trabalho desenvolvido 40% dosassistentes sociais desencadeiam um método de abordagem que contempla umordenamento teórico, técnico e científico por meio da elaboração de indicadores quesubsidiam a intervenção profissional e avaliam o resultado dos procedimentos. Aparticipação em espaços de controle <strong>social</strong> tem se constituído para 40% dosassistentes sociais como um meio de trabalhar na saúde, o que se evidencia queesses espaços de participação da sociedade civil também são espaços departicipação dos assistentes sociais fortalecendo o controle público sobre os<strong>serviço</strong>s de saúde. Entretanto a maior parte dos assistentes sociais ou nãoparticipam ou participam às vezes não sendo identificado em que circunstância issoocorre.


12190%80%70%60%50%40%30%20%10%0%Realiza supervisão de estágioprofissional em Serviço SocialConsidera que <strong>no</strong> seu cotidia<strong>no</strong>profissional tem a oportunidade defortalecer seus conhecimentos econstruir <strong>no</strong>vosOs cursos e/ou capacitaçãopromovidas pela instituição atendemas necessidades demandadas pelo<strong>serviço</strong>Sim Não Às vezesGráficos 8: Supervisão, construção de conhecimentos, atendimento das necessidadesO gráfico 8 demonstra a especificidade da supervisão de campo aosestagiários de Serviço Social, experiência profissional que pressupõe odesenvolvimento de <strong>uma</strong> relação pedagógica relevante e profícua <strong>no</strong>s processos detrabalho, que se dá entre o assistente <strong>social</strong> e o alu<strong>no</strong> em formação acadêmica.Entretanto, observa-se que é maior o percentual de assistentes sociais que nãopraticam a supervisão de campo <strong>no</strong> universo desta pesquisa.Referente às capacitações e/ou aos cursos promovidos pela instituição,espaço onde se dá o exercício profissional, o gráfico demonstra o quanto osprocessos formativos, que envolvem os assistentes sociais, nem sempre atendem asnecessidades demandadas pelo <strong>serviço</strong>. Essa constatação, possível de ser feita pormeio da aplicação desse instrumento, que aproximou e inseriu a pesquisadora do e<strong>no</strong> seu campo de investigação, é, de fato, um indicador da importância da reflexãocrítica sobre o processo de trabalho profissional, para que se possa pensarestratégias de formação que permitam a aquisição de um saber que, ao ser postoem uso, esteja a <strong>serviço</strong> das demandas postas e, principalmente, dos usuários do<strong>serviço</strong>.


122100%90%80%70%60%50%40%30%20%10%0%Encontra dificuldades para criação de Durante a prática profissional ocorreespaços para a discussão da organização e aquisição de conhecimento e habilidadesprocesso de trabalhoProblematiza situações de trabalhoprocurando responder questionamentos,adquirindo conhecimentos e re<strong>no</strong>vandoexperiênciasSim Não Às vezesGráfico 9: Dificuldades, Aquisição de conhecimentos e habilidades, ProblematizaçãoO gráfico 9 demonstra que existe dificuldade de criação de espaçoscompartilhados para a discussão da organização e do processo de trabalho.Entretanto, não se desvendam aí quais seriam essas dificuldades, o que esseinstrumento não <strong>no</strong>s permitiu conhecer, o que foi, posteriormente, desvendado <strong>no</strong>grupo focal. É importante ressaltar que esse indicador não foi determinante naescolha dos assistentes sociais, pelo me<strong>no</strong>s daqueles que assinalaram não ou àsvezes como alternativa, pois o fato de encontrar dificuldades não o impede dedesencadear ou de experienciar situações de aprendizagem <strong>no</strong> trabalho.Ao examinar, o gráfico 9 pode-se perceber o quanto é possível adquirirconhecimentos e habilidades durante os processos de trabalho. Por isso,compactua-se do entendimento de que da instrumentalidade do Serviço Social fazparte um conjunto de conhecimentos e de habilidades adquiridos ao longo daformação profissional, corroborando, mais <strong>uma</strong> vez, o referido por Iamamoto (2001).Por último, o ato de problematizar as situações de trabalho faz parte do processo detrabalho profissional, já que os assistentes sociais, em sua grande maioria (86%),assinalaram afirmativamente esse indicador.


123A partir da análise das informações acima pode-se, então, partir para outratrilha da pesquisa. No próximo item discorre-se sobre a escolha do grupo focal comoum instrumento de investigação privilegiado e do procedimento de análise adotadonessa pesquisa a partir das narrativas dos Assistentes Sociais.4.4 A INTENÇÃO NA ESCOLHA DO INSTRUMENTOCom a intenção de obter informações de caráter qualitativo em profundidade,parte-se para um espaço mais delimitado, realizando grupo focal sobre educaçãopermanente com os assistentes sociais que foram selecionados intencionalmente eque já participaram do estudo inicial, caracterizado pela aplicação do questionário. Aescolha desses sujeitos baseou-se <strong>no</strong> critério de diversificação da amostra que serefere “à identificação de pessoas que são capazes de analisar, de um modosuficientemente amplo, a totalidade ou quase totalidade dos temas, fatos,estratégias, juízos e itinerário do grupo <strong>social</strong> investigado” (MARRE, 1991, p.112).Os profissionais foram contatados pelo pesquisador e convidados, comantecedência, a fazerem parte dessa fase da pesquisa. Uma vez contatados os AS,procurou-se esclarecer junto aos mesmos, os objetivos da entrevista, bem como aconfidencialidade das informações, para proceder na investigação. Emconcordância, foi encaminhado, aos profissionais, um convite por escrito, com data,hora e local de realização do grupo, conforme apêndice B.A escolha do grupo focal como instrumento de pesquisa, dá-se pelo fato de omesmo proporcionar a publicização, a troca de experiências e a interação entre ossujeitos da pesquisa – os Assistentes Sociais. O grupo focal proporciona um debateaberto em que todos os participantes têm acesso à discussão sobre o assunto emfoco, já que o mesmo deve ser de interesse comum. É <strong>uma</strong> troca de pontos de vista,de idéias e de experiências (BAUER e GASKELL, 2002).Privilegiar essa metodologia é <strong>uma</strong> forma de viabilizar um espaço de reflexãocrítica aos profissionais participantes sobre a educação permanente <strong>no</strong> ServiçoSocial, a geração de conceitos, as impressões e as concepções sobre a temática.Além disso, o grupo focal pode possibilitar o conhecimento das diferentes


124experiências (ou não-vivenciadas) de educação permanente e as perspectivas dosparticipantes com relação a esse processo de aprendizagem <strong>no</strong> trabalho.O grupo focal é <strong>uma</strong> técnica qualitativa que foi inspirada nas entrevistas nãodirecionadase grupais usadas na psiquiatria. Os participantes, em princípio, não seconhecem; isso não é <strong>uma</strong> regra, mas devem possuir características comuns(TANAKA & MELO, 2001). Nesta pesquisa, pode-se evidenciar alg<strong>uma</strong>scaracterísticas comuns, pois todos os participantes fazem parte de <strong>uma</strong> mesmacategoria profissional, pertencem ao campo da saúde, mas estão inseridos em<strong>serviço</strong>s diferentes (emergência, Hospital, de saúde comunitária, de saúde dotrabalhador, vigilância da saúde, gestão de desenvolvimento dos trabalhadores dasaúde). Ocorreram situações em que os profissionais haviam sido colegas durante aformação acadêmica e há muito tempo não se viam, o que tor<strong>no</strong>u o ambienteacolhedor, deixando os participantes n<strong>uma</strong> situação confortável, propícia à reflexãoproposta e à interação empírica.Fizeram parte da equipe que realizou os grupos focais: o moderador, sendoesse o pesquisador, e um relator, que foi escolhido com antecedência pelopesquisador. O pesquisador e o relator reuniram-se previamente com o objetivo dediscutir sobre a temática do estudo, bem como para realização de combinações.Como forma de registro principal, optou-se pela gravação das narrativas dosparticipantes que, posteriormente, foram transcritas na sua totalidade.Na literatura que trata sobre o grupo focal encontra-se diferentes abordagenscom relação ao número de participantes que deve ter um grupo focal; entretanto, omínimo fica em cinco sujeitos. O número de participantes convidados para cadagrupo focal foi de oito Assistentes Sociais. A duração prevista em cada grupo foi deaté duas horas. O limite do número de grupos a serem realizados se deu pelasaturação obtida através das informações que foram sendo analisadas a cada gruporealizado. O critério de saturação caracteriza-se “pelo momento em queconseguimos identificar que chegamos ao conjunto das informações que podíamosobter em relação ao tema” (MARTINELLI, 1994, p.15).Foram realizados dois grupos focais, e ao iniciar os mesmos, foram feitas ascombinações referentes ao sigilo apresentando aos participantes, o termo de


125compromisso (apêndice C). O primeiro grupo focal contou com a participação decinco assistentes sociais. Faltaram dois que justificaram a ausência posteriormente àrealização do mesmo. Com <strong>uma</strong> assistente <strong>social</strong> ausente na ocasião do grupofocal, foi possível realizar <strong>uma</strong> entrevista (seguindo em parte o roteiro do grupofocal), pois a mesma manifestou o desejo de participar da pesquisa e <strong>social</strong>izar asua experiência em educação permanente. Já <strong>no</strong> segundo, participaram oitoassistentes sociais de <strong>uma</strong> organização hospitalar, mas que desenvolvem ações emdiferentes espaços e territórios na área de saúde comunitária. Percebeu-se, então,após esse grupo, que não era preciso continuar a coleta, pois ao atingir-se um certonível de saturação, “o campo investigado está coberto” (MARRE, 1991, p.113).É necessário referir que antes da realização desse segundo grupo houve amarcação de um outro e que somente <strong>uma</strong> assistente <strong>social</strong> compareceu. As outrascinco que haviam confirmado presença, não justificaram a ausência. Tal fatodemonstra a dificuldade <strong>no</strong> uso dessa técnica, pois conciliar horários, espaços einteresses depende, também, de um movimento que os próprios entrevistadosdevem fazer, deslocando-se ao local combinado para realização do grupo.Entretanto, na ocasião, a assistente <strong>social</strong> que havia comparecidodemonstrou seu descontentamento por não estarem presentes as demais,manifestando também o interesse pelo objeto de investigação. Foi então que sedecidiu realizar <strong>uma</strong> entrevista com a mesma, seguindo também em parte o roteirodo grupo focal, pois entende-se que um processo de pesquisa qualitativa não podeser engessado e deve-se valorizar todos os momentos e expressões que sãomanifestadas pelos sujeitos envolvidos. A entrevista com a assistente <strong>social</strong>possibilitou essa descoberta de que o significado e a importância do objetoinvestigado, também são atribuídos pelos sujeitos que se inserem por escolhanesses processos investigatórios.Assim, fizeram parte do grupo focal 13 assistentes sociais, aos quais optou-sepor atribuir um <strong>no</strong>me (embora fictício, de modo a assegurar o sigilo e o a<strong>no</strong>nimato nainvestigação desenvolvida). Conforme pode-se observar nas narrativassistematizadas <strong>no</strong> próximo capítulo, os <strong>no</strong>mes são: Helena, Jane, Beatriz, Flávia,Júlia, Carla, Rossana, Sofia, Marlene, Leandro, Verônica, Camila e Carina. Tambémsão inseridas nesse processo as duas entrevistas realizadas com as Assistentes


126Sociais Adriana e Silvia, com as quais seguiu-se o mesmo roteiro que guiou o grupofocal, e apesar da diferença da técnica e da falta de oportunidade de reflexãocoletiva e de interação grupal, os achados destas entrevistas puderam serincorporados nas análises junto às advindas do grupo focal.Para a realização dos grupos formulou-se um roteiro prévio que serviu comoum guia da reflexão proposta <strong>no</strong> grupo Apresentação de um tópico guia sobre a temática Educação Permanente, que sintetizaráas questões e assuntos da discussão, visando sensibilizar e provocar a discussão dasidéias e reflexões. Cada participante deverá relatar <strong>uma</strong> experiência de educação permanente vivenciado <strong>no</strong>processo de trabalho na saúde. Quais obstáculos e/ ou dificuldades existem para desencadearem processos de educaçãopermanente. Que possibilidades. E o projeto ético-político. Quais conhecimentos e habilidades são necessárias para o desenvolvimento do trabalho.Qual conceito que o grupo constrói sobre educação permanente <strong>no</strong> Serviço Social.Quadro 2: Roteiro para o Grupo FocalA cada grupo focal realizado reuniram-se as a<strong>no</strong>tações do trabalho,desencadeando as primeiras aproximações das análises por meio de <strong>uma</strong> escutadas gravações das narrativas e, posteriormente, realizou-se a transcrição dasmesmas. A partir de então iniciaram-se as leituras preliminares das narrativas. Nãoforam <strong>uma</strong> nem duas as oportunidades de leitura que iam, aos poucos, levando apesquisadora à formulação de interrogações diante da riqueza das narrativas dosAssistentes Sociais.Aos poucos foram sendo identificadas as categorias que emergiam dessasnarrativas, pois para realização da análise das falas dos assistentes sociais teve-se,como premissa, observar as tendências e os padrões potenciais, opiniões sólidas efreqüentemente expressas. O texto não é partido em palavras e em frases, mas empartes que têm em si um sentido global unitário (BARDIN, 1994). É, então, nesseprocesso de análise que se reconhece as categorias emergentes das narrativas dos


127Assistentes Sociais como enunciados que dão <strong>uma</strong> unidade de sentido às palavrase aos significados atribuídos pelos próprios sujeitos da pesquisa.Assim, procurou-se destacar as partes das narrativas que correspondiam àsperguntas do roteiro do grupo focal, elaboradas de acordo com os objetivos equestões <strong>no</strong>rteadoras da pesquisa. Foram feitas marcações e comentários arespeito dos enunciados <strong>no</strong> próprio texto das transcrições das falas, como forma desistematizar a descrição das análises daquilo que emergiu destes grupos focais. Aanálise do conteúdo surge nesse contexto como um conjunto de técnicas de análisedas comunicações, que são possíveis de serem feitas, através de procedimentossistemáticos e de objetivos de descrição do conteúdo das mensagens (BARDIN,1994) que emergiram nessa investigação dos grupos focais realizados com asassistentes sociais.Para dar conta da singularidade que constitui a construção identitária dossujeitos dessa pesquisa, a narrativa permite obter informação sobre os processos de<strong>social</strong>ização, ainda que reinterpretados pelo sujeito que narra. (BOLÍVAR, 2001).Portanto, não se trata de reconstituir acontecimentos e experiências, mas decompreender o significado que, na ocasião dos grupos focais, os entrevistadosatribuíram ao percurso formativo vivenciado <strong>no</strong>s seus processos de trabalho nasaúde. Assim como o grupo focal, as narrativas também têm um caráter dialógico einterativo, que entrelaçam-se num espaço coletivo construído intencionalmente, numtempo preciso, em que é possível fazer história, revelar experiência, sentimentos,significados e saberes.Contudo, tem-se clareza dos desafios que <strong>uma</strong> investigação instaura, mas éexatamente <strong>no</strong>s limites do objeto da investigação que se encontram aspossibilidades de, através das narrativas dos assistentes sociais, desvelar como vêmse desenvolvendo as experiências de educação permanente vivenciadas, bem comoos significados atribuídos aos espaços de trabalho, como sendo, também,formadores.Observou-se que os assistentes sociais que participaram dos grupos focaisestavam ali porque têm como principio a busca da formação permanente. Partem dapremissa de que a problematização das situações de trabalho devem fazer parte do


128modo de trabalhar, do jeito de fazer, e que tem <strong>uma</strong> relação com a postura ética doprofissional. Esses profissionais aspiram o aprimoramento profissional para darconta das necessidades postas <strong>no</strong> trabalho, principalmente aquelas trazidas pelosusuários. Fazem parte como sujeitos da pesquisa porque se escolheram. Vierampara a reflexão carregados de <strong>uma</strong> trajetória, assim como a pesquisadora. Tinham odesejo de refletir sobre esse objeto, que foi publicizado <strong>no</strong> momento que ocorreu aaproximação da pesquisadora com o universo da investigação. Como forma deelucidar o que vêm-se destacando nessa parte do estudo, escolheu-se <strong>uma</strong>mensagem original:RosaTudo bem? Gostei muito de participado do Grupo. Quando sai fiqueipensando muito, várias idéias. Vou tentar escrever agora, pois já passoualgum tempo e se perde um pouco do conteúdo.A educação permanente além de ser um processo, também é <strong>uma</strong> dasestratégias que o SS utiliza para a produção da cidadania. No sentido deque o usuário dos <strong>no</strong>ssos <strong>serviço</strong>s, isto é, <strong>no</strong> desenvolvimento do <strong>no</strong>ssoprocesso de trabalho, ao usarmos como falamos a atenção (comocategoria) (ater-se a algo, a <strong>uma</strong> realidade e extrair dela aprendizado,desafios, necessidade de superação) lançamos mão de diferentesinstrumentais, técnicas e estratégias que conduzem a <strong>uma</strong> capacitação deenfrentamento, de empoderamento, de fortalecimento, que agregam valor esentido a <strong>uma</strong> dada situação da realidade (sempre expressão da questão<strong>social</strong> - <strong>no</strong>sso objeto de trabalho), através desta significação eestranhamento, se mobiliza tanto a subjetividade quanto os dados objetivos(condição, a realidade mesma), mediante a utilização de diferentesinstrumentais que levam a <strong>uma</strong> aprendizagem (do profissional e do usuário).Neste percurso as categorias do método materialista dialético (historicidade,contradição...) são imprescindíveis, pois não podemos deixar de examinálase verificar com se desenvolvem na situação em estudo, para umexercício competente do <strong>no</strong>sso saber fazer profissional.Por outro lado, a educação permanente do assistente <strong>social</strong> "para si" écondição de um exercício profissional que se quer competente,contemporâneo e que busca <strong>no</strong>vas estratégias, mediações deenfrentamento das expressões da questão <strong>social</strong> que historicamente seforjam na sociedade num mundo globalizado.(aquilo falo do que é genérico,pois o particular, só vamos encontrar <strong>no</strong> momento do processo de trabalhocom um sujeito, ou com um coletivo de trabalho, de qualquer forma nuncase dá isolado este processo de conhecimento-apropriação-tomada dedecisão-ação-avaliação). Como dizem os teóricos de Planejamento, temosque saber onde queremos chegar, saber a que distância estamos o quenecessitamos (outra categoria fundamental) como e quando faremos aintervenção na realidade...Lembrando que o SS é <strong>uma</strong> disciplina que serarticula com as demais disciplinas e ciências de acordo com o seu campode ação para ter <strong>uma</strong> visão de totalidade. Está aí o viés da formação, isto é,não só a acadêmica, mas toda aquela que agrega conhecimento ao <strong>no</strong>ssonúcleo de competência, pois estamos falando de trabalho vivo, nestesentido a educação tem que ser permanente.O campo da saúde é um dos mais amplos, assim como o é o da justiça,requer do profissional de Serviço Social um conhecimento permanente,transformado em informação e em processo de articulação de participação


129para a garantia de direitos, tão desrespeitados seja por organizaçõesprivadas, seja por organização públicas. O SUS tanto em seus princípiosfilosóficos, quanto <strong>no</strong>s princípios de organização do sistema, contribui comelementos que favorecem um processo de trabalho na garantia de direitos,o que já não acontece com a previdência <strong>social</strong>Rosa, não costumo fazer rascunho, então escrevi direto, sem preocupar-memuito com a língua mãe. Nem sei se a tua metodologia permite este tipo deinformação, de qualquer forma é <strong>uma</strong> reflexão breve que adorei fazer.Um forte abraço e sucesso. (Beatriz).Diante do aprofundamento da reflexão acima, percebe-se o quanto a escolhado grupo focal foi um importante instrumento de captação do real, de apreensão dasexperiências dos assistentes sociais, mas também há de se reconhecer queconstituiu-se num espaço compartilhado do conhecimento dos sujeitos pesquisadose de reflexão crítica sobre os processos de trabalho em que os assistentes sociaisestão inseridos. A pesquisadora, ao responder o e-mail para a assistente <strong>social</strong>expressou sua satisfação em contemplar entre os achados da pesquisa, a reflexãotransmitida virtualmente.: A minha metodologia é aquela que permite ser construídacom os pesquisados, portanto é <strong>no</strong>ssa...tuas reflexões são meus achados.. e teus...vamos <strong>social</strong>izar. (Pesquisadora, em 7/8/2007).A intenção da escolha do grupo focal foi a de instigar os profissionais paraque possam ser propositivos <strong>no</strong>s seus espaços de trabalho, multiplicando aimportância da educação permanente como <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong>s processosde trabalho dos assistentes sociais. Ainda sobre a escolha desse instrumento e aoportunidade proporcionada, o depoimento de Camila, quando na realização dogrupo focal, exemplifica a importância do mesmo: “a gente não tem como sabertudo! Tem que estar sempre em busca de... e isso que vai agregar, com essa própriaprática de está sempre trazendo questões <strong>no</strong>vas, a gente estar sempre buscando etrocando. Aqui, por exemplo, este grupo focal, é um espaço de educaçãopermanente, é <strong>uma</strong> troca de saberes riquíssima”.Com essas palavras de Camila anunciamos o próximo capítulo dessa tese,que mergulha na análise das narrativas dos Assistentes Sociais que evidenciamcomo se dão as suas experiências de Educação Permanente.


1305 NARRATIVAS DOS ASSISTENTES SOCIAIS: AS EXPERIÊNCIAS DEEDUCAÇÃO PERMANENTEParte-se do entendimento que este momento da investigação tem <strong>uma</strong>relevância que não se sobrepõe às outras, mas sua diferença está, sobretudo, nasistematização do significado atribuído pelos assistentes sociais às suasexperiências de educação permanente, desvendadas através da reflexão coletiva edas narrativas expressadas durante a realização dos grupos focais. Os assistentessociais que participaram desse processo investigativo puderam relatar <strong>uma</strong>experiência de educação permanente, cujas narrativas são em relação, ou seja, deacordo com cada percurso profissional, pois a identidade pessoal só se tornanarrativa ao ser relatada. “É <strong>no</strong> e através do ‘relato de si próprio’ que o seu íntimoreflexivo se torna <strong>uma</strong> história” (DUBAR, 2006, p.175). A memória ativa produtora desentido, e ao mesmo tempo de <strong>uma</strong> direção (linha de vida) e de um significado(compreensão dialógica) (DUBAR, 2006) é evidenciada pelos assistentes sociais,sujeitos dessa investigação a partir das relações sociais vivenciadas <strong>no</strong>s espaçossócio ocupacionais do campo da saúde.Assim, a cada relato de <strong>uma</strong> situação vivenciada de educação permanente,de reflexão critica sobre o processo de trabalho, os assistentes sociais traziam suaspercepções sobre as possibilidades e as dificuldades existentes, as estratégias, ashabilidades e as atitudes necessárias aos profissionais, bem como os espaçoscompartilhados, o trabalho interdisciplinar, a relação com os usuários, asnecessidades em saúde, as demandas do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> e da saúde pública. Enfim,pode-se apreender o como esses profissionais desenvolvem educação permanente<strong>no</strong>s processos de trabalho na saúde.O processo de análise das informações coletadas exigiu da pesquisadora<strong>uma</strong> imersão <strong>no</strong>s significados que os assistentes sociais compartilham sobre suasvivências de educação <strong>no</strong> trabalho <strong>no</strong> campo da saúde. Parafraseando Minayo,(2007) um aspecto a ser considerado durante a análise dos resultados de <strong>uma</strong>pesquisa diz respeito à necessidade de “administração das provas”, o que foipossível de ser realizado, através do balizamento entre os achados, os objetivos, asquestões <strong>no</strong>rteadoras e os pressupostos teóricos, pressupostos demarcados narevisão bibliográfica dessa investigação, que iluminam a leitura compreensiva e


131interpretativa das narrativas dos assistentes sociais, quais sejam, educaçãopermanente, educação e formação, produção de saberes e processo de trabalho,destacando-se a questão <strong>social</strong> como <strong>uma</strong> subcategoria dessa última. Constata-seque durante a investigação, mais precisamente <strong>no</strong> processo de análise, alg<strong>uma</strong>scategorias pertinentes das experiências dos assistentes sociais emergiam como“palavras identitárias” (DUBAR, p.175). Entre os achados, tais como, desejo, escutadas demandas, partilha de saberes, dinâmica organizacional, aprendizagemsignificativa e reflexões peculiares a respeito do projeto ético político comoreferência identitária <strong>no</strong> Serviço Social. Foi possível, também, captar alg<strong>uma</strong>snuances dessas categorias emergentes, como compromisso profissional, empatia,questionamentos sobre os meios e os resultados do trabalho, habilidades e atitudes,pesquisa, registros e relatórios, interdisciplinaridade, teoria e prática,articulação nasequipes de trabalho, entre outras. A sistematização seguinte ilustra a maneira comose organizou a análise a partir das categorias que subsidiaram a pesquisa e as queemergiram desse processo.Categorias Reflexivas/TeóricasEducaçãoPermanente- Educação e Formação- Processo de Trabalho- Construção de Saberes- Questão SocialCategorias Emergentes- Desejo- Dinâmica Organizacional- Escuta da Demanda- Partilha dos Saberes- Dimensão ético-política- Aprendizagem Significativa- Formas IdentitáriasNuances das Narrativas- Compromisso- Reflexão- Problematização- Estratégia- Empatia- Interdisciplinaridade- Articulação- Pesquisa- Ruptura de Preconceitos- Registros- Concepção de educaçãopermanenteQuadro 3 – Categorias Teóricas e EmergentesO presente capítulo está organizado de acordo com as categorias queemergem das narrativas e que respondem à questão central dessa investigação.Sabe-se que o ato de analisar requer, também, <strong>uma</strong> escuta e <strong>uma</strong> interpretação doque está sendo dito, o que não é <strong>uma</strong> tarefa fácil, e nem o pesquisador o faz sem oenvolvimento necessário e sem a presença de sua <strong>dimensão</strong> ética e política. Cientedesse entendimento, não é preocupação aqui salientar a importância de <strong>uma</strong>categoria sobre outra, mas de trazê-las articuladas, respeitando a dinâmica que foi a


132interlocução e a reflexão coletiva sobre as vivências de educação permanentenarradas pelos assistentes sociais, quando da ocasião dos grupos focais.5.1 DESEJO: UM PRINCÍPIO PARA MUDANÇANas narrativas dos assistentes sociais, antes mesmo de iniciarem e durante orelato da vivência de educação permanente, observou-se a importância que osmesmos atribuíam ao desejo e o compromisso que os profissionais assumem <strong>no</strong>trabalho, como <strong>uma</strong> escolha não somente subjetiva, individual, mas, principalmente,coletiva, <strong>no</strong> sentido de responsabilização com os resultados das ações e com oprocesso formativo que dele advém.O desejo do profissional assume, para esses profissionais, um dispositivofundamental para que haja <strong>uma</strong> desacomodação que poderá implicar os sujeitos naefetivação de mudanças necessárias que podem se dar através da problematizaçãode <strong>uma</strong> situação posta <strong>no</strong> trabalho, de um envolvimento com um projeto, como bemobservado por <strong>uma</strong> assistente <strong>social</strong> a partir de seu relato.No próprio exemplo que tu deste tinham vários profissionais queestavam envolvidos <strong>no</strong> projeto, então eu acho que é perfeito isso. Isso é dapessoa que se implica, que se sente afetada, que se desacomoda comessas situações e vai atrás e problematiza, enfim. (Julia)O que se evidencia é que os assistentes sociais deveriam ter esse desejo demudança, de problematizar situações, pois é algo dado na formação inicial emfunção do próprio projeto profissional que mobiliza para sua concretização; é umdesejo coletivo e, portanto, com <strong>uma</strong> forte <strong>dimensão</strong> política que, ao ser “engajadoem <strong>uma</strong> dinâmica do desejo” (CHARLOT, 2000, p.82), pressupõe-se que hajasubsídios formativos delegados, quando na formação profissional inicial.Mas ao assistente <strong>social</strong> isso está delegado por conta de um projetoético político, então o assistente <strong>social</strong> já na sua formação acadêmica eledeveria estar mais habilitado e desejar que isto aconteça.( Beatriz).A busca pelo aprimoramento profissional parte de questionamentos quesurgem <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> do trabalho, na relação com o próprio usuário e com o desejode saber. Como <strong>no</strong>s diz Charlot “não há relação com o saber senão a de um sujeitodesejante, e só há sujeito desejante” (2000, p.81). Uma determinada situação oulugar pode provocar um desejo, pôr em movimento um sujeito, um assistente <strong>social</strong>


133que confere valor àquilo que está vivendo e desejando. “É porque o sujeito é desejoque sua relação com o saber coloca em jogo a questão do valor do que ele aprende”(CHARLOT, 2000, p.82). Essa relação do desejo como o saber e da valorização doque se aprende na experiência vivenciada <strong>no</strong> campo da saúde, está tambémrelacionada com um momento real em que emergem questionamentos que sãodispositivos para aquisição de um saber, tal como revela a narrativa de Julia:(...) eu estou bem nesse momento agora de descobrir que é possível criaralg<strong>uma</strong>s coisas, e estou me permitindo questionar alg<strong>uma</strong>s coisas, <strong>no</strong>espaço mesmo do atendimento ao usuário, tanto que daí eu fui, eu sentique precisava me capacitar, fazer <strong>uma</strong> pós-graduação <strong>no</strong> GHC emformação científica e tec<strong>no</strong>lógica em saúde, justamente pra poder mesubsidiar mais, porque alg<strong>uma</strong>s coisas me causam inquietudes.(Julia).Pode-se apreender dessa reflexão de Julia que o desejo do usuário tambémpõe em movimento o profissional. Na intenção de satisfazer esse desejo, que naverdade se materializa através da demanda oriunda de <strong>uma</strong> necessidade desseusuário, o profissional aciona um conjunto de conhecimentos e de habilidades paraintervir nessa situação. Considera-se aqui o usuário como um sujeito desejante,capaz de provocar inquietações <strong>no</strong> profissional. As inquietações, as interrogaçõesprovocadas pelas incertezas do cotidia<strong>no</strong> são pertinentes àqueles profissionais quepossuem o desejo de compreender o que acontece na realidade em que estãoinseridos, para enfrentar os obstáculos e/ou as situações postas.O desejo “é a mola da mobilização” (CHARLOT, 2000) de um assistente<strong>social</strong> engajado <strong>no</strong> mundo, em relação com os outros e com ele mesmo, e queatribui um valor ao saber. Há, então, <strong>uma</strong> disposição interna, algo incorporado peloprofissional, o que se percebe na narrativa:Então tu tem que buscar, tem que ler, tem que buscar dentro da formaçãoacadêmica, mas, também, tem que ter essa disposição interna, que é <strong>uma</strong>vontade política. Eu lembro que eu e mais alg<strong>uma</strong>s colegas começamos aestudar, começamos a montar grupos, mesmo sem saber ao certo o que agente queria, como era a metodologia que a gente ia montar, e a gente foimontando foi escrevendo(...) bem interessante que a gente viu o que asoutras pessoas faziam em outros lugares, e a gente ia fazendo <strong>uma</strong>strocas, mesmo que informais, e hoje a metodologia dos grupos de reflexãosobre trabalho é <strong>uma</strong> metodologia que é adotada pelo Ministério da Saúde,então isso é muito legal de tu participar, de tu conseguir vencer a tuaansiedade, o teu medo de errar, e a gente sabe que errou, mas, enfim, tunão parar, tu continuar buscando, tu te despojar, tu buscar parceria, tudesejar. Poder ver que as coisas crescem, que as coisas andam, e queconseguem um espaço público até. Eu acho que isso é muito importante e,principalmente, tu ter o reconhecimento das pessoas que tu atende, tu ver


134que algo se transformou na vida de alguns usuários e que alg<strong>uma</strong>s coisastu pode participar junto, ver que tu te transformou também. MárciaO desejo, portanto, não é um desejo em <strong>uma</strong> perspectiva individualizada, maso desejo do outro (provocado na relação com os colegas de trabalho, com osusuários), desejo de si próprio (vontade política individual, de autoconhecimento) edesejo do mundo, que tem a ver com <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> política e com <strong>uma</strong> disposiçãointerna, <strong>uma</strong> vontade política de não somente transformar o mundo, mas ver que setransformou a si mesmo. Observa-se a existência de <strong>uma</strong> dinâmica do desejo, deum engajamento coletivo e que essas são situações estudadas como um conjuntode processos articulados (CHARLOT, 2000).O desejo de saber e de aprender nas situações de trabalho é um desejo emrelação, em equipe, com o usuário. Uma relação em movimento que permite areflexão crítica, o que pressupõe romper com os medos, reconhecer os erros e,mesmo assim, continuar a busca por um <strong>no</strong>vo saber, um saber que transformou e,por isso, a <strong>serviço</strong> de <strong>uma</strong> mudança na realidade em que os sujeitos desejantes emrelação buscam o <strong>no</strong>vo.A compreensão por parte de um profissional que “errou” tem um significadoimportante, pois pode-se fazer <strong>uma</strong> relação com o autoconhecimento que oprofissional deve ter, não só sobre os seus aspectos emocionais, mas, sobretudo,aqueles limites e lacunas que possam existir quanto aos aspectos teóricometodológicos,técnico-operativo e também ético-político. Desejar a mudança, o<strong>no</strong>vo, a resolutividade, pressupõe a compreensão do que se deseja e do desejo deoutrem, para que, então, haja o comprometimento na busca de algo. Embora emalg<strong>uma</strong>s circunstâncias não se consiga concretizar o que é desejado, é fundamentalque a intenção desse seja enraizada por princípios éticos e políticos. Para queocorra <strong>uma</strong> mudança, conforme o explicitado pelos assistentes sociais é precisodesejar.5.2 A ESCUTA DA DEMANDA: A GERAÇÃO DE NECESSIDADES FORMADORASMais do que escutar, é preciso interpretar o que está sendo dito. Esta foi aidéia central defendida pelos assistentes sociais quando evidenciaram a importânciada escuta da demanda <strong>no</strong> âmbito da saúde. Esse aspecto foi reiterado por todos os


135assistentes sociais e, em especial, em alg<strong>uma</strong>s narrativas essa escuta significa <strong>uma</strong>habilidade necessária para que se possa construir estratégias de ação.(...) quando eu escrevi o projeto, muitas coisas foram se agregando a partirde <strong>uma</strong> escuta da demanda (...) que tu olha pra demanda, tu reflete e tu vêo que é mais necessário. Então, é <strong>uma</strong> coisa que não vem escrita; naverdade, ela vem vindo, e tu tem que ter esse olhar atento que tu mesmacoloca ali, tem que ter essa ação, essa reflexão, de querer fazer cada vezmelhor, e vê que essa necessidade, essa realidade, está te demandando,então a gente tinha que ter estratégias de ação (Beatriz).Emerge desse entendimento a importância da empatia que o profissionaldeve ter para escutar o que está sendo dito pelo usuário. A empatia pressupõedespir-se de preconceitos. É <strong>uma</strong> habilidade meio invisível, mas fundamental para aescuta profunda das necessidades dos usuários, que se materializam em forma dedemanda. No campo da saúde do trabalhador, o saber escutar permite ao assistente<strong>social</strong> <strong>uma</strong> leitura não só do que diz respeito à subjetividade do usuário, mas,fundamentalmente, dos processos sociais que estão em jogo nas situaçõesvivenciadas pelos trabalhadores afastados do trabalho. A compreensão exigeempatia por parte do profissional, e essa empatia, articulada com a <strong>dimensão</strong>teórica, permite ao mesmo apreender o que está sendo dito e o que estáacontecendo, de acordo com cada história de vida, como na experiência de Jane:Alg<strong>uma</strong>s situações que a gente recebia, por estar afastado por <strong>uma</strong> doençado trabalho, muito limitante, muito frágil, de casos de pessoas até comdepressão, além da questão de estar afastado do trabalho, de todo o roloque vem com a previdência e de poder ver as pessoas que estãoidentificadas com a morte, sem ânimo pra viver, e poder <strong>no</strong> processo dotrabalho tu poder ver as pessoas se transformando de <strong>no</strong>vo em um sujeito,deixando aquela depressão que não dá nem vontade de levantar, de nãoconseguir nem sair da cama o dia inteiro. Tu poder ver essas pessoasreconstruírem suas vidas, além disso, de eles estarem indo muito maislonge que tu propôs, então não sei se isso exemplifica, eu me prepareinesse processo.Eu acho que tem <strong>uma</strong> parte de empatia que é importante tuter. Poder entender realmente o que aconteceu, tu não ter preconceito, tutentar escutar profundamente as pessoas, eu acho que tem umconhecimento teórico que ajuda bastante, mas e acho que tem essa parte,meio invisível, que é como <strong>uma</strong> empatia..JaneA reflexão sobre as demandas postas aos assistentes sociais que atuam <strong>no</strong>âmbito da saúde, se dá de forma contextualizada, ou seja, salientam a importânciade compreender o contexto em que se inserem os usuários dos <strong>serviço</strong>s e osdeterminantes que irão definir as configurações dessas demandas, que advêm dasmúltiplas expressões da questão <strong>social</strong> vivenciadas pelos usuários. Observou-seque a escuta da demanda requer por parte dos assistentes sociais o conhecimento


136do perfil da comunidade, um reconhecimento das determinações históricas, sociais,econômicas, políticas e culturais da população do território da qual faz parte o<strong>serviço</strong>, o usuário e os profissionais da saúde. Essa aproximação crítica einvestigativa da realidade, como <strong>uma</strong> especificidade do Assistente Social, constituisecomo objetivo da profissão “que na área da saúde passa pela compreensão dosaspectos sociais, econômicos, culturais que interferem <strong>no</strong> processo saúde-doença”(BRAVO, 2006, p.212). O que é claramente evidenciado por Verônica, ao dizer que,(...) a gente trabalha na perspectiva de conhecer o perfil de cadacomunidade, e a demanda ela vem muito desse perfil, por exemplo, o localque eu trabalho é <strong>uma</strong> comunidade que tem muitos idosos, então vão virdemandas muito do envelhecimento, de saúde mental, então eu tenho quebuscar o suporte pra isso. E ai o suporte que não ta só na equipe, vai prarede, para os conselhos (...) (Verônica).A narrativa acima descrita <strong>no</strong>s remete à necessidade geradora de formaçãoque se dá de forma coletiva, pois o suporte para atender a demanda passa porprocessos coletivos de formação. Como pode-se analisar, Verônica faz referência àrede, aqui entendida como aquela formada pelos recursos e/ou demais <strong>serviço</strong>sdisponibilizados para atender as necessidades dos usuários, incluindo os conselhosde saúde, que também se constituem em espaços onde se pode “buscar suporte”, oque pressupõe ir além dos recursos existentes na própria equipe de trabalho.Observa-se <strong>uma</strong> apropriação por parte de Verônica, e também do grupo, comrelação à importância dos conselhos de saúde, como espaços “incorporados comoatividade integrante de seu trabalho” (BRAVO, 2006, p.209).Outro aspecto observado refere-se à diferença existente de <strong>uma</strong> demandaque chega em um hospital e a demanda que chega em um <strong>serviço</strong> de saúdecomunitária. Isso demonstra que a forma de analisar e de intervir junto à demanda édiferente, pois essa é mediatizada pelo tipo de organização do trabalho e pelaprópria estrutura institucional, que também demanda um determinado modo deintervenção profissional.Mas eu acho que <strong>no</strong> hospital a demanda chega muito focal. O fato da genteestar n<strong>uma</strong> comunidade, conhecer a história daquela família, conhecer atrajetória toda daquela pessoa que tu esta atendendo, isso tem a diferença,porque não vem a demanda imediata, ela vem <strong>uma</strong> demandacontextualizada e ai tu vai trabalhar de <strong>uma</strong> outra forma.Tem a ver com questão de como é organizado a forma de trabalho de cadalocal. Essa questão da demanda, a gente já discute há muito tempo. É oolhar que cada um tem, porque identificar a demanda é <strong>uma</strong> coisa, é pensar


137nela, é como tu vai intervir, como tu vai trabalhar <strong>no</strong> dia-a-dia, como que tupode qualificar isso? (Verônica).A discussão da demanda aparece relacionada com a forma de organizaçãodo trabalho e vai além de sua identificação. Uma coisa é reconhecer a demanda,outra é intervir, pois a demanda requer <strong>uma</strong> intervenção técnico-operativa. Há,ainda, aquilo que é da equipe e aquilo que é especificidade de cada profissão,evidenciando o que é responsabilidade individual e coletiva. Entretanto, mesmohavendo um destaque da diferença, pois ambas estão imbricadas, o que éespecifico e o que é geral, há <strong>uma</strong> totalidade, baseada em um projeto de promoçãode saúde coletiva, enfim, de atenção integral à saúde, que só ocorrerá a partir doentendimento daquilo que é específico de cada área.A gente discutir a demanda do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> é diferente de discutir ademanda do teu local trabalho, é diferente, entende. (Verônica).Resguardando a especificidade de cada profissão que atua na saúde, éimprescindível que o trabalho do Assistente Social articule os princípios do projetoético-político do Serviço Social e os princípios da reforma sanitária, pois “é semprena referência a estes dois projetos que se poderá ter a compreensão se oprofissional está de fato dando respostas qualificadas às necessidadesapresentadas pelos usuários” (BRAVO, 2006, p.213). Outro aspecto destacado <strong>no</strong>grupo refere-se à importância do registro das demandas que chegam ao <strong>serviço</strong>. Nanarrativa da Camila, observou-se que, mesmo com pouco tempo de exercícioprofissional <strong>no</strong> âmbito da saúde, a assistente <strong>social</strong> provocou <strong>no</strong> grupo <strong>uma</strong> reflexãosobre a importância dos registros dos assistentes sociais.Logo que eu cheguei <strong>no</strong> posto, eu fiquei me perguntando assim, quais sãoas demandas pro <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>? E isso eu senti falta, eu não sei se vocêsfazem, mas eu estou fazendo isso, e todos os dias que eu atendo eu voufazendo <strong>uma</strong> tabela de demandas, até pra saber o que eu tenho, que estãoprocurando. E eu acho importante também que a gente tenha essesencontros, por exemplo, <strong>uma</strong> vez por mês, pra que a gente traga essasdemandas, questões previdenciárias, violência domestica.. e que nem seicomo encaminhar e eu tava conversando com outra residente aqui, porquechegou ontem <strong>uma</strong> usuária e perguntou eu quero saber informações sobreesse programa tal aqui.. e disse: “ai vocês devem saber, né?” E nós <strong>no</strong>solhamos, a gente não sabia, e realmente eu pensei, a gente deveria saber,e eu achei interessante a gente começar apresentar as demandas, a gentetambém ter um espaço pra <strong>no</strong>ticias, porque nem todo mundo sabe, como agente não sabia. Então eu acho importante assim, a gente ter <strong>uma</strong>apresentação de demandas, procurar, pesquisar. (Camila)


138Os aspectos dos registros para que outro profissional possa tomarconhecimento das principais demandas foi ponto polêmico <strong>no</strong> grupo. A prática deregistros sobre as demandas dos assistentes sociais <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s, mesmo sendoreconhecidos como importante, constitui-se num nó crítico, pois não se evidencia ohabitual uso desse recurso <strong>no</strong> processo de trabalho do assistente <strong>social</strong>,constituindo-se, assim, em um obstáculo a ser superado, ou melhor, <strong>uma</strong> prática aser desenvolvida. Por outro lado, foi citado que as demandas <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s de saúdecomunitária são percebidas como demandas da equipe e a própria equipe deve daro suporte para o profissional que está ingressando <strong>no</strong> espaço, de acordo com a falade Carla:Mas as <strong>no</strong>ssas demandas são as demandas da equipe. A equipe todatrabalha com esta demanda, então não é o Serviço Social que vai secapacitar pra aquilo, é a equipe que tem que se capacitar pra aquilo, entãomesmo que saia essa assistente <strong>social</strong> a outra que chegar, a equipe vai daro suporte. (Carla)No aprofundamento da reflexão foi possível observar que o registro torna-serelevante, mas não para que outro profissional conheça por escrito a demandaexistente, até porque não há como realizar análise das demandas se não for em<strong>uma</strong> dinâmica que acompanhe as mudanças sócio-históricas vivenciadas pelapopulação de <strong>uma</strong> determinada comunidade. Muito mais do que isso, está aimportância dos registros se constituírem em um instrumento do processo detrabalho do assistente <strong>social</strong>, que pode ser um dispositivo sócio-histórico, quesubsidiará a reflexão da contextualização sobre as demandas dos espaços sócioocupacionais.Eu acho que é <strong>uma</strong> técnica para tu conhecer as pessoas que tu atende, eusei Verônica que a equipe vai trazer a demanda, mas eu acho que o que elatrouxe ali é importante, de se fazer <strong>uma</strong> tabela, por exemplo, eu precisovisualizar ali, qual foi a produtividade do meu trabalho, quais foram osencaminhamentos, não tanto pra eu saber, mas pra ter os registros, eu achoque eles servem pra tu repensar também a forma como tu está trabalhando,porque daqui a pouco... as demandas vão mudando aos poucos, mas ai tuvai se dar conta depois que já teve a mudança. (Camila)De <strong>uma</strong> forma geral, constata-se que o registro das demandas se constituinum instrumento do processo de trabalho do assistente <strong>social</strong>, apesar dacomplexidade existente em fazê-lo, em função das múltiplas expressões que seconstituem <strong>no</strong> objeto de trabalho profissional. Entretanto, há <strong>uma</strong> discussão sobre asua importância, ou melhor, sobre a efetivação possível desses registros, o que tem


139sido motivo de reflexão crítica para esses assistentes sociais. Observa-se <strong>no</strong> grupo<strong>uma</strong> predisposição de estudar a forma de documentar e/ou registrar as informaçõesdecorrentes da análise da conjuntura e da demanda do Serviço Social <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>sde saúde, de acordo com o que expressam os entrevistados:(...) eu acho importante os registros, porque hoje tu está lá <strong>no</strong> teu posto,amanhã tu sai, mas a comunidade permanece... (Camila)(...) eu achei interessante que a Tati trouxe essa questão de registrar asdemandas, porque a gente tava justamente há meses falando, quem sabe agente usa um Código de Identificação de Demandas- CID, outroinstrumento, para gente identificar qual é a demanda que o Serviço Socialvem atendendo. Eu achei interessante tu trazer isso, tu que entrou agora,mas a gente está há um tempão pensando isso. (Sofia)(...) é, mas ao mesmo tempo - a gente voltou ontem da reunião da equipedessaquestão do CID, acho que tem <strong>uma</strong> tendência do modelo de sempreempurrar o Serviço Social pra isso, vamos colocar um Código deIdentificação de Demandas. A gente está sempre nessa interrogação , qualé a demanda? (Rossana).(...) isso que é legal, quando tu recém inicia o trabalho, se dar conta disso(...), porque também o espaço de formação é quando tu entra <strong>no</strong> local detrabalho e inicia a análise da organização (Leandro).O hábito ou a habilidade de registrar instiga e subsidia o estudo do que écotidianamente vivido para além das percepções inéditas, desafiando o pensarsobre a realidade em que o profissional está inserido. Freire (1974) já referia que aprática de registrar <strong>no</strong>s leva a observar, a comparar, a selecionar e a estabelecerrelações entre fatos e coisas. O ato do registro exerce <strong>uma</strong> função <strong>formativa</strong> aomobilizar a capacidade de observar, desafiando as certezas sobre a própriaobservação. Escrever, então é como refazer o que está sendo pensado emdiferentes momentos de <strong>no</strong>ssa prática (FREIRE, 1974).Outro aspecto evidenciado que se origi<strong>no</strong>u da reflexão sobre as demandasdiz respeito à pesquisa, que é reconhecida como um instrumento importante a serutilizado <strong>no</strong>s processos de trabalho dos assistentes sociais, como forma deaproximação dos mesmos “ao movimento da realidade <strong>social</strong> concreta, às váriasexpressões da questão <strong>social</strong>, captadas em sua gênese e manifestações”(IAMAMOTO, 2001, p.52). A possibilidade de identificar e de conhecer as demandaspostas <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s de saúde é condição para prestação de um <strong>serviço</strong> de qualidadee com a resolutividade prevista <strong>no</strong> SUS.


140De acordo com o grupo, apesar de haver o reconhecimento das produções deconhecimento <strong>no</strong> âmbito do Serviço Social, que se dão através de investigaçõescientificas, a pesquisa como instrumento para atribuir um <strong>no</strong>vo estatuto à <strong>dimensão</strong>interventiva (IAMAMOTO, 2001) ainda é <strong>uma</strong> habilidade que tem que ser mais postaem prática <strong>no</strong>s espaços em que se desenvolve o processo de trabalho. A pesquisa éreafirmada como instrumento de trabalho:A Tati falou em demanda, demanda a gente sabe a forma que chega, agente talvez tenha que buscar a forma de se qualificar pra essa demanda,que ai bom (...) a pesquisa ela te ajuda a enxergar mais a fundo, então achoque esse é o diferencial, a equipe te traz a demanda, tu tem várias formasde atender a demanda, mas antes é preciso pesquisar.. (Verônica).(...) mas como instrumento de trabalho, mas não como algo fora, que ai tuvai pesquisar pra depois trazer o instrumento. (Leandro)(...) mas o primeiro passo para tu pensar em como dar conta da demanda, éidentificar qual é a <strong>dimensão</strong> e a pesquisa permite isso! (Camila).Mesmo não sendo possível apreender exemplos de pesquisas que foram ouestão sendo realizadas pelos Assistentes Sociais para compreender e/ou conhecer ademanda dos <strong>serviço</strong>s da saúde, evidencia-se a sua importância como instrumentode trabalho e a necessidade de seu uso.Cabe desvelar que as narrativas expressam a preocupação de como ademanda dos <strong>serviço</strong>s é atendida naquilo que é essencial na saúde, que diz respeitoà <strong>dimensão</strong> da integralidade do sujeito usuário do sistema. Atender a demandasignifica “a aproximação crítica, interpelante, funcionalmente desadaptada asrelações instituídas <strong>no</strong> trabalho e preocupada com a requalifcação dos coletivos detrabalho”. (CORREIA, 1996, p.14)Mesmo sendo preconizada a integralidade da atenção ao usuário <strong>no</strong> SUS,grande parte dos profissionais que atuam <strong>no</strong> sistema ainda não contemplam aintegralidade do olhar e da escuta ampliada ao que está sendo demandado pelousuário. A aproximação crítica sobre a forma como o usuário é atendido, apesar deser <strong>uma</strong> inquietação de <strong>uma</strong> determinada identidade profissional, <strong>no</strong> caso oassistente <strong>social</strong>, está <strong>no</strong> domínio das situações profissionais, pois ainda é vigente adisputa “do projeto da reforma sanitária e a reforma privatista” (BRAVO, 2006,p.211). Há um entendimento, por parte das assistentes sociais, de que o atendimento


141ou a resolutividade de um <strong>serviço</strong> se dá, sobretudo, na capacidade de atuaçãocoletiva dos profissionais da saúde,(...) o que mais tem me preocupado é a questão da forma como o usuário éatendido <strong>no</strong> <strong>serviço</strong>, porque a Unidade de saúde tem <strong>uma</strong> característicabem específica, ela é um <strong>serviço</strong> complexo, tem alguns reconhecimentos(...), reconhecido por <strong>serviço</strong>s de excelência e de formação, mas apesardisso ele não consegue dar <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> da questão da integralidade dopaciente, então esse trabalho em equipe, o trabalho interdisciplinar é muitodifícil de operacionalizar.(Julia)Pode-se constatar a existência de <strong>uma</strong> preocupação e de <strong>uma</strong> necessidadedos assistentes sociais de analisarem as configurações das demandas dos <strong>serviço</strong>sde saúde. Entretanto, não é somente a demanda que gera a necessidade deformação profissional, mas a escuta que o profissional faz ao contextualizar,problematizar e apreender as múltiplas expressões da questão <strong>social</strong> que semanifestam <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s de saúde e, portanto, são requisições técnico-operativas(SERRA, 2000). Há, nas experiências vivenciadas pelos assistentes sociais, umcompromisso com o resultado do trabalho, com a intervenção como forma degarantir o atendimento das necessidades dos usuários, principalmente <strong>no</strong> que dizrespeito aos seus direitos e a sua integralidade.Um conjunto de dispositivos que são pertinentes, da tríade conhecimento,habilidade e atitudes que caracterizam a competência desses profissionais, taiscomo as nuances – o desejo, a empatia sem preconceitos, os registros, a pesquisa,a interdisciplinaridade, a integralidade na atenção ao usuário do SUS – estãopresentes nas narrativas dos Assistentes Sociais dessa investigação. Isso <strong>no</strong>s fazcrer que é <strong>no</strong> exercício profissional que os Assistentes Sociais vêm rompendo com otrabalho fragmentado, predominando a visão generalista, tão necessária para aatuação <strong>no</strong> campo da saúde.5.3 OS DETERMINANTES DA DINÂMICA ORGANIZACIONALAs condições e as relações de trabalho em que se inserem os assistentessociais articulam um conjunto de mediações que atravessam e interferem naoperacionalização da ação e, conseqüentemente, <strong>no</strong>s resultados individuais enaqueles coletivamente projetados (IAMAMOTO, 2002). Percebe-se nessainvestigação, que há, entre os assistentes sociais, <strong>uma</strong> consciência crítica com


142relação à influência da dinâmica organizacional, caracterizada por diferentespadrões de relações de trabalho, que podem favorecer ou não a criação de espaçoscompartilhados para a aprendizagem e a formação profissional <strong>no</strong> âmbito dos<strong>serviço</strong>s de saúde. “O contexto de trabalho é reconhecidamente um espaço-tempode produção de identidades” (SOUZA, 2007, p.93), pois nas discussões do grupofocal, os assistentes sociais reconhecem que são nesses contextos que sedesenvolvem dinâmicas e interações que potencializam ou limitam as possibilidadesde estruturação de desejos e do projeto profissional.Por outro lado, as diferenças existentes entre os saberes, as especificidadese as identidades, entre outros aspectos, de acordo com cada situação e com ossujeitos envolvidos, são reconhecidas por esse grupo como dispositivos paramudança, ou melhor, dispositivos reconstrutivos, o que demonstra <strong>uma</strong> ruptura dosprocessos cognitivos, ou seja, <strong>no</strong>s modos de pensar a organização do trabalho(Correia,1996). Isso quer dizer, conforme ilustra o depoimento de Beatriz, que existeum modo de pensar que contribui para a superação de obstáculos comumenteidentificados, como, por exemplo, as diferenças existentes entre os profissionais.(...) tem a ver com o processo de trabalho, a forma como estãoorganizados os <strong>serviço</strong>s, a dinâmica (...) Na dinâmica organizacional asrelações de trabalho , a forma, os padrões favorecem ou não aaprendizagem, a partilha, e, dessa forma, as diferenças são dispositivosreconstrutivos.A abordagem sobre a dinâmica de <strong>uma</strong> organização contempla, nessapesquisa, os espaços <strong>social</strong> e político, ou seja, considera, em suas análises, aorganização do processo de trabalho, a elaboração das políticas administrativoorganizacionaise a prática cotidiana em relação (FISCHER, 1987). As instâncias deanálise aqui discutidas, foram agregadas a esses três aspectos com a intenção dedesvelar a complexidade que os mesmos, empiricamente observados, são tratadosentre os assistentes sociais inseridos com e na dinâmica organizacional dos <strong>serviço</strong>sde saúde.O primeiro aspecto refere-se à prática cotidiana em relação e à forma comoum profissional é valorizado ou respeitado na equipe, tanto <strong>no</strong> momento de ingressona atividade quanto <strong>no</strong> processamento da ação cotidiana. Isso é evidenciado a partirda relevância do acolhimento entre os pares, da maturidade profissional e do


143respeito às diferenças, que tornam-se dispositivos relacionais para que sedesencadeiem processos formativos <strong>no</strong> âmbito do trabalho.Logo que entrei na secretaria de saúde, eu tive que realmente aprendermuita coisa em pouco tempo. Eu tive a felicidade de ter <strong>uma</strong> assistente<strong>social</strong> que trabalhava <strong>no</strong> <strong>serviço</strong>, que entendeu bem, me acolheu, nãopensou que eu estava li ocupando o espaço dela. Eu acho que poderia tersido complicado, vai muito do perfil, <strong>no</strong> caso dessa colega ela é <strong>uma</strong>pessoa extremamente generosa, por perfil pessoal, e a gente acabou tendo<strong>uma</strong> relação afetiva bem legal. Mas <strong>no</strong> espaço do trabalho ela conseguia,eu e ela na <strong>no</strong>ssa relação de trabalho, conseguimos estabelecerexatamente os <strong>no</strong>ssos pontos de convergência e de divergência, etrabalhar isso de <strong>uma</strong> forma natural, do próprio trabalho e de crescimentoprofissional também. (Júlia).O segundo aspecto trata das diferenças da organização dos processos detrabalho dos <strong>serviço</strong>s de saúde, entre elas a área hospitalar e a saúde comunitária,como, por exemplo, a Residência Integrada em Saúde- RIS 43 , programa em queassistentes sociais e outros profissionais são orientadores e tem como desafioampliar as possibilidades educativo-participativas do trabalho em saúde. É <strong>no</strong>tória acompreensão que os assistentes sociais possuem sobre o modo como se verificamas relações de trabalho na realidade concreta e as origens das características e dastendências de padrões e das formas utilizadas para organizar os <strong>serviço</strong>s <strong>no</strong> SUS.O processo de trabalho das unidades vinculadas à Residência Integrada emsaúde está organizada para dar conta da formação em <strong>serviço</strong>, desenvolvida sob aótica da interdisciplinariedade e da h<strong>uma</strong>nização da atenção, propiciando melhoratenção à saúde dos usuários que procuram atendimento desses profissionais, poisassim serão vistos em sua integralidade. Nessas experiências observa-se, também,a produção i<strong>no</strong>vadora de ensi<strong>no</strong> em <strong>serviço</strong> entre profissionais de diversasformações, o que contribui com a superação de saberes identitários rígidos,fechados, na medida em que possibilita abertura aos diversos campos deconhecimento. Quando da narrativa sobre <strong>uma</strong> experiência de educaçãopermanente vivenciada <strong>no</strong> processo de trabalho, logo emergem as vivências na RIS.A primeira coisa que me vem na cabeça é o início da residência integradaem saúde <strong>no</strong> <strong>serviço</strong>, isso para mim foi o que marcou a minha história43 A RIS tem como objetivo especializar profissionais de diversas profissões da saúde, através daformação em <strong>serviço</strong>, parar atuar em equipe de forma interdisciplinar e resolutiva, além de fornecersubsídios para a realização de pesquisas <strong>no</strong> âmbito do SUS, desenvolvendo capacidades de analisare propor ações visando alcançar a integralidade, a universalidade e a equidade na atenção à saúdecom participação <strong>social</strong>. (RIS-GHC, 2003, p.4).


144profissional <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s. Ela começou há quatro a<strong>no</strong>s e que eu refletiprofundamente sobre a minha inserção profissional <strong>no</strong> <strong>serviço</strong> e me fezvoltar a olhar o <strong>serviço</strong> assim criticamente, para estudar, para refletir, paratudo. (Carla).O grupo, a partir da fala de Carla, instaurou um processo de reflexão críticaacerca da organização dos processos de trabalho, e foi possível identificar asdificuldades existentes <strong>no</strong>s espaços sócio-ocupacionais mas, sobretudo, quantoàquilo que é atribuição ou competência do Assistente Social. Essa última expressa“a capacidade para apreciar ou para dar resolutividade a determinado assunto, nãosendo exclusivas de <strong>uma</strong> única especialidade profissional, mas a ela concernentes,em função da capacitação dos sujeitos profissionais” (IAMAMOTO, 2002, p.16).A estrutura rígida que caracteriza a organização de alguns hospitais, assimreconhecida pelos participantes dessa investigação, contribui para que cheguem aoServiço Social demandas que, necessariamente, não requerem a intervençãotécnico-operativa de um assistente <strong>social</strong>, podendo ser atendida por outroprofissional ou funcionário do quadro. Há aí um indício de um obstáculo a sersuperado, não somente quanto à objetividade, <strong>no</strong> que diz respeito à especificaçãodas atribuições do assistente <strong>social</strong> na área hospitalar, mas, fundamentalmente,quanto à forma como está organizado o <strong>serviço</strong> de <strong>uma</strong> equipe hospitalar, como porexemplo:Eu senti o contrário, acho que dentro do hospital a gente faz muito maiscoisas não específicas do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> do eu que especificas é <strong>uma</strong>estrutura muito rígida, que tem coisas que alguém precisa fazer, e acabarecaindo pro <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, mas que não necessariamente precisaria deum assistente <strong>social</strong> pra fazer aquilo, então ai me chamou a atençãoquando tu falou isso, e realmente eu concordo a minha vinda a saúdecomunitária, eu pedi a transferência pra cá, também marca isso para mimde realmente me sentir mais trabalhando como assistente <strong>social</strong>, apesar delá ter o setor do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, tudo muito mais especifico eu sinto que otrabalho na comunitária, aqui sim eu estou fazendo o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, lá asvezes eu fazia, as vezes não. (Sofia)Dentro da dinâmica da organização do trabalho na área hospitalar há umentendimento das fragmentações existentes, das profissões atuando isoladamente,contrapondo-se à prática interdisciplinar. Na ausência do Assistente Social, porexemplo, observa-se que, em alg<strong>uma</strong>s situações, o atendimento da necessidade dousuário fica comprometido, pois ele só pode ocorrer na presença desse profissional.Na narrativa de Sofia é explicitado o quanto o Assistente Social é reconhecidoinstitucionalmente em sua forma identitária, por ser o profissional que faz a


145interlocução com a família. Sofia faz <strong>uma</strong> reflexão comparativa da dinâmica dotrabalho na saúde comunitária e hospitalar.(...) tiveram situações que tinham pessoas na emergência esperandodesde a <strong>no</strong>ite passada para alguém tentar localizar o familiar, tentava acharpelo <strong>no</strong>me, pelo 102, perguntava aonde a pessoa morava, se não tinhatelefone, tentava ligar para o vizinho, então eu não acho que precisaria deum assistente <strong>social</strong> pra fazer isso! O usuário espera às vezes o fim desemana inteiro para alguém fazer isso e, muitas vezes, eram coisas assim.Mas não só isso! Claro, em função de ser um hospital, acho que tinhamtrabalhos que era do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, mas muito eram essas coisas, quequalquer outra pessoa podia fazer, bastava ter vontade. E ai como ohospital tem essa coisa mais fragmentada, quem faz o quê? Alguém tinhaque fazer aquilo, e acabava caindo para o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> e acho que issotambém diferencia muito na saúde comunitária, que já não é tãofragmentado, é <strong>uma</strong> equipe que trabalha mais próxima, é interdisciplinar,então essas coisas mais não administrativas, mais de informação, isso ficamais <strong>social</strong>izado. (Sofia).Seguindo esse modo de pensar e de agir ilustrado na fala de Sofia, pode-sedizer que a organização do processo de trabalho <strong>no</strong>s <strong>serviço</strong>s, em que sedesenvolve a RIS, permite e facilita o atendimento das necessidades em saúde, poishá <strong>uma</strong> superação de saberes identitários e o reconhecimento da formação em<strong>serviço</strong>. Além disso, é instituída a importância de <strong>uma</strong> escuta ampliada quanto ao“processo saúde-doença-cuidado-qualidade de vida”. Ao que tudo indica, até aqui,há <strong>uma</strong> preocupação e um compromisso comum entre os trabalhadores que atuam<strong>no</strong> âmbito da saúde comunitária, que é a articulação com o projeto da reformasanitária, segundo a percepção que Sofia e Carla trazem em suas narrativas parareflexão <strong>no</strong> grupo focal:(...) na comunitária, tem coisas que não é de ninguém, mas que é de todomundo, sempre digo isso, tem atribuições aqui dentro que não é deninguém, não é especifico do médico, mas que é da equipe, e a gentecomo faz parte da equipe, pensa: bom também é <strong>no</strong>sso! Então, é mais oume<strong>no</strong>s isso, as coisas se diluem mais, mais aqui também na comunitáriaque também. (Carla).Eu acho interessante vocês colocarem que trabalharam <strong>no</strong> hospital, euachei bem nítido assim, quando a Sofia fala que quando está <strong>no</strong> hospital émais específico, eu entendi ela. Ela quis dizer que é mais fechado. Porquebom, eu chego lá e eu faço isso e aquilo, ponto. E na comunitária, comotem aquela coisa de ter que trabalhar muito mais na promoção a saúde, euacho mais complicado, porque ai sim eu acho que desencadeia isso deestar refletindo <strong>no</strong> próprio processo de trabalho, está criando propostas,pra estar atendendo a necessidade. É mais desafiador é mais complicado.Aqui eu acho mais difícil, necessariamente tu não tem como ter <strong>uma</strong> práticaautomática, tu tem que sempre estar refletindo, vendo propostas <strong>no</strong>vas, apartir de <strong>uma</strong> dificuldade, tem que pesquisar. (Marlene).


146Há, contudo, <strong>uma</strong> compreensão <strong>no</strong> grupo de que os níveis de atenção naárea hospitalar e na saúde comunitária são diferentes, como refere Karen: “adinâmica é diferente”. Os <strong>serviço</strong>s nas unidades de saúde se dão num espaçopropositivo, que facilita a aproximação e a abertura entre os diversos campos dosaber.Mas acho que tem a ver com os níveis de atenção, o hospital está numpapel de dar <strong>uma</strong> resposta, e na questão primária a gente ta em umespaço propositívo, não de dar respostas, mas de propor alg<strong>uma</strong> coisa, eacho que isso talvez faça a gente se aproximar mais, de outros saberes, deoutros conteúdos, enfim. O objetivo do trabalho é diferente, e isso gera<strong>uma</strong> demanda diferente, apesar de ter os mesmos princípios (...) e amesma questão <strong>social</strong> apresentada. (Leandro).Observa-se que as “situações vividas pelos profissionais de saúde ocorrem<strong>no</strong> quadro de organizações sociais, pelo que a <strong>dimensão</strong> organizacional atravessanecessariamente as práticas profissionais, bem como o seu processo formativo”(CANÁRIO, 2003, p.132), que se dá através da interação entre os profissionais. Énessa perspectiva que salienta-se, <strong>no</strong> grupo, que o hospital também possibilita aaproximação com outros saberes e, portanto, pode constituir-se em um lugar deformação. É também identificada <strong>uma</strong> forte ligação com a compreensão atribuída àconcepção de saúde que os profissionais possuem.(...) eu acho que o hospital também propicia que a gente faça isso, não esó na comunitária, trabalhar na saúde em qualquer lugar é muito dinâmico,e tu podes experienciar isso em outros espaços da saúde, eu acho queisso tem a vê com a formação da gente, com o entendimento que a gentetem de saúde, o conhecimento, e tu vai trabalhar em qualquer lugar. Achoque tem espaços na hospitalar e na comunitária para fazer isso. Eu achoque na comunitária a gente fica mais exposto. (Carla).A narrativa de Carla traz à tona <strong>uma</strong> reflexão pertinente, quando se trata dascontradições existentes na dinâmica de <strong>uma</strong> organização e das possibilidades deformação, desde que se tenha clareza das concepções de saúde fincadas empreceitos democráticos, universais e de direito do cidadão.Talvez <strong>uma</strong> questão de limite <strong>no</strong> hospital, seja a estrutura de poder, maisrígida que <strong>no</strong> posto, isso traz <strong>uma</strong> conseqüência negativa pro trabalho, mastambém é um espaço de intervenção e de formação. Nossa se a gentepuder mexer nas estruturas e a gente se ausenta disso e assume aquelepapel que é atribuído, então essa caixinha aqui que é do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>. Ecomo a Unidade de saúde tem até <strong>uma</strong> dinâmica mais democrática de seassumir as ações em conjunto, que por um lado pulveriza a ação doassistente <strong>social</strong>, mas por outro facilita na compreensão de tu quererimplementar <strong>uma</strong> coisa diferente que <strong>no</strong> hospital não tem. (Leandro).


147Assim, há <strong>uma</strong> compreensão de que a estrutura de poder organizacional podetrazer conseqüências negativas para o desenvolvimento do trabalho. Há, entretanto,um espaço de interlocução e, portanto, de formação, inclusive na área hospitalar.O hospital tem um diferencial, <strong>uma</strong> demanda muito grande, frente aonumero de profissionais que a gente tem, então realmente não é o local, eufico babando aqui quando vocês falam,porque quando eu entrei nainstituição hospital de clínicas, a minha visão era de um hospital aonde agente pudesse fazer prevenção, que hoje a gente encontra muito mais ocurativo. Então não se tem muito tempo pra fazer investimento nessa área,tanto de trabalho, de trocas, ou de obter informação, é difícil sair pra <strong>uma</strong>reunião, porque dificilmente a gente tem horários, é extremamente rígidonesse sentido, principalmente <strong>no</strong> que eu faço que é atendimento <strong>no</strong> plantão.(Helena).Reconhecer a presença de <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong>s hospitais, mesmona ausência de <strong>uma</strong> estratégia unificadora e da estrutura de poder mais rígida, nãosignifica prever, <strong>no</strong> seu interior, um conjunto de ações pontuais de formação, mas,sim, otimizar as potencialidades existentes em <strong>uma</strong> organização hospitalar(CANÁRIO, 2003), criando oportunidades educativas por meio da interação entre osprofissionais em atuação e com os próprios usuários. É nessa interação que pode sedar a formação e a mudança na estrutura organizacional, pois são justaposiçõesfundamentais para a construção de um hospital formador. Como exemplo,evidenciamos a narrativa de Helena, em um Hospital também reconhecido por suapolítica educativa.Uma das grandes dificuldades que a gente encontra <strong>no</strong> hospital éjustamente com aquele paciente em fase terminal que a família não aceita eo hospital está muito preocupado com esta situação e está montando <strong>uma</strong>enfermaria, ou <strong>uma</strong> unidade para pacientes terminais. Então é <strong>uma</strong>preparação para o paciente e para a família, pra aceitação da morte. Paraisso então se reuniu o Serviço Social, a Psicologia, e a enfermagem e agente ta fazendo todo esse processo de obter informações e de montagemdessa unidade. Então isso é <strong>uma</strong> vivência bem atual, claro que a gente temdificuldades e<strong>no</strong>rmes, pois temos que buscar informações da área médica,da enfermagem, de cuidados. Então é <strong>uma</strong> troca que está existindo, essaunidade ainda está em formação, a gente ta buscando então não só na áreado <strong>serviço</strong> Social de que forma esse processo pode ser desenvolvido dentrodesse aspecto do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, de apoio, de garantia de direitos, mas juntocom outras áreas. (Helena).Outro aspecto relevante sobre a intervenção dos assistentes sociais refere-seao espaço-tempo da estrutura hospitalar. Tem-se um tempo para localizar <strong>uma</strong>família de um paciente, aproximá-los, repensar vínculos e tem-se o tempo dainternação, que é um determinante na dinâmica do processo de trabalhoprofissional, e esses são fatores que irão influenciar <strong>no</strong> resultado do trabalho. É


148diante dessas situações postas que surge a necessidade de reflexão sobre oprocesso de trabalho e suas dimensões: Qual é o objeto? Quais são os objetivos?Que estratégias acionar para incidir na situação? Que tempo tenho? Quais são oslimites e como superá-los? Enfim, são reflexões cotidianas presente na práticaprofissional.(...) às vezes a gente tem um paciente que é morador de rua, até tu achar afamília dele, o cara vai morrer. Ai tu tem um tempo para achar a família, ai tuacha, ai em 10 dias tu tem que trazer a família para ver o familiar, repensaro seu vinculo, é um trabalho super importante e a gente acaba aprendendocom isso. (Sofia).(...) acho que tem a ver com o grau de complexidade do lugar que tu estátrabalhando, e do limite disso, e não significa que quem trabalha em hospitalfaça me<strong>no</strong>s do que um assistente <strong>social</strong> da comunitária, mas se faz numlimite diferente, a partir daqui eu vou trabalhar em rede, eu não precisoresolver aqui, tu faz o que permite o tempo da internação. (Carla).O terceiro aspecto relaciona-se com a importância atribuída à administraçãoorganizacionale ao modo de gestão na saúde, que pode proporcionar <strong>uma</strong> reflexãosobre os processos de trabalho para que se possa instituir programas e projetos queatendam aos princípios do SUS. No âmbito político, deveria haver um compromissode todo o gestor de <strong>uma</strong> política <strong>social</strong> com a população, ou seja, o exercício dagestão do SUS deveria estar voltado para o interesse público. Para exemplificar ocomprometimento com a população usuária, Beatriz narra a sua vivência junto àimplementação do Projeto Acolhimento na saúde pública e afirma o apoio político dagestão municipal em um determinado momento de sua trajetória, o que foifundamental.(...) dificuldades políticas, muitas(...) teve um momento nesse projeto, antesdessa gestão, que ele ia muito devagar, ai quando entrou outra secretária eachou que era um projeto de gover<strong>no</strong>, ele andou que era <strong>uma</strong> beleza, e agente nem tinha verba... E eu achei um super ganho naquele momento,porque se transformou em <strong>uma</strong> outra relação de trabalho, e assim asequipes passaram a envolverem-se nesse processo, que é um processo degestão.Observa-se na narrativa de Beatriz, que vivenciou sua experiência junto a<strong>uma</strong> política de desenvolvimento dos trabalhadores da saúde, que odesenvolvimento do seu processo de trabalho tinha como intenção a articulação dasequipes de saúde, mobilizando-as, criando espaços compartilhados de discussão ede reflexão sobre os processos de trabalho nas equipes. Para que o Programa deAcolhimento fosse instituído, era necessário desencadear um conjunto de ações que


149pudessem rever a forma como o trabalho estava organizado, a partir da reflexãosobre o processo de trabalho.Também, mas era muito também de organização de trabalho. Era processode trabalho mesmo, a gente fez um livro depois, o que a gente colocou narealidade era um processo de gestão, um processo de trabalho, a categoriacentral, era o processo de trabalho mesmo. E a gente quis trazer essascategorias para o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, a realidade <strong>social</strong>. Das coisas positivas aofazer o mapa falante, <strong>uma</strong> médica se deu conta das realidades em queestava inserida, que tinham pacientes da vila de classe média e a outra eramiserável, e ai ela não entendia porque que ela não conseguia dar aquelamedicação para aquela criança, porque ela não entendia aquela linguagem.Ela não tinha olhado para realidade, o que estava atrás das 4 paredes, e agente dizia que acolhimento não se dá só através de 4 paredes, e era esse<strong>no</strong>sso discurso mesmo. E a questão de como se formava vínculo, se eledava dependência se dava auto<strong>no</strong>mia, isso tudo se dava através dasoficinas, de construção a partir da realidade das pessoas. (Beatriz).Aqui fica explicitada a importância da mediação do assistente <strong>social</strong> entre asdemandas que resultam das condições de vulnerabilidade <strong>social</strong> a que estásubmetida a população usuária, e as demandas postas pela própria organização,responsável pela implementação das políticas sociais, <strong>no</strong> caso, o SUS. Pois, se tratade um Programa que diz respeito à forma como o usuário é atendido <strong>no</strong> sistema, ede um profissional cujo exercício está permeado pelas tentativas de equacionar osdireitos dos usuários à saúde e de buscar a promoção da resolutividade dos <strong>serviço</strong>sprestados e que, portanto, depende da articulação dos diferentes saberes e fazeres.Por outro lado, o modo de gestão pode se tornar um obstáculo para que seinstaure espaços educativos a partir da reflexão critica do próprio processo detrabalho. No campo da saúde pública a mudança de gestores tem sido um obstáculopara que os programas de formação profissional ou da política de educação <strong>no</strong>trabalho, protagonizada pelo Ministério da Saúde, em particular a Secretaria deGestão e trabalho, seja posta em prática. Não se pode negar a importância da áreada gestão do trabalho, das pessoas, ou ainda, a comumente conhecida área deRecursos H<strong>uma</strong><strong>no</strong>s. Entretanto, nem sempre os espaços públicos promovem açõesque viabilizam a formação dos trabalhadores na saúde, como o vivido por Adriana.(...) o obstáculo que eu vejo, é que a secretaria da saúde hoje tem passadopor um processo de muitas mudanças de gestores o que inviabiliza acontinuidade desses projetos, muitas mudanças num curto período detempo ai tu tem que parar, explicar, voltar de <strong>no</strong>vo. Eu diria que atualmentea gente não tem projeto político nenhum na secretaria da saúde e <strong>no</strong>stemos dois a<strong>no</strong>s e meio dessa gestão, <strong>no</strong>s já tivemos, estamos <strong>no</strong> quartocoordenador, <strong>no</strong>s estamos já algum meses sem definição de coordenação,


150é <strong>uma</strong> área que é pouco valorizada, a área de Recursos H<strong>uma</strong><strong>no</strong>s.(Adriana).Entretanto, a falta desse reconhecimento por parte de gestores não podeamarrar a vontade e o compromisso dos profissionais com a política de saúde,tampouco com a necessidade de buscar <strong>no</strong>vos saberes para colocá-los em uso a<strong>serviço</strong> da população usuária da saúde. Essa possibilidade de buscar as brechas enelas se inserir, para na lida do dia-a-dia poder reinventar formas de superarobstáculos que são pertinentes desse contexto sócio-histórico das estruturasorganizacionais, constitui-se n<strong>uma</strong> competência aos Assistentes Sociais, <strong>no</strong>s dias dehoje. É <strong>no</strong>s espaços institucionais minados de disputas de saber e poder que deveseacionar as estratégias de resistência e garantir a participação coletiva, que é <strong>uma</strong>forma de fortalecer a identidade profissional de consolidação de um projeto políticocomprometido com a garantia dos direitos.(...) eu penso que nós assistentes sociais temos que buscar as brechas quese tem com alguns projetos que se consegue fazer. Eu não acredito n<strong>uma</strong>coisa muito a nível grande, eu acho que são em espaços peque<strong>no</strong>s algunstrabalhos que tu faz. Eu acredito que tenham espaços que a gente tem quereinventar. Eu acho que nós temos um espaço <strong>no</strong> qual eu faço parte, que éum espaço de resistência da atual gestão que seria o comitê deh<strong>uma</strong>nização, onde eu represento a equipe de desenvolvimento. Avalio queé um espaço que tem sobrevivido, é um grupo aonde tem pessoascomprometidas, ele não tem <strong>uma</strong> auto<strong>no</strong>mia. Acho que ele é um espaçoque foi instituído e nós estamos aproveitando este espaço para dar umcorpo nesse grupo No momento que ele criar um corpo não tem mais comoa gestão desmontar e esse grupo têm três assistentes sociais que fazemparte, que são bastante comprometidas e inseridas na saúde publica. Entãoeu acho que é isso que <strong>no</strong>s temos que fazer, encontrar esses espaçoscomo esse grupo que eu faço parte, que ele vai pelas bordas seconstituindo e criando como um corpo, que está tomando forma, que nãopossa ser destituído. Nós tínhamos um núcleo de educação permanenteonde tinha <strong>uma</strong> representante de direito de cada <strong>serviço</strong>, era um núcleo queagilizava e discutia as capacitações de toda secretaria e que com essa <strong>no</strong>vagestão, tentou se manter, mas por determinação da secretaria ele foiterminado, suspenso. (Adriana).É interessante observar o quanto a narrativa de Adriana expressa um espaçode criação ocupado pela profissional, pois é dessa brecha que emergem asestratégias metodológicas adotadas pela mesma, para <strong>uma</strong> intervenção crítica epropositiva. Esse é o jeito, o como a Adriana faz educação permanente. O processode trabalho dessa assistente <strong>social</strong> é atravessado de histórias, de experiências, dequestionamentos, de resistências e de dispositivos coletivos. Nesse sentido,evidencia-se a defesa, o aprofundamento e a consolidação da cidadania e da


151democracia, da <strong>social</strong>ização e da participação, conforme princípio do código de éticaprofissional em sintonia com a efetivação do SUS.5.4 A PARTILHA DOS SABERES: EM RELAÇÃOA educação, nesse estudo empírico, é pensada como experiência vivida porsujeitos envolvidos em processos formativos, cujo sentido, atribuído aos mesmos,possibilita a construção de si e do mundo, por isso “empenhado n<strong>uma</strong> experiênciaque ele partilha com outros seres h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s” (CHARLOT, 2004, p.19). A partilha dossaberes <strong>no</strong> trabalho surge nas narrativas dos assistentes sociais como algoimbricado nas experiências vividas de educação permanente na saúde, pois a“relação destes profissionais com o saber implica <strong>uma</strong> atividade do sujeito”(CHARLOT, 2000, p.78), que é exercida junto a <strong>uma</strong> política pública de saúde.Sabe-se que não é fácil a tarefa de criar um clima propício à partilha dossaberes e de reflexão sobre situações complexas e contraditórias do trabalho e,fundamentalmente, admitir que se necessita de ajuda. O que dá sentido à educaçãopermanente é o diálogo entre os profissionais de <strong>uma</strong> equipe, a análise rigorosa doprocesso de trabalho, das intervenções e a procura coletiva de melhores formas deagir através da interlocução dos saberes.Nesse contexto, as fronteiras dos saberes, ao serem rompidas, possibilitam<strong>uma</strong> compreensão do que é especifico de cada profissão, reconhecendo-se suasatribuições e particularidades técnico-operativas. É na articulação dos diferentessaberes que se pode buscar atender as necessidades dos usuários. A relevânciaatribuída às fronteiras dos saberes e o impacto <strong>no</strong> atendimento aos usuários éenfatizada na fala de Sofia:Na prática acho que aparece o quanto essas fronteiras entre os saberes sãocomplexas. Para mim o que marcou antes de entrar na saúde comunitáriafoi a residência em saúde mental que foi <strong>uma</strong> residência multiprofissional.Eram <strong>no</strong>ve mulheres na residência e cada <strong>uma</strong> com <strong>uma</strong> profissãodiferente, e todas passaram por <strong>uma</strong> crise profissional, porque era assim aassistente <strong>social</strong>, com a enfermeira, com a professora de educação física,fazendo <strong>uma</strong> oficina de dança, então o que é de quem, e trabalhar com aquestão de direitos não era só coisa minha também. Acho que a criseprofissional segue, mas que a gente começou a se dar conta de o que <strong>no</strong>sdiferenciava era muito mais <strong>uma</strong> questão do olhar, do que um dispositivo deoficina de grupo... Essa coisa de está realmente articulando com outrossaberes, quanto mais próximos de outros saberes, mais os usuários se


152beneficiam, porque tu consegue também identificar, tu conhece o trabalhodo outro, tu consegue identificar que atendimento seria importante paraaquele usuário (...) Eu trabalhei 6 meses <strong>no</strong> hospital psiquiátrico, foi minhaprimeira experiência profissional, e a demanda institucional era <strong>uma</strong> coisalouca. (Sofia) (Todos riem!)Observa-se que são as “diferenças de especializações que permitem atribuirunidade à equipe, enriquecendo-a e ao mesmo tempo preservando aquelasdiferenças“ (IAMAMOTO, 2002, p.41). A equipe, nesse exemplo, condensa <strong>uma</strong>unidade de diversidade que vai determinar a qualidade e/ou a resolutividade dos<strong>serviço</strong>s prestados. Na narrativa de Sofia fica claro que, mesmo o Assistente Socialpartilhando com outros profissionais <strong>uma</strong> “oficina de grupo”, ele dispõe de um ângulode observação, pois trata-se de <strong>uma</strong> “questão do olhar”, que se diferencia dosdemais. Esse “olhar” tem a ver com a capacidade que o assistente <strong>social</strong> tem decompreender o quanto os aspectos econômicos, sociais e culturais interferem <strong>no</strong>processo saúde-doença, e, ao enunciar esses aspectos junto à equipe, disponibilizasaberes e os direciona, para que o enfrentamento dessas questões ocorra por meiode um trabalho coletivo.O trabalho em equipes interdisciplinares é destacado pelos AssistentesSociais ao narrarem experiências de partilhas de saberes e de processos formativosa partir dessas vivências. Assim, o trabalho coletivo não impõe a diluição decompetências e de atribuições profissionais, mas, ao contrário, “exige maior clareza<strong>no</strong> trato das mesmas e o cultivo da identidade profissional como condição depotencializar o trabalho conjunto” (IAMAMOTO, 2002, p.41). Na narrativa que segueé <strong>no</strong>tória a diferença existente <strong>no</strong> trabalho interdisciplinar na formação de umprofissional.E ai eu estava pensando assim, o que me chama atenção, o que mudouestar aqui hoje, e quais são as questões que fazem a diferença na minhaformação. Eu tive <strong>uma</strong> experiência em trabalhar com assistentes sociais nasaúde pública, depois a experiência <strong>no</strong> Hospital, e o que mudou pra mim,que é marco, o primeiro marco histórico na minha mudança, foi a minhainserção em <strong>uma</strong> equipe interdisciplinar. Isso fez <strong>uma</strong> diferençaimpressionante, tanto comigo mesma, quanto do local de trabalho, entãotodas as questões, as demandas que vão chegando de <strong>uma</strong> forma maisampliada, fez com que eu repensasse o meu trabalho, a partir da demandae a partir do processo de trabalho daquela equipe. Então antes da chegadaa residência, bem importantes, teve situações de conflito na comunidade. Lána floresta aonde eu trabalho, <strong>uma</strong> situação muito complicada, e a genteteve que sentar, discutir, planejar, pensar, ter <strong>uma</strong> estratégia de trabalho,pra poder conseguir manter <strong>uma</strong> relação legal com a comunidade. E a genteteve que repensar o trabalho a partir de <strong>uma</strong> situação vivida, isso foi beminteressante. É um exemplo de situações, que a gente teve que repensar a


153prática. Eu acho que o marco para mim é a troca na equipe interdisciplinar.Ela te exige de <strong>uma</strong> outra forma de trabalhar, tu tem que te colocar, tu temque buscar, tu está ali com o papel de assistente <strong>social</strong>. A gente trabalhamuito com discussões de caso, em alg<strong>uma</strong>s situações, às vezes, assituações mais extremas, <strong>no</strong> caso de saúde mental, <strong>uma</strong> situação maiscomplexa, a equipe senta e discute, tu tem que estudar aquela situação. Porexemplo: <strong>uma</strong> paciente extremamente agressiva e a gente teve que tentarentender o contexto que estava vivendo aquela paciente, a situação desaúde mental dela, pegar e estudar, como que é a situação dessa paciente,que situação ela está, que estratégia que <strong>no</strong>s podemos ter pra conseguirtrabalhar com ela. E hoje ainda é difícil. São situações do dia-a-dia, de <strong>uma</strong>complexidade muito grande, então tu tem que buscar esses elementos, naequipe, <strong>no</strong>s teus conhecimentos, e <strong>no</strong> conhecimento das outras áreas, é<strong>uma</strong> dinâmica diferente a saúde comunitária, ela te exige isso. (Verônica).Como se pode verificar, os exemplos narrados por Verônica são reconhecidospela mesma como experiências de Educação Permanente em situações de trabalhopartilhadas por diferentes profissões, que parte de <strong>uma</strong> ação conjunta, que mobilizaconhecimentos, vontades e competências. Há um envolvimento real que busca amelhoria e a mudança da organização do trabalho, e que demonstra o quanto sefazem necessários o compromisso e a responsabilidade dos profissionais.Contudo, dificuldades existem na partilha dos saberes, pois ainterdisciplinaridade exige iniciativa por parte dos profissionais, em <strong>uma</strong> lógica queprocura romper com a fragmentação e a disputa de saberes pertencentes àsestruturas organizacionais. Constata-se a importância atribuída à iniciativa de cadaprofissional <strong>no</strong> sentido de procurar a “partilha dos saberes”, de <strong>social</strong>izarconhecimentos, pois, ao contrário, a privatização dos saberes, a lógica individualistapreconizada pelos ideários neoliberais, não favorece os processos educativos e, sim,constituem-se em obstáculos, já superados pelos sujeitos dessa pesquisa. Ummovimento de procura e de abertura se faz necessário. Eis o que declara Jane:(...) é procurar as pessoas, as pessoas abrirem o seu conhecimento sem serprivatizado, porque é isso, eu acho que quando a gente fala em privatizaçãonão é só de vender os <strong>serviço</strong>s em si, mas a gente às vezes trabalha nalógica da privatização, como se a gente fosse do<strong>no</strong> do paciente, doconhecimento,e a gente não partilha. (Jane).A interdisciplinaridade aparece nas narrativas dos Assistentes Sociais comoalgo que acontece a partir da cooperação de várias disciplinas para reflexão eanálise de <strong>uma</strong> situação de trabalho, da interação e do intercâmbio entre osdiferentes profissionais, o que resulta não só <strong>no</strong> enriquecimento formativo dosmesmos, como <strong>no</strong> atendimento das necessidades de saúde e do usuário. Como


154pode-se perceber, as experiências reveladas caracterizam “<strong>uma</strong> aprendizagemexperiencial que considera as situações de trabalho e dos problemas reaisencontrados <strong>no</strong> trabalho” (CORREIA, 1999, p.10), que pressupõe situações<strong>formativa</strong>s interdisciplinares.Percebe-se também o quanto a identidade profissional, entendida como “asmaneiras <strong>social</strong>mente reconhecidas para os indivíduos se identificarem uns com osoutros, <strong>no</strong> campo de trabalho e do emprego” (DUBAR, 2006, p. 85), é salientadadiante da competência teórico-metodológica atribuída ao Assistente Social, <strong>no</strong> queconcerne à compreensão e à análise da realidade <strong>social</strong>. É partindo dessacompreensão que se dá o comprometimento do Assistente Social em articular <strong>uma</strong>rede de saberes, de construir parcerias e de mobilizar equipes.Realmente o conhecimento não se faz sozinho, que ele é interdisciplinarsim, mas que o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, é muito importante, por ser <strong>uma</strong> profissãoque também é interdisciplinar, ela <strong>no</strong>s da condição de olhar o <strong>social</strong>, mas deolhar o psicológico, o geográfico, o sociológico também. Enfim todos né,acho que é <strong>uma</strong> profissão muito rica, acho que nós temos um suporte,mesmo que tu não saibas, tu sabes aonde buscar, e tu constrói parcerias, tuvai atrás, constrói alianças, que vão engrandecer o trabalho, e vão dandoimpacto, porque a gente vai querer impacto na verdade, (Beatriz).Os espaços compartilhados de reflexão crítica sobre o processo de trabalhona saúde se dão junto às equipes entre diferentes profissões, entre os conselhos desaúde, com a participação dos usuários, mas, também, há aqueles espaços deencontro dos próprios assistentes sociais.(...) acho que nesse sentido de partilhar, a gente fez <strong>uma</strong> coisa bem legal, agente promoveu um encontro de assistentes sociais da secretaria de saúde,a gente fez o 1º encontro, é um espaço que teve várias tentativas, mas quea gente resolveu tentar de <strong>no</strong>vo, só assistentes sociais. (Beatriz).A partilha de saberes se dá também nas oportunidades de <strong>social</strong>ização daspráticas das equipes que atuam na saúde. A produção em saúde não advém de <strong>uma</strong>única disciplina, mas da mobilização de um conjunto de saberes que produzem epromovem a saúde coletiva. O relato de Adriana é memória viva de <strong>uma</strong> experiênciaem que pode-se promover a <strong>social</strong>ização das práticas em saúde, mas que, aomesmo tempo, é identificada como <strong>uma</strong> experiência de Educação Permanente, porter permitido a reflexão crítica sobre o seu processo de trabalho, o seu fazer e aosdemais trabalhadores de saúde, que participaram desta ação, permitindo apublicização e a <strong>social</strong>ização daquilo que é possível de se realizar <strong>no</strong> campo da


155saúde pública. Há, aqui, <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> que trata das possibilidades, de resultadoscom qualidade e do produto final de um processo de trabalho.Pode-se perceber o quanto a reflexão sobre o processo de trabalho não se dásomente para apontar erros, mas para evidenciar projetos e trajetórias bemsucedidas que estão dando certo, entendidas aqui como aquelas que contribuemcom a formação profissional dos trabalhadores da saúde e para a consolidação doSUS.Para mim um momento rico na secretaria de saúde, que dá para pensarnum processo de Educação Permanente, foi o processo da mostra deprodução em saúde aonde eu aprendi e foi um momento que deu prapolitizar todas as práticas que estavam sendo realizadas na secretaria,aonde o trabalhador pode visualizar a mostra de produção em saúde, elaera <strong>uma</strong> mostra pra ser <strong>no</strong> primeiro momento pra população, que foi <strong>no</strong>mercado publico, mas acabou sendo <strong>uma</strong> mostra interna prostrabalhadores, dava pra sentir na expressão dos trabalhadores, eles severem, e verem o que eles estavam produzindo, acho que foi possívelvisualizar a educação permanente que estava acontecendo nas unidadesde saúde. Foi um momento de troca, aonde teve um momento também deprodução de textos, que a partir da mostra os trabalhadores se reuniram praescrever, pra fazer sua reflexão da prática e poder estar registrando isso <strong>no</strong>papel, poder estar registrando <strong>uma</strong> prática que <strong>no</strong>s não temos o hábito derealizar, então ela possibilitou isso, um momento de para refletir, escrever,se olhar(...) Para mim teve um significado <strong>no</strong> sentido de visualizar, de tornarvisível claro, que é possível ser feito, as experiências ricas que temos nasecretaria da saúde, que eu não tinha <strong>no</strong>ção de muitos trabalhos queestavam sendo desenvolvidos(...) o que eu aprendi foi isso,foi ver opotencial que temos na secretaria e o que é possível ser feito, quando setem espaço(...) e a importância de criar estes espaços de visualização,discussão e visualização do que esta sendo feito, <strong>no</strong> sentido de estarmotivando as pessoas viabilizando este espaço. A equipe dedesenvolvimento tem como um dos instrumentos e/ou meio de trabalho,proporcionar estes espaços de dar visibilidade de produção da escrita, dasexperiências, das trocas. Os trabalhadores na mostra, eles saíram supermotivadas(,,.) (Adriana).No campo da saúde do trabalhador, o relato de Jane trata da mobilização quefoi necessária na estruturação do <strong>serviço</strong>, de como a dinâmica de organização dotrabalho exigiu <strong>uma</strong> construção coletiva de acordo com as escutas das demandascaracterísticas deste <strong>serviço</strong>. A interdisciplinaridade pressupõe a articulação comdisciplinas que atuam em outros <strong>serviço</strong>s. A base de um programa de formação vemda partilha de conhecimentos, <strong>no</strong> estudo de situações de práticas e da maneiracomo esses assistentes sociais, que vivenciam experiências de educaçãopermanente, sinalizam que a reflexão sobre as situações postas <strong>no</strong> trabalho se dãode forma coletiva e a partir de aspectos intersetoriais.


156(...) quando eu fui trabalhar na saúde do trabalhador, era um momento emque estavam querendo remontar a saúde do trabalhador, que tinha só trêsou quatro funcionários, ai começou o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, terapia ocupacional,aos poucos começaram a chamar outras disciplinas, e a gente daí começoutambém a construir. Nós ouvíamos as escutas muito individualmente, de umsofrimento que era muito coletivo nessa área, e também a gente buscavareferencial, buscava experiências, não tinha muito, é <strong>uma</strong> área queinfelizmente briga muito, tem um viés com muitas outras áreas, desde aprevidência, enfim, a parte ambiental, muitas outras áreas que precisamtrabalhar junto pra existir a saúde do trabalhador. Jane(...)teve um símbolo de <strong>uma</strong> pessoa que tinha vários lutos não elaborados, eque a gente trabalhou junto até naquele momento <strong>no</strong> grupo, a gente secoloca <strong>no</strong> lugar do outro, mas ao mesmo tempo fortalece o instrumental do<strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, fortalecimento do grupo. A partir da hora que ela foiconseguindo se fortalecer, e nós também como um grupo, como <strong>uma</strong>intervenção multidisciplinar, ela acaba dando um pouco a volta por cima. Agente via a pessoa se transformando, tendo vontade de mudar o visual,querendo que o natal chegasse. Foi um exemplo muito marcante. BeatrizEnfim, é através da aprendizagem nas relações com os outros, incluindo osusuários, que os Assistentes Sociais contróem os conhecimentos que permitem odesenvolvimento intelectual e mental. No momento em que escutam a idéia do outroe refletem sobre o que foi dito, eles tem a oportunidade de ratificar os saberes e omodo de agir, bem como a maneira de colocá-los em prática, a <strong>serviço</strong> da populaçãousuária.5.5 APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA: A PROBLEMATIZAÇÃOAo analisarmos as narrativas, percebe-se o quanto os Assistentes Sociaisestão inseridos em situações de aprendizagem <strong>no</strong> trabalho. Entretanto, a intençãoaqui não é descrever aquilo que os assistentes sociais aprendem nesses contextos,mas, sim, interessa revelar a capacidade que os profissionais possuem de utilizar oque aprendem. “Podemos conhecer, ter consciência, sem reutilizar forçosamente osaber. Uma coisa é dominar o conteúdo, outra coisa é servir-se dele” (GIORDAN,2007, p.15). Para que haja a aprendizagem significativa, é indispensável que osprofissionais se predisponham a aprender significativamente, aspecto esseobservado nas narrativas.Os assistentes sociais não se limitam a preencher os requisitos da tarefa - há<strong>uma</strong> reflexão sobre os propósitos, e as estratégias e o foco da ação sãodirecionados e, preferencialmente, integrados, confrontando-se crítica ecriativamente com as situações de trabalho, com as problemáticas do cotidia<strong>no</strong>, com


157as expressões da questão <strong>social</strong> que se manifestam. Procuram, com isso, contribuir,ainda que de forma modesta, com a criação de condições de transformação daorganização do trabalho, potencializando as intervenções profissionais para oaprofundamento da democracia e do direito à saúde, como o destacado naexperiência de Júlia.É esse trabalho que a gente está montando, que é o trabalho de atençãoaos pacientes acamados Essa demanda bate <strong>no</strong> <strong>serviço</strong>. A gente primeiro,não tinha como atender e nós fomos construindo alg<strong>uma</strong>s formas deatender, e agora estamos em um momento de avaliação, pois a forma comonós estamos atendendo não estão respondendo com a potencialidade quepoderia dar pra esse usuário. E ai a gente teve que reunir pessoas deformação diferentes, assistentes sociais, enfermeiros, médicos, eproblematizar esse atendimento, <strong>no</strong> seguinte sentindo, porque é <strong>uma</strong> coisabastante modesta o que a gente está tentando. Mas se a gente não tivercapacidade de compreender e de dar <strong>uma</strong> atenção de qualidade pra esseusuário, não teria sentido a gente levar adiante o <strong>serviço</strong>. Ele tem que ser<strong>uma</strong> combinação com aquilo que foi demandado por ele, e aquilo que épossível de estender o <strong>serviço</strong>, não só naquilo que ele ta projetado prafornecer, mas para além daquilo que está se propondo, buscando ampliar,porque ele tem potencial pra isso, mas é um potencial que parece que táadormecido, porque ai tu começa a fazer o ralo, o feijão com arroz e ta tudobem, ninguém da essa contra partida, tem gente muito capaz que está aiassinando ponto, sabe? É <strong>uma</strong> coisa bem descomprometida, sem serchamado, sem ser estimulado para fazer isso. (Julia).A aprendizagem é significativa porque atribui um sentido ao trabalho, a um<strong>serviço</strong> prestado, que ao ser problematizado questiona e avalia o processo, casocontrário, qual o sentido, o significado, a intenção do <strong>serviço</strong>? Esse questionamentoé um ponto de partida para a reflexão crítica dos processos de trabalho, e,fundamentalmente, base para a instauração de sistemas formativos a partir dasexperiências vivenciadas <strong>no</strong> trabalho.É presente nas narrativas das experiências de educação permanente afunção crítica do questionamento pertinente ao modo de fazer. É a reflexão na açãoque proporciona ao profissional questionar a estrutura assumida e repensar o modode intervir. É como revisitar o pensamento que o levou a agir de determinada forma,e, nesse processo, poder pensar em <strong>no</strong>vas estratégias de ação. Pensar de formacoletiva, construindo junto àqueles que são beneficiados com o <strong>serviço</strong> prestado,razão do fazer profissional: os usuários.Agora tu falou e me caiu isso assim, a gente está fazendo um processo deacolhimento e tem <strong>uma</strong> equipe de escuta, então são duas pessoas decategorias diferentes que acolhem todos os que chegam <strong>no</strong> postoindividualmente. E a idéia que a gente tem, isso não começou agora


158começou a<strong>no</strong> passado, a gente lá ta em processo constante de construção,de formação. O espaço continua, mas como a gente ta fazendo? E para queserve esse espaço? São discussões constantes na equipe. E agora meclareou quando tu falaste nisso, que aquele espaço é de educaçãopermanente, porque a gente constrói com o usuário o que ele quer prasaúde dele. Ele vai marcar <strong>uma</strong> consulta com o médico, mas a gente estaáaqui pode conversar com ele, pode ver outras alternativas, e a gente naescuta constrói com ele, e eu tenho feito isso. E agora a gente fez <strong>uma</strong>discussão na equipe, que a gente tem que construir com o usuário. Entãoeu acho que isso da EP eu não tenho duvida, que a gente ta semprerefletindo com o usuário. (Carla).Outro aspecto observado é de que a problematização ocorre através da intersetorialidade.O trabalho na saúde pressupõe a articulação da rede de <strong>serviço</strong>s queatendem a <strong>uma</strong> determinada família, por exemplo, e a resolutividade desseatendimento está relacionada à capacidade dos diferentes profissionais e/ouinstituições buscarem coletivamente a melhor maneira de atender a demanda. Háum compromisso e <strong>uma</strong> preocupação com os resultados, e não somente com osmeios de trabalho. A riqueza da experiência e o desafio materializam o significadodessa aprendizagem relatada por Verônica.Tem <strong>uma</strong> coisa dentro da organização do trabalho, que é a intervençãointersetorial. A semana passada a gente viveu <strong>uma</strong> situação muitointeressante lá na floresta que foi a discussão de um caso que era atendidopor vários locais, <strong>serviço</strong>s diferentes, e ai cada um fazendo sua prática, echegou um momento em que a gente teve que pensar e reorganizar com aspessoas, e foi o que a gente fez. a gente reuniu os <strong>serviço</strong>s discutiuprofundamente os casos, e foi riquíssimo assim,a construção de discussão,porque tem o olhar de cada profissional, a forma como cada um estavaentendendo as questões que envolviam aquela família. É muito significativo,desafiador. A gente vê as limitações! (Verônica).É <strong>no</strong> processo de problematização da organização do trabalho que é possíveldar-se conta do quanto é dinâmico o trabalho coletivo, do quanto é preciso estaratento aos movimentos da realidade institucional. Captar o movimento dos grupos detrabalho instituídos <strong>no</strong>s espaços organizacionais é permitir mudanças <strong>no</strong> processode trabalho, é adquirir <strong>no</strong>vas aprendizagens que contribuirão para oaperfeiçoamento do fazer profissional, <strong>no</strong> exemplo de Flávia, na prática dacoordenação de equipes, da gestão da saúde.A gente criou um grupo de trabalho, composto por chefes de equipes etodos aqueles que tem função gartificada e que não formalmente sãochefes, mas que representam <strong>uma</strong> liderança dentro da equipe. Então hojenós temos um grupo de 44 pessoas que se reúnem, já ta fechando um a<strong>no</strong>,se reúne <strong>uma</strong> vez por mês. E esse grupo ele discute temas, <strong>no</strong> 1º momentoa coordenação elegeu-<strong>no</strong>s 1os encontros quais os temas, porque eramtemas que o grupo de coordenação identificava como problemáticos <strong>no</strong> seu


159dia-a-dia de trabalho, então a reunião de chefia semanal tratava muito maisquestões administrativas, e pelo tempo tu não conseguia discutir os temas.Então foi muito interessante, a gente montou um desenho, ele tinha umcenário que a gente imagi<strong>no</strong>u quanto coordenação, construir, mas <strong>no</strong> meiodo caminho ele foi se modificando. E ai tem um caráter importante para mimdo processo permanente da formação e da educação, que é tu poder captarisso que vai modificando, e o quanto isso é iluminador pra que a mudançatambém <strong>no</strong> processo de trabalho ocorra desde que esteja atento a isso queestá acontecendo. Então esse grupo de educação permanente, eu poderiachamar assim, ele sempre tem servido para gente ter <strong>uma</strong> aprendizagem,conhecer melhor alg<strong>uma</strong>s técnicas. (Flávia).A aprendizagem tem profundidade quando existe a intenção de entender osignificado daquilo que está sendo estudado ou da demanda analisada, o que leva arelacionar o conteúdo com aprendizagens anteriores, pessoais, o que, por sua vez,leva a avaliar o que vai sendo realizado e a perseverar até conseguir um grauaceitável de compreensão sobre o assunto. Em outras, palavras a teoria e a práticasão confrontadas <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> profissional, assim como são questionados ossaberes adquiridos durante o processo de formação inicial.Eu estava pensando em <strong>uma</strong> experiência que pudesse confrontar aeducação formal que a gente tem, com o dia-a-dia <strong>no</strong> posto, porque assimque eu fiz a faculdade em seguida fiz o mestrado e subestimei a academia,e em um determinado momento pensei: puxa não é isso, isso não é osuficiente. E eu percebi em um caso que eu atendi que estava relacionadocoma política previdenciária, e eu não sabia. Ai peguei o telefone, ligueipara C.(<strong>uma</strong> colega), expliquei a situação. A C. falou com o residente quefez o estágio dentro do INSS, em um outro espaço de formação, que tinha<strong>uma</strong> informação concreta, <strong>uma</strong> orientação <strong>no</strong>va. E eu pensei, a gente tem<strong>uma</strong> capacitação formal aqui, e eu aprendi foi lá com o atendimento aousuário, com outra pessoa que fez o estágio na prática <strong>no</strong> INSS. Então eufiquei pensando assim, até que ponto as <strong>no</strong>ssas educações continuadasformais, não <strong>no</strong>s levam a discussões, que não refletem necessariamente <strong>no</strong>que o trabalho exige, é poder ver a teoria viva, né? (Leandro).Mesmo não sendo fácil definir o conhecimento profissional, há de se terclareza de que “tem <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> teórica, mas não é só teórico; tem <strong>uma</strong><strong>dimensão</strong> prática, mas que não é apenas prático; tem <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> experiencial,mas que não é unicamente produto da experiência” (NÓVOA, 2002, p.27). É nessesentido que os assistentes sociais desta pesquisa encontram-se perante umconjunto de saberes, de habilidades e de atitudes que mobilizam em <strong>uma</strong>determinada ação educativa e de intervenção <strong>no</strong>s seus processos de trabalho.Quando se trata da relação teoria e prática, há <strong>uma</strong> compreensão, <strong>no</strong> grupo, de quesão movimentos interligados, questionáveis e, sobretudo, de intervenção,principalmente em se tratando de <strong>uma</strong> profissão eminentemente interventiva, como a


160de Assistentes Sociais, não se fazendo presente a percepção da dicotomia entre ateoria e a prática.(...) se tu pegar qualquer situação, de violência sexual, por exemplo, tu vai láfaz <strong>uma</strong> capacitação, como que tu aborda, enfim, mas na hora da prática,aquilo vai te ajudar, vai por em prática. (Verônica).Eu acho que trazer a realidade do dia-a-dia, aquela coisa da prática com ateoria. Os trabalhadores do próprio <strong>serviço</strong> que trazem sua própriaexperiência e se subsidiam de suas teorias. (Rossana).Eu acho isso muito legal, tu ver que na prática, também aparece aquilo quetu viu antes, bom aquilo que é o saber formal, mas aquilo está ali em <strong>uma</strong>forma bem diferente. (Leandro).Constata-se que a produção de saberes, que advém de <strong>uma</strong> experiência <strong>no</strong>trabalho, se dá, também, a partir da pertinência de um saber enunciado, que ao serutilizado pelo profissional como instrumento de trabalho atinge um propósito, <strong>uma</strong>intenção - é a materialização da teoria e a prática - em prol da resolutividade de um<strong>serviço</strong>. No relato de <strong>uma</strong> assistente <strong>social</strong>, pode-se observar que desatar os nós doprocesso de trabalho em que se esta inserido é um ato de coragem por parte doprofissional e da equipe. Ao vivenciar essas situações, há um retor<strong>no</strong> não somenteem termos de aprendizagem para o profissional, como a alteração da organizaçãodo trabalho, mas, também, para os usuários demandantes do <strong>serviço</strong>. Os usuáriosna oportunidade de participarem da reflexão sobre a própria demanda ou situaçãoque precisa ser solucionada, também vivenciam um processo educativo,evidenciando-se assim a <strong>dimensão</strong> sócio-educativa, pois a resposta para asuperação da demanda requer o envolvimento da equipe de saúde e a mobilizaçãoe a mudança de hábitos da própria comunidade.Quando a gente tem coragem de poder na vivência que tem, trazer aquiloque é o nó do processo de trabalho, eu penso que volta em termos deaprendizagem. Eu lembro aqui de <strong>uma</strong> Cooperativa,.. a gente tem oprograma da dengue aonde tem alguns agentes, que são da Cooperativaque trabalham com os moradores. A população quer que “desratize” porquetem muito rato na vila... a gente tecnicamente sabe que isso não funciona,tu não vai desratizar botando vene<strong>no</strong> pra rato, né? Tu vai desratizar se tutrabalha num processo de educação sócio ambiental, aonde há outramudança. Bom, primeiro processo de reflexão que a equipe vivenciou e quefoi de educação permanente, serviu para que nós <strong>no</strong>s convencêssemosdisso, o grupo que operacionaliza, depois que nós fomos convencidos nósfomos a campo pra convencer os outros, ou seja, refletir com a comunidade,e ai a gente conseguiu convencer. Então acho que é como tu diz, se tuconsegue aproveitar e mudar, tu vai chegar lá diferente, e vai acabarrespondendo a demanda de <strong>uma</strong> maneira mais qualificada, mesmo que elavenha desqualificada. No <strong>no</strong>sso grupo a gente sempre se pergunta qual é areal necessidade de? (Flávia) -


161Existe nessa fala a presença da <strong>dimensão</strong> sócio-educativa explorada peloassistente <strong>social</strong> <strong>no</strong> trabalho comunitário, mais precisamente junto à população quedemandou a “desratização”. Para além da aplicação do vene<strong>no</strong>, há o trabalho sócioeducativo,que pressupõe o acesso às informações, a problematização da demanda,a compreensão da origem da situação posta, da reflexão sobre os hábitos e osvalores existentes na relação da comunidade em que vivem. Também há de sereconhecer que é preciso rever o modo como o trabalho está organizado e como ostrabalhadores estão implicados na busca de um resultado mais eficaz, superando apreocupação com o meio e instrumentalizando a população, contribuindo com aemancipação da cidadania desses sujeitos.(...) eu acho que assim se tu pensar <strong>no</strong> processo todo vem essa questão daprópria equipe, que ela é marco importantíssimo na vida de vários núcleosde <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, porque não interferiu diretamente só <strong>no</strong> <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>,mas nas equipes, é <strong>uma</strong> residência multiprofissional, mas isso movimenta aequipe, a forma como trabalha, a realização de espaços pra educaçãocontinuada dentro da equipe, pra dar conta de <strong>uma</strong> demanda da própriaequipe. Enfim, tu está formando profissionais, a equipe que forma, entãoisso é muito interessante, acho que isso é um marco que muda a forma detrabalho, muda a lógica. (Verônica).Há por parte dos Assistentes Sociais um reconhecimento de que aaprendizagem significativa ocorre em diferentes espaços formativos, mas <strong>no</strong>sexemplos aqui desvelados, os espaços sócio-ocupacionais se constituem emespaços formadores, a partir das oportunidades que têm de questionarem eproblematizarem as situações do cotidia<strong>no</strong> profissional, e as contradições existentesna dinâmica do campo da saúde. Esses mecanismos de problematização de <strong>uma</strong>situação de trabalho nunca são imediatos, pois passam por fases de conflito ou deinterferências. Trata- se, então, de <strong>uma</strong> questão de aproximação, de interconexão,de ruptura, de alternância, de recuo, de mobilização, e, sobretudo, de pré-disposiçãopolítica e ética, para que ocorra <strong>uma</strong> aprendizagem significativa.A aprendizagem, ante as experiências dos assistentes sociais, ocorre porquea intenção desses profissionais é entender o significado da demanda, dasnecessidades dos usuários e da equipe. Observa-se <strong>uma</strong> pré-disposição paraaprender significativamente, não se limitando a atender os requisitos de <strong>uma</strong> tarefa,mas colocando em uso saberes, relacionando com aprendizagens anteriores, o queleva-os a <strong>uma</strong> avaliação do que vai sendo realizado <strong>no</strong> processo interventivo, e aperseverarem até conseguirem um grau aceitável de compreensão do significado da


162demanda e de seu fazer profissional. Enfim, é através da aprendizagem nasrelações com os sujeitos que interagem <strong>no</strong> campo da atuação profissional queconstruímos conhecimentos que permitem o desenvolvimento intelectual e mental.5.6 A PRESENÇA DA DIMENSÃO ÉTICO-POLÍTICA DO SERVIÇO SOCIAL: UMAREFERÊNCIA IDENTITÁRIAPode-se observar que as experiências de Educação Permanente estãoorganizadas em tor<strong>no</strong> de assistentes sociais fortemente comprometidos com aprofissão. São profissionais com predisposição ética e política para aprendizagem, eque se juntam com outros trabalhadores, com o objetivo de refletir sobre o seuprocesso de trabalho, na busca de melhores resultados dos <strong>serviço</strong>s na saúde. Asnarrativas explicitam o quanto a presença da <strong>dimensão</strong> ético-política é pertinente àexperiência de educação permanente <strong>no</strong> campo da saúde. As argumentaçõestrazidas pelos sujeitos dessa pesquisa revelam um “universo de crenças, de formaslingüísticas” que são agrupadas nesse processo de análise e interpretadas comoformas identitárias (DUBAR, 2006, p.176), <strong>uma</strong> vez que os enunciados sãorespaldados pelos princípios do Projeto Ético Político do Serviço Social.Ao refletirem sobre o projeto ético-político, os Assistentes Sociais fazemreferência a um conjunto de fatores que são levados em conta ao questionarem aefetividade dos seus princípios. Um dos fatores diz respeito ao compromisso e àinteração com os sujeitos que demandam a intervenção do Assistente Social, se hápor parte desses profissionais <strong>uma</strong> preocupação e se esta é posta em movimentoque incide nessas relações. Há, aí, <strong>uma</strong> evidência com os resultados do processo detrabalho e com o enraizamento do projeto ético-político nas ações cotidianas. Comoexemplo, destaca-se o relato de Júlia, que demonstra o compromisso com aqualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados à população e com o aprimoramento intelectual naperspectiva da competência profissional, na articulação com os outros profissionais etrabalhadores, de acordo o código de ética profissional.Eu penso que não tem melhor que o usuário para realmente a gente saberse o projeto é alcançado, a demanda que é trazida pelo usuário, seja ele ocolega, seja ele como gestor, se a gente entende que é importante estar emconstante processo de educação permanente, ou seja, a gente estáencontrando os caminhos na verdade pra estar interagindo de forma maisqualificada com esse sujeito, não é possível que ele não vá se beneficiar , e


163necessariamente ele vai ter o benefício. Então até assim na minhaexperiência, que eu trouxe que essa questão da integralidade ela tem a verjustamente com o <strong>no</strong>sso projeto ético-político, porque eu entendo que tempotencialidade pra que isso aconteça, acho que existem os meios pra isso ehá necessidade de <strong>uma</strong> certa desacomodação por parte dos profissionais.(Júlia).Essa reflexão de Júlia <strong>no</strong>s reporta ao entendimento de que <strong>uma</strong> identidadeprofissional relativa a um grupo <strong>social</strong> que partilha um ofício comum não se esgotan<strong>uma</strong> estratégia única para todos os sujeitos (SILVA, 2003), como é o caso daatuação dos profissionais da saúde, incluindo os assistentes sociais, sujeitos desseestudo empírico. As estratégias dos profissionais são diferentes, pois dependem domodo como estes se relacionam com a instituição, com os usuários, com os colegasde equipe, com suas experiências. São articulações em ato. ”Com isso reconhece-seaqui a identidade profissional relativa a um grupo e local singularmente reelaboradaadquirindo formas específicas, que podem ser comuns a vários sujeitos do mesmogrupo” (SILVA, 2003, p.97). Se partirmos do entendimento que é comum entre ostrabalhadores da saúde defender o direito a saúde, o acesso, a prevenção, apromoção, o cuidado e a integralidade, não se pode afirmar que a forma de fazeressa defesa seja a mesma, pois há <strong>uma</strong> diferença <strong>no</strong> modo de fazer, o que pode serevidenciado nas falas.Por outro lado, observou-se que a reflexão sobre o projeto ético-político doServiço Social é polêmico, pois suscitou um aprofundamento sobre a questão doprojeto profissional. Essas reflexões <strong>no</strong>s fazem reportar aos enunciados de Netto(1999) sobre os projetos profissionais que são construídos por um sujeito coletivo.Nessa construção são eleitos valores que vão legitimar <strong>social</strong>mente a profissão,atribuindo e delimitando objetivos e funções para o exercício profissional. Assim, umprojeto profissional prescreve “<strong>no</strong>rmas para o comportamento dos profissionais eestabelecem balizas de sua relação com os usuários dos seus <strong>serviço</strong>s, com outrasprofissões e com as organizações e instituições, públicas e privadas” (NETTO, 1999,p.95).Ao analisar-se a situação discutida entre os participantes do grupo focal sepercebe o quanto é considerada importante a reflexão crítica do próprio projetoético-político <strong>no</strong> âmbito do trabalho, e, fundamentalmente, <strong>no</strong> processo de formaçãoinicial, o que é condição sine qua <strong>no</strong>n ao exercício profissional. Entretanto, para


164ratificar empiricamente esse entendimento, mesmo já tendo sido defendido pelosórgãos da categoria (CFESS, ABPESS, entre outros) e de formação profissional,urge apreender a percepção que os profissionais possuem sobre a consolidação doprojeto profissional. Flávia expõe seus argumentos <strong>no</strong> grupo:(...) eu pessoalmente acho que esse não é um projeto só do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>.É de sociedade, se o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> entende como seu, que bom né? E se agente parte desse principio então como sendo algo do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, euacho que as vivências que a gente relatou aqui, eu acho que elas seconfiguram sim como experiências que levaram a cada <strong>uma</strong> aqui, por meioda experiência.. eu acho que a Júlia de repente ela vem de <strong>uma</strong> áreaentendendo com sendo outra, daqui a pouco nessa que seria a outra, tuenxerga nem tão “outra” assim. Porque ai sim tem um projeto então, aqualidade de vida é só um projeto de quem trabalha com direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s?Não! A qualidade de vida é um projeto pra quem trabalha com a sociedade.(Flávia).O desafio desses Assistentes Sociais tem sido tornar o projeto ético-político“um guia efetivo para o exercício profissional”, para consolidá-lo por meio de suaimplementação efetiva (IAMAMOTO, 2002, p.21). Entre as estratégias acionadasestá a Educação Permanente, que, ao permitir a formação profissional, repercute<strong>no</strong>s resultados do processo de trabalho e, portanto, na relação com o próprio usuáriodo <strong>serviço</strong> e na efetivação do projeto profissional.Não é um projeto somente do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, isso a gente tem que terclareza, a gente está dentro de <strong>uma</strong> sociedade que a gente contribui praela, e acho que o <strong>no</strong>sso projeto ético político dá esse “<strong>no</strong>rte” na direção dagarantia de direitos, e também assim que não é isolado, a gente faz essaeducação permanente crescer, mas não crescemos sozinhas! Na verdade,ele se amplia, ele se repercute em relação aos usuários. (Beatriz).Então eu pessoalmente penso, o que a gente ouviu aqui se configuram comvivências que possibilitaram processos de Educação Permanente, masfundamentalmente processos de auto-revisão e re-direcionamento de rumoe de jeito de trabalhar, seja com a própria equipe, né? Então já é <strong>uma</strong> retroalimentação. Há o processo de trabalho de aprendizagem, mas há tambémo atendimento dessa demanda de <strong>uma</strong> forma mais qualificada a partir domomento que eu aprendo. (Flávia).Essas percepções sobre a relação existente entre o projeto ético político e aeducação permanente são trazidas pelos Assistentes sociais associadas a umprojeto societário. Assim o projeto profissional é indissociável dos projetos sociais,não é isolado, pois expressa um processo de luta contra-hegemônico, de luta contraa violação dos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s. Fica clara a compreensão e o comprometimentocom a presença <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> profissional da defesa intransigente dos direitos


165h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s e recusa do arbítrio e do autoritarismo, que se materializa através doatendimento às necessidades em saúde.Ainda sobre a formação inicial ou acadêmica, como referido pelos assistentessociais, há um diferencial que está na especificidade, naquilo que se constituematribuições privativas dos assistentes sociais, conforme o artigo 5º da Lei nº 8.662 44(CRESS, 2000), que diz respeito à habilidade técnico-operativa que deve ser postaem prática para incidir naquilo que é objeto de trabalho do Assistente Social, por issoestá delegado e reafirmado em estatuto a defesa intransigente dos direitos.No próprio exemplo que tu deste tinham vários profissionais que estavamenvolvidos <strong>no</strong> projeto, né? Então eu acho que é perfeito isso. Isso é dápessoa que se implica, que se sente afetada, que se desacomoda comessas situações e vai atrás e problematiza, enfim. Mas ao assistente <strong>social</strong>isso está delegado por conta de um projeto ético político, então o assistente<strong>social</strong> já na sua formação acadêmica ele deveria estar mais habilitado.(Júlia)De <strong>uma</strong> equipe de saúde, entretanto, fazem parte diferentes profissionais, emuitos não contemplam em seus currículos formativos, conteúdos que os preparempara o reconhecimento da integralidade enquanto estratégia para compreensão doprocesso saúde-doença-cuidado-qualidade de vida, n<strong>uma</strong> lógica que se contraponhaaos modelos privativistas na saúde, como forma de garantir o direito à saúde de todocidadão. Se entre os princípios que guiam o exercício profissional está oreconhecimento da liberdade como valor ético central, que requer o reconhecimentoda auto<strong>no</strong>mia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais e de seusdireitos, mobilizar esforços para efetivação destes não é tarefa fácil.Contudo, é defendido, de <strong>uma</strong> forma geral, que compete aos AssistentesSociais provocar e mobilizar diferentes saberes e profissões, pois sabe-se que oresultado de sua ação profissional está relacionado com o trabalho coletivo. Ainserção do assistente <strong>social</strong> na esfera do trabalho “é parte de um conjunto deespecialidades que são acionadas conjuntamente para a realização dos fins dasinstituições empregadoras, sejam empresas ou instituições governamentais”(IAMAMOTO, 2001, p.64), como o que ocorre na saúde pública, espaço de atuaçãodos sujeitos desta pesquisa.44 Lei da Regulamentação da Profissão, de 7 de junho de 1993 que dispõe sobre a profissão deAssistente Social e da outras providências . Sugiro ver em Coletânea de Leis, CRESS, 2000.


166A articulação, enquanto estratégia de intervenção para estes AssistentesSociais, tor<strong>no</strong>u-se <strong>uma</strong> necessidade ligada mais à evolução do ofício do que <strong>uma</strong>escolha pessoal. O trabalho em equipe é, portanto, para esses profissionais, <strong>uma</strong>questão de competência, e pressupõe, igualmente, a convicção de que deflagrar ainterlocução entre as diferentes áreas é um valor profissional. Portanto, identifica-seque o trabalho coletivo emerge de um saber fazê-lo consciente, estar aberto para tal,perceber e combater resistências, paradoxos, obstáculos e impasses ligados àinterdisciplinaridade e, fundamentalmente, saber se auto-avaliar.Eu penso assim, que o <strong>serviço</strong> <strong>social</strong> tem por excelência isso, porque comona verdade ele vai mobilizando as diferentes áreas pra poder prestar esse<strong>serviço</strong> de melhor qualidade, ele acaba sendo um provocador, ele precisaque o médico vá e não pode ser um atendimento de qualquer forma, temque ter um diferencial, e ai ele vai problematizando, ele vai somando a partirda sua capacidade mesmo de fazer essa interlocução, porque poderia seroutro, por exemplo, gestor poderia cumprir esse papel, mas talvez o <strong>serviço</strong><strong>social</strong> com <strong>uma</strong> área de especialidade seja a mais indicada pra fazer isso.Como profissional da saúde, o assistente <strong>social</strong>, ele tem esse potencial defazer isso, porque ele trabalha justamente com a articulação tanto da equipequanto dos usuários. (Júlia).A atuação diferenciada do assistente <strong>social</strong>, abordada por Julia, ilustra <strong>uma</strong>intervenção competente e crítica <strong>no</strong> campo da saúde, que é “tentar construir e /ouefetivar, conjuntamente com outros trabalhadores da saúde, espaços nas unidadesque garantam a participação popular e dos funcionários” (BRAVO, 2006, p.214) nabusca pelos melhores resultados e na tomada de decisões. Assim, o código de éticaprofissional contém ferramentas fundantes para o trabalho dos assistentes sociais nasaúde (BRAVO, 2006), o que proporciona a articulação e a sintonia com a rede de<strong>serviço</strong>s, das quais fazem parte aqueles que lutam pela efetivação do SUS.(...) a gente tem esse papel que poucos outros têm ou não tem isso na suaformação, ou não tem competência mesmo. Eu acho que essa articulaçãoquando é isso, tem um determinado caso, ou situação, qualquer problemaque surgiu, que <strong>uma</strong> determinada área já não consegue responder sozinha,em geral é chamado alguém do <strong>serviço</strong> <strong>social</strong>, e ele vai não só dar <strong>uma</strong>resposta imediata que termine ali, mas eu acho que a gente conseguecomeçar a construir, e isso vai fazendo <strong>uma</strong> redezinha ali, um redezinhaaqui, quando a gente vê..(Jane).A interlocução sobre ensi<strong>no</strong> e gestão da saúde entre os mundos vividos – oacadêmico e o profissional – é desafio posto aos profissionais da saúde. Os <strong>no</strong>vosmodos de pensar e de organizar o trabalho exige <strong>no</strong>vos tipos de saberes, como:trabalho coletivo, pensar a organização como um todo e agir estrategicamente


167(CANÁRIO, 2003). Ao considerarem as situações de trabalho e os problemas reaiscom que se defrontam, os assistentes sociais que participaram desse processoinvestigativo procuram, através da articulação, um modo de agir coletivo e, então,vivenciam situações <strong>formativa</strong>s interdisciplinares.A efetivação do projeto ético-político é <strong>uma</strong> interrogação que provoca <strong>uma</strong>inquietação, o que é necessário para instaurar processos formativos que partam dasreflexões críticas do processo de trabalho profissional. É dessa maneira que ocorre oposicionamento a favor da eqüidade e da justiça <strong>social</strong>, que implica a universalidade<strong>no</strong> acesso a bens e <strong>serviço</strong>s. Entretanto, esse posicionamento pressupõe <strong>uma</strong>confrontação cotidiana com a realidade, para que se possa discernir aquilo quedeveria ser daquilo que foi possível de ser realizado. Pode-se perceber que areflexão sobre a <strong>dimensão</strong> ético-política permite aos Assistentes sociais reconhecerobstáculos e possibilidades de sua real efetivação, num exercício de questionaraquilo que está prescrito <strong>no</strong> seu estatuto profissional e, mais do que isso, pensarestratégias para o enfrentamento das múltiplas expressões da questão <strong>social</strong> quechegam aos <strong>serviço</strong>s da saúde. Como exemplo, a situação de violência domésticacitada por Silvia:<strong>no</strong> dia a dia, entra a questão dos obstáculos que a gente encontra, eu achoque acaba ficando mais difícil da gente chegar lá, <strong>no</strong> discurso acho que émuito legal, mas <strong>no</strong> dia a dia se tu for ver, será que a gente está vendoaquele usuário como um cidadão? Será que eu estou conseguindo trabalharpelos direitos dessa criança? Enfim as pessoas que trabalham nessa linha,acho que a gente faz um trabalho muito peque<strong>no</strong> diante da complexidadeque é essa situação. Então quando tu pergunta será que com a educaçãopermanente a gente faz chegar (...) eu acho que tem tudo pra isso quandotu busca fazer o trabalho ciente dos princípios, é com esse intuito, daquiloque tu acredita, mas as vezes eu fico meio em duvida se <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong>mesmo tu consegue estabelecer isso, eu tenho dúvida(...) Nas experiênciasdas oficinas <strong>no</strong> hospital, penso que com alg<strong>uma</strong>s famílias a genteconseguiu sim,(...) a gente sempre tem algum retor<strong>no</strong> deles, com certeza aintervenção, o objetivo principal de cessar o ciclo de violência sim,conseguimos, com outras não, é um processo. (Silvia).As inquietações pertinentes, tanto <strong>no</strong> registro da identidade profissionalmarcada pelo projeto ético-político, quanto <strong>no</strong> domínio das situações profissionais,mobilizam o pensamento em tor<strong>no</strong> daquilo que pode ou deve ser feito <strong>no</strong>desenvolvimento do processo do trabalho. Colocam em questionamento os meios detrabalho e, mais do que isso, o próprio resultado do processo desencadeado. Adúvida é intrínseca ao espírito crítico investigativo desses profissionais. Portanto,


168pode-se dizer que a presença da <strong>dimensão</strong> ético-política é referência identitária <strong>no</strong>Serviço <strong>social</strong>, e que se constitui num diferencial na formação desses profissionais.A reflexão ética é crítica porque está comprometida com princípios e valorespreconizados por um projeto profissional e, por isso, faz sentido para essesassistentes sociais a própria dúvida, os questionamentos sobre seu modo de pensare agir. A reflexão ética não pode perder seu compromisso com valores, casocontrário ela deixa de ter sentido, ”se não apreender a fundação desses valores narealidade, não cumpre seu papel teórico; se abrir mão da crítica, deixa de seconstituir n<strong>uma</strong> reflexão ética para se tornar <strong>uma</strong> doutrina” (BARROCO, 2003, p.56-57).Entretanto, para a consolidação de um código de ética não há <strong>uma</strong> “fórmulapronta” (BRAVO, 2006), pois a construção de projetos democráticos exige esforços emobilizações coletivas, e os enunciados dos sujeitos dessa pesquisa apontam quecabe aos assistentes sociais a tarefa de articular os diferentes saberes quecompartilham do fazer “frente ao projeto neoliberal” (BRAVO, 2006, p.214).5.7 O DESENHO DE UMA CONCEPÇÃO: UMA CONSTRUÇÃO COLETIVAEis <strong>uma</strong> construção coletiva, o desenho da concepção de EducaçãoPermanente <strong>no</strong> Serviço Social. Isso foi possível a partir das reflexões realizadaspelos Assistentes Sociais que, ao narrarem suas experiências vivenciadas <strong>no</strong>s seusprocessos de trabalho na saúde, revelaram-se como apreendentes que assumemum papel ativo na sua formação, da qual resultam aprendizagens estruturantes esignificativas na vida desses profissionais. Assim, a concepção existente entre ossujeitos dessa investigação sobre Educação Permanente não foi construída <strong>no</strong> finaldo processo grupal de investigação, mas foi ponto de partida desse processoreflexivo e, porque não dizer, educativo.A concepção aqui desenhada tem sua origem na vivência, na práticaprofissional, <strong>no</strong> dia-a-dia, <strong>no</strong> confronto com a realidade sócio-histórica em que ossujeitos dessa pesquisa estão inseridos. Portanto, são esses Assistentes Sociaisque aprendem é que podem enunciar o significado daquilo que vivenciam em seusprocessos de trabalho, ou seja, as experiências de Educação Permanente e a


169concepção que possuem sobre a mesma. Pode-se dizer que o aprender, para essesprofissionais, é <strong>uma</strong> metamorfose, pois os modos de pensar habituais tornam-seoutros quando aprendem com as situações vivenciadas coletivamente <strong>no</strong> campo dasaúde. A compreensão de um <strong>no</strong>vo saber é resultado de <strong>uma</strong> transformação,inclusive do modo de produzir sentido e significado ao próprio trabalho.A concepção que acompanha as experiências de Educação Permanentedesses Assistentes Sociais estão fincadas em princípios éticos-políticos, quedirecionam a construção de <strong>uma</strong> sociedade com justiça <strong>social</strong> e cidadaniaemancipatória. Entretanto, há <strong>uma</strong> predisposição para tal construção. Para ocorrer aeducação permanente, o sujeito deve estar impregnado por valores éticos e estarconsciente da <strong>dimensão</strong> política que a sua função exerce sobre as mudanças nasociedade e de <strong>uma</strong> consciência crítica de sujeitos dotados de desejo, deconhecimentos e de criatividade, além de serem capazes de <strong>uma</strong> reflexão sobreseus atos. Na seqüência, destacam-se alguns dos fragmentos das narrativas dosassistentes sociais que compõem a compreensão da concepção que os mesmospossuem sobre Educação Permanente.O que eu acho interessante, que eu não sei se eu vou saber dizer, masassim: a educação quando eu penso naquele sentido assim do Paulo Freire,ninguém educa mesmo ninguém, tem algum processo de aprendizagem quea gente mesmo que vai se abrindo pra ela, e é nesse sentido que eu estavaquerendo construir esse conceito. No sentido dessa disposição paraaprendizagem, para troca, para transformação, e para questão também,quando a gente pensa <strong>no</strong> usuário, na relação de trabalho da gente, que tema ver com a emancipação, o que tu está buscando. É isso, cada pessoa,seja o grupo <strong>social</strong>, comunidade inteira, enfim, <strong>no</strong> que for possível e naquiloela conquiste a sua emancipação, que não tem <strong>uma</strong> relação de poder, queprincipalmente nós na saúde, eu acho que <strong>no</strong> teu caso mais ainda, a genteainda na saúde sabe principalmente que alg<strong>uma</strong>s categorias profissionaistêm ainda alg<strong>uma</strong> relação de poder, parece que aquela criatura lá chegasuper desprovida de qualquer capacidade. Eu penso que é isso. (Jane).Eu tava pensando antes (...)que é exatamente <strong>uma</strong> autoconstrução, e issosim é um pouco a educação permanente, a gente está se construindo otempo todo, que está construindo alg<strong>uma</strong> coisa lá com o <strong>no</strong>sso usuário, como <strong>no</strong>sso colega. Quando tu falou (refere-se a Flávia.) isso, a gente estavendo lá <strong>no</strong> posto. Está chegando <strong>uma</strong> demanda e a gente não consegueresponder. Existe aí a necessidade de <strong>uma</strong> sensibilidade e isso, alg<strong>uma</strong>spessoas tem outras não. Essa sensibilidade da gente se deixar tocar, nahora que eu vejo, na pessoa que eu estou atendendo, um pouco de mim,não tem como a gente não se modificar junto, e não buscar construir junto, a<strong>no</strong>ssa ação é muito mais micro política do que na macro, eu acho quemuitas vezes a gente consegue dar um impacto maior, eu acho que issoestá crescendo, mas a gente desde a micro ação, a gente tem um retor<strong>no</strong>,tem um crescimento, tem algo que a gente contribui como também emsituações maiores, como <strong>no</strong> exemplo que a Flávia deu, eu acho que é isso


170assim, um trabalho que começou peque<strong>no</strong> e daqui a pouco virou modelopara todo Brasil. Essa construção (Beatriz) (todos falam).Eu lembrei de <strong>uma</strong> figura agora que dá pra fazer <strong>uma</strong> comparação, então anatação, ela é <strong>uma</strong> modalidade esportiva que conforme o nado, se a gentepensar <strong>no</strong> crow, faz parte da técnica do crow a puxada de ar, então quantomais tu aprimora tua técnica o ar, mais longe tu vai e com mais estilo, commais habilidade tu vai desenvolvendo. A educação permanente pra mim é<strong>uma</strong> técnica de puxada de ar, que tu sabe o caminho que tu quer chegar, é<strong>uma</strong> técnica, não só um método, de busca de conhecimento. (Flávia).Eu tava pensando assim, criar um conceito, eu acho que educaçãopermanente é um processo realmente contínuo, ele é diário, minuto aminuto, é naquela relação da tua subjetividade com a subjetividade dosujeito o qual tu está interagindo, e com toda subjetividade em que tu estáinserida. Porque eu acho que é isso que faz a diferença, que vai teimpulsionando a buscar, a te reciclar, a te rever, eu acho que até essa formasão esses movimentos que faz tu te tornar um profissional melhor, é o queestá dentro e o que ta fora. (Verônica.).(...) para mim educação permanente está <strong>no</strong> dia-a-dia, aquela que tu faz <strong>no</strong>dia a dia tu nem percebe que está fazendo às vezes, que não vem dapalestra, não vem da aula, vem do trabalho mesmo. (Leandro).(...) mas para mim não é individual, é em grupo, <strong>no</strong> dia a dia é <strong>uma</strong> coisamais organizada, tem o núcleo, tem a instância. (Rossana).(...) estou <strong>no</strong> campo de trabalho, me deparo com <strong>uma</strong> situação, me deparocom <strong>uma</strong> limitação minha e vou buscar aprender sobre aquilo ali. Eu nãovou esperar, eu vou discutir com o colega, buscar <strong>no</strong> livro. (Jane).(...) nem é só de buscar o colega, eu acho que eu na hora do atendimento,tu pensa em tentar pra tal caminho e ai tu vê que aquilo funcio<strong>no</strong>u, é ali nahora. (Sofia).(...) quando tu estás lá atendendo <strong>uma</strong> pessoa e a partir disso tu realiza oatendimento, tu repensou o atendimento, tu já está fazendo esse processo,tu escutou e olhou pra ele profundamente e mudou, isso é educaçãopermanente. (Verônica).É um desafio! (Referiu-se Leandro ao encerrarmos o Grupo Focal).As narrativas dos assistentes sociais explicitam o quanto o dia a dia, aquicompreendido como aquele vivenciado <strong>no</strong> espaço de trabalho (Rossana, Leandro,Verônica) é transformado em experiências coletivas (Jane, Sofia, Beatriz) e essasem saberes, que reestruturam suas aprendizagens. Há também um reconhecimentoda sensibilidade e disposição que o profissional deverá possuir para que possaexistir a troca, a aprendizagem, a transformação, principalmente ao considerarmosas necessidades dos usuários <strong>no</strong> que diz respeito à emancipação da cidadania dosmesmos, entre outras conquistas.


171Assim, a compreensão de educação permanente que possuem essesassistentes sociais, além de expressar a dinâmica pertinente ao processo, trás oreconhecimento que os contextos de atuação profissional são espaços deaprendizagens significativas, pois produzem impactos <strong>no</strong> desenvolvimentoprofissional não somente <strong>no</strong> nível instrumental como, também, <strong>no</strong>s domínioscognitivos e emocionais. Percebe-se o componente da responsabilidade com aprópria formação, como algo de valor, de ética, de iniciativa que o profissional devepossuir ao se deparar com seus próprios limites, <strong>no</strong> que diz respeito a intervençãoprofissional.A concepção, construída pelos assistentes sociais, assim como aconcretização do processo de trabalho, em que esses profissionais estão inseridos ,possuem um caráter eminentemente dinâmico e histórico, permitindo-<strong>no</strong>s pensar oServiço Social como <strong>uma</strong> profissão que se transforma ao transformar as condiçõesem que se dá o seu engendramento (MARTINELLI, 2004). Existe um sentido e <strong>uma</strong>direcionalidade da ação profissional (MARTINELLI, 2004), assim como, existe omesmo com relação a educação permanente <strong>uma</strong> vez que o desenho aqui propostotem como pressuposto um projeto ético-político e <strong>uma</strong> prática profissional que“devem pulsar com o tempo e com o movimento” (MARTINELLI, 2004, p.2).Na tentativa de associarmos a concepção de educação permanente(OSÒRIO, 2003) referida na primeira parte desta tese, em que se discorre sobre osaspectos históricos e conceituais, procura-se, aqui, sistematizar as principaisnuances conceituais tratadas pelos Assistentes Sociais ao manifestarem osignificado e/ou a concepção que possuem de educação permanente.


172Educação PermanenteAlg<strong>uma</strong>s de suas conseqüências <strong>no</strong> ServiçoSocial1. Designa um projeto 1. Consolidação do Projeto Ético Político doServiço Social2. Coletivo/ em relação/um processo 2. Promove a interdisciplinaridade; ainterlocução com os usuários; aintersetorialidade; a integralidade3. Ponto de partida: o processo de trabalho 3. Presença da <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong>sprocessos de trabalho/ transescolar4. Pressupõe um sujeito desejante. 4. Postura crítica sobre seus atos dispositivopara aprendizagem. Presença da <strong>dimensão</strong>ético-política.5. Reflexão 5. Criação de <strong>no</strong>vos sistemas cognitivos,Pensar em e sob a ação.6. Problematização da demanda 6. Leitura crítica permanente do significado dademanda; possibilita compreensão e ocomprometimento com o <strong>serviço</strong> prestadojunto ao usuário; ênfase <strong>no</strong> resultado comovalor de uso <strong>social</strong>.7. Auto-construção e auto-conhecimento. 7. Instaura iniciativas profissionais; se dar contados limites e das possibilidades desuperação nas dimensões técnico-operativase teórico-metodológicas.8. Os processos educativos que seguem aolargo da vida do Assistente Social,qualquer que seja sua forma, devem serconsiderados como um todo.8. Vinculação de todos os processoseducativos entre si. Processo educativoinicia-se na formaçãoQuadro 4: Concepção de Educação Permanente <strong>no</strong> Serviço Social: <strong>uma</strong> construção coletiva.A educação permanente, para esses profissionais, se constitui n<strong>uma</strong>estratégia de formação profissional, a partir da possibilidade de se construir e de setransformar <strong>no</strong> e o mundo do trabalho em um movimento dinâmico, mediado porvalores éticos e políticos. Foi a partir dessa dinâmica que os enunciados aquidestacados permitiram dar visibilidade à concepção que os Assistentes sociaisatribuem à Educação Permanente.Entretanto, o significado que essas experiências de educação permanenteproporcionam, são desvendados nas narrativas que se sucederam durante arealização do grupo focal e para além de um conceito, pode-se analisar o como


173vivenciam experiências de Educação Permanente em seus processos de trabalho. Asitematização dessas experiências, com <strong>uma</strong> forte presença de <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong><strong>formativa</strong> <strong>no</strong> Serviço Social, remetem à publicização de um jeito, de um modo, deprocessos de trabalho que tem permitido aos assistentes sociais que atuam nasaúde, anunciar que é possível superar e enfrentar as contradições pertinentes aomundo do trabalho e materializar o Projeto Ético Político do Serviço Social.


1746 CONCLUSÃOEducação Permanente: <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong> Serviço Social. Assiminicia-se o percurso investigativo e intitula-se a tese que ora se conclui. Não há comonegar a existência de <strong>uma</strong> convicção por parte da pesquisadora de que a reflexãocrítica sobre os processos de trabalho dos assistentes sociais permite a aquisição desaberes, sendo o trabalho considerado um lócus privilegiado de formação. Ao longodessa tese, evidencia-se <strong>uma</strong> forte ligação entre a educação e o trabalho, a partirdos fundamentos do materialismo histórico de Marx e pela <strong>dimensão</strong> da contradiçãoe da dialética presente nessa categoria.No atual quadro político-econômico brasileiro, não se pode negar a ênfaseatribuída à importância da educação e da formação, <strong>no</strong> entanto não se pode negar,também, que esta se inscreve n<strong>uma</strong> lógica de caráter econômico marcada pelosideários neoliberais. O discurso mundial de aprendizagem, ao longo da vida, temcomo eixo estruturante a idéia de que a formação profissional é fundamental parainserção <strong>no</strong> mercado de trabalho, o que deixa explícito a visão redutora efuncionalista da educação. Assim, a educação tem sido tratada como um meroinstrumento à <strong>serviço</strong> de interesses econômicos vigentes, como <strong>uma</strong> vantagemcompetitiva individual na aquisição de emprego, ou, ainda, parafraseando Charlot(2004), é em termos de acesso ao mundo do trabalho que a educação é pensadahoje.Esta concepção reducionista de educação trata a formação como umdispositivo que possibilita o conhecimento para <strong>uma</strong> posição <strong>social</strong> que assegure oacesso ao mercado de trabalho e, conseqüentemente o valor de troca, não garanteo sucesso neste mercado, do mesmo modo que se encontra desprovida do valor deuso (SILVA, 2007). Também, pensando em termos de valor de troca - a formação etoda certificação por um emprego e <strong>uma</strong> posição, um trabalho por um salário –formação e trabalho caracterizam-se como objetos que circulam <strong>no</strong> mercado deconsumo silenciando e ocultando a criatividade e a autoria dos trabalhadores,sujeitos implicados na produção de sentidos e significados que atribuem ao seutrabalho profissional.


175No entanto, a educação, nessa tese, é entendida como um processopermanente e difuso em toda a vida <strong>social</strong> e, portanto, possui um papel central adesempenhar, como por exemplo, <strong>no</strong> âmbito da pesquisa para construção de “<strong>uma</strong>saída” coletiva, <strong>no</strong> desenvolvimento de valores que se contraponham as conhecidasformas de competição e de lucro, na reinvenção de “<strong>no</strong>vas formas de articular oaprender, o viver e o trabalhar” (CANÁRIO, 2003, p.4).A preocupação, nessa trajetória investigativa, de aproximar os contextos deformação ao mundo do trabalho não foi pensada a partir do entendimento daadaptabilidade, mas tratou-se de <strong>uma</strong> aproximação crítica preocupada com osprocessos de educação <strong>no</strong>s coletivos de trabalho. Processos estes, que sãocapazes de movimentos instituintes que incidem na organização e <strong>no</strong>s processos detrabalho, mas que, fundamentalmente, consolidem projetos societários quevislumbrem <strong>uma</strong> sociedade democrática e com justiça <strong>social</strong>.As experiências vivenciadas ao se percorrer as trilhas da pesquisa, foramoportunidades de descobertas daquilo que estava oculto e que somente nessediálogo experimental, construído através da interação dos sujeitos e do objeto deinvestigação, foi possível dar visibilidade as experiências de educação permanentevivenciadas pelos assistentes sociais que atuam <strong>no</strong> campo da saúde. O trabalhocientífico realizado foi um trabalho persistente, que exigiu dedicação, compreensão eaquisição de diferentes saberes que subsidiaram as reflexões teóricas do processoinvestigativo.Quando na oportunidade de estágio de Doutorado <strong>no</strong> Instituto de Psicologia eCiências da Educação na Universidade do Porto, mais especificamente, <strong>no</strong>Programa Doutoral das Ciências da Educação, viveu-se aquilo que se chama deimersão. Pôde-se apreender daquela experiência <strong>formativa</strong>, que o marco histórico navida de um profissional é desenhado por questionamentos objetivos e subjetivos, porproblematizações da realidade, por leituras, por construção e desconstrução desaberes, por parcerias, por saudades, por perdas e ganhos, por paixão pelo ofícioescolhido, e por tudo isso o momento vivido, tor<strong>no</strong>u-se um divisor de águas natrajetória dessa pesquisadora.


176Dito isto, faz-se necessário referir que ao proceder à revisão bibliográficasobre as concepções de formação, processo de trabalho e educação permanente,teve-se acesso a diferentes produções teóricas, incluindo a de alguns autores atéentão desconhecidos pela pesquisadora, como, por exemplo, Canário (2003),Correia (2003), Santos (2003), Schwartz (2003), Malglavie (1995), Tardif (2002)entre outros, que tratam da interlocução da temática educação e trabalho, daprodução dos saberes, da prática profissional e das experiências de aprendizagem<strong>no</strong> trabalho. Buscou-se, nesses autores, fundamentos tanto da teoria da sociologiaquanto da educação, que permitiram fazer a articulação com o Serviço Social e coma temática trazida sobre a educação permanente dos assistentes sociais, emespecial os que atuam <strong>no</strong> campo da saúde, por ser este o recorte empírico nessainvestigação. Nesta revisão literária pode-se apreender que a educação como <strong>uma</strong>área específica do conhecimento, possui grande abrangência e relevância de temas,concepções e valores que acabam representando <strong>uma</strong> referência contemporânea,quase obrigatória, para muitos campos do saber, principalmente quando tratamosdos processos formativos, <strong>no</strong> caso o dos Assistentes Sociais.Durante a construção dos pressupostos teóricos, encontrou-se a consistênciacientífica que veio subsidiar as reflexões deste estudo. Ao discorrer sobre a dinâmicados processos de trabalho dos assistentes sociais da saúde, foi possível perceber oquanto é profícuo tratar sobre a educação permanente como <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong><strong>formativa</strong>. As situações de trabalho podem contribuir com o aprimoramentoprofissional, que vai sendo construído a partir das respostas encontradas para oatendimento das demandas que emergem <strong>no</strong>s espaços de trabalho.Assim sendo, a educação permanente não é algo sui generis do campo dasaúde, por se tratar de processos de aprendizagem, que resultam da combinação dediferentes situações e modalidades de formação. Entretanto, cabe salientar que aquestão central dessa investigação, que procura desvendar como os assistentessociais vêm vivenciando experiências de educação permanente <strong>no</strong>s seus processosde trabalho, foi <strong>uma</strong> descoberta apreendida através das narrativas dessesprofissionais que atuam <strong>no</strong> campo da saúde, e que essas conclusões dão conta daelaboração de <strong>uma</strong> síntese daquilo que consideramos mais pertinente entre osachados da pesquisa.


177A primeira questão que essa investigação se propunha a responder era sobrea maneira como os assistentes sociais vivenciam processos de formaçãoprofissional para atender as exigências postas pela questão <strong>social</strong>. A questão <strong>social</strong>e suas múltiplas expressões provocam inúmeras indagações, tornando-senecessário o preparo intelectual, instruindo-<strong>no</strong>s para saber pensar as contradiçõesda sociedade, para tratar de pensar não somente os problemas da h<strong>uma</strong>nidade,mas de pensar <strong>no</strong>vas maneiras de enfrentar os desafios postos <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> dostrabalhadores sociais. Faz-se necessário repensar a organização dos processos detrabalho na saúde para que se possa responder às necessidades sociais trazidaspelos usuários. Os <strong>serviço</strong>s de saúde, recorte empírico desta pesquisa, e osprofissionais em atuação, recebem <strong>uma</strong> demanda caracterizada por <strong>uma</strong> população,que vivencia diversas expressões da questão <strong>social</strong> que se manifestam através dassituações e necessidades de saúde das crianças, dos adolescentes, da juventude,das mulheres, dos idosos, dos moradores em situação de rua, das pessoas comdeficiências, com doenças do trabalho, com dependência química, com transtor<strong>no</strong>smentais, enfim, cidadãos com sede, com fome, com falta de afeto e todos aquelesnão citados aqui, com direitos a serem garantidos.Reconhecendo a complexidade e as contradições inerentes a este cenário, éque se pôde perceber a partir das experiências narradas pelos assistentes sociais,que para a apreensão das diferentes expressões da questão <strong>social</strong> e o atendimentodas necessidades sociais, ocorre a problematização sobre a situação posta, seescuta e se olha para a realidade sócio-histórica, propõe-se a discussão sobre asdemandas que requerem a intervenção técnico-operativa, a troca de saberes pormeio do diálogo com a interdisciplinaridade, com a intersetorialidade e se tem apresença de <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> política <strong>no</strong> fazer profissional.Há o entendimento, entre os assistentes sociais, de que o aprimoramentoprofissional se dá através da aprendizagem significativa, que possibilita a mudança<strong>no</strong> seu modo de atuação profissional e na própria organização do trabalho em queestão inseridos. Como exemplo, destaca-se o reconhecimento do grupo quanto aohábito e/ou à habilidade existente, ou, em alg<strong>uma</strong>s situações, a ser desenvolvida, deregistrar o perfil da demanda dos <strong>serviço</strong>s, o que instiga e subsidia o estudo do que


178é cotidianamente vivido para além das percepções inéditas, desafiando o pensarsobre a realidade em que o profissional está inserido.Não se nega e nem se exclui da compreensão dos processos formativos,aqueles <strong>no</strong>s espaços escolares, que se dão na formação inicial ou continuada,através de cursos e ou atividades de aprimoramento profissional. Entretanto, édestacado pelos assistentes sociais, a importância dessas atividades <strong>formativa</strong>sestarem atendendo as demandas trazidas à profissão, sobretudo aquelasexpressões da questão <strong>social</strong> vivenciadas e experimentadas pelos usuários dos<strong>serviço</strong>s de saúde em que atuam. Assim, o conhecimento atualizado através decursos de pós-graduação, de palestras e de seminários em que participaram ossujeitos dessa pesquisa, constituem-se em dispositivos para a modificação dosprocessos de trabalho, das condições e das relações de trabalho entre osprofissionais.A materialização da educação permanente parte de questionamentos quesurgem <strong>no</strong> cotidia<strong>no</strong> do trabalho, na relação com o próprio usuário e com o desejode saber. Desejo esse que tem a ver com as mudanças, com o <strong>no</strong>vo, com aresolutividade e com o comprometimento para consolidação do SUS. Um projeto deformação não é constituído por <strong>uma</strong> coleção de cursos e de palestras (NÓVOA,2007), tampouco pelo acúmulo de técnicas apreendidas. A bagagem essencialdesses assistentes sociais é resultado das experiências e da reflexividade críticasobre estas e, fundamentalmente, de (re) construção de <strong>uma</strong> identidade pessoal eprofissional.Quanto à segunda questão proposta, que refere-se aos obstáculos,dificuldades e, fundamentalmente, às possibilidades de vivenciarem experiências deeducação permanente, foi possível apreender um conjunto de situações vividaspelos assistentes sociais que expressam <strong>uma</strong> forma peculiar de superação e deenfrentamento das dificuldades, tornando aquilo que é impossível em possível.Sem dúvida, as condições e as relações de trabalho em que se inserem osassistentes sociais articulam um conjunto de mediações que atravessam einterferem na operacionalização da ação e, conseqüentemente, <strong>no</strong>s resultadosprojetados. No entanto, há um reconhecimento do contexto em que estão inseridos,


179suas contradições, seus impactos e suas possibilidades. É essa compreensão quetorna-se um dispositivo para identificar o que é possível produzir em termos derespostas, de saberes e de conhecimentos <strong>no</strong> trabalho.Nas narrativas, os assistentes sociais apontam dificuldades, tais como: asestruturas organizacionais rígidas, as disputas e a fragmentação de saberes, oslimites da formação profissional, a acomodação e a falta de compromisso por partede alguns trabalhadores da saúde com a causa pública, a desarticulação dasequipes e os interesses políticos da gestão, entre outros. Entretanto, a consciênciacrítica reflexiva, pertinente a esses assistentes sociais, tem permitido a construçãode estratégias para superação de obstáculos. Reconhece-se que tais dificuldadesfazem parte de <strong>uma</strong> realidade sócio-histórica, das relações de poder e saber dasdinâmicas organizacionais, das contradições, mas tal reconhecimento, por si só, nãose torna <strong>uma</strong> justificativa e um impedimento para deflagarem mudanças, ainda quesejam tímidas e na micro-atuação,Assim, a <strong>dimensão</strong> ético-política é referência para o vir-a-ser, pois além dafunção critica e vigilante que impede a reprodução de componentes alienantes naprática profissional desses assistentes sociais, põe em movimento a <strong>social</strong>ização, oscoletivos de trabalho, a consciência crítica e a liberdade para projetar as mudanças<strong>no</strong>s espaços sócio-ocupacionais. Desta forma, é preciso visualizar as brechaspertinentes as dinâmicas organizacionais e, então, estrategicamente cruzar asmesmas, na busca da efetivação de melhores resultados.Outra possibilidade analisada refere-se à tarefa assumida por essesassistentes sociais de criarem um clima propício à partilha dos saberes e de reflexãosobre situações complexas e contraditórias do trabalho, pois reconhecem ter ascompetências necessárias para a articulação. Observa-se a importância dautilização dos saberes teórico-metológicos do Serviço Social e a sua aplicablidade,pois a <strong>dimensão</strong> técnico-operativa não é algo somente de domínio dessesassistentes sociais, mas é posta em uso, demonstrando a capacidade de utilizaremo que aprendem <strong>no</strong>s processos de formação inicial e <strong>no</strong>s próprios contextos detrabalho.


180O que dá sentido à educação permanente vivenciada por esses assistentessociais é o diálogo provocado entre os profissionais de <strong>uma</strong> equipe, a análiserigorosa dos seus processos de trabalho, das intervenções e a procura coletiva demelhores formas de agir através da interlocução dos saberes. Isso faz crer que é <strong>no</strong>exercício profissional que os Assistentes Sociais vêm rompendo com o trabalhofragmentado, predominando a visão generalista, que valoriza a especifidade daprofissão, tão necessária para atuação <strong>no</strong> campo da saúde.A interdisciplinaridade é algo que acontece a partir da cooperação de váriasdisciplinas para reflexão e análise de <strong>uma</strong> situação de trabalho, da interação e dointercâmbio entre os diferentes profissionais, que resulta não só <strong>no</strong> enriquecimentoformativo dos trabalhadores da saúde, como <strong>no</strong> atendimento das necessidades desaúde e do usuário, por isso valorizada e praticada por esses assistentes sociais.Outra questão diz respeito ao significado atribuído pelos assistentes sociais ànecessidade de educação permanente e à concepção da mesma. As experiênciasde educação permanente, vivenciadas <strong>no</strong> campo da saúde, estão fincadas emprincípios éticos-políticos que consolidam um projeto profissional, mas, também,<strong>uma</strong> política <strong>social</strong> de caráter universal, como o SUS brasileiro. Nas narrativas dosassistentes sociais, os significados atribuídos aos processos de educaçãopermanente não são discursivos, mas são atos, são vividos, são situações deexperimentação. Pode-se concluir que há <strong>uma</strong> predisposição política e ética entre osassistentes sociais, que permite aos mesmos vivenciarem experiências coletivas,sendo capazes de apreenderem o sentido dos “saberes produzidos do e <strong>no</strong> trabalho”(VENDRAMINI, 2006, p.123) e pô-los em uso a <strong>serviço</strong> das demandas postas nasaúde.Contudo, a concepção desenhada coletivamente sobre educação permanentesó foi possível porque as experiências relatadas haviam sido vivenciadas pelosprofissionais e, portanto, não apenas constituíram em materiais para o investigador,como, também, foram “produções de sujeitos que se constroem falando de si”(DUBAR, 2006, p.192). Nesse sentido, das narrativas dos assistentes socais <strong>no</strong>sgrupos focais, pôde-se apreender alg<strong>uma</strong>s pautas <strong>no</strong>rmativas para suaoperacionalização e que merecem destaque, tais como: designar um projetosocietário, é <strong>uma</strong> formação que ocorre fora do sistema educativo superando o


181período de escolaridade, pressupõe a compreensão das diferentes dimensões davida h<strong>uma</strong>na e do desenvolvimento integral da pessoa, incluindo as dimensõesteórico-metodológicas, técnico-operativas e ético-políticas pertinentes ao exercícioda profissão de assistente <strong>social</strong>.O fato de reconhecermos nesse estudo a interlocução da educação e dotrabalho, bem como a relação que os sujeitos estabelecem com seus saberes, <strong>no</strong>spermite repensar que a legitimação profissional se dá, também, a partir dos saberesconstruidos pelos assistentes sociais <strong>no</strong>s seus processos de trabalho. Pode-se dizerque a relação que o assistente <strong>social</strong> estabelece com o saber passa pela suatrajetória de vida, pela forma como o utiliza e a que interesses está atendendo.Como trabalhadores, os assistentes sociais, inscritos na divisão sócio-técnicado trabalho, precisam repensar a formação profissional, considerando apossibilidade de traçar dois caminhos: de um lado está a legitimação <strong>social</strong> do saberdo trabalhador, considerando-se que está em jogo <strong>uma</strong> disputa política eepistemológica, um embate cotidia<strong>no</strong> e de divergências. Nesse espaço de disputa otrabalhador precisa buscar vias de legitimação do seu conhecimento e colocá-los emuso, desencadeando processos coletivos de reflexão e intervenção. O outro caminhodiz respeito às subjetividades, à singularidade, aos desejos do profissional, para queos assistentes sociais saiam da posição de delegar a verdade sempre àqueles quedetém o conhecimento científico ou a tec<strong>no</strong>logia, como se não fossem capazes deproduzirem conhecimentos; ou ainda, para que consigam superar obstáculospertencentes às contradições de <strong>uma</strong> sociedade capitalista, saindo da esfera daqueixa e da imobilização. É preciso optar pela reflexão crítica sobre os seusprocessos de trabalho, deflagrar processos de educação permanente, construiralternativas e descobrir brechas, comprometendo-se de forma autô<strong>no</strong>ma eresponsável com a consolidação do projeto ético-político.Ademais, é fundamental supor que para ocorrer a educação permanente háque se ter coragem de tempos em tempos, “fazer <strong>uma</strong> faxina na cabeça”, revisarconteúdos, crenças, idéias, procedimentos, metodologias, resultados, enfim,reconstruir saberes. Acredita-se que para repensar a formação profissional, deve-selevar em conta os saberes dos assistentes sociais e as realidades específicas, bemcomo as particularidades de seu trabalho cotidia<strong>no</strong>, o que poderá permitir <strong>uma</strong> <strong>no</strong>va


182articulação e equilíbrio entre os conhecimentos produzidos pelas universidades e ossaberes desenvolvidos pelos trabalhadores em suas práticas cotidianas.Outra questão conclusiva, refere-se à importância de revisitar as diretrizescurriculares do Serviço Social e, da mesma forma, refletir sobre os conteúdostrabalhados <strong>no</strong>s espaços acadêmicos, pois os ideários da educação permanentedevem ser postos em debate <strong>no</strong>s diversos espaços formativos dos assistentessociais permitindo a interlocução do ensi<strong>no</strong>, da gestão e do controle <strong>social</strong>, sendoesse último representado pelos usuários do sistema de saúde. Também, éimportante deixar registrado que a educação permanente ao ser assumida como<strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> <strong>no</strong> Serviço Social, poderá incidir na qualidade da formaçãoe do exercício profissional, <strong>uma</strong> vez que surgem em diferentes regiões do territórionacional, <strong>no</strong>vos cursos formadores de Assistentes Sociais, incluindo os de ensi<strong>no</strong> àdistância, porém muitos deles puramente mercantis, sem qualquer mecanismo decontrole dos gover<strong>no</strong>s e/ou órgãos fiscalizadores da categoria. Há então <strong>uma</strong>emergente necessidade de priorizar conteúdos que contribuam na construção doconhecimento, de saberes críticos, enfim de investigação da realidade, para que aformação dos trabalhadores sociais não seja <strong>uma</strong> mera preparação para atender asexigências do mercado de trabalho, mas que possa refletir criticamente sobre aspossibilidades e limites de consolidação do projeto ético-político profissional.A tese defendida nesta pesquisa é de que a educação permanente, sendo areflexão crítica sobre o processo de trabalho, se constitui em <strong>uma</strong> <strong>dimensão</strong><strong>formativa</strong> vivenciada nas situações de trabalho dos assistentes sociais, que se dáatravés da problematização coletiva das demandas que se apresentam, do desejopolítico e ético-profissional, portanto, <strong>uma</strong> estratégia de formação profissional e depossibilidade de mudança e superação das práticas organizacionais, paraconsolidação de um projeto ético-político comprometido com a defesa intransigentedos direitos h<strong>uma</strong><strong>no</strong>s, da justiça, da democracia e da emancipação da cidadania.Para terminar, por tudo que foi possível analisar, conhecer, crescer,amadurecer nas trilhas percorridas, tem-se a convicção de que o grande desafio dosassistentes sociais está na possibilidade de construção de <strong>uma</strong> sociedade em que a<strong>dimensão</strong> ético-política seja o pilar que <strong>no</strong>s permita, permanentemente,“aprendermos a ser”. Este “aprender a ser” pressupõe consciência crítica, reflexão


183sobre os <strong>no</strong>ssos atos, clareza da escolha e importância da profissão de assistente<strong>social</strong>, principalmente na conjuntura econômica, <strong>social</strong> e política da atualidade.Assim sendo, sustentados por essa compreensão que os assistentes sociais, quefizeram parte desta investigação, <strong>no</strong>s presenteiam com suas experiências, com suasutopias, com suas persistências, suas coragens, suas histórias, com seuscomprometimentos, com narrativas que <strong>no</strong>s mostram o como é possível e quemsabe, por meio de processos de educação permanente possa-se cada vez maisaprender a ser ASSISTENTE SOCIAL.!


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APÊNDICES


194APÊNDICE AEstudo ExploratórioProposta de Questionário de Entrevista com Assistente SocialCaro (a) Colega Assistente SocialEste questionário é parte integrante da Pesquisa de Doutorado daAssistente Social Rosa Maria Castilhos Fernandes vinculada ao Pós-Graduaçãoem Serviço Social da PUCRS tendo como orientadora a Profª Drª Jussara Mª RosaMendes, e tem como objetivo analisar como os Assistentes Sociais da área dasaúde vêm desenvolvendo processos de educação permanente <strong>no</strong> seu processode trabalho.Nossa intenção é convidá-lo a fazer parte deste estudo exploratório, poisas informações que forneceres servirão como subsídios para o conhecimento desteprocesso de aprendizagem <strong>no</strong> trabalho dos assistentes sociais (e para a formaçãoposterior de um grupo focal) Para isto será fundamental o preenchimento dasquestões deste questionário e o encaminhamento do mesmo até final de ( a definir)de 2007.Porém antes de dar início à suas elaborações considere por favor o Termode consentimento.Termo de ConsentimentoA pesquisadora considerará que as respostas a esta estratégia de pesquisaindicarão que os pesquisadores estarão consentindo na utilização dos dados aquiobtidos, incluindo a divulgação dos mesmos e a preservação da identidadeindividual. Ao dar prosseguimento a esta navegação estou autorizando apesquisadora Rosa Maria Castilhos Fernandes sob orientação da Drª Jussara MªRosa Mendes a dar continuidade a sua pesquisa que tem como objetivo analisarcomo os Assistentes Sociais da área da saúde vêm desenvolvendo processos deeducação permanente <strong>no</strong> seu processo de trabalho.


195Questionário de Entrevista com Assistente Social1) Identifique-se:Nome:E-mail:1.1) Sobre o espaço sócio-ocupacional na área da saúde:HospitalUnidade Básica de SaúdeHospital em Saúde ComunitáriaPronto AtendimentoVigilânciaGestãoSaúde do TrabalhadorOutros Especifique:2) Sobre a trajetória de Formação Profissional e Educação Continuada :2.1) Graduação em Serviço Social:Instituição de Ensi<strong>no</strong>:A<strong>no</strong> de formatura:


1962.2) Curso de Pós-Graduação Especialização (se mais de <strong>uma</strong> considere apenas aquela comrelação a sua atuação atual):Mestrado Local:A<strong>no</strong> de Conclusão:Doutorado Local:A<strong>no</strong> de Conclusão:Outros Especificar:2.3) Assinale as atividades que participastes <strong>no</strong> período referente a 2000 até a data dopreenchimento deste questionárioCursosPalestrasSemináriosOficinasCongressos Outros Especifique:Na sua opinião você considera que as atividades que participaste contribuíram para o seuaprimoramento profissional e para atender as exigências postas pelo trabalho? Comente arespeito. Se desejar cite um exemplo.


1973) Sobre o processo de trabalho indique as atividades realizadas conforme a prescriçãoabaixo. Marque a alternativa.AtividadesSimNãoÀsVezesElabora pla<strong>no</strong>s, programas e projetos.Viabiliza a participação dos usuários na instituição.Participa de reuniões interdisciplinares( de equipe técnica) sistematicamente.Oportuniza a criação de espaços compartilhados de discussão sobresituações de trabalho entre profissionais de diferentes áreas.Realiza pesquisas que subsidiem as ações profissionaisSocializa conhecimentos adquiridos junto aos seus colegas.Investe <strong>no</strong> aprimoramento profissional <strong>no</strong> espaço de trabalho, a partir dosproblemas referentes à qualidade e eqüidade dos <strong>serviço</strong>s.Elabora indicadores de avaliação de seu trabalho.Participa de reuniões de conselhos e ou atividades.Realiza supervisão de estágio profissional em Serviço Social.Encontra dificuldades para criação de espaços para a discussão daorganização e processo de trabalho.Considera que durante a prática profissional ocorre aquisição deconhecimentos e habilidades para além daquelas apreendidas na formaçãoacadêmica.Os Cursos e/ou capacitações promovidas pela instituição (local de trabalho)atendem as necessidades demandadas pelo <strong>serviço</strong>.Considera que <strong>no</strong> seu cotidia<strong>no</strong> profissional tens a oportunidade de fortalecerseus conhecimentos e construir <strong>no</strong>vos.O compromisso com a qualidade dos <strong>serviço</strong>s prestados à população e com o aprimoramentointelectual, na perspectiva da competência profissional é um dos princípios do <strong>no</strong>sso Códigode Ética e a pesquisa se constituí em um importante instrumento do cumprimento deste,portanto obrigada por ter dedicado seu tempo a esta produção de conhecimento! Rosa.


198APÊNDICE BCONVITENovos modos de conceber e praticar a formação, revelam opotencial formativo das situações de trabalho. Destacam apluralidade de situações educativas que o ambiente de trabalhoproporciona sugerindo <strong>uma</strong> unidade de tempo e de lugar entre aformação e o exercício do trabalho (Malglavie, 1995).È com base neste argumento teórico que estou desenvolvendo minha pesquisade Doutorado para analisar como os Assistentes Sociais que atuam na área dasaúde do município de POA vêm desenvolvendo processos de educaçãopermanente <strong>no</strong>s seus processos de trabalho?Observo que alguns profissionais vêm vivenciando aprendizagens significativas<strong>no</strong> exercício da profissão. Por isso, gostaria muito de contar com suaparticipação na realização de um Grupo Focal sobre Educação Permanente.Onde: Rua Jacinto Gomes 480, apto.32. Bairro Santana (ônibus São Ma<strong>no</strong>elcom parada na Ramiro Barcelos em frente à faculdade de Psicologia da UFRGS,rua paralela à Jacinto).Quando: dia 3 de agosto de 2007(6ª feira).Horário: das 14:30 às 16:30 (pode chegar antes, pois o grupo inicia as 14:30).Caso você necessite de comprovante para apresentar <strong>no</strong> trabalho estará a suadisposição <strong>no</strong> local, assim como o termo de consentimento da pesquisa.Conto com a sua participação e obrigada mais <strong>uma</strong> vez !Até,Rosa Maria Castilhos Fernandes.Assistente Social pesquisadora.Obs.: Por favor confirme sua presença, caso não possa comparecer é sócontatar por este e-mail rmariacf@uol.com.br ou fone 84449781.


199APÊNDICE CTermo de Consentimento:Grupo FocalEu, ____________________________ , RG nº _________________, abaixoassinado, declaro que, de livre e espontânea vontade e de forma gratuita, aceitoparticipar da pesquisa, realizada por Rosa Maria Castilhos Fernandes, orientadapela Profa. Dra.Jussara Maria Rosa Mendes, autorizando o uso do conteúdo dasinformações dadas para que seja utilizado parcial ou integralmente, sem restriçõesde prazos e citações, a partir da presente data, bem como das fotografias tiradas,filmagem e gravação da entrevista, que têm como objetivo a documentação, análisee avaliação da pesquisa. Fui informado(a) dos objetivos da pesquisa que consisteem analisar como os assistentes Sociais da área da saúde vêm desenvolvendoprocessos de Educação Permanente, tendo como benefícios, dentre outros,contribuir com a inserção da educação permanente na <strong>dimensão</strong> <strong>formativa</strong> daprofissão, incidindo assim na qualificação dos profissionais. Os grupos focais serãogravados e transcritos pela pesquisadora retirando quaisquer informaçõesidentificatórias. O grupo focal terá a duração aproximada de 2 horas e eu podereiinterromper a qualquer momento, não sendo obrigado a responder qualquerpergunta que julgar inconveniente. Estou plenamente ciente de minha participaçãonesse estudo e sobre a preservação do meu a<strong>no</strong>nimato. Fico ciente, ainda, sobre aminha responsabilidade em comunicar a pesquisadora qualquer alteração pertinentea esse estudo, podendo dele sair a qualquer momento, sem acarretar prejuízos <strong>no</strong>meu atendimento na instituição da qual participo. Os dados coletados poderão serutilizados para publicação de artigos, apresentação em seminários e similares.Declaro, outrossim, que este Termo foi lido e recebi <strong>uma</strong> cópia.Abdicando direitos autorais meus e de meus descendentes, firmo o presentedocumento. Quaisquer dúvidas em relação à pesquisa, podem ser esclarecidaspelas pesquisadoras pelo fone 33.20.35.39 (Pós Graduação em Serviço SocialPUCRS) ou pelo Comitê de Ética em Pesquisa da PUCRS pelo fone 33.20.33.45.Porto Alegre, __ de ___________ de 2007.Entrevistado(a):Pesquisador (a) Doutoranda: Rosa Maria Castilhos Fernandes /51-84449781.Orientadora: Profª Drª Jussara Maria Rosa Mendes.

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