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B2<br />
POLÍTICA<br />
SALVADOR DOMINGO <strong>29</strong>/5/<strong>2016</strong><br />
CORRUPÇÃO Em meio a denúncias envolvendo figurões do PMDB e aliados,<br />
Temer terá de garantir apoio parlamentar para aprovar as medidas econômicas<br />
VAZAMENTODEÁUDIOSE<br />
QUEDADEJUCÁAGITAMOS<br />
18DIASDAGESTÃOTEMER<br />
PATRÍCIA FRANÇA<br />
Apósumasériedeavançose<br />
recuos, com destaque para a<br />
recriação do Ministério da<br />
Cultura, e de enfrentar a sua<br />
primeira crise política –a<br />
exoneração do ministro do<br />
Planejamento, Romero Jucá,<br />
pego numa gravação sugerindo“umpacto”paraconter<br />
“asangria”daOperaçãoLava<br />
jato –, o governo interino de<br />
MichelTemer(PMDB)chega,<br />
hoje,aoseudécimooitavodia<br />
comumavitóriaimportante<br />
no Congresso Nacional.<br />
O Executivo conseguiu<br />
aprovar a proposta de alteraçãodametafiscalde<strong>2016</strong>.<br />
Na sessão conjunta com senadoresedeputados<br />
federais,quedurou16horasesó<br />
terminounamadrugadade<br />
quarta-feira (25), o Congressoautorizouogovernoafecharoanocomumdéficitde<br />
até R$ 170,5 bilhões.<br />
Apresidente afastada Dilma<br />
Rousseff (PT) havia pedidoautorizaçãoparaumdéficit<br />
de R$ 96,6 bilhões. Caso<br />
otextonãotivessesidoaprovado,oatualgovernoteriade<br />
cumprirametaaprovadainicialmente,queestipulavaum<br />
superávit de R$ 24 bilhões.<br />
Amudançadametafiscal<br />
foiaprimeiraprovadefogo<br />
donovogoverno,emmeioà<br />
ondadevazamentosdegravações<br />
envolvendo figurões<br />
doPMDBedacúpuladoPlanalto.Mas<br />
Temer sabeque<br />
paralevaracabooplanodo<br />
ministro da Fazenda, Henrique<br />
Meirelles, para tirar o<br />
país da crise efazer aeconomiacrescerprecisarátanto<br />
do aval do Legislativo como<br />
do apoio da população.<br />
SemfalarquetalqualDilma,quenoprimeiroanode<br />
seu primeiro governo exonerou<br />
sete ministros envolvidos<br />
em corrupção (o primeiro<br />
foi Antonio Palocci,<br />
do PT,então chefe da Casa<br />
Civil e agora investigado na<br />
LavaJato),Temertemaomenosoutrosseisministrosinvestigados<br />
ou citados por<br />
delatores na Lava Jato.<br />
Alguns tambémserviram<br />
aogovernodapresidentepetista<br />
afastada, como o ministro<br />
do Turismo, Henrique<br />
EduardoAlves(PMDB).Emdezembrode2015,acasadoministrofoialvodemandadode<br />
busca eapreensão em uma<br />
das fases da Operação Lava<br />
Jato, batizada de Catilinárias.<br />
Para oprofessor de Ciência<br />
Política da Universidade<br />
FederaldaBahia(Ufba),Jorge<br />
Almeida, ogrande desafio<br />
deste governo será, portanto,superar<br />
afalta de legitimidade,<br />
que também<br />
marcou o governo passado.<br />
Ele diz que Dilma se elegeu<br />
com um programa de governoeacenou,depois,com<br />
medidas impopulares para<br />
tentar conter a crise econômica.<br />
“OgovernoTemervainesta<br />
direção. Falou em fazer<br />
muitas coisas e teve querecuar,<br />
na ausência de mulheresnoministério,naextinção<br />
do MinC, na volta da CPMF,<br />
impostosenasmudançasda<br />
Previdência. Um desgaste<br />
enorme em poucos dias de<br />
gestão”, assinala Almeida.<br />
Quem bemdefiniu essas<br />
idas e vindasfoi oministro-chefe<br />
da Secretaria de<br />
O governo saiu<br />
vitorioso com<br />
a alteração da<br />
meta fiscal de<br />
<strong>2016</strong> para<br />
déficit de até<br />
R$ 170,5 bilhões<br />
Michel Temer<br />
está sob a<br />
sombra da<br />
Lava Jato<br />
Governo,Geddel VieiraLima,<br />
logo no segundo dia da<br />
novagestão.“Asensaçãoéde<br />
que estamos em um governodequatroanos,comtransiçãode90dias”,disseGeddel,<br />
pedindo “calma” ao ter<br />
denegarqueoExecutivoiria<br />
criar um novo imposto sobre<br />
movimentação financeira,<br />
nos moldes da CPMF.<br />
Falta de popularidade<br />
Ocientistapolíticovêcomo<br />
umoutrocomplicadorofatodeogovernonãoteruma<br />
basepopularparafazersua<br />
defesa.AocontráriodoPT,os<br />
principaispartidosdestegoverno–PMDB,PSDBeDEM<br />
–não têm inserção expressiva<br />
junto aos movimentos<br />
sociais e sindicais.<br />
“O que estamos vendo é<br />
uma crescente mobilização<br />
nas ruas, não só de petistas<br />
Com baixa<br />
popularidade, o<br />
governo ainda<br />
terá de agradar<br />
a sua base no<br />
Congresso em<br />
ano eleitoral<br />
como de vários setores insatisfeitos<br />
com onovo governo.Mas,dooutrolado,do<br />
pessoal quevestia verdee<br />
amarelo epedia o impeachment,<br />
há um silêncio”,<br />
comparaoprofessor.“Ficou<br />
difícildefenderumgoverno<br />
quetem tanta gente envolvido<br />
em corrupção”, frisa.<br />
Àfaltadeapoiopopulare<br />
ao pouco tempoparaaprovar<br />
medidas “fortes” para<br />
combater o desemprego e<br />
recuperaraconfiançadoinvestidor,<br />
o presidente interinoMichelTemeraindaterá<br />
de mostrar,em ano eleitoral,<br />
habilidade para não<br />
melindrarabaseparlamentarconquistadanoprocesso<br />
de impeachment.<br />
OprofessordaUfbaexplica:<br />
“Senadores e deputados<br />
têm interesses específicos<br />
nas suas bases, alguns deles,<br />
inclusive, são candidatos a<br />
prefeito. Não vãoquerer assinar<br />
a responsabilidade de<br />
propostas impopulares”.<br />
Daí,osentidodafrasemartelada<br />
nos últimos dias pelo<br />
ministro da Fazenda, Henrique<br />
Meirelles, de queogoverno“tempressa”paraaprovar<br />
as medidas de equilíbrio<br />
fiscal,comocortesnosgastos<br />
eareformadaPrevidênciaaté<br />
meados de setembro –antes,<br />
portanto, de o impedimento<br />
de Dilma ser votado no plenário<br />
do Senado Federal.<br />
“O<br />
presidente<br />
já disse aos<br />
auxiliares<br />
que se for<br />
preciso<br />
demitir, por<br />
conta de<br />
denúncias,<br />
ele o fará”<br />
ARTHURMAIA, vice-líder<br />
“A sensação<br />
é de que<br />
estamos em<br />
um governo<br />
de quatro<br />
anos, com<br />
transição<br />
de 90 dias”<br />
GEDDEL VIEIRA LIMA,<br />
ministro-chefe da Secretaria<br />
de Governo<br />
Jucá foi exonerado<br />
do Planejamento<br />
Waldemir Barreto/Agência Senado<br />
Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil/ 17.<strong>05</strong>.<strong>2016</strong><br />
Marcelo Camargo /Agência Brasil/ 24.<strong>05</strong>.<strong>2016</strong><br />
Presidenteestá<br />
tranquilo,diz<br />
vice-líderdo<br />
governo<br />
Recém-empossado vice-líder<br />
do governo na Câmarados<br />
Deputados, o baiano Arthur<br />
Maia(PPS)negouquehajacrise<br />
no novo governo,apesar<br />
das gravações e delações que<br />
vieram a público, na semana<br />
passada. Elas revelam que<br />
parlamentaresdoPMDBede<br />
outrospartidosdabase,como<br />
PSDBeDEM,estariamenvolvidos<br />
em corrupção em estatais<br />
e atuando para atrapalhar<br />
a Operação Lava Jato.<br />
ArthurMaiaafirmouque<br />
o presidente Michel Temer<br />
(PMDB)estátranquiloquanto<br />
a esses vazamentos. “Estive<br />
comopresidente eele<br />
não demonstrou preocupação<br />
em relação aisso (denúncias).<br />
A única questão<br />
colocadaporelefoiquantoà<br />
urgência na aprovação da<br />
pauta para tirar o Brasil da<br />
crise”, revelou Maia.<br />
Nasnovas gravações feitas<br />
pelo ex-presidente da<br />
Transpetro Sérgio Machado<br />
–omesmoquelevouàexoneração<br />
de Romero Jucá da<br />
pasta do Planejamento –, o<br />
presidente do Senado, Renan<br />
Calheiros (AL), eosenador<br />
José Sarney (PA), tentamajudaroexecutivoanão<br />
ser preso pela Lava Jato.<br />
Nos áudios vazados, eles<br />
criticamváriospolíticos,como<br />
o senadorepresidente<br />
doPSDBAécioNeves(MG),e<br />
odeputadolicenciadoMendonçaFilho(DEM-PE),atual<br />
ministro da Educação.<br />
Masovice-líderminimiza<br />
oefeitodasgravaçõessobre<br />
o governabilidade e a base<br />
parlamentar no Congresso.<br />
“O presidente já disse aos<br />
auxiliaresqueseforpreciso<br />
demitir,porcontadedenúncias,<br />
ele o fará, e que a Lava<br />
Jato prosseguirá”, disse ele.<br />
Maia afirmou, ainda, que<br />
espera queas questões políticas<br />
geradas pelos vazamentos<br />
não atrapalhem a<br />
aprovaçãodapautaeconômica.<br />
Depois da vitória do governoemgarantiranovameta<br />
fiscal, oesforço, frisou<br />
Maia, será aprovaraLei de<br />
Responsabilidade das Estatais,queobrigaasempresasa<br />
seguirem regras de governança<br />
e de controle de risco,<br />
eareformadaPrevidência–<br />
umadasprincipaispropostas<br />
dogovernoTemerparaequilibrar<br />
as contas públicas.<br />
PATRÍCIA FRANÇA<br />
O foco, agora, é<br />
aprovar a Lei de<br />
Responsabilidade<br />
das Estatais<br />
e a Reforma da<br />
Previdência<br />
Eraldo Peres/AP Photo<br />
TEMER:DILEMAEPERSPECTIVAS<br />
Joviniano Soares<br />
de Carvalho Neto<br />
Professor de Ciência Política<br />
da UFBA<br />
Jovinianoneto@hotmail.com<br />
Michel Temer assumiu um<br />
governo interino comdisposiçãodeefetivo,noinício<br />
do processo de impeachmentdeDilma,enfrentando<br />
problemas decorrentes do<br />
modo como chegou ao poder<br />
e das expectativasdos<br />
que o apoiam ou rejeitam.<br />
No processo de impeachment,<br />
há divisão entre os<br />
queoconsideramlegal,pois<br />
está previsto na Constituiçãoeseguindooritolegal,e<br />
osqueafirmamqueégolpe,<br />
poisDilmanãocometeucrime<br />
de responsabilidade.<br />
Maségolpebranco,comoos<br />
deHonduraseParaguai,eé<br />
parte da tradição brasileira<br />
encobrir ações autoritárias<br />
sob formalismos legais.<br />
Lembramoconceitode“exceção<br />
brasileira”, que emergiudaanálise<br />
do golpede<br />
1964edaditaduraquemanteve,<br />
formalmente, as instituições<br />
democráticas.<br />
Dilmafoieleitacomapoio<br />
dedezpartidos,emum“presidencialismo<br />
de coalizão”<br />
queserompeudiantedacrise<br />
econômica, política e policial<br />
e das diferenças de alternativasparaenfrentá-las.<br />
Porisso,tantosex-ministros<br />
de Lula e Dilma no governo<br />
de Michel Temer.<br />
Parasequalificarcomoalternativa,oPMDBdeTemer<br />
lançou,emoutubrode2015,<br />
o documento “Ponte para o<br />
Futuro”que,aomesmotempo,<br />
serviu para receber<br />
apoio do mercado financeiro,degruposempresariaise<br />
da oposição à Dilma, e para<br />
despertar a reação dos sindicatos,movimentossociais<br />
e partidos de esquerda, inclusivedosquecriticaramo<br />
governo Dilma.<br />
Assumindo ogoverno, Temerdefrontou-secomumdilema:<br />
cumprir rapidamente<br />
aspromessasda“ponte”eestimular<br />
a manutenção das<br />
reações populares ou ir devagar,esperandoaconclusão<br />
doimpeachment.Aopçãofoi<br />
assumircomoefetivo,procurar<br />
garantir maioria no Congresso<br />
e lançar medidas políticaseeconômicasparaobter<br />
apoio, especialmente do<br />
“mercado”.Modificounúmeroeestruturadosministérios,<br />
Se for feliz,<br />
o governo<br />
Temer será de<br />
transição,<br />
“limpeza<br />
de terreno”<br />
para 2018<br />
desencadeando críticas dos<br />
setores desconsiderados;<br />
apresentoupolítica de limitação<br />
do Estado e fortalecimento<br />
do mercado que deve<br />
provocar grandes reações.<br />
Ameta de crescimento<br />
real zero (congelamento)<br />
dasdespesaspúblicas,independentedocrescimentodo<br />
PIB e das receitas, quebrará<br />
os percentuais atualmente<br />
previstos na Constituição<br />
paraeducaçãoesaúde;aretiradadaobrigatoriedadeda<br />
participação da Petrobras<br />
no Pré-Sal, aaceleração de<br />
concessões eprivatizações<br />
garantindo maiores lucros;<br />
a predominância do “negociado”<br />
sobre aCLT; a Reforma<br />
da Previdência, são<br />
exemplosdeagendaque,se<br />
pode estimular empresários,<br />
convoca a reação dos<br />
movimentossociais, de nacionalistas<br />
e esquerdistas.<br />
Enquanto isto, políticos<br />
doPMDB,PP,PSDBsãoatingidos<br />
por “vazamento” de<br />
gravaçõesquandoseprocuraafirmarpoderdoLavaJato<br />
ePolíciaFederal.Vazamento<br />
que derrubou Romero Jucá<br />
do Ministério do Planejamento<br />
e fortaleceu argumento<br />
do impeachment como<br />
golpe, para diminuir<br />
pressão sobre investigados.<br />
Há quem diga que Temer<br />
estaria aplicando fórmula<br />
deMaquiaveldefazeromal<br />
(medidas impopulares ou<br />
dedifícilaprovação)deuma<br />
vezeobemaospoucos.Mas<br />
uma coisa é fazer omal,<br />
abruptamente,outracomos<br />
atingidos avisados, há meses,<br />
do seu conteúdo e consequências.<br />
E Temer tem<br />
pouco tempo para, depois,<br />
fazer “bondades”. No máximo,<br />
se Dilma não retornar,<br />
dois anos e meio.<br />
Nessequadro, seforfeliz,<br />
o governo Temer será de<br />
transição, “limpeza de terreno”para<br />
2018. Conta com<br />
ofatode,antesdasuaposse,<br />
ainflaçãojáestarcaindoea<br />
balança comercial melhorando.<br />
Deve terapoio, condicionado,degrandesmeios<br />
de comunicação, mercado,<br />
setoresdoempresariado,Judiciário,<br />
MinistérioPúblico,<br />
partidos de centro direita.<br />
Com essa base, procurará<br />
implantar novas políticas,<br />
apostarnoimpeachmentde<br />
Dilma, apresentar o que seriam<br />
benefícios paraofuturo<br />
crescimento do país.<br />
Deveráenfrentaradefesa<br />
jurídicaepolíticadeDilma,<br />
amobilização das frentes<br />
“BrasilPopular”e“PovoSem<br />
Medo”, denúncias ou transformaçãoemréusdeapoiadores,<br />
disputas entre partidos<br />
da base, debate nacionalizadonaseleiçõesmunicipais,<br />
mobilização para<br />
eleiçõespresidenciais.Setudodercertoparaele,Temer,<br />
o mais velho aassumir a<br />
Presidência,apóslongacarreirasemnuncaseromaior<br />
protagonista,terá ummandato<br />
curto e instável.