criança e consumo
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(art. 21, XII, a), seja quando atribui à Lei Federal “regular as diversões e<br />
espetáculos públicos, cabendo ao poder público informar sobre a natureza<br />
deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários<br />
em que a sua apresentação mostre-se inadequada” e, igualmente, “estabelecer<br />
os meios legais que garantam à pessoa e à família defenderem-se<br />
de programas ou programações de rádio e televisão” (§ 3º, incisos I e II<br />
do art. 220, respectivamente).<br />
As limitações normativas contidas no inciso X do artigo 5º, nos parágrafos<br />
3º, 4º e 5º do artigo 220 e nos quatro incisos do artigo 221 são<br />
regulações dirigidas ao meio e à mensagem que, em vez de obstar o direito<br />
à liberdade de expressão, viabilizam seu exercício. Quando a Constituição<br />
estabelece tais limitações ao exercício da liberdade de expressão, garante<br />
(empenhando sua força e oferecendo sua proteção) a realização de todo<br />
processo comunicacional cuja mensagem corresponda a um conteúdo<br />
lícito e cujo meio esteja previsto (ou não esteja proibido) por lei. Basta isso<br />
e agentes capazes (emissor e receptor) para que o processo de comunicação<br />
se realize sob garantia ou, sob outra perspectiva, sem que o Estado<br />
atrapalhe. Assim, diz Owen Fiss (2005, p. 13), a regulação justifica-se<br />
“como uma intervenção a favor, e não contra a liberdade de expressão”.<br />
Emissor e receptor capazes, meios não proibidos ou expressamente<br />
permitidos por lei e mensagens lícitas (que não constituem violência dirigida<br />
a outra pessoa, como injúrias e calúnias, por exemplo) são os ingredientes<br />
de um processo de comunicação equilibrado. Poder-se-ia usar<br />
“constitucionalmente adequado” em vez de “equilibrado”, mas a palavra<br />
sozinha é mais sugestiva que a expressão: a própria Constituição recorre a<br />
ela várias vezes para preconizar a harmonia no desenvolvimento socioeconômico<br />
e a cooperação federativa, entre outros valores constitutivos. 15<br />
Assim, sem mais parênteses e explicações indispensáveis, pode-se<br />
definir direito à comunicação como o direito de participar livremente de processos<br />
de comunicação equilibrados por sujeitos plenamente capazes, por<br />
meios prescritos ou não defesos e por mensagens lícitas.<br />
Trata-se de uma definição operacional, que viabiliza a aplicação do<br />
direito à comunicação sob uma perspectiva tanto defensiva, quando<br />
os cidadãos tiverem de recorrer ao Judiciário para embargar qualquer<br />
iniciativa, estatal ou particular, de cerceamento de seu direito de participar<br />
livremente de processos de comunicação equilibrados, quanto ofensiva,<br />
quando os cidadãos obrigarem o Executivo a regulamentar – “atuação<br />
alocativa” do Estado, expressão preferida por Owen Fiss (2005) – todas as<br />
garantias jurídicas (constitucionais e infraconstitucionais) que viabilizam<br />
a participação no processo de comunicação.<br />
DOIS CASOS RELEVANTES<br />
De forma mais concreta, vale considerar dois problemas relevantes<br />
que, atualmente, desafiam a sociedade e o Judiciário brasileiros: a publicidade<br />
dirigida ao público infantojuvenil e a exibição de conteúdos<br />
audiovisuais não recomendados a <strong>criança</strong>s e a adolescentes.<br />
No parecer “A constitucionalidade da restrição da publicidade de alimentos<br />
e bebidas não alcoólicas voltada ao público infantil”, 16 Virgílio Afonso<br />
da Silva demonstra que é, sim, possível restringir por completo a publicidade<br />
destinada às <strong>criança</strong>s. Ele reafirma tanto a proteção constitucional<br />
conferida à publicidade quanto o disposto no artigo 37, parágrafo 2º, do<br />
Código de Defesa do Consumidor, que define como abusiva toda publicidade<br />
que se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da <strong>criança</strong>:<br />
No caso da publicidade dos produtos aqui analisados, são várias as possibilidades<br />
de configuração de restrições. As mais promissoras delas<br />
são aquelas que não proíbem a publicidade de nenhum produto específico,<br />
proibindo apenas que a publicidade desses produtos seja dirigida<br />
às <strong>criança</strong>s. Nenhum desses produtos – gêneros alimentícios e bebidas<br />
– são produtos consumidos apenas por <strong>criança</strong>s. Assim, a publicidade<br />
dirigida aos adultos pode continuar livremente, afinal de contas, são os<br />
adultos, e não as <strong>criança</strong>s, que são consumidores no sentido técnicojurídico<br />
da palavra. É esse público – os adultos – que deve ser o alvo da<br />
publicidade. (p. 27)<br />
Em outros termos, mas sob o mesmo fundamento de que não se pode<br />
considerar a <strong>criança</strong> plenamente capaz de receber, discernir e escolher<br />
tudo o que a propaganda lhe transmite, seria possível descrever esse<br />
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