Marcha News Edição 42 Site

você se lembra?
Ainda aos 03 anos de idade, esse cavalo recebeu o glorioso dever
de apresentar ao universo do Mangalarga Marchador o seu novo
proprietário, e projetar o seu criatório, o Haras das Águas JM, a
nível nacional, posteriormente o ranqueando entre os melhores da
raça.
Quando iniciou a sua trajetória pelas pistas, o Talento sofreu
muito preconceito. Pelos idos anos 2000, a pelagem alazã ainda
não era das mais valorizadas, já que, no Mangalarga Marchador,
ainda havia a prevalente influência de criatórios que foram muito
populares durante as décadas de 1970, 80 e início da década
de 1990. Basicamente, a raça vivia a hegemonia dos animais
tordilhos, ao ponto que qualquer
outra pelagem sofria intensa
discriminação, especialmente a
alazã, alazã amarilha, baia e a
pampa, por serem notoriamente
conhecidas em outras raças de
cavalos brasileiros. Ironicamente,
essas mesmas pelagens estão presentes no Mangalarga Marchador
desde os seus primórdios, remetendo a um período em que a raça
nem era mesmo assim definida.
Não bastasse sua “cor”, a origem do Talento era também
execrada dentro do Mangalarga Marchador. Apesar de ser neto
de Abaíba Marengo, o Talento carrega nas suas veias uma origem
castiça, que o reporta a alguns criatórios da região da Mogiana
Paulista, ainda “novos” para muitos criadores no início dos anos
2000, mesmo que tradicionais e compostos por grandes baluartes
do andamento genuinamente marchado. Poucos anos mais tarde,
tais seleções obtiveram ascensão, reconhecimento e notoriedade,
quando a marcha passou a ser devidamente valorizada na raça.
Logo nos seus primeiros campeonatos, o Talento mostrou quais
rumos o seu destino tomaria. A pelagem e a sua origem, diante de
todas as suas qualidades, em especial a sua temeridade, passaram
a ser barreiras irrisórias.
No ano de 2002, o seu proprietário, ainda novato no universo
das exposições, recebeu a notícia de que o seu garanhão estava
classificado para a Exposição Nacional, que ocorreria na cidade
de Belo Horizonte - MG. Mesmo sendo desprovido de amigos
expositores, de estrutura, conhecimento e reconhecimento no
assunto, além de estar localizado a mais de 1.000km da capital
mineira, o João Mário não desistiu e adotou a digna missão de
disputar o campeonato nacional.
Naquela época, sem ter em mente as devidas proporções do
evento que viria pela frente, o Talento foi levado a Belo Horizonte em
um reboque cedido por um amigo do seu proprietário. No momento
“...uma atuação íntegra e digna do campeão que a desempenhou,
o cavalo que foi motivo de chacota para alguns,
ascendeu à rampa novamente, para receber o emérito prêmio de
Res. Campeão dos Campeões Nacional de Marcha.”
do embarque, o cavalo só coube na carretinha após alguns ajustes,
pois ela era baixa e curta para o animal. Levado por uma camionete
F.1000, com o motorista e mais 03 pessoas a bordo, que estariam à
sua disposição, o Talento chegou ao seu destino.
Após dias de espera, de muito cuidado, zelo e ansiedade, é
chegado o tão esperado momento do campeonato. Mesmo com
todo o receio e tensão, o Talento passou pela seletiva, brilhando
na pista, e conquistou o prêmio de Campeão Nacional de Marcha
Cavalo Jovem, que foi imensamente comemorado, de maneira
merecida, além de ter conquistado, naquela mesma ocasião, o título
de Campeão Brasileiro de Marcha Cavalo Jovem, pois o CBM era
disputado junto com a Exposição
Nacional. Uma vitória inesperada,
não pelo potencial do animal que
sempre foi inquestionável, mas
pelo temor presente referido à
pressão que havia, por parte de
muitos, para que um cavalo alazão
calçado e de frente aberta não vencesse o campeonato. A sensatez
dos árbitros, entretanto, permaneceu soberana mais uma vez.
A sua fama o precedeu, porém, seu proprietário ainda era um
mero desconhecido em meio à multidão, o que ficava ainda mais
nítido quando alguns criadores desmereciam o Talento na sua frente,
sem possuírem conhecimento de que estavam fazendo isso. Assim
ocorreu em vários eventos em que estiveram presentes, porém,
bastava que o cavalo se apresentasse para que, até mesmo os
mais críticos, reconhecessem as suas qualidades como marchador.
Por dentro, nesse instante, João Mário ficava ainda mais orgulhoso
do seu animal.
Confiante, dias depois, o Talento voltou à pista sagrada do
Parque da Gameleira, para participar do Grande Campeonato. Após
uma atuação íntegra e digna do campeão que a desempenhou, o
cavalo que foi motivo de chacota para alguns, ascendeu à rampa
novamente, para receber o emérito prêmio de Res. Campeão dos
Campeões Nacional de Marcha.
Retornando glorioso para a sua morada, o Talento estava pronto
para ser iniciado na reprodução e colocar em xeque, agora, as
expectativas de um futuro promissor como reprodutor. Porém, no
ano de 2004, todos os planos de projetar o iniciante garanhão na
vida reprodutiva foram interrompidos, após o Talento quebrar o seu
posterior esquerdo, após dar um coice na parede da sua cocheira.
A recuperação de uma fratura no membro de um eqüino não
é das tarefas mais fáceis, pois, além de ser um tratamento muito
caro, a grande maioria dos animais acaba sendo sacrificada
por não corresponder às expectativas dessa que é uma terapia
Marcha News XLII - Setembro Dezembro 2018 113