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Moda & Negócios EDIÇÃO 12

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José Nivaldo Junior<br />

A CRISE DE ELEGÂNCIA NA<br />

POLÍTICA<br />

Tem gente que, ainda hoje, erroneamente, associa etiqueta<br />

com futilidade. Claro que “tudo demais é exagero”,<br />

como dizia Almirante, aquele personagem do meu romance<br />

“O Atestado da Donzela 2”, que só falava o óbvio.<br />

A etiqueta, dentro dos limites, torna a vida melhor e mais suave.<br />

Facilita a convivência das pessoas. Ajuda o mundo a ser<br />

mais agradável. Se isso vale para as relações pessoais, ainda<br />

mais se aplica ao mundo político e institucional. O exercício<br />

dos poderes do Estado - Legislativo, Executivo e Judiciário -<br />

não apenas pede, na verdade exige que as condutas dos seus<br />

ocupantes seja pautada por estritos limites formais. Cada<br />

função pública tem suas etiquetas, que garantem a convivência<br />

harmônica dos poderes entre si e principalmente<br />

com o conjunto da sociedade.<br />

Desse modo, o poder sempre foi acompanhado de rituais,<br />

de formalidades, de simbolismos. Em alguns momentos da<br />

História, verificamos até exageros nos trajes, cerimoniais e<br />

rapapés cujo exemplo que me ocorre é a corte de Luís XIV,<br />

na França. Um tipo de elegância,digamos, um tanto exagerada.<br />

Mas as pompas e circunstâncias, o decoro, fazem, como<br />

foi dito, parte do espetáculo do poder. A dignidade com um<br />

toque teatral está intimamente ligada ao desempenho da<br />

função pública. Infelizmente no Brasil recente, essa linha<br />

foi quase que completamente abandonada. Episódios circunstanciais<br />

e raros de quebra de decoro, antes reprovados<br />

e mesmo punidos pelas instituições e pela sociedade,<br />

foram se banalizando a ponto de tornarem-se corriqueiros.<br />

A transmissão ao vivo ou gravação de imagens para a televisão<br />

ao invés de levarem os detentores de cargos públicos a<br />

um comportamento mais comedido, parecem estimular as<br />

demonstrações explícitas de falta de educação doméstica e<br />

coletiva.<br />

Pior e muito mais grave que isso é a deselegância institucional.<br />

A democracia moderna fundamenta-se na harmonia e<br />

interdependência entre os três poderes. Quando esse equilíbrio<br />

é rompido, a ordem institucional fica ameaçada. E nada,<br />

absolutamente nada, justifica condutas que ameacem os valores<br />

democráticos e as garantias das liberdades individuais.<br />

Ser elegante no poder é muito mais que andar bem vestido.<br />

É também, saber desempenhar o seu papel, ocupar dignamente<br />

o seu lugar. Enfim, respeitar a liturgia do cargo para<br />

ser digno dele.<br />

Assistimos recentemente no Brasil a tristes espetáculos de<br />

deselegância institucional. Apenas como exemplo: em um<br />

único dia, a presidente da República atacou duramente um<br />

juiz de primeira instância; membros do Supremo Tribunal<br />

Federal bateram boca com um ex-presidente . E integrantes<br />

do judiciário proferiram impropérios dirigidos a integrantes<br />

dos outros poderes, instalando uma crise institucional<br />

- como se não bastassem as crises política, econômica e ética<br />

já em curso. O que de bom se pode tirar desse desprezo<br />

generalizado pelas liturgias? Também na política, principalmente<br />

no exercício dos poderes, quando a elegância sai de<br />

moda, a sociedade não tem nada a ganhar.<br />

José Nivaldo Junior<br />

Publicitário e escritor. Da Academia Pernambucana de Letras.<br />

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